Erickson de Jesus Freitas

Resumo: O presente artigo trata dos direitos inerentes à personalidade à luz do âmbito jurídico brasileiro, tratando da conceitualização das mesmas e fazendo uma análise de suas características e classificações. Em seguida, é feita uma análise das formas de se proteger a personalidade, a intimidade e o corpo. Também, são abordadas as formas de disposição do próprio corpo e o direito à integridade moral e psíquica. É feita, ainda, a análise das decisões dos tribunais relativas aos direitos da personalidade.

Palavras chave: Civil, personalidade, direitos, proteção

INTRODUÇÃO 

Personalidade é a aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações. Toda pessoa é dotada de personalidade.

Segundo Maria Helena Diniz, a personalidade é o conjunto de caracteres próprios da pessoa. Sendo o primeiro bem do indivíduo. É objeto de direito. Para que a pessoa possa ser o que é, para aferir, adquirir e ordenar outros bens.

Nesse contexto, o homem deve também ser protegido em sua essência, nas suas características individuais. Por isso, torna-se importante os direitos da personalidade. “A previsão legal dos direitos da personalidade dignifica o homem.” (GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de direito Civil. p 135).

1 CONCEITO 

Os direitos da personalidade distinguem-se dos direitos de ordem patrimonial. Disciplinando os valores não redutíveis do indivíduo, reconhecidos pelo ordenamento jurídico, como a vida, a integridade física, a intimidade, a honra, entre outros.

Para Maria Helena Diniz, os direitos da personalidade, são os direitos subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, protegendo-se os bens inatos, tendo como objetivo principal a preservação e do respeito à dignidade da pessoa humana, qualidade necessária para o desenvolvimento das potencialidades físicas, psíquicas e morais de todo ser humano.

O direito da personalidade teve suas origens no direito natural.

Segundo Rubens Limongi França, “direitos da personalidade dizem-se as faculdades jurídicas cujo objeto são os diversos aspectos da própria pessoa do sujeito, bem assim da sua projeção essencial no mundo exterior”. (FRANÇA, Rubens Limongi. Instituições de direito civil. p 1025).

Contudo, o Código Civil de 2002 traz um capítulo específico aos direitos da personalidade, previstos nos artigos 11 a 21. 

2 CARACTERÍSTICAS E FUNDAMENTOS DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE

As características dos direitos da personalidade são: intransmissibilidade, indisponibilidade, irrenunciabilidade, inexpropriabilidade, imprescritibilidade e vitaliciedade. O novo Código Civil brasileiro refere à intransmissibilidade, à irrenunciabilidade e à impossibilidade de limitação voluntária, que pode ser entendida como indisponibilidade, pois a limitação apenas pode ocorrer por ato de disposição.

A titularidade dos direitos da personalidade é única e exclusiva, não podendo ser transferida para terceiros, herdeiros ou sucessores. Por não serem objetos externos à pessoa, não podem ser disponíveis, inclusive quanto ao exercício deles, ainda que gratuito. O Poder Público não pode desapropriar qualquer direito da personalidade, porque ele não pode ser domínio público ou coletivo. A pretensão ou exigência para o cumprimento do dever e da obrigação de abstenção ou de fazer, como na hipótese do direito de resposta, ou da indenização compensatória por dano moral, jamais prescreve. Os direitos da personalidade extinguem-se com a pessoa; pode haver a transeficácia deles, post mortem, de modo a que a defesa seja atribuída a familiares, como no caso da lesão à honra do morto. 

3 CLASSIFICAÇÃO DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE 

a) direito à vida  

     Quem nasce com vida tem direito a ela. Esse direito é inato, mas também é um dever imposto à própria pessoa, que não pode dele dispor. Os sistemas jurídicos, de modo geral, negam o direito ao suicídio, porque a vida é indisponível.

     O direito à vida, como os demais direitos da personalidade, é irrenunciável e incompatível com atos contra a vida. O direito à vida não inclui o direito à morte, no sistema jurídico brasileiro. A punição, no campo penal, a quem auxilia o suicídio é decorrência da tutela ilimitada ao direito à vida.

b) direito geral à liberdade

     O direito geral à liberdade é o direito de ser livre, desde o nascimento até à morte, o direito de não estar subjugado a outrem, o direito de ir e vir, salvo a restrição em virtude do cometimento de crime.

    A prisão, embora prive ou restrinja o direito à liberdade, não o extingue, pois a Constituição brasileira não admite a prisão perpétua (art. 5º, XLVI, “a”) nem o desrespeito à integridade física e moral do presidiário (art. 5º, XLIX). Por outro lado, ninguém poderá ser privado da liberdade sem o devido processo legal (art. 5º, LIV), que busca impedir o abuso e o arbítrio e assegurar sua tutela.

c) direito à integridade física e psíquica

     Visa proteger a integridade do corpo físico e mental da pessoa humana. Não se admite a agressão física e psicológica, nem se permite a mutilação do próprio corpo, salvo o que é renovável, como se dá com o corte dos cabelos e das unhas e a doação de sangue, ou de transplante de órgãos duplos ou de partes de órgãos, sem prejuízo das funções vitais. A proteção estende-se ao corpo morto, pois o transplante, ainda que para fins altruísticos, haverá de ser consentido.

d) Direito à privacidade

      Direito à privacidade diz respeito a fatos íntimos das pessoas. Dados e documentos que possam trazer algum tipo de constrangimento para a pessoa estão protegidos pela privacidade. Diz o inciso XI do artigo 5º da Constituição que a casa é o asilo inviolável do indivíduo, ninguém podendo penetrar sem o consentimento do morador, salvo em flagrante delito ou para prestar socorro ou por determinação judicial. Com o avanço da tecnologia da informação, a vida privada encontra-se muito vulnerável à violação.                                                                 

e) direito à honra (ou reputação)

     Também conhecido como direito à integridade moral ou à reputação, o direito à honra tutela o respeito, a consideração, a boa fama e a estima que a pessoa desfruta nas relações sociais. Toda pessoa, por mais que se conduza de modo não ético, desfruta desse direito, em grau maior ou menor, a depender de seu comportamento moral e da comunidade em que vive ou atua.

f) direito moral do autor

     As criações intelectuais, especialmente as obras literárias, científicas e artísticas, envolvem dois aspectos distintos: os direitos patrimoniais do autor, de natureza econômica e que são objetos de atos jurídicos, e os direitos morais do autor, que integram os direitos da personalidade do criador, dotados de todas as características referidas: intransmissibilidade, indisponibilidade, irrenunciabilidade, imprescritibilidade, inexpropriabilidade. Segundo a Lei nº.  9.610, de 1998, são assim considerados os direitos à paternidade da obra, à nominação, ao ineditismo, à integridade ou intocabilidade da obra, à modificação, o de impedir a circulação, neste caso associado à reputação (honra) e à imagem. A utilidade econômica da obra pode ser negociada, mas nunca qualquer dos direitos morais do autor.

 g) direito à identidade pessoal

     O direito à identidade pessoal significa direito a ter nome, que é absoluto e inato. O nome é composto de prenome e  sobrenome. O prenome, simples ou composto, é individual, enquanto o sobrenome indica a procedência familiar. No Brasil, costuma-se compor o sobrenome, sucessivamente, com os nomes das famílias materna e paterna, mas não há obrigatoriedade legal, pois apenas pode conter um ou outro. Durante muito tempo, o prenome foi imutável, salvo hipóteses estreitas de erro gráfico ou ridicularia, ou durante o primeiro ano após adquirir a maioridade. Essa regra foi mudada pela Lei nº. 9.708, de 1998, que admite a mudança por apelidos públicos notórios, ou seja, quando uma pessoa é conhecida no meio social por nome diverso do que foi registrada.

     Inclui-se na direito ao nome a proteção do pseudônimo utilizado para atividades profissionais.

4 PROTEÇÃO DOS DIREITOS DE PERSONALIDADE 

     O ordenamento jurídico atua na proteção e defesa dos direitos de personalidade, no que se refere principalmente ao respeito à dignidade da pessoa humana, permitindo ao lesado vários modos de reação e atingir os objetivos almejados, como por exemplo, conseguir a cessação de práticas lesivas, reparação de danos materiais e morais e o direito de indenização decorrente dessa violação. De modo, a resguardar os direitos que são inerentes e inalienáveis, que visam à defesa de valores inatos ao cidadão, o novo Código Civil, a Constituição Federal veio defender e assegurar esses direitos que são concernentes à pessoa humana, por meio de medidas judiciais adequadas que devem ser ajuizadas pelo ofendido ou pelo lesado indireto, a fim de protegê-lo.

     A proteção dos direitos de personalidade poderá ser de duas naturezas, sendo elas preventiva ou repressiva. A primeira, principalmente, por meio de ajuizamento de ação cautelar, ou ordinária, objetivando suspender os atos que ofendam a integridade física, intelectual e moral, ajuizando-se em seguida a ação principal, ou de natureza cominatória, com fundamento nos artigos 287, 461 e 644 do Código de Processo Civil, destinados a evitar a concretização da ameaça de lesão ao direito de personalidade. A última ou repressiva por meio de imposição de sanção civil, como o pagamento de indenização, ou penal em caso de a lesão já ter sido efetivada.

     Além do próprio ofendido poderão reclamar a reparação do dano seus herdeiros, seu cônjuge ou companheira e os membros de sua família a ele ligados, desde que provem efetivamente o nexo de causalidade, o prejuízo e a culpa.

     Destarte, quanto à tutela dos direitos de personalidade o Código Civil de 2002 consagrou as duas formas de proteção jurídica, tanto a proteção à integridade física, tanto quanto a integridade moral, em seu artigo 12 prevê que pode-se exigir que cesse ameaça, ou lesão a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.  No parágrafo único da mesma, fala que em se tratando de morto terá legitimação para requerer a medida prevista em lei o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau. Na Constituição Federal são também elencados inúmeros direitos da personalidade, como por exemplo, o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à integridade física, à inviolabilidade da intimidade, da vida privada e da honra, entre outros, inclusive a proibição de atos que degradem o ser humano, dentre tais garantias destacam-se o artigo 5º da CF. A Convenção Interamericana de Direitos Humanos - Pacto de São José da Costa Rica – determina que os estados se comprometam a respeitar e garantir os direitos da personalidade no plano internacional.

     Portanto, o que se observa é um grande comprometimento com o respeito à dignidade da pessoa humana como um cidadão de direitos e obrigações, o que se cabe fazer é o individuo que sofre o gravame ficar atento e correr atrás para que seus direitos sejam resguardados e respeitados, para que assim seja feita a justiça.

5 UMA ÀNALISE SOBRE A PROTEÇÃO À INTIMIDADE 

     O artigo 21 do Código Civil de 2002 e o inciso X do artigo 5º da CF protegem todos os aspectos da vida particular da pessoa natural, pois a vida privada é inviolável e compreende-se como um direito do cidadão preservar a sua intimidade. Essa proteção visa resguardar o direito das pessoas de exigir respeito ao isolamento de cada ser humano, que não pretende que certos aspectos de sua vida privada cheguem ao conhecimento de terceiros, assim o que se quer é impedir intromissões indevidas em seu lar e no seio de sua família.

     Caso aconteça algum dano, seja ele material ou moral é assegurado o direito de tomar as providências necessárias para impedir ou fazer cessar o ato lesivo, ou exigir reparação ao dano já consumado, como por exemplo, conceder ao prejudicado o direito de indenização. Várias são as formas de ofensa à intimidade, como por exemplo, violação de domicílio ou de correspondência, uso de drogas ou de meios eletrônicos para obrigar alguém a revelar fatos de sua vida particular ou segredo profissional, emprego de binóculos para expiar o que ocorre no interior de uma casa, violação a diário íntimo, divulgação de enfermidades de segredo profissional, interceptação de conversas telefônicas, divulgação de assuntos acerca da vida amorosa, etc.

     Logo, é um direito fundamental do ser humano exigir respeito pela proteção à sua intimidade, pois ainda que sejam pessoas públicas elas tem todo o direito de ter a sua intimidade preservada, e não é pelo fato de adquirirem relevância social que tais pessoas não mereçam gozar da proteção legal para excluir terceiros e a imprensa do seu âmbito de sua vida privada. 

6 DIREITO AO CORPO

 

 

Segundo Francisco Amaral apud GONÇALVES, 2007, p. 163:

O direito ao próprio corpo abrange tanto a sua integralidade como as partes dele destacáveis e sobre as quais exerce o direito de disposição. Consideram-se, assim, coisas de propriedade do titular do respectivo corpo. O corpo humano sem vida é cadáver, coisa fora do comércio, insuscetível de apropriação, mas passível de disposição na forma da lei. Os elementos destacados do corpo deixam de ser objeto dos direitos da personalidade. Por outro lado, passam a integrá-lo os elementos ou produtos, orgânicos ou inorgânicos, que nele se incorporam, como enxertos e próteses.

Na atualidade, devido ao aumento do uso de tatuagens, piercing, e cirurgias plásticas, por exemplo, tem-se cogitado amplamente sobre o alcance do direito que o indivíduo possui sobre o seu próprio corpo. Por outro lado sabe-se que tais práticas não são consideradas como atentado à personalidade, desde que, respeitem alguns critérios como não acarretar danos à saúde e integridade física e mental; não oferecer risco aos órgãos ou parte do corpo do indivíduo. Deve-se respeitar, acima de tudo, o consentimento e a capacidade do titular.

Outra questão de grande relevância refere-se aos transplantes de órgãos, cada vez mais frequentes devido aos avanços da medicina. Porém, esse tema tem sido alvo de várias discussões nos campos ético, moral, jurídico e religioso, embora as leis 9.434/1997 e 10.211/2001 já disciplinem o assunto.

O art. 15 do Código Civil diz que “ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou intervenção cirúrgica”, determinando que a remoção de órgãos, tecidos ou parte do corpo deve, necessariamente, ser autorizada pelo indivíduo, ainda em vida, ou por seus parentes mais próximos, quando morto.

Além disso, a doação de órgãos deverá ter sempre um objetivo científico ou altruísta, caso contrário, o infrator poderá ser punido. A lei expressa, também, que a doação só é permitida em caso de órgãos duplos, partes regeneráveis de órgãos ou tecidos e não deve causar mutilação ou deformação ao doador. Deve, ainda, ser uma necessidade terapêutica comprovadamente indispensável à pessoa receptora. Em suma, além de não comprometer a integridade física do doador, a cessão deve ser sempre gratuita.

 

 

7 ATOS DE DISPOSIÇÃO DO PRÓPRIO CORPO

 

 

Os artigos 13 e 14 do Código Civil tratam da disposição do próprio corpo, ou parte dele, durante a vida e depois da morte, respectivamente. De acordo com art. 13, salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo quando importar diminuição permanente da integridade física ou contrariar os bons costumes.

Segundo Washington de Barros Monteiro:

O legislador procura proteger a incolumidade física da pessoa, resguardando-a de terceiros e de si própria. A não ser que se cuide de necessidade médica, não pode o indivíduo, por exemplo, amputar a própria mão, ou doar órgão vital, ou submeter-se a cirurgia para mudança de sexo. Nada impede, porém, que a pessoa venda seus cabelos, já que não comprometam a integridade física do doador. (MONTEIRO, 2005, p. 102)

A doação do corpo, ou de partes, para depois da morte deve atender alguns requisitos, como: a remoção deve ser realizada apenas após a morte; o objetivo deve ser científico ou altruístico; é imprescindível a autorização do doador ou de sua família.

O art. 14 do Código Civil preceitua que:

É válida, com objetivo altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte.

Parágrafo único: O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo.

Destarte, pode-se inferir que, mesmo após a morte, terminada a personalidade jurídica, o indivíduo ainda possui sua dignidade humana.

Dessa forma, a violação do cadáver só é admitida em duas situações, a saber: a) direito à prova, realização de exame necroscópico, na forma da lei, para se averiguar caso de morte violenta ou suspeita de crime, e b) necessidade, também na forma que a lei designa, de realização de transplantes em benefício da ciência. Vale ressaltar que a disposição do corpo sempre depende de autorização prévia do indivíduo ou de sua família.

8 DIREITO À INTEGRIDADE MORAL 

Segundo Carlos Roberto Gonçalves, o direito á integridade física compreende a proteção jurídica à vida, ao próprio corpo vivo ou morto, seja na sua totalidade ou em relação a tecidos, órgãos e partes suscetíveis de separação e individualização, incluindo-se o direito de alguém submeter-se ou não a exame e tratamento médico.

Tendo em vista que a vida constitui bem jurídico fundamental e dela se originam os demais direitos, o objetivo principal da proteção jurídica à vida humana e à integridade da mesma é a preservação já que sua extinção põe fim à condição de ser humano e a todas as manifestações jurídicas que se apoiam nessa condição. Essa proteção inicia-se conforme dispõe o art. 2° do Código Civil, desde a sua concepção até a morte, se encontrando disposta na Constituição Federal (art. 1°,III, e 5°, III), no Código Civil (artigos.12 a 15, 186 e 948 a 951) e no Código Penal que prevê punição, nos artigos. 121 a 128, para quatro tipos de crime contra a vida, sendo eles: Homicídio, induzimento, instigação ou auxilio a suicídio, infanticídio e aborto, e no art. 129, o crime de lesões corporais. Nesse sentido a defesa d a vida passa pela proibição de matar, de induzir a suicídio, de cometer aborto e eutanásia, envolvendo, ainda, as praticas cientificas da engenharia genética, especialmente transplantes de órgãos (Lei 9.434 de 4 de janeiro de 1997), transferência de genes, reprodução assistida, entre outras. 

9 DIREITO À INTEGRIDADE PSÍQUICA 

Convêm ressaltar que no art. 15 do Código Civil, ao coibir constrangimento da pessoa, nota-se a integridade psíquica. Na disciplina do nome, elaborada nos artigos 17 a 19 encontramos atenção tanto à integridade psíquica quanto ao patrimônio moral, ainda, no artigo 20 do referido Código Civil ao defender a imagem igualmente abarca o âmbito psíquico e moral da pessoa.

De maneira geral, todos os preceitos de proteção aos direitos individuais estão interligados e podem ser afetados de diversas maneiras indiretas, como por exemplo, a tortura, que rompe diretamente direitos como honra, imagem, integridade física e psíquica.

Enfim, a importância da interpretação e análise dos aspectos singulares de cada caso se deve ao fato de as normas positivadas sobe o direito à integridade física possuírem textos os mais abrangentes e gerais possíveis, de modo a alcançar quaisquer conflitos que venham a surgir, podendo se manter eficiente às demandas advindas das evoluções sociais e tecnológicas, assim reconhecendo que a proteção dos direitos da personalidade, para ser eficaz, deve ser a mais ampla possível. 

10 ANÁLISE DE DECISÕES DOS TRIBUNAIS 

Caso Daniella Cicarelli

Um vídeo exibido em alguns sites na internet mostrou cenas de intimidade entre a modelo Daniella Cicarelli e seu namorado Renato Malzoni, na praia de Cádiz, na Espanha.

Um "paparazzo" flagrou o casal trocando carícias e intimidades e tal vídeo, lançado na internet, gerou enorme polêmica e repercussão nacional e internacional.

Tal acontecimento acabou chegando aos Tribunais.

Após trâmite do processo, a tese que prevaleceu na 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo foi que a modelo Daniella Cicarelli e Renato Malzoni têm o direito de ter a imagem e a privacidade resguardadas.

A turma julgadora deu provimento ao recurso apresentado pela defesa de Daniella e seu namorado por maioria de votos para que três sites retirassem do ar as cenas "calientes" do casal enquanto namoravam na referida praia.

Ênio Santarelli Zuliani, juiz relator, defendeu a tese, acompanhado pelo terceiro juiz Carlos Teixeira Leite Filho, onde somente o revisor Maia da Cunha votou favorável à divulgação das imagens.

Foi determinado pelo julgador que, em caso de descumprimento, os sites estarão sujeitos a multa diária de R$ 250 mil, conforme decisão liminar do Desembargador Zuliani.

Na decisão do juiz de 1ª instância, o feito foi determinado como sendo segredo de justiça, onde, já no TJ, os desembargadores se manifestaram sobre o esvaziamento da sala de julgamento. A turma julgadora entendeu, em votação unânime, que não há justificativa para tal medida, pois as provas do processo não seriam exibidas no julgamento do recurso pelo Tribunal de Justiça.

No entendimento do juiz relator, o direito de imagem é protegido pela Constituição Federal Brasileira e pelo Código Civil Brasileiro e não há provas de que as imagens foram feitas com o consentimento de Daniella e seu namorado.

Questionou ainda, o Des. Santarelli, que "Qual o interesse público em licenciar a exploração das imagens captadas de forma clandestina?

Segundo o Des. Santarelli, a intenção do "paparazzo" que filmou foi expor a intimidade do casal e cabe a Justiça resguardar a vida íntima e a imagem das pessoas, o que é um direito constitucional. "O papel da tutela inibitória é evitar o ilícito ou a continuidade do ato ilícito, completo ainda.

"Muito diferente da imagem de alguém captada, por exemplo, num campo de futebol", disse o desembargador se referindo que Daniella e seu namorado não foram fotografados como se fizessem parte do cenário, mas sim como sendo o foco das imagens, citando a decisão dos Tribunais Italianos.

Desta forma, esse tipo de divulgação de imagens ofende direitos como honra, recato, privacidade, intimidade e requer consentimento expresso, segundo ele.

Acrescenta-se ainda o que ressaltou o Des. Teixeira Leite, que acompanhou o relator, onde disse que "uma coisa é a usurpação do nome ou imagem e outra é que, pela utilização dos mesmos, se exponha a pessoa ao menosprezo ou ridículo".

Em contrapartida, houve a tese do revisor Maia da Cunha, afirmando que não houve, por parte do casal, a menor preocupação em preservar o direito de imagem. "Os agravantes, como pessoas públicas, ao resolverem agir como agiram, abriram mão da intimidade e da privacidade". "Elas sabiam que numa praia, com tanta gente, corriam o risco de não terem a sua imagem preservada", completou o ilustre e nobre revisor.

O revisor entendeu ainda que, não havia risco de demora no despacho do juiz de 1º grau e que, no caso uma manifestação contrária do tribunal violaria o direito à informação, outro direito fundamental.

No recurso não foi discutido o direito à indenização, apenas se o vídeo poderia ou não ser exibido pelas empresas de comunicação.

O processo, que tramita em segredo de justiça, continua em andamento na 23ª Vara Cível Central da Capital.

O advogado Rubens Decoussau Tilkian pediu, em sua peça, que todos os sites retirassem as cenas do casal namorando na praia, onde o Des. Êni Santarelli Zuliani concedeu a liminar obrigando todos os sites a tirar do ar as cenas de Daniella Cicarelli e Renato Malzoni namorando em Cádiz. (BUENO; CONSTANZE, 2007)

CONCLUSÃO 

A Constituição Federal se refere aos direitos da personalidade, no art. 5º, X, onde diz: “X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. O Código Civil, por sua vez, preceitua em seu art. 11: “Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”.

Como pôde ser visto, os direitos da personalidade são inalienáveis e imprescritíveis. São inerentes à pessoa humana, estando a ela ligados de maneira perpétua. Na conceituação de Maria Helena Diniz, os direitos da personalidade são “direitos subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja, a sua integridade física (vida, alimentos, próprio corpo vivo ou morto, corpo alheio vivo ou morto, partes separadas do corpo vivo ou morto); a sua integridade intelectual (liberdade de pensamento, autoria científica, artística e literária); e sua integridade moral (honra, recato, segredo profissional e doméstico, identidade pessoal, familiar e social)”. (DINIZ, 2000, p. 102)

Assim, por serem direitos absolutos, os direitos da personalidade diferenciam-se dos outros direitos, pois toda pessoa está obrigada a respeitar e conservar seus próprios direitos humanos, para que ninguém possa atentar contra sua vida, saúde, corpo, honra, imagem e outras prerrogativas individuais, inerentes à pessoa humana e que merecem proteção legal.

                                     REFERÊNCIAS 

BUENO; CONSTANZE. Caso Daniella Cicarelli. Disponível em: www.buenoecostanze.adv.br <Acesso em 28/11/2009 às 10h>. 

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil. 16. ed. vol. I. São Paulo: Saraiva, 2000.

Direitos da personalidade. Novo Código Civil e repercussões no Direito do trabalho. Disponível em: http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/trabalho.pdf <Acesso em 27/11/09 às 10h>.

GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil: parte geral. Coleção: Sinopses jurídicas. 15. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.

LÔBO, Paulo Luiz Netto. Danos morais e direitos da personalidade. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4445<Acesso em 28/11/2009 às 12h>.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil - Parte geral. 40. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

REALE, Miguel. Os Direitos da personalidade. Disponível em: www.miguelreale.com.br/artigos/dirpers.htm<Acesso em 27/11/2009 às 10h>.