1 INTRODUÇÃO


1.1 Diversidade cultural e educação


A diversidade cultural engloba longo contexto, gerando uma observação de Nkomo e Cox Jr. (1998) relatando a falta de especificidade de conceito como um dos principais problemas nas pesquisas sobre a diversidade, portanto, torna-se deficiente em relação a sua construção científica. Segundo Gilbert e seus colaboradores (1999) também estão de acordo com a carência de especificidade na diversidade, e afirma que infelizmente muito da literatura pró-diversidade é forte em retórica e fraca em resultados empíricos.
Definições recentes nos mostram um designo totalmente variado. Essas definições variam de amplitude: de definições limitadas, que enfatizam apenas raça, etnia e gênero, até num geral amplo que se referem a todas as diferenças entre as pessoas, ou seja, todos somos diferentes.
Thomas Jr. (2000) define de forma mais abrangente para o qual o conceito de diversidade inclui todos, não é algo que seja definido apenas por raça ou gênero. Este é um conceito que une a idade, história pessoal e corporativa, formação educacional, função e personalidade. Engloba, também, estilo de vida, preferência sexual, origem geográfica, tempo de serviço na organização, status de privilégio ou de não-privilégio e administração e não-administração.
Assim, Loden e Rosener (1991) relatam que as distinções entre dimensões primárias, que consistem em diferenças humanas imutáveis: idade, etnia, gênero, raça, orientação sexual e habilidades físicas; e diferenças secundárias mutáveis: como formação educacional, localização geográfica e experiência de trabalho.
A diversidade em relação ao sistema social é caracterizada por diferenças grupais, sendo distintas em majoritários e minoritários, ou seja, aqueles que têm menor representação no sistema social em comparação direta aos que tem maior representação ? o grupo majoritário. Este grupo também se refere àqueles membros que têm, em relação à história, mais poder e recursos econômicos, quando comparados aos membros dos grupos minoritários.
Assegurar que a sociedade brasileira é diversificada em relação à cultura significa compreender inteiramente que, a diversidade cultural refere-se, diretamente, aos diversos grupos sociais. Porém, constitui também verificar as desigualdades no acesso a bens econômicos e culturais por parte dos diferentes grupos, em que diferente classe social, raça, gênero e diversidade cultural ajam de forma acentuada.
Surgimos da confluência, do entrechoque e do caldeamento do invasor português com índios silvícolas e campineiros e com negros africanos, uns e outros aliciados como escravos. (...) A sociedade e a cultura brasileiras são conformadas como variantes da versão lusitana da tradição civilizatória européia ocidental, diferenciadas por coloridos herdados dos índios americanos. (Ribeiro, 1995)

Já Nkomo e Cox Jr. (1998) subentendem que para compreender melhor a linguagem e o significado de diversidade, é preciso, diretamente, estruturar o próprio conceito, pois o termo encontra-se necessariamente incompleto. Para esses autores, apesar de haver um conflito sobre a formação do conceito de diversidade, parece haver uma compreensão comum no mundo acadêmico de que se está falando de "diversidade de identidade". Por esta ótica os autores definem diversidade como "um misto de pessoas com identidades grupais diferentes dentro do mesmo sistema social".
Se nos dermos à oportunidade de realizar uma consulta ao dicionário em busca do significado para diversidade encontraremos diferença, dessemelhança. Assim, isso pode nos levar a pensar que a diversidade refere-se apenas aos sinais menos minuciosos e mais grotescos. Porém, se expandirmos esta visão, e a abordarmos de forma cultural e político poderemos entendê-las de duas formas: As diferenças são estabelecidas de forma cultural tornando-se, então, empiricamente observáveis; e as diferenças também são estabelecidas ao longo da história, nas relações sociais e nas relações de poder. Diversas vezes, os grupos humanos tornam o outro diferente para fazê-lo inimigo, para dominá-lo.
Logo, falar sobre a diversidade cultural não diz respeito apenas ao reconhecimento do outro. Significa pensar a relação entre o eu e o outro. Aí está o encantamento da discussão sobre a diversidade. Ao considerarmos o outro, o diferente não deixou de focar a atenção sobre o nosso grupo, a nossa história, o nosso povo. Ou seja, falamos o tempo inteiro em semelhanças e diferenças.
A diversidade cultural, no entanto, não pode ser explicada apenas pela dimensão das classes sociais. É preciso levar em conta que vivemos num período de transformações sociais profundas, que interferem diretamente no plano individual, produzindo uma heterogeneidade mais ampla. Assim, de acordo com Velho (1987), de um lado, "fruto da coexistência, harmoniosa ou não, de uma pluralidade de tradições cujas bases podem ser ocupacionais étnicas, religiosas, etc". Por outro lado, a sociedade contemporânea apresenta, cada vez mais, um leque de espaços e tempos diferenciados, o que faz com que os mesmos indivíduos participem de mundos diferenciados e desempenhem múltiplos papéis. Junto à crescente oferta de recursos informacionais, faz com que os indivíduos possam articular suas experiências em tradições e valores múltiplos, construindo identidades cujas fronteiras simbólicas não são demarcadas apenas pela origem de classe.
Já Stolcke (1993) considera que a diversidade cultural florescerá e será criativa sem trazer desvantagens quando, de fato, a sociedade for democrática e igualitária o suficiente para permitir que as pessoas resistam a e desenvolvam diferenças, sem colocar em risco a si mesmo e à sua solidariedade.
De acordo com Canen (1999, 1997), Silva (1992), Lüdke & Mediano (1992), Candau (1995), Grant (1997) e Moreira (1995), a importância da preparação docente que leve em conta a diversidade cultural tem sido reconhecida em virtude de dois aspectos relevantes: por um lado, a constatação do peso de estereótipos sobre o rendimento de alunos de universos culturais diferentes daqueles que perpassam as práticas pedagógico-curriculares no cotidiano escolar.
Na defesa as tendências à diversidade, tem se destacado a UNESCO, que considera os seguintes fatores ? qualidade e diversidade, os eixos das políticas educativas. No documento "Declaração Mundial sobre Educação Superior no Século XXI: visão e ação", resultante da Conferência Mundial sobre Ensino Superior, 1998, é assim definida a qualidade em Educação Superior:
[...] é um conceito multidimensional que deve envolver todas as funções e atividades, ensino, programas acadêmicos, pesquisa e fomento da ciência, ambiente acadêmico em geral. Uma auto-avaliação interna e transparente e uma revisão externa com especialistas independentes, se possível com reconhecimento internacional, são vitais para assegurar a qualidade. Devem ser criadas instâncias nacionais independentes e definidas normas comparativas de qualidade, reconhecidas no plano internacional. Visando a levar em conta a diversidade e evitar a uniformidade, deve-se dar atenção aos contextos institucionais, nacionais e regionais específicos. Os protagonistas devem fazer parte integrante do processo de avaliação institucional. (Unesco, 1998, artigo 11, alínea a)

Porém, relacionado à educação e diversidade cultural esta preconizada e estudada sob diversos enfoques, geralmente conflitantes e contraditórios entre si. Canen (1997a) identificou quatro perspectivas básicas: assimilação, reprodução, aceitação e conscientização cultural. Essas perspectivas de assimilação baseiam-se no paradigma estrutural-funcionalista, no qual a função do docente será a de realizar de forma crítica à transmissão dos conteúdos marcados por diferentes maneiras de ver o mundo e seus valores culturais dominantes, sem que se questionem a representatividade de grupos étnico-culturais diversos em práticas curriculares. No Brasil, esta perspectiva pode identificar à teoria da carência cultural, a embasado nos programas de educação compensatória nas décadas de 70 e 80, cujo discurso baseia-se na idéia de "falta", no que o aluno "não tem" da cultura dominante, cabendo à escola "suprir" as "deficiências socioculturais" por meio de programas compensatórios, assimilacionistas. Como observa Earp (1997, p. 179), neste tipo de abordagem, qualquer referência às crianças de camadas populares é realizada "pela negação, pela desqualificação", adicionando-se, ainda, estereótipos com relação a suas famílias vistas como desestruturadas e desestruturantes, "em que as relações caracterizam-se pela agressividade, pela violência e pela falta de higiene". Apoiando-se em Gouvea (1993), Earp (1997, p. 180) sugere que este tipo de abordagem percebe a diferença enquanto desvio ou atraso, a partir de uma concepção etnocêntrica da sociedade humana em que o observador toma sua cultura de origem como ponto de referência.
Assim, a identidade nacional é uma ilusão, porque esconde os pequenos fragmentos de uma nação falha em seus direitos. Talvez, então, fosse possível sentir-se brasileiro em lugares sociais onde a solidariedade humana ainda é possível. O diferente é apenas aquele que não tem direitos.
Por tanto, a educação para a diferença direciona a humanização crescente do discente e na sua relação com o outro, resgatando a diferença como valorização da vida social, estimulando a essência do saber e do aprender dentro do vínculo amoroso entre as pessoas. Educar para a diferença permite que discente entenda seu próprio valor, agenciando a auto-estima como ser humano pleno de ser digno, com cooperativismo na formação de autodefesas relativas a expectativas indevidas que poderiam ser maléficas. É necessário que, cada vez mais, possam existir espaços de convívio que possibilitem conhecimentos e vivências que cooperem para que se apure, nas pessoas, sua percepção de injustiças e de manifestações de preconceito e de discriminação que recaiam sobre elas próprias ou que elas venham a testemunhar - e para que desenvolvam atitudes de repúdio a essas práticas.
Logo, o verdadeiro objetivo da educação para a diferença é proporcionar harmonia a convivência de diferentes grupos sociais; promover a justiça social, considerando as distinções dos segmentos sociais; permitir o acesso de todos os seres humanos aos bens intelectuais, materiais, espirituais e naturais; assim como, mobilizar cada um para a aceitação de si mesmo, percebendo-se diferente do outro ? por essa razão, somos muito mais enriquecidos nessa convivência dos diferentes.
Porém, Eunice Durham (1980) nos adverte, pois, tratar a desigualdade cultural no âmbito de uma mesma sociedade é, totalmente, diferente de tratá-la entre diversas sociedades. Numa outra plataforma, pode-se dizer que, quando buscamos compreender a cultura, estamos lidando com diferenças que expressam manifestações de uma mesma capacidade humana criadora, fruto de um processo histórico independente.

1.2 A universidade e a formação do docente


A universidade é vista como uma instituição única, com os mesmos sentidos e objetivos, tendo como principal função garantir a todos o acesso ao conjunto de conhecimentos socialmente acumulados pela sociedade. Tais conhecimentos, porém, são reduzidos a produtos, resultados e conclusões, sem se levar em conta o valor determinante dos processos.
Ensinar se torna transmitir esse conhecimento acumulado e aprender se torna assimilá-lo. Como a ênfase é centrada nos resultados da aprendizagem, o que é valorizado são as provas e as notas e assim a finalidade da universidade, acaba por, se reduzir a conseguir aprovação no semestre. Nessa lógica, não faz sentido estabelecer relações entre o vivenciado pelos discentes e o conhecimento universitário, entre a universidade e o extra-universitário, justificando-se a desarticulação existente entre o cotidiano universitário, o conhecimento e a vida dos discentes.
Então, a preparação do docente na linha da apreciação da diversidade cultural beneficiava atitudes positivas que auxiliariam, a fim de, transformar a situação de fracasso escolar. Por outro lado, a importância de tal educação reforça-se também em artigos recentes, tais como os de Barcelos (1993), Candau (1995, 1997), Canen (1997a), Coutinho (1996), Cruz (1995), Kramer (1995a), Lucinda (1996) e outros, que têm auxiliado para desvelar o mito da democracia racial e a conscientização acerca da relevância de práticas docentes que preparem futuras gerações nos valores da tolerância e apreciação à diversidade cultural, de forma a desafiar preconceitos e promover uma educação para a cidadania.
Esse momento de uma nova cultura capaz de contribuir para a eliminação das tensões que ameaçam a vida de nosso planeta será impossível sem um novo tipo de educação que leve em consideração todas as dimensões do ser humano. Todas as várias tensões, sendo elas econômicas, culturais, espirituais, são inevitavelmente perpetuadas e aprofundadas por um sistema educacional fundado em valores de outro século e pelo desequilíbrio acelerado entre as estruturas sociais contemporâneas e as mudanças que estão acontecendo no mundo atual.

Apesar da enorme diversidade dos sistemas de educação de um país para outro, a mundialização dos desafios de nossa época leva à mundialização dos problemas da educação. Os diversos abalos que atravessam a área de educação num ou noutro país são os sintomas de uma única e mesma fissura: a da desarmonia que existe entre valores e as realidades de uma vida planetária em mutação. Embora não exista receita milagrosa, há um centro comum de questionamento que convém não ocultar se quisermos realmente viver em um mundo harmonioso. (Nicolescu, 2000)
Nessa medida, a educação e seus processos são compreendidos para além dos muros escolares e vai se ancorar nas relações sociais. São as relações sociais que verdadeiramente educam, isto é, formam, produzem os indivíduos em suas realidades singulares e mais profundas. Nenhum individuo nasce homem. Portanto, a educação tem um sentido mais amplo, é o processo de produção de homens num determinado momento histórico (Dayrell, 1992).
A educação, portanto, ocorre-nos mais diversos espaços e situações sociais, num complexo de experiências, relações e atividades, cujo as limitações estão fixados pela estrutura de quatro materiais e simbólica da sociedade, em determinado momento histórico. Nesse campo educativo amplo, estão incluídas as instituições, assim como também o cotidiano difuso do trabalho, do bairro, do lazer, e demais.
O campo educativo onde os jovens se inserem como habitantes de uma sociedade complexa, urbana e industrial, apresentam uma ampla diversidade de experiências, marcadas pela própria divisão social do trabalho e das riquezas, o que vai delinear as classes sociais. Assim, a princípio, dois conjuntos culturais básicos, numa relação de oposição complementar, e expressam uma das dimensões da desigualdade cultural na sociedade moderna, sendo a oposição cultura erudita em relação à cultura popular.
Então, trabalhar com representações de docentes, futuros docentes e aqueles responsáveis por sua formação representa um caminho possível na formação docente, trazendo à tona a futilidade de iniciativas pedagógico-curriculares que não levem em conta as formas pelas quais os docentes pensam e representam sua prática pedagógica. Entretanto, uma análise dos estudos sobre universos culturais e aqueles sobre representações sobre o saber dos docentes, parece indicar uma brecha em termos da interseção de ambas as abordagens. O banco de dados da pesquisa Cotidiano Escolar e Culturas (Gecec, 1997), desenvolvido na PUC-RJ pelo Grupo de Estudos Cotidiano Escolar e Culturas, coordenado por Candau, parece confirmar esta tendência nos artigos nacionais cadastrados. Nesse sentido, embora diversos artigos tratem de temas tais como educação e etnia, a educação e gênero, e assim por diante, as categorias içadas pelo grupo referentes a Currículo, saber docente e cultura escolar e também a educação e representação social, isso contêm artigos que, embora forneçam contribuições para o avanço da reflexão sobre práticas pedagógicas transformadoras, poderiam melhorar de forma significativa em análise da dimensão cultural destas mesmas práticas e o impacto da pluralidade cultural no processo de ensino-aprendizagem.
Partindo deste processo, a partilha universal do conhecimento não pode ocorrer sem o surgimento de uma nova aceitação, fundamentada numa atitude transdisciplinar, que implica colocar em prática a visão transcultural, transreligiosa e transnacional. Decorre daí a relação direta e inquestionável entre paz e transdisciplinaridade.
Essa visão transcultural, como filosofia educativa, seria especificada nos seguintes objetivos (Hanson; Lynch, 1997):
 Desenvolver certa empatia para com os outros seres humanos, compreendendo a diversidade, as similitudes, as diferenças e as interdependências;
 Conhecer as razões dos conflitos entre seres humanos no círculo de relações dentro de nações ou no contexto internacional;
 Desenvolver um compromisso em combater os preconceitos e discriminações, favorecendo a solidariedade e o respeito aos direitos humanos;
 Valorizar o significado das realizações de indivíduos e de grupos distintos;
 Internalizar normas morais de comportamento dentro das sociedades e de um mundo pluricultural;
 Desenvolver a compreensão da interdependência entre distintos ambientes, economias e culturas;
 Adquirir habilidades práticas, conhecimentos, destrezas e atitudes apropriadas para se desenvolver em uma sociedade pluralista;
 Desenvolver capacidades de imaginação, investigação e de racionalidade para comportar-se, responsavelmente, no meio cultural, social e ambiental.
A educação para a diferença reflete-se na humanização crescente do indivíduo consigo mesmo e na sua relação com o outro, resgatando a diferença como riqueza da vida social, estimulando a essência do saber e do aprender dentro do vínculo amoroso entre as pessoas.
Nesse sentido, o conhecimento do discente é concretizado como condição para a viabilização de práticas pedagógicas transformadoras, conforme enfatizado por Kramer (1995b), não tem lugar no cotidiano da universidade em questão, na visão dos docentes entrevistadas. Ao contrário, podemos ver depoimentos que revelam as representações docentes sobre os universos culturais dos discentes com que deparam no cotidiano universitário, no qual, se acha revestido de uma confusão de discursos que, em sua grande maioria, tendem a uma redução destes universos àqueles aspectos que estariam faltando para que se igualasse aos das camadas dominantes. Exemplificando, podemos citar um docente em sala fala dos universos culturais de seus discentes, relacionando como costumes locais, de sua aparência como estilo de vestimenta, da alimentação por eles degustada em relação a região no qual são naturais dentre diversas outras características não citadas. Outras se referem ao fato de que estes discentes são, em grande parte, com sérias dificuldades lingüísticas, e que se trata de uma verdadeira "luta" o processo de ensino de escrita e leitura, assim como déficit em disciplinas exatas, como em cursos de engenharia, matemática, física e os demais. Tais colocações vêm a confirmar dados das pesquisas desenvolvidas por Paes da Silva & Vasconcelos (1995) e Earp (1997), trazendo à tona os estereótipos relacionados às crianças das camadas populares, a referência a seus universos culturais em termos de negação ou desqualificação com relação àqueles das camadas dominantes e, por conseguinte, uma visão da educação como compensatória das deficiências culturais nelas apontadas.
Educar para a diferença permite que cada pessoa compreenda seu próprio valor, promovendo a auto-estima como ser humano pleno de dignidade, cooperando na formação de autodefesas relativas a expectativas indevidas que poderiam ser prejudiciais. É preciso que, cada vez mais, possam existir espaços de convívio que possibilitem conhecimentos e vivências que cooperem para que se apure, nas pessoas, sua percepção de injustiças e de manifestações de preconceito e de discriminação que recaiam sobre elas próprias ou que elas venham a testemunhar, e para que desenvolvam atitudes de repúdio a essas práticas.
O objetivo da educação para a diferença é harmonizar a convivência de diferentes grupos sociais; promover a justiça social, considerando as distinções dos segmentos sociais, permitir o acesso de todos os seres humanos aos bens intelectuais, materiais, espirituais e naturais. Assim como, mobilizar cada um para a aceitação de si mesmo, percebendo-se diferente do outro, e por essa razão, somos muito mais enriquecidos nessa convivência dos diferentes. Para enfrentar a diferença é preciso discernimento, sensibilidade, intencionalidade e informação. Aqui se coloca a sensibilidade em relação ao outro.
Como a história do preconceito é muito antiga, muitos dos grupos vítimas de discriminação desenvolveram um medo profundo e uma cautela permanente como reação.
Reconhecer a diversidade de universos culturais de alunos no âmbito de práticas docentes implica não só a conscientização acerca do peso dessas práticas no sucesso ou no fracasso destes alunos, mas também na importância em se trabalhar no sentido de mobilizar expectativas positivas que promovam a aprendizagem de todos, independentemente de raça, classe social, sexo ou padrões culturais.
É necessário que sejamos capazes de produzir um processo de ação-reflexão coletiva que engendre uma vontade de transformação e de autonomia das pessoas e grupos, para que possamos relacionar-nos dentro de padrões éticos de respeito mútuo, reconhecimento das diferenças e desejos de cooperação, superando a violência, o autoritarismo e o oportunismo político de um lado e a subserviência, a inércia, o acomodamento e dependência de outro.
Nesse sentido, trabalhar com uma proposta de conscientização cultural em formação docente significa, também, ter em vista as representações e o saber desenvolvido por docentes em seu cotidiano escolar, de forma que se incorporem as iniciativas de ruptura com a homogeneização cultural e se combatam as expectativas negativas com relação àqueles cujos padrões culturais não correspondem aos dominantes.
As representações docentes revelam muitas vezes uma visão fragmentada dos universos culturais dos alunos, percebidos em grande parte em termos dos aspectos que lhes faltam para se equipararem àqueles das camadas dominantes da população.


2 A DIVERSIDADE CULTURAL NA EDUCAÇÃO BRASILEIRA


De fato, a problemática da diversidade cultural e da construção das diferenças tem sido trazida em uma visão de cidadania multicultural, legal, concreta, negociada em discursos e espaços dentre os quais a educação e a formação docente emergem, com força. Conforme Lopes (1999), Moreira (1999) e Silva (1999), estes estudos têm tensionado o campo do currículo, trazendo novas configurações e propondo novos olhares, voltados ao reconhecimento e valorização de identidades culturais apagadas ou negadas em estruturas curriculares monoculturais.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), por exemplo, apresentam, como um dos eixos transversais, o tema da Pluralidade Cultural, trazendo à baila a necessidade de se levar em conta esta dimensão no cotidiano escolar. A última reunião anual da Associação Nacional de Pós-Graduação em Educação (ANPEd), em 1999, trouxe, para o título do evento, a questão da diversidade e da desigualdade, indicando esta como o principal desafio para a educação na fronteira do século. Da mesma forma, autores como McLaren (2000, 21), apontam que a tensão entre pluralidade étnicocultural e a necessária política de justiça universal consituti-se "a questão urgente do novo milênio".

2.1 Diversidade cultural no Brasil


A cultura brasileira reflete os vários povos que constituem a demografia deste país sul-americano: indígenas, europeus, africanos, asiáticos, árabes e demais fatores. Como resultado da intensa miscigenação de povos, surgiu uma realidade cultural peculiar, que sintetiza as várias culturas.
O início da formação da cultura brasileira se deu na vinda de diversos povos, porém a maior influência foi dada pelos europeus, sendo principalmente dos portugueses. Ao longo de 322 anos o Brasil foi colónia de Portuguesa e houve uma transplantação da cultura da metrópole para as terras sul-americanas. Os colonos portugueses chegaram em maior número à colónia a partir do século XVIII, sendo já neste século o Brasil um país Católico e de língua dominante portuguesa.
Porém, antes da chegada desses povos, alguns historiadores afirmam que, as primeiras décadas de colonização possibilitaram uma rica fusão entre a cultura dos europeus e a dos indígenas, dando margem à formação de elementos como a Língua geral, todavia isso não impediu que os nativos fossem dizimados pela ação colonizadora. Além da dizimação dos povos autóctones, houve a ação da catequese e a intensa miscigenação, o que contribuiu para que muitos desses aspectos culturais fossem perdidos. A influência indígena faz-se mais forte em certas regiões do país em que esses grupos conseguiram manterem-se mais distantes da ação colonizadora e em zonas povoadas recentemente, principalmente na Região Norte do Brasil.
Os africanos deram sua influência cultural através dos povos escravizados trazidos para o Brasil num longo período que durou de 1550 à 1850. A diversidade cultural de África contribuiu para uma maior multiplicidade do povo brasileiro. Os próprios escravos eram de etnias diferentes, falavam idiomas diferentes e tinham tradições distintas. Assim como a indígena, a cultura africana fora subjugada pelos colonizadores, sendo os escravos batizados antes de chegarem ao Brasil. Na colónia aprendiam o português e eram batizados com nomes portugueses e obrigados converter-se ao catolicismo. Através do sincretismo religioso, os escravos adoravam os seus orixás através de santos Católicos, dando origem às religiões afro-brasileiras como o Candomblé. Com eles também se teve a herança na dança, música, religião, cozinha e no idioma. Essa influência faz-se notar em praticamente todo o País, embora em certas zonas (nomeadamente nos estados do Nordeste como Bahia e Maranhão) a cultura afro-brasileira seja mais presente.
A imigração europeia foi incentivada não apenas para suprir o fim da mão-de-obra escrava, mas também foi promovida pelo governo, que tinha a intenção de branquear o Brasil e europeizar a sua cultura, afinal, a maior parte da população no século XIX era composta por negros e mestiços. Dentre os diversos grupos de imigrantes que aportaram ao Brasil, foram os italianos que chegaram em maior número, entre 1870 e 1950. Espalharam-se desde o sul de Minas Gerais até ao Rio Grande do Sul, sendo que a maior parte instalou-se na região de São Paulo. Além dos italianos, destacaram-se os alemães, que chegaram em fluxo contínuo desde 1824. Esses fixaram-se primariamente na Região Sul do Brasil, onde diversas regiões herdaram influências germânicas desses colonos. A contribuição asiática viria com a imigração japonesa, porém de forma mais limitada.
A arquitetura bandeirista e o barroco mineiro são considerados por muitos estudiosos como expressões de estilos europeus que encontraram no Brasil uma manifestação e linguagem próprias, evidenciando-se das suas contrapartes metropolitanas. A primeira refere-se à produção realizada basicamente no que seria hoje o Estado de São Paulo, pelas famílias dos bandeirantes, inspirando-se numa estética próxima, ainda que bastante alterada, do maneirismo. A segunda corresponde a um tipo de barroco representado especialmente pelas igrejas construídas por Aleijadinho. Assim, a arquitetura brasileira teve o seu ponto culminante no movimento modernista, com a construção de Brasília, por Lúcio Costa e Oscar Niemeyer.
Dentre outros aspectos culturais no Brasil, temos a religião individual, onde Cerca de 3/4 da população brasileira segue a Religião Católica Romana, o que faz do país o maior em número absoluto de católicos no mundo. Há ainda um pequeno número de seguidores da Igreja Católica Apostólica Brasileira. Seguem o Protestantismo 15% da população (a maior parte através de igrejas evangélicas pentecostais), 1% é espírita, 0,5% é testemunha de Jeová e cerca de 7% não tem religião. Outras religiões que, apesar de poucos praticantes, merecem citação são as religiões de origem africana, como a Umbanda e o Candomblé. O Judaísmo, o budismo, o islamismo e hinduismo têm um número reduzido de seguidores no Brasil, geralmente concentrados em cidades do Sul, Sudeste ou Nordeste.
Em relação à arte, temos obras literárias no país que basicamente à produção de textos narrativos sobre o país inserido no contexto dos Descobrimentos. A produção literária de ficção, propriamente dita só vem a ocorrer efetivamente com a inauguração do Barroco. Anos seguintes o Realismo e o Naturalismo, ainda que autores como Machado de Assis tenham sido considerados altamente inovadores. E por fim, movimentos modernos que explodem no início do Século XX têm por princípio rejeitar os valores europeus e buscar aquilo que é genuinamente nacional, digerindo a cultura estrangeira e devolvendo-a sintetizada à nacional. A produção das artes plástica, até meados do século XIX brasileiras, possui pouco destaque, excetuando o trabalho de Aleijadinho e Manuel da Costa Ataíde no Barroco mineiro. E por fim, a música Alguns dos géneros musicais populares originários do Brasil mais conhecidos são o Choro, o Samba, a Bossa Nova e a Música Popular Brasileira.
A diversidade cultural reuni diferentes costumes da sociedade. O Brasil, por conter um extenso território, apresenta diferenças climáticas, econômicas, sociais e culturais entre as suas regiões. Nesse contexto, devemos falar sobre a cultura local de cada região brasileira, dentre: Norte, nordeste, centro-oeste, sudeste e região sul.











Figura 1. Lavagem das escadarias do Bonfim

Em relação à região nordeste do Brasil pode-se destacar as manifestações culturais da região estão danças e festas como o bumba meu boi, maracatu, caboclinhos, carnaval, ciranda, coco, terno de zabumba, marujada, reisado, frevo, cavalhada e capoeira. Manifestações religiosas como A festa de Iemanjá e lavagem das escadarias do Bonfim (Figura 1). A literatura de Cordel é outro elemento forte da cultura nordestina. O artesanato é representado pelos trabalhos de rendas. Os pratos típicos são: carne de sol, peixes, frutos do mar, buchada de bode, sarapatel, acarajé, vatapá, cururu, feijão verde, canjica, arroz doce, bolo de fubá cozido, bolo de massa de mandioca, broa de milho verde, pamonha, cocada, tapioca, pé de moleque, entre tantos outros.
Figura 2. Festival de Parintins
Considerando a região norte do país, podemos verificar uma imensidão de eventos culturais. As duas maiores festas populares do Norte são o Círio de Nazaré, em Belém (PA), e o Festival de Parintins (Figura 2), a mais conhecida festa do boi bumbá do país, que ocorre em junho no Amazonas. Outros elementos culturais da região Norte são: o carimbo, o congo ou congada, a folia de reis, a festa do divino. A influência indígena é fortíssima na culinária do Norte, baseada na mandioca e em peixes. Outros alimentos típicos do povo nortista são: carne de sol, tucupi (caldo da mandioca cozida), tacacá (espécie de sopa quente feita com tucupi), jambu (um tipo de erva), camarão seco e pimenta de cheiro.
Figura 3. Fogaréu
A Região Centro-Oeste, tem uma cultura bem diversificada, recebendo contribuições principalmente dos indígenas, paulistas, mineiros, gaúchos, bolivianos e paraguaios. São manifestações culturais típicas da região: a cavalhada e o fogaréu, no estado de Goiás (Figura 3), o cururu, em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A culinária regional é composta por arroz com pequi, sopa paraguaia, arroz carreteiro, arroz boliviano, maria isabel, empadão goiano, pamonha, angu, cural, os peixes do Pantanal - como o Pintado, Pacu e Dourado, entre outros.
Figura 4. Feijoada
Na região sudeste os principais elementos da cultura regional são: festa do divino, festejos da páscoa e dos santos padroeiros, congada, cavalhadas, bumba meu boi, carnaval, peão de boiadeiro, dança de velhos, batuque, samba de lenço, festa de Iemanjá, folia de reis, caiapó. A culinária do Sudeste é bem diversificada e apresenta forte influência do índio, do escravo e dos diversos imigrantes europeus e asiáticos. Entre os pratos típicos se destacam a moqueca capixaba, pão de queijo, feijão tropeiro, carne de porco, frito, bolinho de bacalhau, picadinho, virado à paulista, cuscuz paulista, farofa, pizza, etc.
Figura 5. Oktoberfest
E por fim, a região sul apresenta aspectos culturais dos imigrantes portugueses, espanhóis e, principalmente, alemães e italianos. As festas típicas são: a Festa da Uva (italiana) e a Oktoberfest (alemã) (Figura 5). Também integram a cultura sulista: o fandango de influência portuguesa, a tirana e o anuo de origem espanhola, a festa de Nossa Senhora dos Navegantes, a congada, o boi-de-mamão, a dança de fitas, boi na vara. Na culinária estão presentes: churrasco, chimarrão, camarão, pirão de peixe, marreco assado, barreado (cozido de carne em uma panela de barro), vinho.


2.2 A educação no Brasil


Levando em consideração alguns aspectos regionais do Brasil e toda a sua cultura, podemos considerar a educação brasileira dividida entre a diversidade da cultura e a dificuldade do aprendizado, sendo que, estes aspectos podem levar a um déficit no rendimento do aprendizado.
O Brasil teve seus primeiros cursos superiores (não teológicos) no século XIX e sua primeira universidade apenas no século XX, ao passo que nas colônias espanholas da América, quando da nossa independência, já havia mais de duas dezenas de universidades (Cunha, 1980), assim, não é de se estranhar que apresente uma tão baixa Taxa de Escolarização Bruta1 na Educação Superior, em relação com aquela de nossos vizinhos latino-americanos, conforme mostra a Tabela 1.

Tabela 1
Taxa de Escolarização Bruta na Educação
Superior de países selecionados ? 1999/2000

País Taxa de escolarização bruta
Argentina 48
Bolívia 33
Brasil 15
Chile 38
Colômbia 22
Cuba 21
Paraguai 14
Uruguai 34
EUA 72
México 20
Portugal 47
Coréia do Sul 72
África do Sul 15

Taxa de Escolarização Bruta na Educação
Superior de países selecionados ? 1999/2000
Fonte: UNESCO, Global Education Digest, 2003.
Razão entre o total de matrículas na Educação Superior e a população na faixa etária correspondente.


Esses dados apresentados mostram que o Brasil ocupa uma posição extremamente desfavorável, com uma oferta próxima apenas do Paraguai e da África do Sul, entre os demais países. Assim é que, em 1960, a Taxa de Escolarização Bruta na Educação Superior era de apenas 1% (INEP, 2004). É importante observar também que, este aumento se deu de forma distinta entre as redes pública e privada. Assim é que, enquanto, no mesmo período, as matrículas na rede privada cresceram 59 vezes, na rede pública o aumento foi de 20 vezes. O resultado deste processo é que, se em 1960 o setor privado respondia por 44% das matrículas de graduação, em 2002, essa participação passou para 70%, tornando o Brasil um dos países com mais elevado grau de privatização desse nível de ensino. Basta dizer que a participação do setor privado nas matrículas no Brasil é quase três vezes maior que a da média dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Dourado (2001), ao analisar o processo de interiorização do ensino superior por meio da discussão das fundações municipais em Goiás, destaca a obscura relação entre os setores públicos e privados. Na sua afirmativa, evidencia que, em sua maioria, as fundações municipais de ensino superior constituíram-se por meio de uma engenharia jurídica voltada para viabilizar a expansão do setor privado por intermédio de contratos de prestação de serviços e, ainda, pela cobrança de mensalidades dos alunos. A ambiguidade jurídica destas instituições ditas municipais constitui fortes evidências de que a adoção do regime fundacional foi o meio encontrado para garantir a expansão privada do ensino superior, sob os auspícios legais e o financiamento do poder público municipal (Dourado, 2001).
Pela educação, pode-se combater, no plano das atitudes, a discriminação manifestada em gestos, comportamentos e palavras, que afasta e estigmatiza grupos sociais. Pode-se partilhar um cotidiano em que o simples olhar-se permite a constatação de que todos nós somos provenientes de diferentes famílias, de diferentes origens e possuímos todos os quais diferentes histórias, o que nos permite desenvolver uma experiência de interação entre diferentes, na qual cada um aprende e cada um ensina. Cada pessoa é única e, por essa singularidade, insubstituível.
É preciso que tenha uma posição que compreenda a relatividade de opiniões, preferências, gostos, escolhas, é preciso aprender a respeitar o outro, independente de sua idade, sexo, posição social, status, profissão, gostos ou necessidades.
Para enfrentar a "diferença" é preciso discernimento, sensibilidade, intencionalidade e informação. Aqui se coloca a sensibilidade em relação ao outro. Compreender que o jovem infrator é alvo da discriminação sofre de fato e profundamente é condição para que o tutor possa escutar até mesmo o que não foi dito. Como a história do preconceito é muito antiga, muitos dos grupos vítimas de discriminação desenvolveram um medo profundo e uma cautela permanente como reação. O tutor precisa saber que a dor do grito silenciado é mais forte do que a dor pronunciada.
Para aproveitarmos ao máximo a experiência do estudo ou da iniciação à investigação aprofundada precisamos afiar o comando da língua portuguesa estreitando a nossa relação com a escrita e a leitura e fazendo avançar o comando da oralidade para expor e debater com maior clareza e persuasão os caminhos e produtos dos nossos esforços. A experiência de linguagem numa agenda de tópicos relevantes acaba por fortalecer os sentidos de identidade e humanização dos graduandos, da cultura brasileira e da cidadania planetária ética e responsável.
Assim, a formação universitária vai servir ainda para construir um profissionalismo ligado às carreiras e a consciência profissional emergirá do exame de práticas, da indagação de explicações e da busca do sentido ético das ações e propósitos dos atores sociais.



3. A FORMAÇÃO DO DOCENTE E AS UNIVERSIDADES


Falar da universidade relacionada à cultura e sociedade implica, assim, resgatar o papel dos sujeitos na trama social que a constitui, enquanto instituição. Na educação e na formação docente, o papel dos discursos e práticas curriculares na preparação de professores e de futuras gerações nos valores de apreciação da diversidade cultural e de desafio a preconceitos ligados a determinantes de gênero, raça, religião, deficiências, padrões culturais e outros.
Na década de 80, a universidade era pensada nos marcos das análises de grandes estruturas, sendo assim, de um lado, englobava as teorias funcionalistas como Durkheim, Talcott Parsons, Robert Dreeben, entre outros, e de outro, nas teorias da reprodução. No início desta década, surgiu uma nova visão da análise da universidade, que buscava superar as determinações sociais criadas entre homem e a circunstância, a ação e a estrutura, o sujeito e o objeto. Essa visão se inspira num movimento existente nas ciências sociais, direcionado por um modelo emergente que, no segundo de Boaventura (1991) apud Dayrell (1999), tem como característica a superação do conhecimento dualista, expresso na volta do sujeito às ciências: "o sujeito, que a ciência moderna lançara na diáspora do conhecimento irracional, regressa investido da tarefa de fazer erguer sobre si uma nova ordem científica".
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) apresentam, como um dos eixos transversais, o tema da Pluralidade Cultural, trazendo à baila a necessidade de se levar em conta esta dimensão no cotidiano escolar. A reunião anual da Associação Nacional de Pós-Graduação em Educação (ANPEd), em 1999, trouxe, para o título do evento, a questão da diversidade e da desigualdade, indicando esta como o principal desafio para a educação na fronteira do século. Da mesma forma, autores como McLaren (2000), apontam que a tensão entre pluralidade étnico cultural e a necessária política de justiça universal constitui-se a questão urgente do novo milênio.
Nessa perspectiva, Szpeleta & Rockwell (1986) desenvolvem uma análise em que privilegiam a ação dos sujeitos, na relação com as estruturas sociais. Sendo assim, a universidade seria resultado de um confronto de interesses: de um lado, uma organização oficial do sistema universitário, no qual define conteúdos da tarefa central, atribui funções, organiza, separa e hierarquiza o espaço, a fim de diferenciar trabalhos, definindo idealmente, assim, as relações sociais.
A universidade é entendida, portanto, como um espaço social próprio, ordenado em dupla dimensão. Institucionalmente, por um conjunto de normas e regras, que buscam unindo e determinado à ação dos seus sujeitos. No dia-a-dia, por uma difícil trama de relações sociais entre os sujeitos envolvidos (discentes), que incluem alianças e conflitos, imposição de normas e estratégias individuais, ou coletivas, de transgressão e de acordos. Assim, um processo de apropriação constante dos espaços, das normas, das práticas e dos saberes que dão forma à vida universitária, sendo este, obra da ação mútua entre o sujeito e a instituição, esse processo, como tal, é heterogêneo. Nessa realidade, a universidade aparece mediada, no cotidiano, pela apropriação, elaboração, reelaboração ou repulsa expressas pelos sujeitos sociais (Ezpeleta & Rockwell, 1986).
O processo de ensino/aprendizagem ocorre numa homogeneidade de ritmos, estratégias e propostas educativas para todos independentes da origem social, da idade, das experiências vivenciadas.
A diversidade real dos discentes é reduzida a diferenças apreendidas na ótica da cognição ou na do comportamento. A prática universitária, nessa lógica, desconsidera a totalidade das dimensões humanas dos sujeitos sendo, discentes docentes e funcionários, que dela participam. Partindo de uma perspectiva intercultural crítica ou multiculturalismo crítico (McLaren, 2000; Canen, 1997, 1999), pressupomos que preparar discentes e docentes para atuarem em sociedades cada vez mais multiculturais exigirá pesquisas que avancem nas questões teóricas e práticas envolvidas na formação de identidades multiculturalmente comprometidas, mobilizadas no desafio a discursos pretensamente universais que estereotipam, calam e interditam identidades plurais.
Sob a afirmativa da democratização da universidade, da educação para a cidadania, essa perspectiva homogeneizante expressa um determinado construto, socialmente produzido, ligado à ideia do Estado-Nação. Nela, domina a ideologia do universalismo antidiferencialista, que nega os particularismos das especificidades culturais em nome de uma cidadania universal. Na universidade, se traduz numa forma de conceber a educação, o ser humano e seus processos formativos, ou seja, traduz um projeto político pedagógico onde a universidade como espaço privilegiado de formação do futuro profissional, que vai informar o conjunto das ações educativas, que ocorrem no seu interior.
Conforme tem sido apontado (McLaren, 2000; Canen, 1997; Canen & Moreira, 1999), multiculturalismo é um termo polissêmico, que pode abarcar desde posturas de reconhecimento da diversidade cultural sob lentes de exotismo e folclore, passando por visões de assimilação cultural, até perspectivas mais críticas de desafio a estereótipos e a processos de construção das diferenças, estas últimas, conhecidas como perspectivas interculturais críticas ou multiculturalismo crítico (McLaren, 2000; Canen, 1997, 1999). Nossa forma de aproximação ao objeto de investigação vincula-se a esta visão intercultural crítica, especialmente enriquecida e tensionada por sensibilidades pós-coloniais que têm trazido para o centro das reflexões, questões referentes à construção das identidades plurais e híbridas, entendidas como centrais para a concretização do multiculturalismo crítico. De fato, dentro dessa perspectiva teórica, a compreensão das identidades como constituídas em espaços e discursos plurais, incluindo os educacionais, leva à rejeição de posturas que naturalizam ou essencializam essas mesmas identidades.
Como aponta, também, Álvaro Marchesi, a inclusão educativa não está resolvida em nenhuma parte do mundo. O que tenho visto é que há mais inclusão nos países mais pobres, onde há menos recursos, onde existem menos serviços paralelos, onde há uma educação especial menos instalada. Portanto, temos que partir do ponto de que a diversidade em forma de inclusão é uma certa utopia, é um desafio ao futuro que temos que construir.
Outra forma de compreender esses jovens que chegam à universidade é analisá-los na ótica da diversidade cultural. Implica em superar a visão homogeneizante e estereotipada da noção de discente, buscando compreendê-los na sua heterogeneidade, enquanto indivíduos que possuem uma historicidade, com visões de mundo, escalas de valores, sentimentos, emoções, desejos, projetos, com lógicas de comportamentos e hábitos que lhe são próprios.
Assim, em relação à universidade, cabe ao docente acender ao profundo e oculto significado das uniões pela análise participante e de um contato com os dicentes para além dos horários regulares de aula, bem como, intervalos, interação sobre vivência, bem como, sua história de vida, de forma a descobrir os alicerces do social.
Vale reforçar, neste ponto, que a aproximação com universitário em cursos de formação docente, aliada a uma proposta imbuída por uma perspectiva intercultural crítica, poderia permitir uma rica interlocução para o avanço de uma preparação docente coadunada com a pluralidade cultural.
Em uma perspectiva intercultural crítica, aproximar a reflexão sobre práticas docentes para a pluralidade cultural à temática das representações e do saber docentes no cotidiano escolar constitui, sem dúvida, um caminho possível e instigante para uma formação docente que vislumbre a transformação da universidade em um espaço de cidadania para discentes de todas as raças, gêneros, classes sociais e padrões culturais.
Desta forma, o processo educativo universitário recoloca a cada instante a reprodução do velho e a possibilidade da construção do novo, e nenhum dos lados pode antecipar uma vitória completa e definitiva. Esta abordagem permite ampliar a análise educacional, na medida em que busca apreender os processos reais, cotidianos, que ocorrem no interior da universidade, ao mesmo tempo em que resgata o papel ativo dos sujeitos, na vida social e universitária.
A primeira condição é a valorização da diversidade como um elemento enriquecedor do desenvolvimento pessoal e social. Acredita-se que a inclusão educativa não é, em primeira instância, uma questão técnica ou, como diria Nicola Cuomo, não é uma questão de engenharia didático-pedagógica. É, em primeira instância, uma opção ideológica, uma opção de valores, uma opção de vida e, em definitivo, é um sentimento. Assim, docentes muito bem formados didaticamente, se não têm uma atitude de respeito e valorização em relação às diferenças, se não têm um compromisso, não irão responder adequadamente a essas diferenças, pelo contrário, um docente que respeite as diferenças, que seja comprometido com elas, mesmo que não esteja muito bem formado, responderá bem a elas, porque depois a parte técnica vem quase por si só. Afirma-se que o importante é a universidade partir do ponto de que a Diversidade não é um problema, mas pelo contrário, é uma oportunidade para nos enriquecer, pessoal e socialmente, e para enriquecer o processo de ensino-aprendizagem. Todos têm a experiência de que quando podemos compartilhar com pessoas que têm diferentes experiências, opiniões, pontos de vista e conhecimentos, aprendemos melhor. Se sempre nos juntássemos aos que têm a mesma capacidade, opiniões e pontos de vista, não cresceriam.
Nesse sentido, a experiência vivida é matéria prima a partir da qual os jovens articulam sua própria cultura, aqui entendida enquanto conjunto de crenças, valores, visão de mundo, rede de significados: expressões simbólicas da inserção dos indivíduos em determinado nível da totalidade social, que terminam por definir a própria natureza humana (Velho, 1994). Não há, portanto, um mundo real, uma realidade única, pré-existente à atividade mental humana.
O mundo real não é um contexto fixo, não é só nem principalmente o universo físico. O mundo que rodeia o desenvolvimento do aluno é hoje,mais que nunca,uma clara construção social onde as pessoas, objetos, espaços e criações culturais, políticas ou sociais adquirem um sentido peculiar, em virtude das coordenadas sociais e históricas que determinam sua configuração. Há múltiplas realidades como há múltiplas formas de viver e dar sentido à vida. (Sacristan, 1995).

Porém, nos adverte Eunice Durham (1980), tratar a heterogeneidade cultural no âmbito de uma mesma sociedade é, qualitativamente, diferente de tratá-la entre diversas sociedades. Analisando melhor, quando procuramos compreender a cultura xavante, estamos lidando com diferenças que expressam manifestações de uma mesma capacidade humana criadora, fruto de um processo histórico independente. Outra coisa é lidar com alguma expressão da cultura popular, a linguagem, por exemplo, em que a diversidade não é apenas a expressão de particularidades do modo de vida, mas aparece como manifestações de oposições ou aceitações que implicam num constante reposicionamento dos grupos sociais na dinâmica das relações de classe (Eunice Durham, 1980). A diversidade cultural na sociedade brasileira também é fruto do acesso diferenciado às informações, às instituições que asseguram a distribuição dos recursos materiais, culturais e políticos, o que promove a utilização distinta do universo simbólico, na perspectiva tanto de expressar as especificidades das condições de existência, quanto de formular interesses divergentes. Dessa forma a heterogeneidade cultural também tem uma conotação político-ideológica.
Tais questões, ao não serem trabalhadas na graduação podem impedir o acesso dos seus futuros discentes a novas formas expressivas de linguagem, não por discriminação, mas por impossibilidade de seus professores trabalharem um padrão culto, que também não dominam.
Essa mesma diversidade está presente na elaboração e na expressão dos projetos individuais dos discentes, onde a universidade se inclui. A noção de projeto é entendida como uma construção, e fruto de escolhas racionais, conscientes, ancoradas em avaliações e definições de realidade, representando uma orientação, um rumo de vida (Velho, 1987). Um projeto é elaborado e construído em função do processo educativo, como evidenciamos acima, sempre no contexto do campo educativo ou de um campo de possibilidades, ou seja, no contexto sócio-histórico-cultural concreto, onde se insere o indivíduo, e que circunscreve suas possibilidades de experiências. Com isso, afirmamos que todos os discentes têm de uma forma ou o de outra, uma razão para estar na universidade, e elaboram isto, de uma forma mais ampla ou mais restrita, no contexto de um plano de futuro.


4. DESAFIOS DA DIVERSIDADE CULTURAL NA EDUCAÇÃO


O Estado avaliador marcou o final do século passado e continua marcando o início deste. As tendências internacionais, trazidas pela idade do conhecimento, acirradas pela internacionalização e pelo desenvolvimento e disseminação de acesso às novas tecnologias de informação, têm diminuído o fosso de adoção de medidas educativas, entre o norte e o sul, entre os países que têm altos índices de população na universidade e aqueles em que, praticamente, só uma minoria tem acesso ao ensino superior. Vivemos a era da qualidade, num país caracterizado historicamente pelo controle do Estado sobre a Educação Superior. No afã de sermos modernos e integrantes do concerto mundial aceitamos cartilhas que orientam os países subdesenvolvidos a reduzirem o papel do Estado na educação superior e copiamos políticas educativas de outras realidades paralelamente ao alijamento de construções próprias. Muitas vezes, essas mesmas cartilhas reconhecem os erros da minimização da importância da formação de recursos de alto nível e da produção de conhecimento local.
Assim, entre as tendências da qualidade como isomorfismo e respeito à diversidade, a nação latino-americanos, deve observar o conceito de qualidade para a preservação da cidadania. Deve-se ressaltar que somente 4% da população têm o ensino superior completo e 12,2% o médio. Muitas vezes, copiando tendências internacionais reforçamos a estratificação vigente, na qual, de um lado, estas instituições universitárias e/ou nichos em condições iguais ou muito similares a instituições internacionais de excelência e, de outro, um ensino superior rarefeito, com poucos programas de pós-graduação reconhecidos pelos órgãos governamentais e professores com índices de qualificação baixos.
Partindo de uma perspectiva intercultural crítica ou multiculturalismo crítico (McLaren, 2000; Canen, 1997, 1999), acredita-se que preparar discentes e docentes para atuarem em sociedades cada vez mais multiculturais exigirá pesquisas que avancem nas questões teóricas e práticas envolvidas na formação de identidades multiculturalmente comprometidas, mobilizadas no desafio a discursos pretensamente universais que estereotipam, calam e interditam identidades plurais. Argumentamos que pesquisas que articulem a dimensão individual da construção às questões relativas à pluralidade cultural, ao desafio à construção das diferenças e à hibridização, no qual possuem maiores potenciais para avançar na construção do conhecimento na área do multiculturalismo.
Um dos processos do sistema educacional brasileiro reside na qualificação do corpo docente. Esses docentes precisam estar habilitados a trabalhar com essa nova temática curricular. Sugere-se, para tanto, um esforço por parte dos órgãos governamentais ligados à área de promoção da igualdade, no sentido de oferecer, em parceria com as instâncias educacionais, cursos de extensão sobre a história de diversas culturas, bem como a publicação de material didático-pedagógico que possa dar suporte técnico a atuação desses docentes no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem.
A cultura, como um todo, orienta processos que têm por base o reconhecimento do direito à diferença e a luta contra todas as formas de discriminação e desigualdade social. Tenta promover relações dialógicas e igualitárias entre pessoas e grupos que pertencem a universos culturais diferentes, trabalhando os conflitos inerentes a esta realidade.
No Brasil, a reflexão sobre esta realidade vai penetrando lentamente na vida acadêmica. Nas diferentes práticas educativas ainda está muito pouco presente. Nos anos que levamos aprofundando nesta temática, identificar propostas educativas concretas que tenham uma referência explícita a questões que podem ser situadas no âmbito das preocupações interculturais não tem sido fácil.
O ponto inicial deve ser uma perspectiva em que a educação é vista como uma prática social em íntima relação com as diferentes dinâmicas presentes numa sociedade concreta. A educação intercultural é sempre histórica e socialmente situada.
Os principais desafios relacionados a diversidade cultural, podem ser listados e descriminados de diversas formas e maneiras. Assim, pode-se relatar que para promover alguma alteração no âmbito universitário é necessário desconstruir, articular, resgatar e promover a diversidade como um todo.
Quando se fala em desconstruir, trata-se diretamente de penetrar no universo de preconceitos e discriminações presentes na sociedade brasileira. Esta realidade se apresenta entre nós com um caráter difuso, fluido, muitas vezes sutil, e está presente em todas as relações sociais. A naturalização é um componente que a faz em grande parte invisível e especialmente complexa. Para a promoção de uma educação intercultural é necessário reconhecer o caráter desigual, discriminador e racista da nossa sociedade, da educação e de cada um. Desenvolver estratégias nesta perspectiva é fundamental. E assim, questionar o caráter monocultural e o etnocentrismo que, explícita ou implicitamente, estão presentes nas universidades e nas políticas educativas e impregnam os currículos universitários.
Só realizando este processo de desconstrução das barreiras em relação à diversidade cultural que podemos articular igualdade e diferença. Torna-se importante articular no nível das políticas educativas, assim como das práticas pedagógicas, o reconhecimento e valorização da diversidade cultural com as questões relativas á igualdade e ao direito à educação como direito de todos.
Logo, devidamente articulado, a partir da desconstrução desses elementos que impedem a realização da integração universitária, faz-se necessário reconstruir os processos de construção das nossas identidades culturais, tanto no nível pessoal como coletivo. Um elemento fundamental nesta perspectiva são as histórias de vida e da construção de diferentes comunidades sócio-culturais. Especial atenção deve ser dada aos aspectos relativos à hibridização cultural e à constituição de novas identidades culturais. É importante que se opere com um conceito dinâmico e histórico de cultura, capaz de integrar as raízes históricas e as novas configurações, evitando-se uma visão das culturas como universos fechados.
Sendo assim, resta apenas promover experiências de interação sistemática com os discentes,a fim de, sermos capazes de relativizar nossa própria maneira de situar-nos diante do mundo e atribuir-lhe sentido é necessário que experimentemos uma intensa interação com diferentes modos de viver e expressar-se. Não se trata de momentos pontuais, mas da capacidade de desenvolver projetos que suponham uma dinâmica sistemática de diálogo e construção conjunta entre diferentes pessoas ou grupos de diversas procedências sociais, étnicas, religiosas, culturais. Também torna-se importante ressaltar que a educação intercultural não pode ser reduzida a algumas situações ou atividades realizadas em momentos específicos, nem focalizar sua atenção exclusivamente em determinados grupos sociais. Trata-se de um enfoque global que deve afetar todos os atores e a todas as dimensões do processo educativo, assim como os diferentes âmbitos em que ele se desenvolve.
E por fim, favorecer processos de ação coletiva das diversas atividades, principalmente orientados aos atores sociais que historicamente tiveram menos poder na sociedade, ou seja, menores possibilidades de influir nas decisões e nos processos coletivos. Essa ação, por ventura, começa por liberar a possibilidade, o poder, a potência que cada pessoa tem para que ela possa ser sujeito de sua vida e ator social. Assim, se torna também uma dimensão coletiva, trabalha com grupos sociais minoritários, discriminados, marginalizados, e favorece sua organização e participação ativa na sociedade civil.
E assim, sendo mais profundo em relação ao ensino superior, poderia fazer uma maior ingerência junto ao CNE para que, no currículo mínimo obrigatório dos cursos da área de humanidades e ciências sociais, esteja presente a disciplina História da diversidade da cultura mundial. Entretanto, consideramos que não basta apenas introduzir o estudo dessa disciplina no currículo desses cursos. Há que se pensar, também, na formação de profissionais em nível de pós-graduação (mestrado e doutorado) na temática dos estudos afro-brasileiros, a fim de contribuir com avanços na pesquisa científica dessa área.
Para melhorar o acesso a pesquisa científica, as instituições de fomento à pesquisa (CAPES, CNPq, FINEP, FAPESP, entre outras) poderiam incentivar essa formação mediante criação de bolsas de estudos e intercâmbios culturais com centros de pesquisa de países de interesse cultural, bem como o continente africano ou asiático, no qual são menos procurados pelos bolsistas. Ainda hoje, a maior parte dos bolsistas que saem do Brasil para cursar a pós-graduação escolhe os Estados Unidos ou países europeus. Assim, reforça-se uma formação acadêmica de caráter estritamente eurocêntrico. Por fim, sugere-se, que se tenha incentivo, através de concursos e premiações, para a elaboração de material didático condizente com a Lei nº 10.639, de 2003. Ainda hoje, apesar da renovação da historiografia brasileira nos últimos anos, os livros didáticos existentes no mercado editorial não contemplam a riqueza da diversidade étnico-cultural de nosso país, cuja matriz afro-brasileira merece ser ressaltada para que, de fato, tenhamos uma escola plural e democrática, que permita o acesso e permanência dos afrodescendentes no sistema educacional brasileiro.
Logo, a promoção de uma educação intercultural é uma questão complexa, que exige problematizar diferentes elementos do modo como hoje, em geral, concebemos nossas práticas educativas e sociais. As relações entre direitos humanos, diferenças culturais e educação nos colocam no horizonte da afirmação da dignidade humana num mundo que parece não ter mais esta convicção como referência radical. Neste sentido trata-se de afirmar uma perspectiva alternativa e contra-hegemônica de construção social, política e educacional.


CONCLUSÃO


A diversidade cultural é a riqueza da humanidade. Para cumprir sua tarefa humanista, a escola precisa mostrar aos alunos que existem outras culturas além da sua. Por isso, a escola tem que ser local como ponto de partida, mas tem que ser internacional e intercultural como ponto de chegada. A universidade independente constitui uma universidade curiosa, ousada, procurando discorrer com todas as culturas e concepções mundiais. Assim, essa diversidade relaciona-se diretamente ao pluralismo, no qual não tem por significado apenas um conjunto informe de retalhos culturais., mas também o diálogo com todas as culturas, a partir de uma cultura que se liga às demais e permite a troca cultural.
Assim através desta revisão em relação à diversidade cultural, pode compreender que relacionar a universidade e a diversidade cultural tem por significado entender na visão cultural, através de uma verificação minuciosa, que considera o habitual e a extensão da facilidade, levado a efeito por homens e mulheres, trabalhadores e trabalhadoras, negros e brancos, adultos e adolescentes, enfim, discentes e docentes, seres humanos concretos, sujeitos sociais e históricos, presentes na história, atores na história.
No atual mundo de economia globalizada, ao contrário do que se previa, houve um revigoramento e uma valorização das culturas regionais e a afirmação de identidades étnico-culturais latentes que, encontra espaço para a defesa de seu direito à diferença e reconhecimento da alteridade.
A par de toda valorização às culturas das minorias sociais, muito pouco se fala das etnias na escola brasileira. Só muito recentemente, por pressão dos movimentos sociais, é que a questão da pluralidade cultural vem encontrando certa ressonância no ambiente escolar. Segundo Gadotti (1992),
Por tanto, a educação para a diferença direciona a humanização crescente do discente e na sua relação com o outro, resgatando a diferença como valorização da vida social, estimulando a essência do saber e do aprender dentro do vínculo amoroso entre as pessoas.
Consideramos, portanto, que um longo caminho ainda precisa ser percorrido para que a universidade seja, de fato, um instrumento de afirmação de uma identidade pluricultural. O ensino de história, ao priorizar a construção da identidade nacional, tem sido bastante omisso no tocante à valorização das culturas das minorias étnicas. Constatamos, também, que a falta de conhecimento das peculiaridades e das especificidades regionais, em um país de continentais dimensões, bem como dos elementos referenciais das culturas silenciadas de índios, negros e imigrantes nos currículos escolares têm contribuído para a formação de preconceitos e estereótipos por parte dos próprios brasileiros. Isso em nada contribui para a construção de uma sociedade democrática que todos almejamos, onde as diferenças raciais e culturais não se constituam em motivo de discriminação social, mas sim em instrumento possibilitador da construção de uma nova identidade nacional, assentada no pluralismo cultural.
Precisa-se, pois, propiciar, por meio do ensino em todos os níveis, o conhecimento de nossa diversidade cultural e pluralidade étnica, bem como a necessária informação sobre os bens culturais de nosso rico e multifacetado patrimônio histórico. Só assim estaremos contribuindo para a construção de uma escola plural e cidadã e formando cidadãos brasileiros cônscios de seu papel como sujeitos históricos e como agentes de transformação social.
Assim, em relação à universidade, cabe ao docente acender ao profundo e oculto significado das uniões pela análise participante e de um contato com os discentes para além dos horários regulares de aula, bem como, intervalos, interação sobre vivência, bem como, sua história de vida, de forma a descobrir os alicerces do social.
Logo, a promoção de uma educação intercultural é uma questão complexa, que exige problematizar diferentes elementos do modo como hoje, em geral, concebemos nossas práticas educativas e sociais.
E por fim, a igualdade se faz necessário, com isso é prioridade a realização de muito estudo, de diversas pesquisas para ampliar o conhecimento, e o desenvolver e testar formas que viabilizem o verdadeiro rompimento das barreiras em relação à diversidade cultural dentro dos centros universitários em nosso país.


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