DIREITO PENAL DO INIMIGO E SUA APLICABILIDADE NO ORDENAMENTO BRASILEIRO

[1]José Renato Sousa Pereira

[2]Valéria Matias de Alenca

RESUMO

Este trabalho analisa o modelo de política criminal, conhecido como Direito Penal do Inimigo, apresentando de forma geral, desde sua origem até sua atual aplicabilidade no ordenamento jurídico brasileiro. As considerações apresentadas neste artigo baseiam-se em analise de autores especialistas na area penal, de ambito nacional e internacional. Haja vista tratar-se de relevante discussão entre os doutrinadores, referente ao presente e futuro da teoria estudada, principalmente referente ao ordenamento jurídico pátrio, o Estado Democrático de Direito e sua aplicação constitucionalizada em um sistema penal garantista. O objetivo principal é trazer ao contexto acadêmico, importante discussão sobre o tema abordado, com a finalidade específica de assegurar ao leitor o acesso a informações de grande importância para o seu desenvolvimento intelectual, sem ter a pretensão de esgotar o tema.

DESCRITORES: Direito Penal do Inimigo. Ordenamento Jurídico Brasileiro.

Introdução

O Direito Penal tem como finalidade a resolução de fatos sociais indesejados, sendo que deve intervir no caso concreto, quando um bem jurídico tutelado for lesado. Os doutrinadores dividem-se em duas visões distintas para a solução da criminalidade. Uma corrente doutrinária segue na defesa de um Direito Penal minimo, vendo-o como ultima ratio. Defendem a punição, somente, das condutas tipificadas no Direito que atingem os bens juridicos tutelados. Segundo LUIS REGIS PRADO ( 2010, p. 55) “ em um país e em determinado momento histórico, afirmando-se a positividade do Direito como fator básico da segurança jurídica e do Estado de Direito.”

Na outra ponta, temos doutrinadores, que seguem a visão do Direito Penal Máximo,  tratando-o como prima ratio de intervenção estatal, onde destaca-se o Direito Penal do Inimigo. Segundo ROGÉRIO GRECO (2011)  o Direito Penal passa a ter caráter educador e repressivo, onde a punição é posta a qualquer tipo de conduta socialmente intolerável.

Em face desse contexto, temos a teoria do Direito Penal do Inimigo que basea-se em punir delitos cometidos, sem assegurar as garantias penais-procesuais ao sujeito considerado como inimigo. Apoiado em duas vertentes, a separação entre Direito Penal do cidadão e o Direito Penal do Inimigo, com claras distinções entre pessoas (cidadãos) e as não pessoas (inimigos). Passando a ter novos contornos, a proteção aos bens jurídicos tutelados, com uma maior intervenção do Estado, exercendo seu ius puniendi.

Diante do exposto, justifica-se a abordagem apresentada na pesquisa acadêmica, de forma meramente superficial, mas com a prerrogativa de ser instigante a estudos mais aprofundados acerca do tema. Não tendo a pretenção de consumir todas as investigações, mas propor debate de ideias  acerca da teoria do Direito Penal do Inimigo. Haja vista, estas razões são as que justificam o relevante interesse pela teoria abordada.

O tipo de pesquisa realizada tomou como base produções de doutrinadores renomados da area penal, legislações cometadas, artigos publicados na Rede Mundial de Computadores ( internet), adequando-se ao objetivo pretendido no estudo.

Origem do Direito Penal do Inimigo

Na  decada de 1985, durante as Jornadas de Professores de Frankfurt, foi abordada pela primeira vez a teoria desenvolvida pelo alemão  Gunther Jakobs, que trazia a dicotomia entre o Direito Penal do Cidadão e o Direito Penal do Inimigo.  Essa teoria veio a se desenvolver efetivamente já na segunda metade da decada de 1990.

A ideologia que fundamenta essa teoria, existiu durante a toda a evolução da sociedade. A história nos traz como exemplo, a santa inquisição, o nazismo, o facismo de Mussolini, as diversas ditaduras na América ( Argentina, Brasil, Chile, Uruguai e Paraguai). Tal ideologia fora veemente criticada, nesses períodos.

Quando Jakobs apresentou pela primeira vez sua teoria, o autor “demonstrava grande preocupação em que dispositivos desta natureza contaminassem o direito penal do cidadão.”  .(ESTEFAM, 2013, p. 170) Sendo considerada como a fase crítica do Direito Penal do Inimigo.

Já em 1999, quando retomou o assunto, notava-se uma mudança em seu discurso, passando, então, o autor a descrever com mais clareza as caracteristicas da teoria. Encerrando a fase crítica e iniciando a fase descritiva.

Nessa fase Jakobs elenca quatro caracteristicas que são basilares do Direito Penal do Inimigo: I - ampla antecipação da punibilidade; II - a falta de redução da pena proporcional a esta antecipação; III - a transposição própria de Direito Penal para uma legislação combativa; IV- a supressão de garantias processuais penais. Sendo, neste período, que o autor se refere, pela primeira vez, ao trnsgressor como não pessoa.

Em 2004, com a publicação do texto Direito penal do cidadão e direito penal do inimigo, na Alemanha, observamos Jakobs legitmar sua teoria. Para ANDRÉ ESTEFAM (2013, p. 171), essse texto marca a acentuada mudança entre as fases, inicialmente crítico, posteriormente descritivo e, finalmente, legitimador. Confirmando, nos anos posteriores a legitmidade, para Jakobs, do Direito Penal do Inimigo.

O Inimigo na  Teoria de Gunther Jakobs

Para Gunther Jakobs é considerado inimigo todo agente que reincide persistentemente em delitos ou em crimes que colocam em risco o Estado e a sociedade. O inimigo recusa-se a participar do estado de cidadania e portanto está impedido de usufruir das prerrogativas que são inerentes a pessoa.

Para a teoria de Jakobs, o inimigo é o sujeito que não oferece segurança cognitiva, por conta de seu comportamento pessoal, manifestado em sua conduta. O autor individualiza,o inimigo do cidadão, dividindo em duas posturas próprias de cada um.  "...não se trata de contrapor duas esferas isoladas do direito penal, mas de descrever dois pólos de um só contexto jurídico penal".(JAKOBS, 2009, p.21)

No polo do Direito Penal do Cidadão, este mantêm as prerrogativas inerentes a sua condição de pessoa, apesar de ter cometido ato ilícito. Se o sujeito, mesmo transgredindo a norma, oferece garantias de não mais transgredir, assim continua sendo considerado cidadão. “ O Direito Penal do Cidadão é Direito também no que se refere ao criminoso. Este segue sendo pessoa. Mas o Direito Penal do Inimigo é Direito em outro sentido.” (JAKOBS, 2009, p. 28)

 Contudo Jakobs elenca algumas transgressões que não podem ser consideradas reparáveis, portando estes sujeitos devem ser considerados inimigos. Enquadram-se, nesse polo, os crimes sexuais, terrorismo, crimes econômicos e outras infrações consideradas de maior potencial ofensivo.

Portanto, no Direito Penal do Inimigo, todos os sujeitos transgressores que não se adaptam ao comporatemnto social exigido é uma não-pessoa, ou seja um inimigo do Estado.

Caracteríticas do Direito Penal do Inimigo

De acordo com Gunther Jakobs, o Direito Penal do Inimigo é caracterizado por:

I- Objetivar a eliminação de perigos;

A finalidade não é a garantia da vigência da norma, pois esta já é esperada na conduta do cidadão e sim a eliminação do perigo defraudado de maneira duradora pelo agente, que em seu comportamento (delitos sexuais), em sua vida econômica ( tráfico de drogas) ou em sua incorporação em organizações (terrorismo) afastam-se do Direito.

II- O agente visto como “não pessoa”;

O autor baseia-se na periculosidade do indivíduo, passando a ser visto como inimigo, portanto alguém que não pode ser considerado como sujeito de direitos. “ Um indivíduo que não admite ser obrigado a entrar em um estado de cidadania não pode participar do conceito de pessoa” (JAKOBS, 2009, p. 35)

III- Punição dos atos preparatórios;

A antecipação da punibilidade, cuja finalidade é coibir ações perigosas antes de sua concretização, concluí-se que, para JAKOBS “ a punibilidade avança um grande trecho para o âmbito da preparação, e a pena se dirige à segurança frente a fatos fututos, não à sanção de fatos cometidos.” (2009, p.34)

IV- As penas devem ser severas;

Para JAKOBS, as penas em si não significam nada, senão serem efetivas, portadora da resposta ao fato. “ A coação não pretende significar nada, mas quer ser efetiva, isto é, que não se dirige contra pessoa em Direito, mas contra o indivíduo perigoso.” (2009, p. 22) A exclusão do agente transgressor deve se dar pelo maior tempo possivel, ficando este fora do convívio social, com isso ocorre uma exasperação na dosimetria da pena e supressão de garantias processuais.

V- Combater o inimigo;

Em sua tese, Jakobs faz distinção entre Direito Penal do Cidadão e Direito Penal do Inimigo, ressaltando que os direitos inatos a pessoa humana não podem ser retirados ou ignoados. Contudo, para o agente transgressor, por não se adaptar a sociedade, este poderá perder sua qualidade de cidadão. “O Direito Penal do Cidadão é o Direito de todos, o Direito Penal do Inimigo é daqueles que o constituem contra inimigos: frente ao inimigo, é só coação física, até chegar à guerra.” (JAKOBS, 2009, p. 28)

 Sendo que o ordenamento jurídico deve ser voltado para a eliminação dos considerados inimigos, sendo direitos e garantias relativizados, com a aplicação de uma legislação diferenciada, com enfoque combativo.

VI- Utilização de medidas de segurança

A penalização do individuo transgressor, o inimigo, seria aquela medida de força, que apresente os efeitos físicos da custódia de segurança, obstruindo dessa forma o ato futuro, ou seja o crime, tendo assim um caráter preventivo, diante da negatividade da validade da norma. Segundo JAKOBS “consequentemente quem não participa na vida em um estado comunitário-legal deve retirar-se, o que significa que é expelido (ou impelido à custódia de segurança)”. 2009, p. 27

VII- Supressão das garantias processuais

O sistema processual penal acompanha a divisão entre os polos da teoria, sendo que para o Direito Penal do Cidadão é fundado na imputação acusatória, assegurado as garantias processuais, tais como devido processo lega e ampla defesa. Contudo o Direito Penal do Inimigo é fundado na imputação inquisitória, retirando do inimigo as garantias constitucionais. Assim afirma Jakobs:

O duplo sistema de imputação de Jakobs suprime as garantias constitucionais, inerentes em um Estado Democrático de Direito. Portanto o processo contra o inimigo não é necessário ter forma de justiça, ao contrário, necessariamente deve conter a forma de guerra, para que o inimigo seja destruido.

Harmonização do Direito Penal do Inimigo Com os Princípios Constitucionais

A Constituição Federal de 1988, tem como base um Estado Democrático de Direito, cuja finalidade é resguardar os direitos fundamentais do homem, assegurando-lhes, para isso, as garantias penais processuais. Essas garantias estão positivadas, principalmente, no artigo 5º da nossa Carta Magna. Tais princípios não se harmonizam com a teoria de Gunther Jakobs.   

Os doutrinadores que se opõe ao Direito Penal do Inimigo, os fazem por representar uma ameaça aos princípios constitucionais, desvalorazando a segurança normativa. Assim ressalta ROGÉRIO GRECO:

Portando nosso sistema jurídico garantista, não aceitam o discurso por um Direito Penal mais repressivo, onde as garantias dos individuos são suprimidas. Em um Estado Democrático de Direito o que se impõe são  as leis, estas voltadas para o princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

DIREITO PENAL DO INIMIGO E SUA APLICABILIDADE NO ORDENAMENTO BRASILEIRO

No Brasil, podemos perceber traços do Direito Penal do Inimigo dentro do nosso ordenamento jurídico, especificamente dentro das leis elaboradas nos últimos anos -  a exemplo temos a Lei do Crime Organizado ( Lei n. 12.850/2013), Lei dos Crimes Hediondos ( Lei n. 8.072/1990) e a Leis de Drogas ( Lei n. 11.343/2006).

Essas leis apresentam em comum, diretrizes penais e processuais divergentes com o modelo liberal- clássico. Caracterizam-se por serem instrumentos de antecipação de tutela punitiva, com tipificação de novos delitos e personificação dos transgressores, priorizam uma punição mais rigorosa para os que cometem os atos tipificados e relativizam as garantias fundamentais do acusado, como meio de resposta a insegurança crescente que permeia a sociedade.

A Lei de Crimes Hediondos ( Lei 8072/90), trouxe diversas proibições que flexibilizaram as garantias de direiots dos transgressores, tornando o regime penal mais rigoroso. Segundo JOÃO JOSÉ LEAL essa lei é fruto do conservadorismo e da alienação parlamentar ( 2007, p. 32):

Com base em um rigor maior evidenciando a relativização da garantias inerentes aos cidadãos, a lei de crimes hediondos, na visão de alguns doutrinadores, apresenta traços do Direito Penal do Inimigo de Jakobs.

Na mesma linha de pensamento temos a Nova Lei de crime Organizado ( lei 12.850/2003), que visa a criminalização da conduta do crime organizado, evidenciando o anseio do legislador de afastar as garantias fundamentais em relação as pessoas acusadas de praticar infrações penais. A Lei de crimes hediondos autoriza o uso de meios excepcionais de persecução , usados em modelos de sociedade imersa em conflitos extremos, para conseguir manter/reaver a normalidade social.

De igual modo, temos a Lei de Drogas ( Lei 11.343/2006), onde em seu artigo 33, existem dezoito verbos caracterizadores do sujeito delinquente e não do tipo penal :

Art. 33 - Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Podemos perceber que as condutas, descritas no artigo, são distintas e ofedem a bens jurídicos diferentes, bem como algumas condutas são irrelevantes jurídicamente, como “ter em deposito”, “guardar” e “adquirir”. Evidenciando o tratamento reservado ao usuário, o mesmo reservado ao traficante de drogas. Punindo severamente o autor.

Portando diante da crescente violência urbana, nossos lesgiladores passaram a adotar, nas leis recentes, um rigor penalista maior, baseadas em um Direito Penal Maximo.   

Regime Disciplinar Diferenciado e o Direito Penal do Inimigo

 A lei que regulamenta o RDD,  derivou dos acontecimentos ocorridos em 2001, no Estado de São Paulo, onde diversas unidades prisionais da Secretaria de Segurança Pública do Estado, se rebelaram. Vigorando por pouco tempo, contudo voltou a discussão em 2003 logo após o assassinato de juízeis do estado de São Paulo e Espirito Santo por ordem de organizações criminosas. Diante da pressão popular e da imprensa midiática, voltou-se a discussão do projeto de lei 5.073 de 2001, dando origem a Lei 10.792/2003, que introduziu o Regime Disciplinar Diferenciado na legislação brasileira, alterando a Lei de Execuções Penais( Lei 7.210/1984).

Destacando, principalmete, a alteração do artigo 52 da LEP, vigorando os seguintes termos:

Art. 52. A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave, e, quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso provisório ou condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as seguintes características:

I – duração máxima de trezentos e sessenta dias, sem prejuízo da repetição da sanção por nova falta grave da mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada;

II – recolhimento em cela individual;

III – visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas horas;

IV – o preso terá direito à saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol.

§ 1º O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem ou a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade.

§ 2º Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando. (grifos nossos)

A expressão usada no artigo quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas”, torna-se muito vago, não oferecendo  uma conceituação conclusiva, por parte do legislador, dificultando seu campo de atuação. Ocorre que, sendo assim tão vago, abre para uma maior penalização, de uma gama  indeterminadas de condutas, não conceituadas. O Estado, detentor do ius puniendi, amplia seu poder punitivo, conforme defende a doutrina do Direito Penal do Inimigo.

Ferindo, dessa forma, o princípio da legalidade que exige que as leis penais sejam claras, com precisão em seu conteúdo, conforme nos ensina BITENCOURT “ Em termos de sanções criminais são inadmissíveis, pelo princípio da legalidade, expressões vagas, equívocas ou ambíguas.” (2011, p. 41) Sendo o princípio da legalidade, tratado como uma garantia relativizada do cidadão, no artigo 52 da Lei de Execução Penal, frente ao poder punitivo do Estado, característica do Direito Penal do Inimigo.

A expressão “alto risco para a ordem ou segurança do estabelecimento penal ou da sociedade”, é usada mais uma vez de forma vaga e imprecisa, causando dano as garantias do cidadão. Segundo NILO BATISTA ( 2007, p. 78) “Formular tipos penais “genericos ou vazios”, valendo-se de “clasulas gerais” ou “ conceitos indeterminados” ou “ ambiguos”, equivale teoricamente a nada formular, mas é pratica e politicamente mais nefasto e perigoso”.

Nas duas situações, o agente está exposto a arbitrariedade e subjetividade da autoridade competente, relativizando o princípio da legalidade, uma garantia fundamental do agente transgressor. Podemos perceber, também, uma clara antecipação da punibilidade, já que os agentes não necessariamente precisam ter cometido, ainda, qualquer ato ou exteriorizado a conduta proibida, para ser colocado no regime Disciplinar Diferenciado.

A prioridade punitiva do Regime Disciplinar Diferenciado, aproxima-se do Direito Penal do autor, já que pune-se o agente pelo que ele é (personalidade) e não pelo que faz ou omite (fato), sendo dirigo a determinadas classes de pessoas. Por fim temos a expressão “fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando”, podemos perceber a inobservância aos princípios da ampla defesa e do contraditório, bem como o princípio de presunção de inocência, constitucionalmente garantidos.   

Portanto, o Regime Disciplinar Diferenciado aproxima-se do Direito Penal do Inimigo, ao trazer expressões vagas que tornam mais rigoroso o cumprimento da pena, individualizando o agente transgressor por caracteristicas pessoais e não observando princípios constitucionamente garantidos.

 Direito penal do Inimigo Sob a Ótica de Manuel Cáncio Meliá

A maioria dos penalistas criticam a teoria do Direito Penal do Inimigo, dentre esses está Manuel Cancio Meliá. Em sua visão, não é justificavel a separação em dois polos, o Direito Penal do Cidadão e o Direito Penal do Inimigo.

MELIÁ analisa o estado da política criminal, tendo como principal caracteristica a expansão do direito penal, com isso ocorre o surgimento de diversas figuras novas na área penal.

A expansão da idéia do Direito Penal do risco, as chamadas teorias antigaratistas, expandem-se  dentro de um quador político-criminal. Diante  da clamação social para a resolução da criminalidade. A partir da evolução políco-criminal, o autor, resume em dois fenômenos, que são o ressurgimento do punitivismo e o Direito Penal Simbólico. Segundo MELIÁ (2009, p. 77) “ ambas as linhas de evolução, a simbólica e a punitivista, constituem a linhagem do Direito Penal do inimigo.”

Críticas ao Direito Penal do Inimigo

Um dos maiores críticos, a teoria de Jakobs é o mestre Zaffaroni, LUIZ FLÁVIO GOMES,  durante uma conferência realizada em São Paulo, no dia 14 de agosto de 2004, explicitou didaticamente a crítica do mestre Zaffaroni a teora do Direito Penal do Inimigo, sob o título “Reação de Zaffaroni ao Direito penal do Inimigo”, segue abaixo as criticas resumidas:

ZAFFARONI entende que o temor que sofre a sociedade é o meio difusor para o exercício desse tipo de poder punitivo,  tendo o Direito Penal a função de extinguir o inimigo, tal discurso serve como remédio dos políticos e demagogos. Sendo utilizado como produto de mercado e “discurso publicitário.” (GOMES, 2004)

Para CANCIO MELIÁ o Direito Penal do Inimigo atenta contra a Constituição, em um Estado Democrático de Direito, pois o mesmo  não admite o tratamento dispensado a alguem que comete delitos, suprimindo-lhes as garantias constitucionais-processuais. Não devendo ser tratado pelo Direito como mero objeto de coação, despido de sua dignidade como pessoa.

Referente ao modelo defendido no Direito Penal do Inimigo, este para Meliá, não cumpre sua finalidade de eficácia, uma vez que as leis que incorporam suas características não têm reduzido a criminalidade.

A existência de leis penais, fundadas no Direito Penal do Inimigo, não garante sua existência conceitual dentro de um sistema jurídico. Segundo Meliá os considerados inimigos,  não possuem a alta e especial periculosidade auferida pelos teóricos do Direito Penal do Inimigo.

Ao contrário do que prega o Direito Penal do Inimigo, a maneira de reagir a criminalidade e combater o inimigo, não é o endurecimento do sistema penal, “com este instrumento, o Estado não fala com seus cidadãos, mas ameaça seus inimigos”. ( MELIÁ, 2009, p. 95)  Portanto deveria buscar a confirmação da vigência do ordenamento jurídico, independente da conduta praticada, sempre cimentado pelos princípios e as regras jurídicas, em face do autor, respeitando-o como pessoa

 Este retrocesso ao punitivismo feito pelo  Direito Penal do Inimigo, excessivamente pautado na punição de determinados comportamentos, vai de encontro a um dos princípios fundamentais do Direito Penal: o princípio do direito penal do fato, segundo o qual não podem ser incriminados simples pensamentos.

Portanto, observa-se que as crítica ao Direito Penal do Inimigo estão voltadas para as novas diretrizes do Direito Penal, como simbolismo excessivo, políticas criminais voltadas para o autor e não para o fato, flexibilização de garantias fundamentais, que buscam eficência em políticas criminais de controle máximo e combate a criminalidade organizada, bem como também aos atos de terrorismo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme posto em evidência, a teoria do Direito Penal do Inimigo é incompátivel com um Estado Democrático de Direito, ferindo os princípios fundamentais, que caso fosse legitimado passariamos a ser um Estado autoritário. Ao retirar o status de pessoa do sujeito transgressor das normas, nos afastamos da forma legitimada de punição de delitos instituida constitucionalmente. Aceitar a teoria de Jakobs como política criminal representa um verdadeiro retrocesso na seara penal.

Observando que por não existir um conceito definido de inimigo, a redução de garantias não ficaria limitada aos inimigos, mas também alcançaria o cidadão. Frente ao Estado todos passariam a serem alvos, minando a segurança da sociedade, mesmo que a política criminal seja voltada para os que possuem a personalidade reprovada, podeira um inocente ser confundindo e ser processado sem ter respeitado suas garantias.

Portanto, mesmo sendo pequena a influênciado direito Penal do Inimigo, no ordenamento jurídico brasileiro, não causando malefícios aos direitos humanos e as garantias fundamentais, como prega a teoria de Gunther Jakobs. Devendo os legisladores pautarem seus esforços, em teorias que equilibrem a intervenção do Estado, devendo o Direito Penal somente intervir em casos extremos, quando os demais ramos do Direito não forem suficientemente capazes de solucionar os conflitos. A intervenção do Estado deve ser pautada pela Constituição Federal, garantindo tratamento penal em conformidade com as garantias constitucionais, se assim não o fizer tornar-se-a ilegítimo o Direito Penal.

Destacando as críticas perpertradas por renomados doutrinadores, como Zaffaroni, acerca da legitimidade do Direito Penal, fundamentadas na inconstitucionalidade dos institutos que compõe o Direito Penal do Inimigo. Sua aplicação resulta em um reflexibilização ou supressão de garantias fundamentais previstas em um Estado Democrático de Direito, gerando uma violação dos princípios constitucionais.

Não há pretenção, com esse estudo, de sanar os debates acerca da teoria de Gunther Jakobs, haja vista ocorrer um avanço na adoção do Direito Penal do Inimigo na legislação penal brasileira, principalmente por conta da pressão exercida pela sociedade e reforçada pela mídia. Entretando, existiu grande preocupação em suscitar dúvidas acerca do instituto ora em estudo, questões relavantes na seara penal.

 

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[1] Aluno do 10º semestre do curso de Direito da Faculdade Paraiso-FAPCE. Email: [email protected]

[2] Aluna do 10º semestre do curso de Direito da Faculdade Paraiso_FAPCE. Email: [email protected]