DO CONCEITO DE EXECUÇÃO FORÇADA E O SURGIMENTO DO PROCESSO SINCRÉTICO

 

 

 

 

 

Nayana de Alencar Andrade[1]

RESUMO

O presente trabalho visa analisar a execução, estudando seu conceito, peculiaridades e aplicação, bem como se demonstra que, quando a prestação não se realiza voluntariamente, surge a execução forcada através da intervenção estatal. Além disso, fora estudado a execução como apenas uma fase do processo, o chamado processo sincrético. Por fim, fora analisado as normas fundamentais relativas a atividade executiva, tais como o princípio da efetividade, da tipicidade, da responsabilidade patrimonial, do menor sacrifício possível do exetutado, da maior coincidência possível, e por fim, o princípio da nulla executio sine titulo.

Palavras-chave: Execução; Atividade executiva; Normas fundamentais

1. INTRODUÇÃO

 Este trabalho tem como finalidade demonstrar o conceito da execução, demonstrando que a atividade executiva é bastante diferenciada da atividade cognitiva, uma vez que o processo de conhecimento analisa os fatos, constatando a existência ou não de um direito, nascendo uma sentença constitutiva ou condenatória.

Além disso, pretender explicar que quando a prestação não se realiza voluntariamente, surge a intervenção estatal, nascendo a partir daí a chamada execução forçada.

Outro ponto da atividade executiva que ficou explanado foi quais os meios que podem ser utilizados para se realizar a execução: os meios de coercitivos e os meios de sub-rogação, também chamada de execução indireta e execução direta; foi diferenciada também a execução provisória da definitiva.

Ademais, foi tratado dos direitos potestativos, dando seu conceito e fazendo uma relação com a execução, mostrando que os mesmos não se executam.

Esse trabalho, demonstrou ainda que o surgimento do processo sincrético trouxe mais eficiência e celeridade a execução, uma vez que a execução será apenas uma fase do processo.

Além disso, abordou-se as normas fundamentais da execução, dentre eles o princípio da efetividade, da tipicidade, da responsabilidade patrimonial, do menor sacrifício possível do exetutado, da maior coincidência possível, e por fim, o princípio da nulla executio sine titulo, essenciais para a compreensão da execução.

Por fim, é válido dizer que a pesquisa utilizada para a realização deste trabalho foi do tipo bibliográfica, que tem como fonte principal referências publicadas em documentos, com o objetivo de demonstrar, explorar, justificar e esclarecer o instituto analisado.

              

1. DA EXECUÇÃO FORÇADA

1.1 Conceito de Execução

A execução é uma atividade jurisdicional claramente distinta da atividade cognitiva. Ambas possuem atividades bem diferenciadas, pois a cognição trata de um processo de conhecimento, que, por meio da análise de fatos e provas, se verifica a existência ou inexistência de um direito, que em regra resulta em uma sentença constitutiva ou condenatória. Por outro lado, de forma breve, pode-se dizer que a execução busca a satisfação de um direito previamente constituído, cuja atividade dominante é a executiva.

Segundo Câmara, 2010, apud Dinamarco, 1997 pode conceituar execução como um: CÂMARA 2010 P. 150

[...] conjunto de atos estatais através de que, com ou sem o concurso da vontade do devedor (e até contra ela), invade-se seu patrimônio para, à custa dele, realizar-se o resultado prático desejado concretamente pelo direito objetivo material.

 Nesse sentido, a execução pode apresentar-se de duas formas. A primeira é a voluntária, na qual o devedor voluntariamente cumpre com a obrigação, seja ela de fazer, não fazer, dar dinheiro ou coisa distinta de dinheiro. A segunda é a forçada, que se realiza através da atuação do Estado-juiz quando não há o devido cumprimento do dever jurídico por parte do devedor ou responsável.

Diante disso, não havendo o cumprimento normal na prestação, a satisfação se dará através da invasão do patrimônio do executado, com ou sem seu consentimento, e por muitas vezes contra ele, mediante atos jurisdicionais. Portanto, quando surge o inadimplemento, surge para o prejudicado uma pretensão de execução forçada para adimplir um direito à prestação. Ante o que fora exposto, é possível afirmar que a execução possui natureza jurisdicional, uma vez que diante do não cumprimento da prestação, o estado se faz presente, substituindo as partes, em especial o executado, e buscando a realização concreta da lei. (Câmara, 2010)

Os direitos potestativos, diferentes dos direitos a uma prestação, caracterizam-se por criarem uma situação passiva de sujeição, em que, quando exercidos, são capazes de criar, extinguir ou modificar situações jurídicas em relação à outra pessoa, mesmo sem a vontade desta, mas, em alguns casos, fazendo-se necessária a autorização judicial. Essa categoria de direito não impõe ao sujeito passivo uma prestação ou conduta, e sim, uma alteração jurídica, e, por essa razão, não há que se falar em violação de tais direitos. (Didier, 2013)

É de grande importância ressaltar que, devido a isso, os direitos potestativos não são executados, não há como adimpli-los, pois eles se efetivam por si só. O que na verdade se executa é a sentença constitutiva que os reconheceu. Nesse sentido, é importante destacar o pensamento de Fredie Didier Jr (2013, p. 27):

A efetivação de um direito potestativo pode gerar um direito a uma prestação. A situação jurídica criada após a efetivação de um direito potestativo pode ser exatamente um direito a uma prestação (de fazer, não fazer ou dar). Perceba: a efetivação de um direito potestativo pode fazer nascer um direito a uma prestação, para cuja efetivação (deste último), aí sim é indispensável a prática de atos materiais de realização da prestação devida.

O poder judiciário, ao certificar e efetivar um direito potestativo, certificará também a existência de uma prestação. Destarte, a eventual prestação decorrente do exercício de um direito potestativo é reconhecida por uma sentença constitutiva.

Para a realização da atividade executiva, utiliza-se de meios de sub-rogação, em que o Estado-juiz substitui o executado, adentrando o seu patrimônio, mesmo que contra a sua vontade, a fim de satisfazer a obrigação prestacional, garantindo, assim, a concretização do direito. Nesse caso, o Estado faz o papel do devedor, implicando na retirada compulsória do seu patrimônio.

Os meios usados na execução direta são o desapossamento, realizado através da busca e apreensão; a transformação, em que a obrigação é realizada às custas do devedor, ou seja, converte-se uma obrigação de fazer em uma obrigação de dar coisa distinta de dinheiro; e por fim, a expropriação, na qual transforma um bem do devedor em dinheiro. É de grande importância esclarecer que esse método acarreta é oneroso, acarretando custos para o Estado.

Há, ainda, os meios utilizados predominantemente nas obrigações de fazer e não fazer, os chamados meios coercitivos, denominada também de execução indireta. Apesar de não possuir natureza essencialmente executiva, possuem eficiência no processo autônomo de execução ou na fase de execução de um processo misto. Aqui, o Estado estimula o devedor ou responsável para efetuar o direito prestacional, que tanto pode ocorrer pelo medo ou pelo incentivo.

A sanção premial (que pode ser o parcelamento da dívida), as astreintes, ou seja, multas diárias decorrentes do atraso no adimplemento, e a prisão civil são exemplos de execução indireta. Além disso, a execução indireta pode ser de cunho patrimonial como no caso da multa coercitiva ou de cunho pessoal, no caso da prisão civil do devedor.

A execução indireta traz menos custos para o Estado, sendo que é tão eficiente quanto a execução direta, motivo pelo qual é atualmente estimulada.

Contudo, para Humberto Teodoro Júnior, somente há execução forçada quando a execução se realiza pelos meios de sub-rogação.

Conforme Teodoro Júnior, (2009), apud, James Goldschmidt, (1936), a execução forçada ocorre quando há intromissão coercitiva na esfera jurídica do devedor com o fim de obter um resultado real ou jurídico a cuja produção esteja ele obrigado ou pelo qual responda.[2]

Pode se classificar, ainda, a execução em provisória e definitiva. Na execução definitiva não há incertezas sobre o título executivo, pois trata de título fundado em coisa julgada material. Aqui a execução é completa, chegando se a fase final do processo com a entrega do bem da vida. Nessa hipótese são se exige garantias do credor-exequente.

A execução do titilo judicial é definitiva, conforme preleciona art. 587 do Código de Processo Civil, a saber: É definitiva a execução fundada em título executivo extrajudicial; é provisória enquanto pendente apelação da sentença de improcedência dos embargos do executado, quando recebidos com efeito suspensivo.

Quanto à execução provisória, observa-se que esta não possui uma estabilidade no titulo executivo. Aqui paira dúvidas a cerca do título. Esse tipo de execução possibilita ao credor a satisfação da prestação obrigacional, mesmo que sobre essa decisão haja um recurso, desde que seja sem efeito suspensivo. Com isso, há um desestímulo aos recursos interpostos apenas com fito de atrasar o andamento do processo.

Percebe-se, pois, que não se pode distinguir execução provisória de execução definitiva como antes, em que se dizia que aquela era incompleta uma vez que se entendia que ela não chegava à fase final do processo. Desse modo, esse entendimento é ultrapassado, pois ambas chegam a fase final, porém com circunstâncias diferentes. Frisa que o que é provisório é a execução, e não o titulo.

Por outro lado, com fito de garantir e preservar os direitos do devedor-executado exige-se do credor-exequente uma caução, uma vez que a decisão poderá vir a ser modificada ou anulada integralmente, no que será extinta a execução provisória, voltando as partes ao estado anterior, com a devida reparação e indenização pelos prejuízos causados. A reforma ou anulação pode, ainda, ser parcial, em que naquilo que fora modificado ou anulado a execução provisória será extinta, ficando sem efeito, cabendo ainda a reparação e indenização, e no que não for alterada a execução provisória tornará se de imediato definitiva.

Sobretudo, é valido destacar que não exige a caução para a instauração da atividade executiva, mas sim para a prática de atos que poderão causar um dano real.

A caução na execução provisória é dispensada nos casos de crédito alimentar ou crédito decorrente de ato ilícito, desde que seu valor não ultrapasse sessenta salários mínimos e fique demonstrada uma situação de necessidade. Nesses casos, a dispensa da caução fundamenta-se na natureza do título e no seu baixo valor. Em relação ao crédito alimentar a situação de necessidade é presumida.

Outra hipótese que dispensa a caução é o fato de ter pendente um agravo contra decisão que não se admitiu recurso especial nem recurso extraoridinário. Nesse caso, busca se evitar a interposição de recursos meramente protelatórios.

Por fim, há o caso em que a parte é beneficiária da justiça gratuita. A falta de recursos financeiros não pode ser obstáculo para a execução provisória, eis que estaria ferindo preceitos constitucionais, dentre eles o do acesso à justiça. Contudo, isso não é suficiente para afastar a caução, pois assim o sistema processual estaria adotando medidas assistencialistas. O magistrado deve, no caso concreto, buscar solucionar esse conflito de interesses com base no principio da proporcionalidade, em que deve se medir o direito de acesso à justiça do credor e a preservação material do devedor.

A execução é, também, distinguida quanto à amplitude do seu conceito. Ao se tratar da execução em sentido amplo, ou execução lato sensu, verifica-se a presença dos meios de sub-rogação e coerção, que busca a concretização prática da vontade da lei. Por sua vez, a execução em sentindo estrito, ou execução stricto sensu, dispõe apenas dos meios de sub-rogação, realizando apenas os resultados que produziria se o executado adimplisse a devida prestação.

No processo executivo, a atividade predominante é a executiva, porém nela não se esgota. Há também atividade cognitiva. O magistrado, em certos momentos, poderá formar juízos de valor, seja no processo autônomo de execução, ou na fase executiva, objetivando sempre a real efetivação do direito do demandante. Porém, vale ratificar que a atividade cognitiva e a executiva são bastante distintas. No processo de conhecimento, o fim normal é alcançado quando o resultado da ação é favorável ou não ao demandante.

Entretanto, na fase executiva o fim normal é alcançado apenas quando o resultado final é satisfatório ao demandante, pois é para isso que se destina a execução. Se, por qualquer motivo, o resultado da ação não for favorável ao demandante, esse será considerado anômalo. Por esse motivo, diz-se que a ação da execução possui desfecho único. 

Será considerado também desfecho anômalo quando a execução da sentença não trouxer o resultado reclamado pelo demandante. A execução não é concreta, podendo o resultado da sentença ser diverso do esperado pela parte ativa, desviando-se assim do objetivo da execução, ou seja, da satisfação do credor. Nesse caso, a execução será considerada abstrata.

Um ponto que merece destaque no estudo das execuções são as duas formas viáveis para a efetivação da prestação devida, que tanto pode se realizar mediante um processo autônomo ou mediante fase de um processo misto, que será decidido pelo legislador com base na política legislativa de acordo com aparato histórico, cultural e econômico.

Nesse sentido ensina Fredie Didier Jr (2013, p. 29):

É preciso, pois, perceber que nem toda execução de sentença ocorre, necessariamente, em um processo autônomo de execução. No entanto, convém frisar: toda a execução realiza-se em um processo de execução, procedimento em contraditório, seja em um processo instaurado com esse objetivo, seja como fase de um processo sincrético.

Há execução sem processo autônomo de execução, mas não há execução sem processo.

Antes, a diferença do processo de conhecimento e do processo de execução era bem definida. Para obter a efetivação do direito, era necessário ingressar novamente no judiciário, o que tornava pouco eficiente e demandava muito tempo, uma vez que era necessária nova citação, entre outras diligencias. Contudo, alguns atos processuais comprometiam a pureza dos módulos processuais, motivo pelo qual recebia diversas críticas por parte da doutrina, que apoiava, segundo Fredie Didier Jr (2013, p. 30) a “ideia de que a divisão dos processos deveria dar-se pela predominância da função, não pela exclusividade”.

As obrigações de fazer e não fazer trazia uma peculiaridade. Estas possuem a chamada força executiva própria, ou seja, para a efetivação das mesmas dispensava-se um processo autônomo de execução. Nesses casos, dentro do mesmo processo, o magistrado realizava as providencias necessária para a satisfação do credor, fazendo da execução apenas uma fase complementar. Observou que tal procedimento não comprometia os fundamentos e valores do processo, reforçado a ideia da desnecessidade da distinção processual. A partir disso, tal procedimento alcançou as obrigações de dar coisa distinta de dinheiro, promovendo maior dinamicidade para a satisfação da prestação.

Além disso, outra questão que fragilizou essa estrutura foi a generalização da tutela antecipada, que passou a ser aceita pelo legislador no procedimento comum, e, com isso, os atos executivos passaram a ser efetivados no procedimento padrão, afetando a pureza dos módulos processuais.

Essa mudança ocasionou uma contradição no sistema processual, uma vez que era mais eficiente o pedido da tutela antecipada do que a própria sentença, pois para executar a sentença fazia-se necessário um novo processo, o que demandaria mais tempo. Além disso, a sentença se pauta na cognição exauriente, o que dificulta ainda mais sua execução. Nessa linha, para manter a lógica processual, o legislador pôs fim a essa dessemelhança.

Nesse contexto, angariou os processos sincréticos, mistos ou multifuncionais, tornando a execução forçada mais célere, pois o magistrado, ao certificar o direito, sine intervalo, realiza os procedimentos necessários para a satisfação prestacional. (Didier, 2013)

Observa-se, porém, que as obrigações de pagar quantia não obtiveram mudanças, permaneceram, portanto, com as decisões ex intervalo, necessitando de um processo autônomo de execução. Contudo, com a prática forense, essa necessidade caiu por terra, verificando a eficiência do processo sincrético, em que a execução é realizada apenas com uma fase no processo, como já ocorria nas obrigações de fazer, não fazer e dar coisa. Diante disso, a Lei Federal n. 11.232∕2005 criou a fase de cumprimento de sentença, em que a execução será apenas uma fase, não havendo mais necessidade de criar um novo processo com essa finalidade.

Por fim, há que se ressaltar que a sentença penal condenatória transitada em julgado, a sentença arbitral, a sentença estrangeira homologada pelo STJ e o acórdão que julgar procedente revisão criminal necessitam de um processo autônomo de execução.

1.2 Normas fundamentais da execução

Diante das mais variáveis normas jurídicas destinadas a regular fatos conexos, são claramente perceptíveis a presença de alguns pressupostos que norteiam o legislador em busca, principalmente, da interpretação particular da norma, seguindo em concordância com os demais institutos. Esses são os chamados princípios.

O processo de execução forçada e o processo de conhecimento são regidos pelos mesmos princípios. Contudo, há princípios gerais específicos próprios da atividade executiva.

1.2.1 Princípio da Efetividade

Segundo Fredie Didier Jr (2013), todo princípio do direito processual nasce da cláusula geral do “devido processo legal” e é dela que se retira o princípio da efetividade, ou ainda, direito fundamental à tutela executiva.

De acordo com este princípio, todo e qualquer direito que venha a ser reconhecido deverá ser devidamente efetivado. Para que o sistema executivo torne-se completo, deve haver meios executivos que possibilitem a inteira satisfação do direito.

À luz desse princípio, é valido citar a frase de Chiovenda, a qual aduz que “O processo deve dar, quando for possível praticamente, a quem tenha um direito, tudo aquilo e exatamente aquilo que ele tenha direito de conseguir”. É notório que esta se aplica a todos os tipos de processo, contudo, há um maior destaque no processo executivo, pois se vê mais claramente a adequação do processo jurisdicional com a finalidade de alcançar o resultado pretendido. Nesse sentido, a satisfação da prestação será efetiva ao passo que os meios executivos se mostrem aptos a assegurar ao titular do crédito aquilo que ele tem direito de obter. (Câmara, 2010)

As obrigações, em regra, são executadas de forma específica, com o cumprimento real da prestação e a satisfação inteira do exeqüente. Excepcionalmente, são executadas de forma genérica, em que há a substituição do dever pela pecúnia.

 Nas execuções de dar e pagar quantia, a execução somente será efetiva se a mesma for capaz de garantir a entrega da coisa, o bem da vida esperado pelo exeqüente ou se for apta a assegurar o pagamento do valor devido ao que o exeqüente faz jus, respectivamente.

Por outro lado, as execuções de fazer e de não fazer possuem um limite. Em regra, a execução de fazer apenas estaria efetivada com a realização da prestação devida pelo executado, porém há situações em que isso se torna impossível, uma vez que ninguém pode ser compelido a prestar um fato. Com isso, há a conversão da obrigação de fazer em uma obrigação de pagar quantia (perdas e danos) ou ainda na realização da prestação de fazer por um terceiro, a qual ocorrerá às custas do devedor.

É também visível essa mesma situação nas execuções de obrigações de não fazer, as quais poderão ser convertidas em perdas e danos, como também poderá ser escolhido um terceiro para fazer o papel do devedor, que correrá por conta deste.

1.2.2 Princípio da Tipicidade

Na visão clássica do direito, o juiz estava restrito à lei, pois o mesmo somente poderia atuar dentro dos limites legais. Contudo, modernamente, a tendência é a ampliação dos poderes executivos do magistrado. Diante disso, o juiz poderia atuar segundo as particularidades do caso concreto, buscando os meios mais eficazes para conseguir a satisfação do credor, independente de previsão legal. (Elpídio Donizetti, 2010)

A atipicidade das medidas executivas está consagrada no artigo 461,§5º do CPP, que permite ao juiz “determinar as medidas necessárias” para a obtenção do resultado prático equivalente. É o chamado poder geral de efetivação, em que se estabelece um rol meramente exemplificativo dos meios executivos que podem ser adotados pelo magistrado diante do caso concreto.

Contudo, segundo Marinoni (2008), esse princípio está edificado na desnecessidade de aplicação dos meios executivos no caso concreto, diferentes dos trazidos pela lei. Ademais, garante fundamental segurança e proteção aos litigantes contra o arbítrio judicial.

1.2.3 Princípio da responsabilidade patrimonial

Historicamente, aceitou-se que a execução fosse exercida sobre a pessoa, e não somente sobre o patrimônio. No Direito Romano, por exemplo, os devedores tornavam-se escravos de seus credores. Contudo, com a humanização do direito isso passou a ser repudiado, e, a partir daí, surgiu o princípio da patrimonialidade.

Segundo Teodoro Júnior, apud, Lopes da Costa (2009), diante do direito processual moderno, apenas o patrimônio do devedor, de forma única e exclusiva, responderá pela obrigação e jamais a pessoa do executado.

Nesse sentido, afirma Araken de Assis (2002, p. 400):

De fato, o princípio da responsabilidade patrimonial sublinha a sujeição dos bens do devedor à excussão para obter a soma de dinheiro. Não regula, por decorrência natural, a realização de outras obrigações, quando, por vezes, a prestação do devedor importa antes um determinado comportamento (facere). Naquele primeiro sentido, é correto afirmar, a exemplo de Carmine Punzi, que o objeto de expropriação é o objeto da responsabilidade patrimonial.

Esse princípio tem por base o artigo 591 do CPP, em cujos termos “o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei.” Logo, observa-se que este dispositivo normativo se aplica tão somente às obrigações de dar ou pagar quantia, uma vez que as obrigações de fazer e não fazer não serão adimplidas com pecúnia, mas sim com uma conduta positiva ou negativa, as quais, em último caso, serão convertidas. Assim, compreende que o princípio da efetividade restringe o título de que toda execução é real.

1.2.4 Princípio do Menor Sacrifício Possível do Executado

A execução, como ação ou fase processual, está voltada para a satisfação do credor, na qual o estado atuará em seu favor, e para isso, requer-se um sacrifício do devedor que não cumpriu a obrigação espontaneamente, não podendo, nesse momento, possuir de prerrogativas. Apesar disso, não se pode afirmar que o processo executivo movimenta apenas em favor do credor. (Misael Montenegro, 2009)

Esse princípio decorre da evolução do direito, uma vez que com o inadimplemento da obrigação e não dispondo de bem suficientes, a execução recai sobre a pessoa do executado, que poderia ser preso, tornar-se escravo ou até mesmo morto em virtude da dívida. Contudo, ao passar do tempo e com evolução da civilização, esta prática passou a ser repudiada, no que somente o patrimônio deverá responder pelos débitos. (Câmara, 2010)

Além dessa restrição, ressalta-se que também há limite quanto à invasão patrimonial do devedor. Segundo artigo 620 do CPC, quando houver vários meios de se satisfazer a obrigação, “o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor”. Portanto, havendo várias formas de se adimplir a obrigação, sendo estas igualmente eficazes, optar-se-á pela menos onerosa, impedindo assim a execução abusiva.

Nas palavras de Misael Montenegro Filho (2007, p. 234):

O dispositivo da lei analisado qualifica-se como favor debitoris, garantindo que dentre várias formas possíveis de se operar o (natural) sacrifício do devedor que se prossiga pelo caminho menos tortuoso, que o menos traumatize. Se o devedor possui dois bens, cada um de valor suficiente para o adimplemento da obrigação, a lei lhe confere a prerrogativa de requerer a substituição do bem penhorado, desde que comprove cabalmente que a substituição não trará prejuízo algum ao exequente e será menos onerosa para ele devedor (art. 668, com redação que lhe foi dada pela Lei nº 11.382∕2006).

Vemos a aplicação desta norma, restringindo invasão patrimonial, no caso das impenhorabilidades, a qual proíbe a apreensão de utensílios domésticos, rendimentos de natureza alimentar, instrumentos ou ferramentas necessárias ao exercício da profissão, bens necessários ao sustento do devedor ou de sua família, entre outros.

Dessa forma, percebe-se que tal princípio não está ligado diretamente à dignidade do devedor, mas sim a boa-fé processual, pois o legislador buscou proteger a ética processual e a lealdade e repeliu qualquer comportamento abusivo do credor em usar meios executivos para satisfazer a obrigação de maneira mais onerosa, mesmo que tenha outro meio igualmente eficaz.

Entretanto, deve ser interpretado com cautela, uma vez que a sua interpretação não pode ser estendida a redução do valor da dívida, a correção monetária, ao parcelamento da dívida, abatimento de juros, entre outros.  Muito importante destacar que esse princípio não tem o condão de retirar a possibilidade de penhorar dinheiro pelo fato de ser mais oneroso, pois não há outro meio mais eficaz quanto este. (Didier, 2013).

1.2.5 Princípio da Maior Coincidência Possível

Segundo esse princípio, a execução deve ser específica, uma vez que o credor deve receber tudo aquilo que receberia se a prestação fosse adimplida normalmente, fora do âmbito judicial. É permitido, entretanto, nos casos de impossibilidade da entrega da coisa ou recusa da prestação, substituir a prestação devida pelo equivalente em perdas e danos. (Teodoro Júnior, 2009)

Em virtude do artigo 461, § 1º do CPP, há possibilidade de a tutela se realizar de forma genérica, que ocorrerá por escolha do credor ou por impossibilidade de cumprir a prestação. Ressalta-se que, em regra, a tutela deve ser específica, pois o credor tem o direito de exigir o cumprimento especifico da obrigação, seja ela de fazer, não fazer ou de dar.

Nas obrigações de dar dinheiro o credor pode exigir, se assim quiser, receber como pagamento da divida um bem penhorado.

1.2.6 Principio da nulla executio sine titulo

Pela tradição do direito processual civil, a execução deve se fundar em um título, seja uma sentença ou um documento extrajudicial. Essa exigência se dá pelo fato de haver a prática de atos coercivos no patrimônio do executado, e por isso, a execução não pode basear-se tão somente em alegações, mas em informações seguras que permitam seu início. (João Batista Lopes, 2008)

Nesse sentido, os artigos 475-N e 485 do CPP elencam os documentos previstos em lei que são considerados títulos capazes de fomentar a execução, não podendo as partes conferir executividade a demais títulos não previstos em lei.

CONCLUSÃO

Esse trabalho abordou a atividade executiva em vários aspectos, fazendo a distinção sobre execução provisória e definitiva, direta e indireta, ente outros.

A execução tem como finalidade prover ao credor, dono de um direito a uma prestação deve ter a sua inteira satisfação, através de um sacrifício do devedor.

Com a transformação da atividade executiva em apenas uma fase, a execução mostrou-se muito mais eficaz e célere, uma vez que não se faz mais necessário entrar com um processo autônomo de execução.

Portanto, o processo sincrético é um meio hábil para adimplir a prestação do credor, sendo, um processo rápido, não havendo mais que se discutir fatos.

Por fim, falou-se das principais normas fundamentais da execução, como o da responsabilidade patrimonial, que garante que apenas os bens do devedor responderão pela execução, e não a pessoa do executado, como ocorria anteriormente.

REFERÊNCIAS

ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução. 8. ed. Revistas dos Tribunais: São Paulo, 2002.

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil, volume 2.  18. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro; BRAGRA, Paula Sarno; Oliveira, Rafael Alexandria. Curso de Direito Processual Civil. Volume 5. 8 ed.. Salvador: Juspodivum, 2013

LOPES, João Batista. Curso de direito processual civil. Volume 3 – São Paulo: Atlas, 2008.

MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil, volume 3. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.

MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil. Volume 1: teoria geral do processo e processo de conhecimento. – 4.ed. – 2.reimpe. – São Paulo: Atlas, 2007.

MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil. Volume 2: teoria geral recursos, recursos em espécie e processo de execução. 5. ed. – São Paulo: Atlas, 2009.

 



[1] Aluna do Curso de Direito – 10º semestre/manhã – Faculdade Paraíso do Ceará

E-mail: [email protected]

[2] TEODORO JÚNIOR, Humberto (2009) apud James Goldscmidt, Curso de Direito Processual Civil, p.113