DPVAT: Reflexões Sobre Prescrição e Decadência e os Interesses das Vítimas de Acidentes de Trânsito

Resumo: O DPVAT, ou seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, objetiva proporcionar a todas as vítimas de acidentes automobilísticos indenizações sobre danos pessoais, incluídas a morte e as incapacidades permanentes (totais ou parciais), e sobre as despesas médicas e suplementares. Pode-se dizer até mesmo que o DPVAT, assim, assume certo caráter social. Procuramos, com o presente trabalho, abordar, sob os prismas da lei, doutrina e jurisprudência, questões relativas à natureza jurídica de referido seguro obrigatório bem como aos prazos decadenciais e prescricionais a serem observados pelas vítimas de acidentes que pretenderem receber as indenizações a que têm direito.

Palavras-chave: DPVAT – Seguro obrigatório – Responsabilidade civil – Danos Pessoais – Prescrição.

1. Introdução

Somos obrigados anualmente ao pagamento do prêmio relativo ao seguro DPVAT – seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre –, que é destinado, conforme seu próprio nome sugere, a garantir indenizações às vítimas de danos decorrentes de acidentes automobilísticos.

Todavia, desde a sua criação, o DPVAT tem sido confundido com os seguros de responsabilidade civil, tanto por operadores do direito como por operadores do mercado segurador, de modo a dissociá-lo da teoria do risco e vinculá-lo à teoria da culpa.

Essa infeliz mutação imposta ao DPVAT tem implicado, na problemática processual cotidiana, principalmente com o advento do novo Código Civil, na equivocada percepção quanto ao prazo prescricional das pretensões das vítimas de acidentes de trânsito.

Na judicatura anterior ao Código Civil entendiam os tribunais que referido prazo prescricional era vintenário, eis que a natureza da pretensão do beneficiário contra a seguradora seria diversa à do segurado contra a seguradora.

Atualmente há julgado do recém extinto Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo que entende também incidir o prazo prescricional máximo previsto pelo Código Civil sobre as pretensões das vítimas-beneficiárias contra a seguradora.

Este novo julgado, no entanto, carrega grande equívoco em relação à fundamentação adotada, embora tenha acertado na fixação do prazo prescricional, haja vista ter sido notadamente influenciado pela equivocada jurisprudência pretérita ao atual Código Civil, conforme se vê:

“No sistema do Código Civil de 1916, a prescrição da ação de beneficiário por indenização decorrente de seguro obrigatório dava-se em vinte anos. No do Código Civil de 2002, dá-se em dez anos.

Trata-se de matéria definida na Súmula 124 do extinto Tribunal Federal de Recursos, na orientação do Superior Tribunal de Justiça e na do extinto Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo.”

Todos esses equívocos, passados e presentes, devem ser urgentemente superados, sob pena de aplicar-se prazos prescricionais, desta vez mais exíguos, em detrimento do legítimo direito das vítimas de acidentes de trânsito.

 

2. Considerações sobre a responsabilidade civil

Nos termos do art. 186 do CC: “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”, sendo certo que o autor do ato ilícito está obrigado a reparar o dano causado (art. 927).

Nosso legislador estabeleceu como requisito essencial para a configuração da responsabilidade civil o comportamento culposo ou doloso do agente, ou seja, prevalece entre nós a teoria da responsabilidade subjetiva.

As hipóteses de responsabilidade objetiva contempladas por nosso direito, por seu turno, representam meras exceções à regra da responsabilidade subjetiva, conforme magistério de Rui Stoco, em comentários ao Código Civil:

“Se nos termos do caput do art. 927 desse Estatuto a obrigação de reparar o dano só nasce quando se pratica ato ilícito, tal como definido no art. 187 (como se verifica da remissão a esta norma, contida no art. 927), e desse ato decorre um dano, não há como deixar de admitir que a culpa, queiram ou não, ainda é o pressuposto fundamental da obrigação de reparar.

As exceções em maior número e abarcando outras hipóteses fáticas não contrariam a regra. Ao contrário, a confirmam.”

A obrigação de reparar o dano ilícito, independentemente de culpa, exige previsões legais excepcionais, além de que surgirá referida obrigação nas hipóteses em que o autor do dano desenvolver atividade que, por sua natureza, implicar em riscos excepcionais para terceiros (art. 927, parágrafo único do CC).

São também exemplos dessas exceções, no Código Civil, a responsabilidade objetiva dos pais, tutores e curadores, empregador e donos de hotéis, respectivamente pelos atos dos filhos menores, dos pupilos e curatelados e dos empregados (art. 932); responsabilidade do dono, ou detentor do animal por dano causado por este (art. 936); responsabilidade do dono de edifício ou construção (art. 937); responsabilidade daquele que habita prédio de onde caírem ou forem lançadas coisas (art. 938).

No direito das relações de consumo, o Código de Defesa do Consumidor prevê a responsabilidade objetiva do fabricante, do produtor, do construtor, nacional ou estrangeiro, e do importador, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos (art. 12) e do fornecedor de serviços pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos (art. 14).

Como se vê, as hipóteses de responsabilidades consideradas objetivas representam algumas poucas exceções, à medida que a imensa maioria das condutas cotidianas – ações e omissões – que venham a causar danos a outrem exige, para efeitos de responsabilização por ato ilícito, seja investigada e constatada a culpa, ou dolo, do agente.

2.1 A teoria da culpa

Para que surja a obrigação de indenizar amparada nos arts. 186 e 927 do CC é essencial a presença do fator culpa, que, segundo o mestre argentino Atílio Anibal Alterini, honrosamente invocado por Caio Mário da Silva Pereira, “advém de um ato voluntário, isto é, realizado com os necessários elementos internos: discernimento, intenção e liberdade. Mas a vontade do sujeito, no ato culposo, vai endereçada à sua realização, mas não à conseqüência nociva.”

Em um acidente de trânsito, por exemplo, verifica-se o requisito da culpa quando o causador do evento danoso rompe inadvertidamente o semáforo vermelho, ou desrespeita a ordem de parar, ou transita em velocidade excessivamente alta e incompatível com a via etc.

A culpa, como vontade decorrente do discernimento, da intenção e da liberdade do indivíduo, está intimamente ligada às condutas do mau motorista descritas no parágrafo anterior, embora o resultado danoso, o acidente, não esteja.

A intenção culposa não é causar o acidente, mas sim dirigir em alta velocidade. O acidente e o dano são meras conseqüências da ação culposa, ambos estão ligados pelo nexo de causalidade.

Todavia, em se tratando do seguro DPVAT as indenizações serão pagas independentemente de ter o agente atuado culposa ou dolosamente, mesmo que não se verifique o nexo de causalidade, nos termos do art. 5.º da Lei 6.194/74, como veremos a seguir.

3. Origens do DPVAT: o Recovat e a impropriedade de sua nomenclatura

A origem do seguro DPVAT remonta à década de 60 do século passado (em outros países o seguro obrigatório também remonta a épocas passadas: por exemplo, na Itália, surgiu em 1969, através da Lei 990, de 24.12.1969; na Bélgica, surgiu com a Lei sobre seguro obrigatório de 01.07.1956), quando foi criado seu antecessor, o Recovat (seguro de “responsabilidade civil” dos proprietários de veículos automotores de via terrestre), que era impropriamente filiado à teoria da culpa e, portanto, se enquadraria aos conceitos estabelecidos pelos arts. 186 e 927 de nosso atual Código Civil (correspondentes ao art. 159 do Código então vigente).

Diz-se impropriamente filiado à teoria da culpa porque a incorreta nomenclatura que lhe foi conferida vinculava-o à idéia de seguro de responsabilidade civil. É por isso que o art. 20 do Dec.-lei 73/66, antes do advento da Lei 6.194/74, previa o seguro obrigatório “de responsabilidade civi” dos proprietários de veículos automotores e era assim redigido:

“Art. 20. Sem prejuízo do disposto em leis especiais, são obrigatórios os seguros de:

(...)

b) Responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores de vias terrestre, fluvial, lacustre e marítima, de aeronaves e dos transportadores em geral.”

Referido art. 20 do Dec.-lei 73/66 foi regulamentado pelo Dec. 61.867/67 (e posteriormente pelo Dec.-lei 814/69), que previa garantias contra os danos decorrentes de “responsabilidade civil” do proprietário de veículos automotores, conforme registra Elcir Castello Branco:

“Após o artigo 20, b, do Decreto-Lei 73/66, os seguros obrigatórios foram regulamentados pelo Decreto 61.867, de 7 de dezembro de 1967, o qual fixava como garantia os danos decorrentes de responsabilidade civil do proprietário, causados pelo veículo e pela carga transportada às pessoas e aos bens, transportados ou não (art. 6.º – Decreto citado).”

O mesmo autor já advertia, à época, que os seguros de responsabilidade civil filiam-se à teoria da culpa, à medida que “este ramo visa cobrir, como já dissemos, as obrigações contraída em virtude de ato ilícito culposo pelo qual responda o segurado”, sendo certo que, “de qualquer forma, se considera realizado o evento, com a prática do delito.”

Não poderia ser diferente, já que o próprio Código Civil de 1916, tal como o atual, elegia a culpa como fundamento da responsabilidade civil por ato ilícito, nos termos de seu art. 159: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.”

Diante disso, a nomenclatura do Recovat, de pouco ou nenhum rigor técnico, causou enorme confusão na comunidade jurídica da época, haja vista ter conduzido ao entendimento de que o Recovat filiava-se à teoria da culpa, embora o art. 5.º do Dec.-lei 814/69 (norma que insistia em vincular o Recovat à teoria da culpa) dispusesse que “o pagamento das indenizações será efetuado mediante a simples prova do dano e independentemente de apuração de culpa (...).”

Toda essa problemática, decorrente da impertinente denominação conferida ao então Recovat, culminou no entendimento equivocado de que, sendo referido seguro “de responsabilidade civil”, a prescrição dos beneficiários seria vintenária.

Exemplo máximo do equívoco cometido pelos operadores do direito em decorrência da incorreta nomenclatura do Recovat é a Súmula 124 do extinto Tribunal Federal de Recursos, segundo a qual “prescreve em vinte anos a ação do beneficiário, ou do terceiro sub-rogado nos direitos deste, fundada no seguro obrigatório de responsabilidade civil.”

A prescrição, de fato, era vintenária, mas não porque o seguro era chamado de responsabilidade civil, mas sim porque, tal como ocorre no Código Civil atualmente vigente, não havia previsão quanto à prescrição à pretensão dos beneficiários de indenizações decorrentes de seguros obrigatórios de danos pessoais.

Naquela época, ademais, não havia nem mesmo previsão relativa às pretensões decorrentes de seguros obrigatórios de responsabilidade civil, ao contrário do que se observa atualmente, haja vista o art. 206, § 3.º, IX, do atual CC.

Posteriormente, em 1974, com o advento da Lei 6.194/74, o art. 20 do Dec.-lei 73/66 passou a contar com a seguinte redação:

“Art. 20. Sem prejuízo do disposto em leis especiais, são obrigatórios os seguros de:

(...)

l) Danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não.”

3.1 O DPVAT e a teoria do risco

A Lei 6.194/74 trouxe grande evolução para o campo jurídico da reparação dos danos, à medida que aboliu o seguro de responsabilidade civil obrigatório equivocadamente vinculado à teoria da culpa e, assim, instituiu o seguro obrigatório de danos pessoais corretamente filiado à teoria do risco.

Com efeito, nos exatos termos do art. 5.º de referida Lei 6.194/74, é absolutamente desnecessário apurar-se a culpa, porque “o pagamento da indenização será efetuado mediante simples prova do acidente e do dano decorrente, independentemente da existência de culpa, haja ou não resseguro, abolida qualquer franquia de responsabilidade do segurado.”

A teoria do risco, conforme magistério de Pedro Alvim, pode ser sintetizada pela seguinte concepção: “Toda pessoa que causar dano a outrem sujeita-se à reparação, sem necessidade de indagar se houve de sua parte culpa. O que importa é apenas a causalidade entre o mal sofrido e o fato causador.”

No mesmo sentido, Caio Mário da Silva Pereira:

“Se alguém põe em funcionamento uma qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que esta atividade gera para os indivíduos, independentemente de determinar se em cada caso, isoladamente, o dano é devido à imprudência, à negligência, a um erro de conduta, e assim se configura a ‘teoria do risco criado’.”

Mais recentemente, a Lei 8.374/91 conferiu nova redação ao art. 20 do Dec.-lei 73/66, incluindo no seguro obrigatório os danos causados por embarcações:

“Art. 20. Sem prejuízo do disposto em leis especiais, são obrigatórios os seguros de:

(...)

l) Danos pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres e por embarcações, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não.”

Foi assim que a evolução legislativa aboliu os seguros obrigatórios de responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores de via terrestre, outrora regulamentados pelo revogado Dec. 61.867/67 (equivocadamente filiados à teoria da culpa, insista-se) e trouxe ao cenário jurídico nacional o atual DPVAT, nomeado pelo legislador, com bastante propriedade, aliás, tendo em vista a teoria do risco que lhe norteia, de “seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre (...)”.

Ou seja, a partir de meados da década de 70 do século passado priorizou-se assegurar às vítimas dos infortúnios de trânsito o pronto pagamento da indenização, com o afastamento da dúvida acerca da necessidade de se apurar a responsabilidade, ou ilícito civil, do causador do dano, sendo suficiente, para configurar o direito à indenização, apenas a prova da ocorrência do dano decorrente do acidente respectivo, não importando tenha sido o acidente causado por conduta culposa ou não (tal como haveria de ter ocorrido durante a vigência do Recovat, mas assim não o foi em razão do equívoco surgido em razão de sua nomenclatura).

É por isso que podemos afirmar, com absoluta segurança, que a cobertura do seguro DPVAT não está, e jamais esteve, vinculada nem mesmo às regras de trânsito, à medida que as indenizações devem ser pagas independentemente de apuração de culpa, pouco importando igualmente se a vítima é transportada, ou não, por um veículo automotor.

Nesse sentido, a doutrina dos renomados especialistas Ernesto Tzirulnik, Flávio de Queiroz Bezerra Cavalcanti e Ayrton Pimentel:

“Muito comumente se inclui entre os seguros obrigatórios de responsabilidade civil o seguro de proprietários de veículos automotores de via terrestre, o chamado seguro DPVAT. Bem examinado, o seguro em questão, apesar de sua nominação, não é de responsabilidade civil, e sim de danos, vez que a indenização deve ser paga à vítima independentemente da apuração de responsabilidade. Para que fosse de responsabilidade civil, o seguro DPVAT só deveria operar quando existisse situação capaz de engendrar a responsabilização do segurado, o que não é o caso. A pacificação jurisprudencial de abatimento deste seguro da indenização devida pelo responsável não lhe transmuda a natureza, apenas lhe imprime caráter indenizatório e o abatimento é permitido porque o seguro é custeado pela parte responsável pela indenização. O seguro DPVAT, por não se enquadrar como seguro obrigatório de responsabilidade civil, e sim seguro obrigatório de danos, prossegue regido por legislação especial.”

O direito da vítima ao recebimento da indenização a título de DPVAT persiste até mesmo quando rompido o nexo de causalidade pela presença dos fatores de exclusão de responsabilidade (caso fortuito, força maior, culpa exclusiva da vítima e ato de terceiro), ou quando o veículo causador do dano não é identificado, ou quando não houver o pagamento do prêmio respectivo, bem como, entre outras, nas hipóteses em que o veículo não estiver em circulação ou quando a vítima for o próprio condutor ou o proprietário do veículo responsável pelo pagamento do seguro.

Nesse sentido, corroborando o texto legal, é a jurisprudência:

“Indenização. Seguro obrigatório. Veículos automotores. DPVAT.

A indenização decorrente do chamado Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT), pode ser cobrada mesmo que o acidente seja anterior à Lei 8.441/92 e à formação do consórcio de seguradoras.” (STJ, 3ª T., AgRg no AgIn 781.315/RJ, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 21.09.2006, DJ 16.10.2006).

“Civil e processual. Seguro obrigatório de responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores de via terrestre (DPVAT). Não pagamento do prêmio respectivo. Fato irrelevante ao direito à cobertura pela vítima ou sucessores. Leis 6.194/74. Exegese. Direito existente mesmo anteriormente à alteração procedida pela Lei 8.441/92.

I. O seguro obrigatório de responsabilidade civil de veículos automotores é exigido por lei em favor das vítimas dos acidentes, que são suas beneficiárias, de sorte que independentemente do pagamento do prêmio pelos proprietários, devida a cobertura indenizatória pela seguradora participante.” (STJ, 4ª T., REsp 541-288/SP, rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 26.10.2004, DJ 28.02.2005).

“Civil. Recurso especial. Seguro de danos pessoais causados por veículos de via terrestre (DPVAT). Explosão. Carga inflamável. Hipótese de incidência da norma. Lei 6.194/76.

I – A cobertura do seguro obrigatório prevê como hipótese de incidência o acidente causador de danos pessoais graves, havido com o veículo ou com a carga transportada.

II – O acidente que dá ensejo ao pagamento do seguro não tem, necessariamente, causa no trânsito, mas no dano pessoal provocado também pela carga transportada, ainda que o veículo não se encontre em movimento, nem tampouco seja atingido por outro. Não é o acidente de trânsito, mas o acidente com o veículo, ou com a carga, o fato gerador da obrigação de indenizar em razão das regras do denominado seguro obrigatório.” (STJ, 3ª T., REsp 646-784/RS, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 23.11.2005, DJ 01.02.2006).

O surgimento do direito ao recebimento da indenização a título de DPVAT depende apenas de dois únicos fatores, a causa (acidente) e os danos (sofridos pela vítima), sendo absolutamente dispensável qualquer perquirição sobre o causador do acidente e as circunstâncias deste.

Até mesmo nos casos em que não é possível a identificação do veículo causador do dano persiste o direito ao recebimento da indenização pelo DPVAT, nos termos do art. 7.º da Lei 6.194/74:

“A indenização por pessoa vitimada por veículo não identificado, com seguradora não identificada, seguro não realizado ou vencido, será paga nos mesmos valores, condições e prazos dos demais casos por um consórcio constituído, obrigatoriamente, por todas as sociedades seguradoras que operem no seguro objeto desta lei.”

Conclui-se, assim, que o DVPAT não se enquadra, evidentemente, à natureza dos seguros de responsabilidade civil, os quais exigem, para efeitos de surgimento do direito à indenização, a conduta culposa ou dolosa pelo autor do dano (arts. 186 e 927 do CC).

4. O DPVAT e a prescrição

É de se indagar, a par do que vimos até aqui, acerca da incidência do art. 206, § 3.º, IX do CC.

Esta norma substantiva estabelece prescrever em 3 (três) anos “a pretensão do beneficiário contra o segurador, e a do terceiro prejudicado, no caso de seguro de responsabilidade civil obrigatório.”

Como demonstrado acima, o seguro DPVAT não é seguro de responsabilidade civil fundado na teoria da culpa, mas sim seguro obrigatório de danos pessoais, cuja indenização deve ser prestada, nos termos da própria lei do DPVAT, a todas as vítimas de acidentes automobilísticos independentemente de apuração de culpa, bastando seja demonstrado a existência de dano (às vítimas transportadas ou não) e sua causa (acidente envolvendo veículos automotores).

Também é certo que o legislador substantivo jamais cuidou de estabelecer prazos prescricionais para os seguros obrigatórios de danos pessoais, que é o caso do DPVAT.

Por isso podemos concluir que em razão da omissão legislativa no que tange aos seguros obrigatórios de danos há de prevalecer a incidência do art. 205 do CC, competindo a nós, operadores do direito, sepultar a péssima herança decorrente da equivocada nomenclatura do antigo Recovat.

Cumpre-nos estabelecer, definitivamente, que o DPVAT não é seguro de responsabilidade civil e por isso não está sujeito ao prazo do art. 206, § 3.º, IX do CC.

A pretensão dos beneficiários (vítimas, transportadas ou não, passageiros ou motoristas) do DPVAT prescreve, então, em 10 (dez) anos a contar da ciência expressa dada ao beneficiário da negativa da seguradora ao pagamento da indenização, nos termos da Súmula 229 do Superior Tribunal de Justiça, ou da data do recibo de pagamento realizado a menor.

Cumpre-nos também esclarecer que não se aplica o prazo prescricional estabelecido pelo Código de Defesa do Consumidor para a solução dos conflitos decorrentes do DPVAT.

Com efeito, não se pode falar em dano causado por defeito do produto ou serviço o simples fato de a seguradora negar-se ao pagamento da indenização pretendida pela vítima do acidente de trânsito.

A jurisprudência formada no universo dos seguros facultativos, perfeitamente aplicável, por analogia, aos casos de DPVAT, no que tange aos prazos prescricionais, é assente no sentido de afastar, por tais razões, a prescrição qüinqüenal do Código de Defesa do Consumidor:

“Civil. Acidente de veículo. Seguro. Indenização. Recusa. Prescrição ânua, Código Civil, art. 178, § 6.º, II. Inaplicabilidade à espécie do Código de Defesa do Consumidor, Art. 27.

I. Em caso de recusa da empresa seguradora ao pagamento da indenização contratada, o prazo prescricional da ação que a reclama é o de um (1) ano, nos termos do art. 178, § 6.º, II, do Código Civil.

II. Inaplicabilidade do lapso prescricional qüinqüenal, por não se enquadre a espécie do conceito de ‘danos causados por fato do produto ou do serviço’, na exegese dada pela 2ª Seção do STJ, uniformizadora da matéria, ao art. 27 c/c os arts. 12, 13 e 14 do Código de Defesa do Consumidor.

(...) Na hipótese aqui versada, contrato de seguro de veículos, seriam exemplos de fato do serviço aqueles acidentes decorrentes das garantias adicionais ao contrato, como o caso do segurado que, por mera pane no sistema elétrico de seu automóvel, acionava a assistência 24 horas, vindo o guincho que rebocava seu carro até a oficina mais próxima, sofrer colisão, causando-lhe grandes avarias em seu veículo. (...)” (STJ, REsp 207.789, 2ª Seção, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 27.06.2001, DJ 24.09.2001).

“Seguro. Prescrição. Ação de cobrança de Indenização securitária proposta mais de um ano após a negativa da seguradora. Prescrição do direito ocorrida. Prazo ânuo é do CCB e não do CDC, que se refere às pretensões decorrentes de danos de acidente de consumo previstos nos arts. 12 e 14 do CDC. Sentença correta. Recurso Improvido.” (ApCív 2004.001.01921; rel. Des. José Carlos Varanda; 10ª Câm. Cív. do TJRJ; j. 29.06.2004).

5. Direito intertemporal

Os prazos prescricionais (e também os decadenciais) sofrem influências, muitas vezes indesejáveis, com o surgimento de uma nova lei, principalmente quando a discussão recai sobre os casos de direitos adquiridos, conforme magistério de Humberto Theodoro Junior:

“Quando uma lei nova interfere nos prazos prescricionais, a preocupação histórica sempre se situou no plano do direito adquirido e, conseqüentemente, na necessidade de evitar efeitos retroativos que pudessem desestabilizar a situação jurídica já estabilizada.”

É necessário sejam criadas, assim, regras de transição para a aplicação da nova lei, a fim de que sejam respeitadas as relações estabelecidas sob o amparo da lei revogada e, por conseguinte, o novo prazo prescricional não traga prejuízos ao titular da pretensão.

Nessas hipóteses não se pode admitir que os prazos da lei revogada continuem seu curso normal até o final escoamento do tempo por ela previsto.

Também não é correto desejar que os novos prazos sejam aplicados imediatamente, principalmente em relação àqueles que já iniciaram seu respectivo curso sob a vigência da lei revogada.

Para estas situações o Código Civil previu uma específica regra de transição, nos termos de seu art. 2.028: “Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.”

É de se entender, assim, que em relação à ampliação de determinado prazo prescricional, será aplicada a contagem estabelecida pela nova lei, tomando-se por termo inicial a data do fato ocorrido sob o amparo da lei anterior.

Para as hipóteses de diminuição dos prazos prescricionais, o Código Civil estabelece que deve ser contado e aplicado o prazo da nova lei quando, na data em que entrou em vigor, ainda não tiver transcorrido a metade do prazo fixado pela lei anterior.

Quando, todavia, na data em que passou a viger já tiver transcorrido mais da metade do prazo prescricional estabelecido pela lei anterior, este haverá de ser respeitado e sua contagem seguirá seu curso absolutamente normal até o final.

É mister que se busque conciliar, sempre, os prazos da lei nova e da velha, conforme metodologia adotada por Roubier, invocada por Humberto Theodoro Júnior:

“(...) conta-se o prazo da lei nova a partir de sua vigência, mas não se despreza a fração já transcorrida antes dela. O prazo menor será aplicado, mas se antes de seu vencimento completar-se o prazo antigo (maior), este é que prevalecerá, pois não seria lógico que tendo a lei nova determinado a redução do prazo prescricional sua aplicação acabasse por proporcionar à parte um lapso maior ainda que o da lei velha. Se, porém,o prazo novo (o menor) terminar antes que ultimada a contagem do antigo, é por aquele e não por este que a prescrição se consumará.”

Entendemos, assim, não ser possível aplicar retroativamente o prazo menor da nova lei a contar do nascimento da pretensão, sob o argumento de ainda não ter transcorrido mais da metade do prazo.

O efeito retroativo acarretaria, sem dúvida alguma, situações absolutamente temerárias e indesejáveis, eis que a prescrição consumar-se-ia até mesmo antes do início da vigência do novo Código.

As vítimas de acidentes automobilísticos, ocorridos antes da vigência do novo Código, não terão grandes problemas em relação às regras de transição.

Têm elas o prazo, decadencial, de vinte anos para reclamarem, administrativamente, o recebimento da indenização, a contar da data do sinistro, se na data em que passou a viger o novo Código Civil já tiver transcorrido mais da metade do prazo conferido pelo Código anterior, ou seja, se já tiver decorrido, por exemplo, o lapso de dez anos e um dia. Se ainda não tiver decorrido mais da metade do prazo, aplicar-se-á o prazo novo, de dez anos, a contar da entrada em vigor do novo Código.

Caso a resposta negativa da seguradora, ou o pagamento a menor, ocorra antes da entrada em vigor do novo Código, haverão de ser observadas as mesmas regras de transição para exercerem suas pretensões em juízo. Todavia, caso a resposta negativa da seguradora, ou o pagamento a menor, ocorra em data posterior à entrada em vigor do novo Código, o prazo prescricional para exercerem suas pretensões em juízo será de dez anos.

Para as vítimas de acidentes ocorridos a partir da vigência do novo Código o prazo será sempre o da lei nova, de dez anos, tanto para pleitearem o recebimento da indenização administrativamente (prazo decadencial), quanto para, posteriormente, exercerem suas pretensões em juízo depois da reposta negativa da seguradora ou do pagamento realizado a menor (prazo prescricional).

6. Direito projetado

Há uma melhor solução, de lege ferenda, no sentido de atribuir-se especificamente para os casos de seguros obrigatórios em geral o prazo prescricional único de 03 (três) anos, a contar da ciência da recusa expressa da seguradora, nos termos do art. 136, § 4.º, do Projeto de Lei 3.555, de 2004 (PL 3.555):

“Art. 136. Prescrevem:

(...)

§ 4.º Em três anos, contado o prazo da ciência da recusa expressa da seguradora, as pretensões fundadas nos seguros obrigatórios.”

Referido prazo prescricional, de acordo com o PL 3.555/2004, será suspenso pelas causas previstas pelo Código Civil e, ainda, com o recebimento do aviso de sinistro pela seguradora e mais uma única vez quando a seguradora receber pedido de reconsideração (art. 138, I e II), cessando a suspensão com a comunicação ao segurado da decisão da seguradora:

“Art. 138. Além das causas previstas no Código Civil, a prescrição da pretensão relativa ao recebimento de indenização ou capital será suspensa:

I – Com o recebimento pela seguradora do aviso do sinistro;

II – Uma única vez quando a seguradora receber pedido de reconsideração da recusa de pagamento.

Parágrafo único. Cessa a suspensão quando o interessado for comunicado da decisão da seguradora.”

O PL 3.555/2004 também cuidou de prever a decadência do direito à indenização ou ao capital segurado para o beneficiário que não observar o prazo improrrogável de 03 (três) anos para avisar o sinistro à seguradora:

“Art. 140. Decai do direito à indenização ou ao capital, o beneficiário que deixar de avisar o sinistro à seguradora no prazo de três anos.”

Com a aprovação do PL 3.555/2004 os beneficiários do DPVAT terão de observar dois novos prazos, distintos, um sob pena de perder o direito à indenização e outro sob pena de prescrição da pretensão contra a seguradora.

Atualmente, no entanto, haja vista a já mencionada ausência de previsão legal, a prescrição ocorrerá em 10 (dez) anos a contar da comunicação expressa ao segurado da negativa da seguradora ao pagamento da indenização, ou da data do recibo de pagamento realizado a menor.

Todavia, entendemos que assim como nos seguros facultativos individualmente contratados, também as vítimas-beneficiárias do DPVAT haverão de comunicar o sinistro à seguradora durante um primeiro prazo, de natureza decadencial, iniciado com a ocorrência do evento danoso.

Caso não observe este prazo decadencial o beneficiário estará sujeito à perda do direito ao recebimento da indenização a título de DPVAT, conforme notável doutrina de Ernesto Tzirulnik, Flávio de Queiroz B. Cavalcanti e Ayrton Pimentel:

“A ocorrência do sinistro estabelece para o segurado o ônus de comunicar o evento à seguradora, conforme já examinado. Surge, igualmente, a obrigação para a seguradora de promover a regulação do sinistro. Há uma pretensão de obrigação de fazer, exigível pelo segurado. Dessa maneira, desde o instante em que o segurado tenha ciência da ocorrência do sinistro, começa a correr um prazo de prescrição.

“Caso o segurado se quede inerte, decorrido o prazo legalmente previsto, consuma-se a prescrição, extinguindo sua pretensão perante a seguradora.

“Caso o segurado exerça seu ônus e efetue o aviso de sinistro, terá pretensão apenas se a seguradora se negar ao cumprimento de suas obrigações contratuais, ou se demorar injustificadamente as providências ou respostas. (...)

“Enquanto não houver negativa, não surge propriamente a pretensão, pois não caracterizada a violação. O segurado não pode, todavia, ser compelido a esperar por tempo indefinido. Quando alguma regra, legal, administrativa ou contratual, fixar prazo, o ultrapasse dele caracteriza uma violação autônoma, fazendo surgir a pretensão.”

A doutrina se refere à incumbência do segurado em comunicar o sinistro à seguradora tão logo lhe seja possível, sob pena de perder o direito de pleitear a indenização, como sendo um ônus e não um dever.

Cumpre-nos, assim, estabelecer, ainda que rapidamente, a diferenciação entre ônus e dever, com o auxílio da valiosa doutrina de Paulo Luiz de Toledo Piza:

“No estágio atual da dogmática jurídica sustenta-se que o ônus, tal qual a obrigação, é uma relação de sujeição; porém, enquanto no ônus há a possibilidade de escolha entre o sacrifício de um interesse próprio e o alheio, na obrigação não há essa alternativa. A distinção é importante, porque, tratando-se de ônus, o titular do interesse não tem ação para exigir a satisfação do seu interesse, ao passo que, tratando-se de obrigação, diferentemente, o titular pode exigir judicialmente o cumprimento da prestação.”

As seguradoras têm interesse em que o segurado ou, no caso deste estudo, as vítimas de acidentes de trânsito beneficiárias do DPVAT comuniquem o sinistro o mais rápido possível, a fim de que paguem a respectiva indenização e recalculem suas reservas e provisões técnicas de acordo com a nova realidade.

Todavia, não podem as seguradoras compelir os beneficiários que exerçam este ônus no tempo em que lhes for mais adequado. Não têm ação contra o segurado visando tal desiderato, ao contrário do que ocorreria se a incumbência dos beneficiários do DPVAT fosse classificada como dever.

Às seguradoras cabe apenas aguardar que os beneficiários, sob pena de verem extintas suas pretensões perante aquelas, lhes comuniquem a ocorrência do sinistro e pleiteiem a indenização, quando se iniciará a contagem do prazo para a liquidação das indenizações.

Diante disto e conforme já vimos acima, haja vista a atual ausência de regra legal neste sentido, não nos resta alternativa senão adotar, como prazo decadencial para as vítimas pleitearem a indenização administrativamente, o mesmo prazo que lhes foi conferido para o exercício de suas pretensões em juízo, ou seja, dez anos (art. 205 do CC).

7. Procedimento de regulação e liquidação dos sinistros

O Conselho Nacional de Seguros Privados, através da sua Resolução 099/2003 e respectivo anexo, estabeleceu o prazo de quinze dias para que as seguradoras concluam a regulação do sinistro e paguem as indenizações por morte, invalidez permanente e despesas de assistência médica e suplementar, a contar da data de apresentação da documentação indicada no art. 19 (art. 18).

No entanto, se for detectada alguma falha de natureza formal em um dos documentos, ou existirem indícios de fraude, a seguradora deverá, no prazo máximo de quinze dias a contar do recebimento da documentação, notificar o interessado para que preste esclarecimentos a fim de solucionar as falhas ou para elucidar os fatos indicativos da existência de tentativa de fraude (art. 20).

Resolvidas as falhas e esclarecidas as dúvidas, a seguradora deverá pagar a indenização no prazo máximo de quinze dias, a contar da data do recebimento da resposta (art. 22).

Caso a seguradora entenda que a vítima não tem direito à indenização, seja porque não apresentou a documentação legalmente exigida, seja porque os danos pessoais sofridos não decorrem de acidente automobilístico, deverá manifestar-se expressamente perante a vítima acerca de sua negativa.

As vítimas, no entanto, não estão condicionadas à comunicação da negativa da seguradora em pagar a indenização para exercerem sua pretensão em juízo.

Com efeito, decorrido o prazo de quinze dias sem que a seguradora ofereça uma resposta definitiva acerca do pagamento da indenização, já poderá o beneficiário do DPVAT exercer sua pretensão em juízo, ainda que não se tenha iniciado a contagem do prazo prescricional.

8. Conclusão

Diante de tudo que vimos até aqui, três conclusões se afloram:

1 – O prazo para o beneficiário do DPVAT comunicar a ocorrência do sinistro à seguradora é de 10 (dez) anos, sob pena de consumar-se a decadência de seu direito ao recebimento da indenização a título de DPVAT;

2 – O prazo prescricional, para o exercício da pretensão em juízo, igualmente de 10 (dez) anos, iniciar-se-á somente com o recebimento da comunicação da negativa da seguradora em pagar a indenização pleiteada administrativamente ou da data em que receber a indenização a menor;

3 – O beneficiário do DPVAT poderá ajuizar a ação objetivando o recebimento da indenização securitária ainda que a seguradora não tenha se manifestado negativamente, nas hipóteses em que não for respeitado o prazo legal de 15 (quinze) dias para a liquidação do sinistro. Nestas circunstâncias, o beneficiário ajuizará a ação antes mesmo do início da contagem do prazo prescricional, que depende do recebimento da notícia da negativa expressa da seguradora ou da data do pagamento realizado a menor.

(Trabalho publicado originalmente em Revista de Direito Privado, Vol. 29, Ano 6, jan.-mar./2007, Coord. Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, Editora Revista dos Tribunais http://www.rt.com.br/produtos/produtos_detalhes.aspx?id=16862)