Doação de órgãos: implicações penais da falta de ética médica[1]

Camila Maria Mont’Alverne Frota e Ricardo Castro Ramos[2]

Sumário: Introdução; 1 Disposição sobre o próprio corpo: limites e condições previstas no ordenamento jurídico; 2 Doação de órgãos e a falta de ética médica no Brasil; 3 Relação da prática de doação com a atividade Direito Penal; 4 Conclusões finais

RESUMO

O trabalho tratará da possibilidade de o indivíduo dispor de órgãos do seu próprio corpo e dos riscos de a sua livre vontade de disposição vir a ser desrespeitada por profissionais médicos não-éticos. Sua problemática girará em torno de questões como a possibilidade de a falta de ética médica causar riscos à vida dos candidatos à doação de órgãos, a morte acelerada pela ganância de médicos anti-éticos e o mercado de órgãos para transplante, além disso, questionaremos os aspectos penais dessa prática. O objetivo geral do presente trabalho é demonstrar os aspectos ilícitos da prática anti-ética de transplante de órgãos, tratando de questões envolvendo a prática de doação de órgãos, seu processo histórico no país e suas conseqüências, bem como analisando dispositivos que tratam da prática de crimes relacionados à problemática apresentada.

PALAVRAS-CHAVE:

Transplante. Órgãos. Corpo. Ética. Riscos.

Introdução

A doação de órgãos é um assunto bastante discutido mundialmente. Questiona-se acerca de seus riscos, suas possíveis vantagens e desvantagens, suas conseqüências e os meios através dos quais ela é realizada. Sendo assim, também entra em questão a competência dos profissionais que realizam tal prática. Neste caso, referimo-nos às suas intenções ao realizarem transplantes, à sua ética ou falta dela, caso seus interesses particulares venham a ser externados em situação de tamanha gravidade e seriedade. O presente artigo buscará explorar a prática de doação de órgãos no Brasil, relacionada à falta de ética médica e aos direitos do indivíduo de dispor do próprio corpo.

 A Lei nº 9.434 de fevereiro de 1997 surgiu a fim de dispor sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento, além de dar outras providências a casos dessa natureza. É a partir dela que são refletidos diversos valores culturais em relação a esta questão, e são impostas diversas formas de cuidado e zelo no que se refere à doação entre vivos ou até mesmo à doação post mortem. Vale, também, ressaltar a grande influência e o grande progresso do nosso país no que tange os resultados alcançados pelo programa de transplantes, apesar da escassez de recursos financeiros. Após a análise destes itens, será feita uma outra, que identificará a problemática existente entre a prática de doação e o próprio Direito Penal, já que a falta de ética dos profissionais médicos se caracteriza como crime, atingindo o bem jurídico protegido mais importante: a vida.

  1. 1.     Disposição sobre o próprio corpo: limites e condições previstas no ordenamento jurídico

Primeiramente, é importante ressaltar que dentro dos direitos fundamentais contidos na Constituição Federal brasileira, existe um direito individual de dispor sobre o próprio corpo. Considerando que o ser humano, por ser dotado de consciência e inteligência, capacidade de análise, memória e outros recursos intelectuais, tem a capacidade de tomar decisões racionais. Por este motivo, a liberdade de escolha e a autonomia da vontade são elementos importantes dos direitos fundamentais e do princípio da dignidade humana.

Partindo desta lógica, com a faculdade que o indivíduo possui para tomar decisões que dizem respeito única e somente a sua esfera pessoal, existe o reconhecimento de um direito de cada um de fazer o que lhe interessa, de acordo com as suas preferências, desde que não atinja direito alheio, sendo responsável por qualquer destes atos. Desta forma, exemplificando, ao Estado não cabe impedir o ato religioso de autoflagelação, geralmente praticado por ultra-religiosos, e que do ponto de vista social é bastante reprovado, pois viola a integridade física do praticante. Isto porque, apesar de considerado ato irracional, o indivíduo que pratica atos desta natureza acredita de forma verdadeira – há a necessidade de autenticidade e sinceridade no ato – que a autoflagelação resulta em uma satisfação espiritual.

Portanto, toda pessoa que esteja em pleno gozo de suas faculdades mentais, e em condições reais e autênticas de tomar decisões que dizem respeito somente à ela, poderá dispor do próprio corpo, desde que não atinja o direito de outrem. É importante ressaltar que a verificação da validade do ato é feita com a análise da autenticidade e sinceridade da escolha feita por aquele que dispõe do próprio corpo, não cabendo nestes casos a interferência estatal.

Analisando cientificamente, buscamos primeiramente no ordenamento jurídico, a Constituição Federal do Brasil, que no seu artigo 5° caput, apresenta a liberdade como direito fundamental inviolável, prevendo que:

                “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes” (Constituição Federal, art.5 caput;)

                  É o indivíduo, como vimos, capaz de analisar a sua liberdade como bem entender, desde que não venha a ferir direito alheio. Ainda no artigo 5°, vemos no inciso X que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas (...)”, ressaltando a importância da esfera particular de cada um. Estes princípios que dizem respeito à liberdade individual e esfera pessoal de cada um são responsáveis por revestir os demais dispositivos acerca da disposição sobre o próprio corpo.

               Já no Código Civil Brasileiro, mais precisamente no seu artigo 13, diz que “salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes”. Diante desta previsão, há muito o que se falar sobre a constitucionalidade deste dispositivo, visto que vários tipos permissivos de disposição sobre o próprio corpo atingem os bons constumes, como por exemplo, a faculdade do indivíduo de vender o próprio corpo (prostituição). Outro exemplo que pode considerar uma afronta a este dispositivo, é a prática de doação de orgãos, por a remoção de um tecido ou orgão diminui permanentemente a integridade física.

               Direcionando este tópico para o objetivo principal do presente artigo, o principal dispositivo a ser analisado é o da Lei N° 9.434/1997, auxiliado pela Lei N° 10.211/2001. A primeira “dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento e dá outras providências.”. Já a segunda “altera dispositivos da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997, que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento.”. A prática de doação ou remoção de órgãos e tecidos, em vida ou após a morte, esta regida no Brasil no texto destas duas leis. Estes dispositivos serão analisados de forma mais profunda em um próximo tópico do presente artigo.

               Como apresentado, algumas práticas de disposição causam controvérsia quanto à legalidade, visto que podem atingir as exigências do artigo 13 do Código Civil, no que diz respeito aos bons costumes ou a integridade física. Considerando o princípio da tipificação penal, atividades como a prostituição, por exemplo, que atinge diretamente os bons costumes e a integridade física do praticante, são permitidas, visto que não há no ordenamento qualquer proibição, considerando a disposição sobre o próprio corpo. Importante ressalvar que é proibida a facilitação e intermediação, como também da instituição de casas de prostituição, porém a sua prática é uma liberdade individual que não pode ser coibida (Capítulo V, Código Penal).

               Em relação à doação de órgãos, esta atividade é diretamente interligada ao direito penal no que diz respeito às restrições para a sua legalidade, pois a disposição deve ser gratuita, sem fins comerciais, revestida da autenticidade do pedido do praticante da doação, para fins terapêuticos. Porém, infelizmente, é possível observar no Brasil e no mundo irregularidades nesta prática, principalmente pelo motivo de que envolve a atuação de profissionais da área médica, e que, como será visto, atuam de forma antiética e cometem práticas criminosas, inclusive de homicídio, previsto no artigo 121 do Código Penal.

2. Doação de órgãos e a falta de ética médica no Brasil

Tendo em vista o fato de que a vida humana carece de especial proteção, evitando ao máximo qualquer tipo de risco a destruição e degradação de sua integridade, foram criadas normas a fim de proteger o bem jurídico “vida”. Ao falarmos sobre integridade física, compreende-se que tratamos do direito ao corpo e nele incluindo “os seus tecidos, órgãos e partes separáveis, e o direito ao cadáver” (AMARAL, 2006, p.263). Ou seja, pode-se perceber que estão assegurados não apenas a vida e a totalidade do corpo humano, mas também a tutela à totalidade do corpo do cadáver. A legislação brasileira também assegura proteção ao corpo do cadáver e à doação de seus órgãos. Já afirmou Guilherme Calmon Nogueira da Gama:

O bem jurídico integridade física representa a projeção do princípio da dignidade da pessoa humana sobre o corpo do sujeito e no próprio texto constitucional, pode ser verificado regras que vedam a pratica da tortura, o tratamento desumano ou degradante, a aplicação de penas cruéis (GAMA, 2006, p.34).

Logo, aquele que desrespeita a integridade física de alguém está, também, desrespeitando a norma constitucional, cometendo crime de lesão corporal. É, portanto, dessa forma que diversos profissionais são julgados e condenados pela prática do transplante de órgãos de forma indevida, como trataremos adiante.

No Brasil, o número de transplantes realizados cresce a cada ano, dando destaque ao programa de transplantes, que possui profissionais especializados, inclusive, na Europa e nos Estados Unidos. A porcentagem de doadores vivos é bem maior do que a de doadores cadáveres, que vêm recebendo maior atenção, com o intuito de aumentar seus números pelos próximos anos. O transplante entre doadores vivos é regulado pelo Estado, o qual exige uma autorização judicial em caso de doação entre pessoas sem parentesco. Todo este aparato é concentrado nas Secretarias Estaduais de Saúde com listas únicas regionais, sob observação e fiscalização do Ministério Público. Já podemos afirmar que, de acordo com dados informados, o Brasil perde apenas para os Estados Unidos no ranking de transplantes renais e quando esse número de transplantes é apresentado em relação a uma fração do PIB, o Brasil é aquele com melhor potencial no mundo.

De acordo com o art. 9º da Lei nº 9.434/97, é permitido à pessoa juridicamente capaz dispor gratuitamente de tecidos, órgãos e partes do próprio corpo vivo, para fins terapêuticos ou para transplantes em cônjuge ou parentes consangüíneos até o quarto grau, inclusive, na forma do § 4o deste artigo, ou em qualquer outra pessoa, mediante autorização judicial, dispensada esta em relação à medula óssea. E, seu artigo 4º afirma: “O doador deverá autorizar, preferencialmente por escrito e diante de testemunhas, especificamente o tecido, órgão ou parte do corpo objeto da retirada”. Sendo assim, conclui-se que a doação de órgãos pode ser feita em vida para algum membro da família ou amigo, após avaliação clínica da pessoa. Deve haver compatibilidade sangüínea, excluindo qualquer possibilidade de risco para o doador. Além disso, há órgãos específicos que poderão ser retirados em vida, são eles rim, pâncreas, medula óssea, parte do fígado e parte do pulmão. Somado a estas especificações, há exigências em relação àquela que será um doador como, por exemplo, ser um cidadão juridicamente capaz, apresentar condições adequadas de saúde, avaliadas por um médico que afaste a possibilidade de existir doenças que comprometam a saúde durante e após a doação, querer doar um órgão ou tecido que seja duplo, como o rim, e não impeça o organismo do doador continuar funcionando, ter um receptor com indicação terapêutica indispensável de transplante.

Quando se trata se doador post mortem, o art. 3º da Lei 9.434/97 afirma: a retirada post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de diagnóstico de morte encefálica, constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina. Embora ainda restem batimentos cardíacos, a pessoa com morte cerebral não respira sem auxilio de aparelho, é imprescindível que os órgãos sejam aproveitados enquanto há circulação sangüínea para irrigá-los. Porém se o coração parar, somente as córneas poderão ser aproveitadas. As leis agem de forma a preservar ao máximo a vida humana, devendo-se adotar o transplante como conduta terapêutica quando não houver outra possível forma de tratar o indivíduo e, nos casos de doação em vida, o doador não poderá sofrer nenhum tipo de dano, nenhum prejuízo, como no caso de doação de rim, só poderá ser feita a doação de um dos órgãos.

O Portal do Brasil esclarece:

Quando um doador efetivo é reconhecido, as centrais de transplantes das secretarias estaduais de saúde são comunicadas. Apenas elas têm acesso aos cadastros técnicos de pessoas que estão na fila. Além da ordem da lista, a escolha do receptor será definida pelos exames de compatibilidade com o doador. Por isso, nem sempre o primeiro da fila é o próximo a ser beneficiado. As centrais controlam todo o processo, coibindo o comércio ilegal de órgãos.

Não deveria haver tanta dificuldade em relação à doação de órgãos no Brasil, visto que todo o processo está regulamentado. Apesar de, na área biomédica, os conhecimentos e a tecnologia incorporados aos transplantes já possuírem alto grau de segurança e êxito, ainda observamos lacunas e erros nas áreas ética e jurídica, gerando controvérsias e grandes complicações. Na área ética, há muitos casos de violação do próprio Código de Ética dos profissionais, já na área jurídica, a grande problemática gira em torno dos direitos da pessoa e de seus representantes legais. As questões éticas refletidas pelos transplantes são relativas à experimentação no corpo humano, bem como às decisões relacionadas com a saúde, e ainda questionam os limites do conceito da dignidade e da integridade humana.

Um dos maiores obstáculos para a prática da doação diz respeito à falta de ética dos profissionais responsáveis por esse tipo de procedimento médico. O grande número de casos de violação do Código de Ética acaba por aterrorizar grande parte da população, sendo suficiente para convencê-la a não se submeter aos transplantes. Na última quinta-feira (20 de outubro de 2011), foi finalizado o julgamento do caso Kalume. Tal caso é referente a três médicos acusados de terem retirado os rins de pacientes ainda vivos a fim de usá-los em transplantes particulares em Taubaté, interior de São Paulo, em 1980. A condenação foi referente a crime de homicídio doloso, uma vez que foram desligados os aparelhos que sustentavam a vida das vítimas antes da hora para que houvesse a retirada de seus rins. Durante o julgamento, a primeira pergunta feita aos réus foi se houve extração dos órgãos sem a efetiva constatação de morte encefálica, ou seja, é absolutamente decisória a questão levada a júri. Os médicos foram condenados a 17 anos e meio de prisão pela retirada e tráfico de órgãos de pacientes ainda vivos, todavia possuem autorização do Conselho Regional de Medicina para continuarem atuando na área. São casos como este que deixam grande parte da população insegura. Há violação de direitos fundamentais do ser humano, o corpo humano é tratado de forma grotesca e banal, ferindo princípios que garantem tutela à disposição sobre o próprio corpo e, mesmo assim, profissionais como esses, julgados e condenados, continuam soltos, atuando num processo tão sério e decisivo na vida de muitos indivíduos.

  1. 3.     Relação da prática da doação com o Direito Penal

O artigo 21 do Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem afirma que é dever do enfermeiro cumprir e fazer cumprir os preceitos éticos e legais da profissão. No artigo 27, explicita-se que o enfermeiro deve respeitar e reconhecer o direito do cliente de decidir sobre sua pessoa, seu tratamento e seu bem estar. O artigo 30 afirma que o enfermeiro deve colaborar com a equipe de saúde, no esclarecimento do cliente e família sobre o seu estado de saúde e tratamento, possíveis benefícios, riscos e conseqüências que podem vir a ocorrer. Infelizmente, não é exatamente assim que acontece. O artigo 39 diz que é dever do enfermeiro alertar o profissional quando diante de falta cometida por imperícia, imprudência ou negligência. O artigo 46 ainda afirma ser proibido ao efermeiro promover a eutanásia ou cooperar em prática destinada a antecipar a morte do cliente. Caso o enfermeiro venha a realizar tarefas de competência do médico por sua ordem, caberá possibilidade de denúncia por negligência, e o enfermeiro por conivência.

O médico não pode dispor incondicionalmente da vida de seu paciente a ponto de obrigá-lo a aceitar uma conduta terapêutica, a não ser diante de iminente perigo de vida (...). Nos transplantes, deve o médico informar ao doente todos os riscos operatórios, as possibilidades de êxito e a duração possível de sua sobrevivência. (GOGLIANO, 1993, p.148).

Além disso, o Código de Ética Médica apresenta os artigos a seguir:

Art. 43. Participar do processo de diagnóstico da morte ou da decisão de suspender meios artificiais para prolongar a vida do possível doador, quando pertencente à equipe de transplante; Art. 44. Deixar de esclarecer o doador, o receptor ou seus representantes legais sobre os riscos decorrentes de exames, intervenções cirúrgicas e outros procedimentos nos casos de transplantes de órgãos; Art. 45. Retirar órgão de doador vivo quando este for juridicamente incapaz, mesmo se houver autorização de seu representante legal, exceto nos casos permitidos e regulamentados em lei; Art. 46. Participar direta ou indiretamente da comercialização de órgãos ou de tecidos humanos.

Como em todas as outras áreas, e em relação a todo tipo de interlocutor de determinado ordenamento, aqui também há violação da lei. Alguns profissionais omitem informações ao paciente, justificando-se com a explicação de que, assim, diminuem o estresse da proximidade do transplante, diminuindo os riscos cirúrgicos por conta do estado emocional do doador. Entretanto, há casos mais graves, como Kalume, citado anteriormente, em que, pensando em questões particulares, na maioria das vezes financeira, os profissionais responsáveis pelos transplantes acabam cometendo crimes mais sérios, como o homicídio doloso, haja vista o fato de os médicos terem total conhecimento do Código de Ética e suas conseqüências, devendo ter cuidado preciso, agindo com precaução no que diz respeito à prática de retirada de órgãos de um paciente, e mesmo assim atuam de maneira ilícita.

Além de violação de leis expressas, temos também princípios que sustentam a dignidade da pessoa humana. O princípio da autonomia, por exemplo, garante que a colheita de tecido ou órgãos deve passar por autorização legal do doador e do receptor. O princípio da gratuidade é imposto a fim de agir contra o tráfico de órgãos, uma vez que impõe que o órgão deverá ser dado, nunca vendido. O princípio da intangibilidade corporal garante o vínculo do corpo à identidade pessoal, ou seja, merecedor da dignidade e da indisponibilidade inerentes à pessoa humana. Logo, caso haja intervenção na integridade corporal, também haverá intervenção na integridade pessoal.

  1. 4.      Conclusões Finais

Diante dos fatos e argumentos apresentados no presente artigo, é pertinente afirmar inicialmente que apesar das limitações impostas pelo artigo 13 do Código Civil no que tange à disposição sobre o próprio corpo, esta, quando feita de forma autêntica e verdadeira, e principalmente não atingindo esfera individual alheia, não é passível de uma ação estatal para ser coibida. Em outros termos, o direito de escolha e a liberdade individual de cada um dentro da sociedade não pode ser afetado e violado, nem mesmo pelo Estado.

Outro ponto crucial do estudo realizado neste paper é a inobservância dos valores éticos e morais dos profissionais médicos envolvidos na remoção de órgãos e tecidos de paciente que desejam fazê-la. Além de ferir o que prevê a Lei n° 9.434/97 como também a Lei N° 10.211/2001, os atos gananciosos dos médicos implicam muitas vezes na observância de tipos penais gravíssimos, como, por exemplo, o resultado morte do crime do artigo 121 do Código Penal, o homicídio.

Por fim, é importante concluir a carência de uma fiscalização proporcional aos riscos da prática de dispor sobre o próprio corpo para fins de remoção e doação de órgãos, visto que a falta de ética dos operários da medicina já domina uma parte deste setor da medicina no nosso país, tornando criminosa uma prática que possui como objetivo salvar a vida de inúmeras pessoas que aguardam por uma oportunidade.

REFERÊNCIAS

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[1] Paper apresentado como requisito parcial para aprovação na disciplina Direito Penal do curso de Direito da UNDB ministrada pelo professor Cleopas Isaías;

[2] Graduandos em Direito na Universidade de Ensino Superior Dom Bosco