Cuida-se, na verdade, de forma involuntária da perda do domínio, consistindo, ainda, em instituto de direito manifestamente público, que, aliás, encontra fundamento jurídico constitucional e, como aqui será exposto, regulado outrossim pelo direito administrativo com efeitos no direito civil, já que determina perda da propriedade de bem imóvel unilateralmente, resguardada, claro, a indenização antecipada e justa.
Pois bem.
Nos dizeres de José Cretella Júnior, cumpre trazer à colação a definição do instituto sub examinem;
[?] desapropriação é o procedimento complexo de direito público, pelo qual a Administração, fundamentada na necessidade pública, na utilidade pública ou no interesse social, obriga o titular de bem, móvel ou imóvel, a desfazer-se desse bem, mediante justa indenização paga ao proprietário .

Conforme estatuído junto ao artigo 1275, inciso V, do Código Civil, há perda da posse, por meio de desapropriação. Já no artigo 1228, parágrafo terceiro, do mesmo codex, há a seguinte previsão:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
§ 1o Omissis.
§ 2o Omissis.
§ 3o O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente.
No parágrafo quarto, do mesmo dispositivo, tem-se a criação de novel modalidade de desapropriação, que é aquela cuja determinação emana do Poder Judiciário, sendo, inclusive, de bom alvitre trazer à baila, in litteris verbis, a respectiva redação (vale dizer, in casu, o magistrado deverá fixar o quantum concernente à justa indenização, nos termos do parágrafo quinto):
§ 4o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.
§ 5o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.

Nos termos dos dispositivos acima alinhavados, insta salientar que estamos diante de uma importante inovação trazida pelo Código Civil, que, aliás, encontra inspiração na função social da propriedade.
Por oportuno, vale anotar que não se trata de uma forma de confisco exercida pelo Poder Público, vez que não há falar-se em existência de tal instituto junto ao ordenamento jurídico pátrio, salvo os casos de bem apreendido em decorrência de tráfico ilícito de entorpecentes (artigo 243, parágrafo único, da Constituição da República Federativa do Brasil).
E mais, não há como classificar o instituto sub studio como um ato de compra e venda, porquanto não temos ato voluntário do desapropriado, requisito, aliás, para configuração da alienação pela modalidade de compra e venda.
Ainda, não se cuida de hipótese de servidão administrativa, porquanto, nesta, a Administração Pública não adquire o bem, o que, por óbvio, já diferencia da desapropriação; vale dizer, na servidão, o Poder Público adquire o direito de usar o bem do particular (permanecendo sob o domínio deste), mediante indenização.
Ora, a desapropriação consiste em uma modalidade de transferência da propriedade realizada compulsoriamente e, assim também, em face de particular ou entidade pública de grau inferior, em favor da Administração Pública ou, ainda, de seus concessionários. Sem sombra de dúvida, é uma modalidade de mitigação do direito de propriedade, prevalecendo, neste trilho, o interesse público-social sobre o individual.
Conforme ensinamento de Afrânio de Carvalho
[?] a desapropriação oferece peculiaridade registral de dispensar o registro do título anterior, por se entender que é um modo originário de aquisição da propriedade, em virtude do qual o Estado chama a sai o imóvel diretamente, livre de qualquer ônus. Se o registro existir, a desapropriação será inscrita na folha do imóvel desapropriado para assinalar a perda da propriedade do titular ali nomeado .

Destarte, de rigor anotar que a desapropriação é um modo originário de aquisição da propriedade, sendo, contudo, o registro mero instrumento declaratório, o que nos remete ao fato de que a aquisição do domínio é independente do registro.
No que concerne ao momento em que ocorre a efetiva transferência do domínio, vale salientar que é quando ocorre o depósito realizado nos autos para fins de pagamento da indenização.
Neste sentido, é também o entendimento de José Carlos Moraes Salles:
"Para nós o momento consumativo da desapropriação é aquele em que se verifica o pagamento ou o depósito judicial da indenização fixada pela sentença ou estabelecida em acordo."
O registro tão-somente traz a efetiva regularização da desapropriação havida, sendo, ainda, instrumento de comodidade para os interessados no ato, mormente de quem adquiriu o imóvel, que, possui manifesto interesse de dar publicidade àquele ato. Não é imprescindível, para fins de consumação da desapropriação, o registro. Há operação dos efeitos da desapropriação, em relação a terceiros, ainda que não tenha sido registrada a transferência junto ao Serviço Cartorário respectivo.
Porém, tem-se que a questão não é tão pacífica assim.
José Cretella Júnior aduz, verbi gratia, que não há falar-se em transferência do domínio quanto não houver o registro do título, asseverando, para arrematar, que a sentença proferida pelo magistrado servirá como título hábil ao sobredito registro.
Para fins de complementação do presente artigo, porque fora trazido à baila as questões de necessidade e utilidade pública, vale trazer, à luz do entendimento de Seabra Fagundes, a definição destes pressupostos para desapropriação. Vejamos, pois:
[?] ocorre necessidade pública quando a administração se encontra diante de problema inadiável e premente, que não pode ser removido nem procrastinado, e para cuja solução se torna necessário incorporar ao domínio do Estado o bem particular. A utilidade pública existe quando a utilização da propriedade privada é vantajosa e conveniente ao interesse coletivo, mas não constitui imperativo irremovível. Em verdade, a necessidade é a mesma utilidade, porém, apenas em grau mais elevado .

Conforme entendimento doutrinário, entende-se como sendo necessidade pública os seguintes casos:
a) Defesa do território nacional;
b) Segurança pública;
c) Em casos de calamidade, os socorros públicos;
d) Salubridade pública.

Já no que concerne à utilidade pública, temos:
a) Estabelecimentos de assistência, educação ou instrução pública;
b) Obras concernentes a ruas, praças, canais, estradas de ferro e demais vias públicas em geral;
c) Obras referentes à higiene e decoração de certa localidade, buscando o bem geral;
d) Exploração de minas.

Por todo o exposto, conclui-se pelo fundamento jurídico do instituto da desapropriação, trazendo, ademais, os requisitos (bem como breves definições) exigidos pelo Código Civil de 2002 para fins de desapropriação.






REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. Volume V: direito das coisas /Carlos Roberto Gonçalves. 2ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006.

http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406.htm - Acesso em 17 de junho de 2011.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. v. 3 : direito das coisas/Washington de Barros Monteiro. 37. ed. rev. e atual. por Carlos Alberto Dabus Maluf. São Paulo: Saraiva, 2003.