EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO MECANISMO JURÍDICO: Da Contextualização Histórica à Aplicabilidade do Artigo 225 da Constituição Federal.
Wlisses Figueiredo Matos 1
RESUMO
O presente trabalho apresenta uma breve discussão sobre a educação ambiental no Brasil, seu histórico, sua relação com os princípios do direito ambiental e com as legislações elaboradas de 1964 até a presente data. Ressalta-se também a importância da educação ambiental como mecanismo de construção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado como dispõe o Artigo 225 da Constituição Federal.
Palavras-Chave: Educação Ambiental, Lei 9795/99, Política Nacional de Educação Ambiental e Artigo 225 da Constituição Federal.
ABSTRACT
This paper presents a brief discussion of environmental education in Brazil, its history, its relationship with the principles of environmental law and the legislation drawn up in 1964 to date. We also emphasize the importance of environmental education as a means to construct an ecologically balanced environment as provided in Article 225 of the Constitution.
Keywords: Environmental Education, Law 9795/99, the National Environmental Education and Article 225 of the Constitution.
Introdução
A Constituição Federal Brasileira de 1988 foi um grande marco no direito pátrio por instituir direitos e deveres inovadores, refletindo claramente a situação em que se encontrava a sociedade da época, pós-regime militar, que lutava por direitos iguais garantidos por fim na supradita Carta Magna. Como exemplo esta trouxe conceitos como o da Dignidade da Pessoa Humana e avanços nas áreas sociais, culturais, educacionais e ambientais. Nesta área ressalte-se que foi a primeira a tratar o meio ambiente como um bem de todos; pertencente à coletividade tornando este um princípio da dignidade da pessoa humana (Artigo 225, CF).
Art. 225. "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações".
Por conseguinte, para a promoção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado necessita-se de uma ferramenta eficaz o suficiente para divulgar informações sobre o meio ambiente a toda uma sociedade educacionalmente precária. Quanto a isto o constituinte incumbiu ao Poder Público "a promoção da educação em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente" (Artigo 225, §1º, IV, CF), ressalte-se o caráter amplo desta.
Ciente da importância e da amplitude desta excepcional ferramenta que o Estado
1 Graduando em Direito pelo Centro Universitário do Maranhão
CDP 577820; E-mail: [email protected]
elaborou a Lei 9795/99, que dispõe sobre educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências. Salienta-se que além desta existe a Lei da Política Nacional de Meio Ambiente (Lei 6938/81), uma espécie de "Lei- mãe" de todas as outras.
Data venia, que apesar dos grandes avanços obtidos na legislação ambiental brasileira e do opulento arsenal jurídico-ambiental pátrio, a sociedade ainda continua carente da educação ambiental proposta pelas leis e pela excelsa Constituição; mesmo sendo aquela o melhor mecanismo para a promoção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
A Principiologia do Direito Ambiental e a Educação Ambiental
A Carta Magna Brasileira de 1988 principia os debates de âmbito constitucional sobre direito ambiental, ao dedicar pela primeira vez um capítulo exclusivo para o meio ambiente, tratando-o como um direito difuso e como princípio da dignidade pessoa humana (Artigo 225, CF). A propósito, explica Miguel Reale:
"O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um novo direito da personalidade, que converge necessariamente em direção à realização plena do direito à vida, à saúde e à segurança [...] A cada civilização corresponde um quadro dos direitos da personalidade enriquecida esta com novas conquistas no plano da sensibilidade, graças ao progresso das ciências naturais e humanas"2.
Por ser a educação um valor inerente do ser humano, faz necessário caracterizá-los de forma conjunta e num contexto mais amplo, como por exemplo, a análise deste na coletividade, ou seja, um estudo do indivíduo como um ser social para a promoção da educação ambiental. Ressalte-se que esta visão só foi construída com a criação da "Constituição Cidadã" em 1988, onde novos direitos foram criados tendo princípios como o da dignidade da pessoa humana como paradigma.
Além desta ligação indispensável, a educação ambiental também é tida como um instrumento importantíssimo na aplicação do Direito Ambiental, no que tange ao princípio da prevenção, concernente ao atendimento dos objetivos de preservação, conservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental, como dispõe o artigo 2º da Política Nacional do Meio Ambiente:
Art. 2º "A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios:
I ? ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo;
II ? racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar;
(...)
IV ? proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas representativas;
(...)
VI ? incentivos ao estudo e à pesquisa de tecnologias orientadas para o uso racional e a proteção dos recursos ambientais;
VII ? acompanhamento do estado da qualidade ambiental;
(...)
2 REALE, Miguel. Os direitos da personalidade. Reale advogados associados. Rio de Janeiro, ago.2008. Disponível em: http://www.miguelreale.com.br Acesso em: 21 set. 2010.
IX ? proteção de áreas ameaçadas de degradação;
X ? educação ambiental a todos os níveis do ensino, inclusive a educação da comunidade, objetivando capacitá-la para participação ativa na defesa do meio ambiente".
Destarte que cada ação acima citada está intimamente associada ao disposto no inciso X, pois todos os incisos anteriores necessitam da difusão de informações sobre o meio ambiente, ou seja, para a manutenção do equilíbrio ecológico ou para qualquer ação de proteção do meio ambiente necessita-se anteriormente de uma educação ambiental precisa e eficiente. Em suma, tais ações buscam a educação ambiental para prevenir danos ambientais já comprovados, não se limitando apenas ao princípio da prevenção, estando atrelada de forma direta a princípios como o democrático, do desenvolvimento sustentável e da cooperação. Sendo que o primeiro e o último relacionam-se objetivamente por serem princípios sociais, que primam pelo caráter social do indivíduo e a educação ambiental no âmbito coletivo. Já o intermediário é o objetivo-mor da educação ambiental e de toda política ambiental: a sustentabilidade para as presentes e futuras gerações.
A Legislação Ambiental Brasileira e a Educação Ambiental
Na cronologia da elaboração de leis específicas para conservação e preservação do meio ambiente, o Código Florestal (Lei 4771/65) enceta o preceito educacional ambiental, ao dispor, de forma ainda que autoritária, no seu artigo 42 restrições visando a aplicação da educação florestal nas instituições de ensino.
Art. 42. "Dois anos depois da promulgação desta Lei, nenhuma autoridade poderá permitir a adoção de livros escolares de leitura que não contenham textos de educação florestal, previamente aprovados pelo Conselho Federal de Educação, ouvido o órgão florestal competente".
Quanto ao caráter autoritário do artigo em questão salienta-se o contexto histórico em que foi elaborado recebendo influência direta do regime militar vigente na época, contudo o dito Código possui uma visão educacional ímpar na preservação e conservação dos recursos naturais existentes, promovendo a educação ambiental em sua delimitação formal, reformulando a publicação e editoração de livros escolares.
Por conseguinte, surgiu em 1981 a Lei da Política Nacional de Meio Ambiente (Lei 6938/81), com novas abordagens e paradigmas ambientais. Constituída por 21 artigos, a citada lei estatui normas e conceitos ambientalmente abrangentes e preservacionistas que demarcam a evolução desta no contexto histórico em que foi elaborada e publicada. Em relação à educação ambiental, a mesma aparta no artigo 2º o inciso X, supracitado, relacionando implicitamente esta à execução das atividades dos incisos anteriores.
Já em relação à Constituição Federal, avulta-se o acima exposto, sobressaindo-se o fato desta dedicar um capítulo exclusivo para o meio ambiente, caracterizando a educação ambiental como um direito social difuso, coletivo e de terceira geração. Advindo consecutivamente, a Lei de Crimes Ambientais de 1998 (Lei 9605/98) com uma abordagem mais diferenciada, aplicando a educação ambiental como instrumento de reinserção do infrator, além das multas e sanções penais estipuladas, difundindo ideais de preservação, conservação e sustentabilidade dos recursos naturais, já tão escassos.
Seguindo a relevância gradativa dada a tal mecanismo, o Estado criou a Lei da Política
Nacional de Educação Ambiental (Lei 9795/99), que estabelece diretrizes para a aplicação eficaz da Educação Ambiental no Brasil, definindo-a como um componente essencial e permanente da educação nacional (Artigo 2º). Destarte que o conceito proposto é de caráter amplamente social, no instante em que relaciona o indivíduo a uma coletividade e os une num processo conservacionista em prol de um bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade: o meio ambiente (Artigo1º).
A Educação Ambiental Conforme a Lei 9795/99.
A visão educacional proposta pela Lei da Política Nacional de Educação Ambiental - PNEA tem caráter bastante extensivo abrangendo-a em todos os níveis do processo educativo, ou seja, alcançando os segmentos educativos formais e não formais. Consoante avulta-se o ideal conservacionista, e não preservacionista, desta, razão que relaciona a educação ambiental do indivíduo ao meio em que está inserido, de forma a proteger o meio ambiente com a utilização racional dos recursos naturais manejando-os sustentavelmente para a posteridade.
No âmbito formal destaca-se a amplitude da aplicação da educação ambiental que, segundo o artigo 10, "será desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua e permanente", ou seja, aquela desenvolvida na delimitação dos currículos escolares. Contudo não poderá ser uma disciplina autônoma, mas permear os conteúdos ministrados por todas as outras de forma conexa e lógica, sendo uma "preocupação presente em todo o processo educativo de forma transversal"3, como afirma Paulo de Bessa Antunes. Salvo os cursos de pós-graduação e extensão nos quais lhes é facultada a criação de disciplina específica (Artigo 10, §2º). É importante salientar que para a aplicação eficaz destas regulamentações torna-se necessária uma reforma educacional na formação dos professores de todos os níveis de ensino da educação formal com elaborações de novas metodologias com capazes de instituir tal interdisciplinariedade supra proposta, por exemplo.
Além de tal proposta, o legislador inovou notavelmente ao apresentar à sociedade uma educação ambiental no âmbito não-formal, relacionando-a com a coletividade de maneira mais participativa, como exemplifica claramente o seu conceito: "ações e práticas educativas voltadas à sensibilização da coletividade sobre as questões ambientais e à sua organização e participação na defesa da qualidade do meio ambiente". Logo, cabe enfatizar que a amplitude do alcance deste processo educativo, que ultrapassa as fronteiras da coletividade através de ações conjuntas com entidades públicas e privadas, instituições de ensino, empresas públicas e privadas, atuando e propondo projetos e programas visando difusão de informações sobre o meio ambiente, inserindo desta forma outra visão educacional que não a do ensino formal, posto que a educação ambiental necessita alcançar todos os níveis e modalidades do processo educativo da coletividade como dispõe o artigo 2º desta Lei. Em suma, sua definição pode ser também tida como uma espécie de educação ambiental popular, agindo objetivamente na coletividade visando a formação de sujeitos políticos capazes de agir criticamente na sociedade, uma prática social de construção de cidadania frente às questões ambientais que cercam o indivíduo.
Embora a lei 9795/99 tenha sido inovadora em relação a alguns quesitos, há levantamentos a serem relevados principalmente quanto a sua aplicabilidade que é confundível no que concerne à execução por parte do Poder Público, como por exemplo pela não definição de um órgão gestor, entretanto lhe definindo atribuições. Outros pontos relevantes dizem respeito à
3 ANTUNES, Paulo de Bessa. DIREITO AMBIENTAL, editora Lumen Juris, 5ª edição, ampliada e atualizada; pág.181.
previsão de recursos para aplicação das regulamentações desta lei e à cobrança das responsabilidades atribuídas ao "órgão gestor". Todavia a instituição de recursos destinados à promoção da educação ambiental é importantíssima para o desempenho das atividades educativas e em todo o processo. Neste contexto é relevante citar que o único artigo, artigo 18, que tratava objetivamente desta questão foi vetado pelo então presidente da república, Fernando Henrique Cardoso, e estabelecia que pelo menos 20% dos recursos arrecadados em função da aplicação de multas decorrentes do descumprimento da legislação ambiental deveria ser destinada a ações em educação ambiental.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ab initio dos questionamentos sobre a promoção de uma Política Ambiental eficiente de âmbito nacional, que se busca por mecanismos eficientes o suficiente para cumprir o disposto legalmente. Com o desenvolvimento da legislação pátria ambiental, novos ideais foram propostos e difundidos, assim como importantes mecanismos propostos. Dentre eles destaca-se a promoção da educação ambiental, defendida pela Constituição Federal de 1988 em seu artigo 225 e pelas leis anteriores e posteriores à esta. Neste âmbito sobressai-se a Lei 9795/99, que prescreve regras para a aplicação da educação ambiental, com abordagens inovadoras e amplas, com novos e extensos termos. Entretanto esta lei possui um teor teórico ímpar, mesmo apresentando certa precariedade quanto a sua execução, carecendo de dispositivos regulamentadores também na captação de recursos aplicáveis no fomento da educação ambiental.
Tal fato se percebe nas ações do Poder Público para a promoção da educação ambiental que são em sua maioria insuficientes e divergentes do que dispõe o texto constitucional, pois não suprem a carência de investimentos para implementação de projetos e programas educativos na área ambiental e, principalmente, na formação de profissionais para atuarem como educadores ambientais. Como exemplo, destacam-se os programas e projetos educacionais que divulgam informações sobre o meio ambiente nas comunidades que são, em sua maioria de iniciativa privada e realizadas como cumprimento a alguma sanção ambiental ou para obtenção de algum privilégio como é , por exemplo a Autorização de Supressão de Vegetação (ASV), onde para recebimento desta a empresa solicitante poderá firmar um termo com o órgão competente pela emissão da ASV, responsabilizando-se pela aplicação de algum projeto educativo nas áreas de impacto ou circunvizinhas. Entretanto estas ações não demonstram o caráter contínuo e permanente que deveria caracterizar a educação ambiental brasileira que se encontra cada vez mais inconstante e interrompido pelas limitadas ações do Poder Público.
Neste viés o Estado salienta-se a necessidade de uma reforma na base da regulamentação que trata sobre educação ambiental para atender o disposto constitucionalmente e as consequentes necessidades coletivas. Para se promover educação ambiental é inevitável investimento e planejamento em todas a etapas e categorias. Pois, ainda que o Brasil possua uma legislação ambiental teoricamente cabível e mundialmente inovadora, sua aplicação é ainda precária, dependendo da democratização dos direitos e deveres ambientais de cada indivíduo , e isto só se dará por intermédio da educação ambiental. Em suma a educação precisa ser popularizada, para que o brasileiro possa desempenhar o seu papel de cidadão na solução dos problemas ambientais e na busca de um meio ambiente equilibrado.
Logo para a obtenção de um meio ambiente equilibrado necessita-se de uma eficiente execução da educação ambiental na sociedade, em seus mais diversos setores partindo do âmbito formal para as comunidades. Em suma, os indivíduos necessitam de informações sobre o meio ambiente para poderem atuar de forma harmônica na natureza, e isto somente se dará por intermédio da educação ambiental, que se fundamenta na construção do conhecimento como forma de mudança de comportamentos e atitudes em relação aos problemas ambientais, para a obtenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado defendido tão incisivamente na Constituição.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 5ª. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2001. p. 181. BRASIL;
&#61623; Constituição da Republica Federativa do Brasil (1988). Disponível em:<http://www.senado.gov.br/sf/legislacao/const/ >. Acesso em: 22 set. 2010;
&#61623; REALE, Miguel. Os direitos da personalidade. Reale advogados associados. Rio de Janeiro, ago.2008. Disponível em: http://www.miguelreale.com.br. Acesso em: 21 set. 2010.
&#61623; DIAS, Genebaldo Freire. Educação Ambiental: princípios e práticas. 9. ed. São Paulo: Gaia, 2004.
&#61623; Lei Política Nacional Educação Ambiental. Disponível em: < http://www.lei.adv.br/9795-99.htm > Acesso em: 22 set. 2010