Fornecimento de Medicamentos e o Poder Público

Lara França Souto

Introdução

 No art. 196 da Constituição Federal estabelece que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução de riscos de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Para regulamentar essas condições foi criada a Lei n. 8.080/1990, que instituiu o SUS (Sistema Único de Saúde). No artigo 2º da referida Lei destaca que “a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício”.

Do Estado pode-se exigir somente a prestação de assistência à saúde. Nos direitos fundamentais inseridos no caput do art. 5º da CF não estabelece nenhum direito à saúde.

 Do dever de fornecimento de medicamentos

A Lei n. 8.080/90 em seu art. 6º diz respeito ao fornecimento de medicamentos. O mesmo estabelece que:

Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS):

I - a execução de ações:

a) de vigilância sanitária;

b) de vigilância epidemiológica;

c) de saúde do trabalhador; e

d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica;

Com base nesse artigo estão sendo conferidos pelo Poder Público efetividade para determinação de medicamentos a quem os requer e deles necessita.

Para Barroso (2008), a concessão de medicamentos pelo Poder Público deve ser ampla, e considera uma excesso de judicialização.

O sistema, no entanto, começa a apresentar sintomas graves de que pode morrer da cura, vítima do excesso de ambição, da falta de critérios e de voluntarismos diversos. Por um lado, proliferam decisões extravagantes ou emocionais, que condenam a Administração ao custeio de tratamentos irrazoáveis – seja porque inacessíveis, seja porque destituídos de essencialidade –, bem como de medicamentos experimentais ou de eficácia duvidosa, associados a terapias alternativas.  Por outro lado, não há um critério firme para a aferição de qual entidade estatal – União, Estados e Municípios – deve ser responsabilizada pela entrega de cada tipo de medicamento. Diante disso, os processos terminam por acarretar superposição de esforços e de defesas, envolvendo diferentes entidades federativas e mobilizando grande quantidade de agentes públicos, aí incluídos procuradores e servidores administrativos. Desnecessário enfatizar que tudo isso representa gastos, imprevisibilidade e desfuncionalidade da prestação jurisdicional. Esses excessos e inconsistências não são apenas problemáticos em si. Eles colocam em risco a própria continuidade das políticas de saúde pública, desorganizando a atividade administrativa e impedindo a alocação racional dos escassos recursos públicos. No limite, o casuísmo da jurisprudência brasileira pode impedir que políticas coletivas, dirigidas à promoção da saúde pública, sejam devidamente implementadas. Trata-se de hipótese típica em que o excesso de judicialização das decisões políticas pode levar à não realização prática da Constituição Federal. Em muitos casos, o que se revela é a concessão de privilégios a alguns jurisdicionados. (BARROSO, 2008 apud MELLO, 2010, p.140-141).

Assim, a jurisprudência pode acabar impedindo que políticas coletivas de promoção à saúde pública sejam devidamente implementadas.

O fornecimento de medicamentos deve basear na política nacional constante na Portaria n. 3.916/98, que estabelece os medicamentos essenciais, da sua aquisição, distribuição e entrega dos medicamentos, buscando atender a maioria da população com problemas de saúde.

Na Constituição, o art. 196 garante a todos o acesso universal e igual aos serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde. Assim, qual o papel dos Estados na entrega desses medicamentos?

De acordo com a Portaria n. 3.916/98, na cláusula 5.3, o elenco de medicamentos que serão adquiridos diretamente pelo estado, inclusive os de dispensação em caráter excepcional, tendo por base critérios técnicos e administrativos.

É estabelecido no art. 17, da Lei n. 8.080/90 que:

Art. 17. À direção estadual do Sistema Único de Saúde (SUS) compete:

I - promover a descentralização para os Municípios dos serviços e das ações de saúde;

II - acompanhar, controlar e avaliar as redes hierarquizadas do Sistema Único de Saúde (SUS);

III - prestar apoio técnico e financeiro aos Municípios e executar supletivamente ações e serviços de saúde;

IV - coordenar e, em caráter complementar, executar ações e serviços:

a) de vigilância epidemiológica;

b) de vigilância sanitária;

c) de alimentação e nutrição; e

d) de saúde do trabalhador;

V - participar, junto com os órgãos afins, do controle dos agravos do meio ambiente que tenham repercussão na saúde humana;

VI - participar da formulação da política e da execução de ações de saneamento básico;

VII - participar das ações de controle e avaliação das condições e dos ambientes de trabalho;

VIII - em caráter suplementar, formular, executar, acompanhar e avaliar a política de insumos e equipamentos para a saúde;

IX - identificar estabelecimentos hospitalares de referência e gerir sistemas públicos de alta complexidade, de referência estadual e regional;

X - coordenar a rede estadual de laboratórios de saúde pública e hemocentros, e gerir as unidades que permaneçam em sua organização administrativa;

XI - estabelecer normas, em caráter suplementar, para o controle e avaliação das ações e serviços de saúde;

XII - formular normas e estabelecer padrões, em caráter suplementar, de procedimentos de controle de qualidade para produtos e substâncias de consumo humano;

XIII - colaborar com a União na execução da vigilância sanitária de portos, aeroportos e fronteiras;

XIV - o acompanhamento, a avaliação e divulgação dos indicadores de morbidade e mortalidade no âmbito da unidade federada.

 Assim, o Estado deve definir os medicamentos a serem adquiridos.

Conclusão

Diante do exposto, o poder público garante o acesso igual aos medicamentos necessários para proteção, promoção e recuperação da saúde aos cidadãos. Cabe aos estados e municípios relacionar os medicamentos essenciais e de distribuição obrigatória aos cidadãos, bem como a distribuição dos medicamentos.

Ademais, o fornecimento dos medicamentos deve ser cumprido através das políticas econômicas e sociais, visto que todos têm direito à obtenção de medicamentos constantes da relação de medicamentos essenciais do município e da relação de medicamentos obrigatórios da União e do estado onde reside.

REFERÊNCIAS

BARROSO, L.R. Da falta de efetividade à judicialização excessiva: direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros para a atuação judicial. Migalhas, 21/1/2008. Disponível em:<http://www.migalhas.com.br/mostra_noticia_articuladas.aspx?cod=52582>. Acesso em:

BRASIL. Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm. Acesso em: 20 mar. 2016.

GOUVÊA, M.M. O direito ao fornecimento estatal de medicamentos. Revista Forense, v.370, Rio de Janeiro, 2003, p.103-104.