O Artigo de Danielle Souza de Andrade e Silva, juíza Federal em Pernambuco. Discorre sobre a divisão de competência na justiça brasileira, com destaque à competência  penal, examinando os instrumentos legais que a operacionalizam. Trata também das consequências do descumprimento das regras de competência, tentado estabelecer as distinções e aproximações entre a nulidade absoluta e a relativa, e entre a inexistência e a nulidade processual, quando se trata de incompetência constitucional.

A investigação sobre os efeitos da decisão proferida por uma justiça incompetente há de pressupor uma divisão, meramente administrativa e burocrática, entre setores jurisdicionais, a chamada “competência de justiça”. E tal divisão, esboçada na Carta da República, da-se entre justiça comum estadual, justiça federal, justiça eleitoral e justiça trabalhista, calhando realçar que esta última não exerceu jurisdição criminal.

A competência é situada entre os pressupostos subjetivos de existência do processo, de modo que, sendo incompetente o juízo de uma causa, sequer se poderá falar em processo, que não chegaria mesmo a existir no mundo jurídico. Sem juiz competente, haveria mero “simulacro do processo, um processo apenas aparente, um “não-processo”.

A distinção, no direito brasileiro, entre competência absoluta e relativa não é legal, mas doutrinária, e sua teleologia vem pautada nos efeitos práticos dos vícios atinentes à sua inobservância. Na doutrina processual civil, diz-se absoluta “quando a matéria de que se trata entra nas atribuições de juiz” e relativa, quando, “dentre muitos juízos com iguais atribuições, um deles é o competente para conhecer da causa na hipótese dada”. Já no processo penal, em que o interesse público sobrepuja o âmbito do direito material, para permear todo o processo, erigido em uma garantia do indivíduo contra o arbítrio do Estado. Logo, fixando embora o Código de Processo penal como foro comum o da consumação do delito (competência territorial), não visou a atender senão, preponderantemente, o interesse público.

No estágio atual, partindo-se do principio de que o juiz natural é aquele constitucionalmente competente para processar e julgar a causa e sem juiz natural, descabe falar-se em jurisdição, sempre que se tratar de competência estabelecida na Constituição, não terá vez a regra do art 567 do CPP, que prescreve: “A incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, devendo o processo, quando for declarada a nulidade, ser remetido ao juiz competente”. Já que, violadas normas dessa estatura, faltará pressuposto de existência do processo. Não existe, nem poderia existir ressalva do constituinte aos atos não-decisórios praticados por juízo constitucionalmente incompetente.

A sentença inexistente, no processo penal, gera, uma vez preclusos todos os recursos, efeitos quando prolatada a favor do réu, em vista de quem, afinal, é construída a garantia do juiz constitucionalmente competente. Trata-se, portanto, de um ato que não existe, mas surte efeitos, pelo mesmo fato delituoso.

Pela mesma diretiva, cuidamos encontrar semelhante desfecho, podendo-se interpretar a súmula 160 do STF no sentido de que não só a nulidade, mas também, a fartiori, a inexistência jurídica de um ato jurisdicional, não poderá ser pronunciada, quando desfavoreça o acusado/condenado, sem que haja sido alegada pela acusação.