Este artigo visa analisar a educação no direito pátrio, sobretudo quanto à ordem constitucional nacional, partindo da abrangência normativa de sua proteção. O direito a educação é o principal meio de emancipação do indivíduo visando efetivá-lo no ambiente social, onde pela premissa de que a educação deva ser garantida pelo Estado através de políticas educacionais públicas e gratuitas, todos sem qualquer distinção, devem ter acesso à educação como alicerce para uma fática construção do conhecimento. Mister se faz a exposição efetiva dos problemas de eficácia de tal direito, que no afã de oferecer conforme os ditames da constituição, um ensino básico aos indivíduos, deixa transparecer a inoperância de meios eficazes para sua consolidação. Resultante das bases arenosas do ensino provindo da escassez material e humana disposta, a educação superior se confronta com seu verdadeiro objetivo, dirimindo metas visionárias qualitativas. Assim, uma interpretação analítica da ordem constitucional brasileira se faz necessária, a começar pelos deveres do Estado no âmbito dos direitos do cidadão.

É inquestionável a idéia de que o acesso à educação é um direito fundamental inerente a todo cidadão, mas a fruição efetiva de tal direito se contrapõe ao reconhecimento das lideranças políticas, mesmo sendo este uma garantia constitucional, onde a efetividade dos direitos sociais depende de ações estatais concretas visto que sua plena satisfação extrapola o nível da satisfação individual do direito (DUARTE, 2004, p.113-118).

A Constituição traz em seu artigo 205 que: "A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho" e enquanto atividade do Estado, torna-se instrumento de concretização do programa constitucional, sendo este acesso às políticas educacionais, direito de cada cidadão (BRASIL, p. 135).

Contudo, a educação em sua amplitude tem a finalidade de tornar o homem mais integro fornecendo meios de aplicabilidade do conhecimento adquirido de forma disciplinada através de instrução educacional, o que embora possa ser entendida como linhas paralelas, instrução e educação devem se completar ou mesmo, integrar-se (MUNIZ, 2002, p.7).

O artigo 208 da Constituição Federal por sua vez discorre como dever do Estado a garantia do ensino fundamental, obrigatório e gratuito mesmo para aqueles que não tiveram acesso na idade própria, imputando responsabilidade à autoridade competente quando não oferecido, cabendo ainda aos municípios dar prioridade ao ensino fundamental e educação infantil e aos Estados e Distrito Federal atuar prioritariamente no ensino fundamental e médio, conforme trata art. 211 (BRASIL, p.136-137).

Vale destacar que o primeiro documento de cunho internacional a tratar sobre o assunto foi a Declaração Internacional dos Direitos Humanos de 1948, que recebeu complemento direto e posterior pelo Pacto sobre os Direitos Civis e Políticos e Direitos Econômicos, Sociais e Culturais adotados pela Assembléia Geral das Nações Unidas datada de 1966 (ALVES, 1997, p. 24).

Destaca-se que a forma de execução das políticas educativas vem expressa nos artigos 206 e 207 no que tange os princípios de administração do ensino, a garantia de gratuidade dentre outros, indispensáveis a plena execução do ensino (BRASIL, p. 135-136).

Devido à carência de prestações e recursos limitados ao nível de desenvolvimento econômico social, notado pela limitação a ostensividade das políticas educacionais adotadas no Brasil, a proteção ao direito à educação bem como ao ensino gratuito a todos, não é garantido faticamente a todo cidadão, mesmo que tais direitos estejam expressos na Constituição onde o que se nota é que o Direito Constitucional tem servido para desconstruir a Constituição, não acompanhando as transformações da sociedade (BERCOVICI, 2009, p. 12).

1 EDUCAÇÃO: DEVER DO ESTADO, DIREITO DO CIDADÃO

1.1 CONCEITO DE EDUCAÇÃO

Voltado a sua etimologia, o conceito de educação sempre sofreu dupla influencia, ora entendido como desenvolvimento interior do homem onde o educador apenas exterioriza as possibilidades já existentes dentro do indivíduo ou o conhecimento adquirido pelo homem através das experiências. O primeiro entendimento é denominado nativismo sendo o outro empirismo, sendo encerrada esta dupla concepção com os vocábulos educare e educere, origem etimológica do verbo educar (MUNIZ, 2002, p.7).

Conforme ainda nos ensina Muniz (2002, p.7 e ss) o termo educare abrange o desenvolvimento físico, intelectual e moral do indivíduo, buscando melhor integração deste à sociedade, ou seja, a expressão educare neste contexto tem significado de subministrar o necessário para o desenvolvimento da personalidade enquanto que o termo educere trata de um sentido etimológico, de educação voltada a capacidade interior do educando dependendo o desenvolvimento do dinamismo interno.

1.2 DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO

Por ser um direito humano fundamental, a educação é também um meio indispensável para a realização dos demais direitos humanos, sendo veiculo primário pelo qual os seres marginalizados econômica e socialmente, podem combater a pobreza e participar ativamente e na plenitude das ações comunitárias (BONTEMPO, 1988, p. 75).

O Estado deve disponibilizar uma estrutura que permita a formação intelectual de seu povo por meio de materiais e estruturas reais satisfazendo os diversos pressupostos de caráter econômico, político e jurídico, o que em contrario impossibilitaria a plena eficácia do ensino (KRELL, 2002, p. 21).

Assim nos ensina Freitag (2005, p. 32) "a educação sempre expressa uma doutrina pedagógica, a qual implícita ou explicitamente se baseia em uma filosofia de vida, concepção de homem e sociedade".

Conforme define a Lei 9.394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a educação é dever da família e do Estado visando o pleno desenvolvimento do educando de forma a abranger os processos formativos na vida familiar, na convivência humana, trabalho dentre outros.

Vale destacar que ao estado não cabe o dever de manutenção e acesso ao ensino médio e superior além de outras formas de educação especial, e sim, somente, a educação básica, podendo inclusive o Poder Público optar vagarosamente pela desestruturação do ensino público e gratuito em seus níveis mais elevados, estando sujeito ao status positivus socialis e assim, condicionadas às políticas públicas e à reserva do possível por se tratar de prestação inessencial, dependente da situação econômica do país e da riqueza nacional (TORRES apud DERBLI, 2007, p. 92).

A educação além de transmitir conhecimentos aos indivíduos auxilia-os na convivência em sociedade, possibilitando a estes ações positivas e relevantes, tais como a democracia, a tolerância mútua e igualdade por meio de coesão social propiciada pelo convívio com diversas temáticas e valores construídos através de ensinamentos e aprendizagem (ARAUJO, 2007, p. 35).

Desta forma é garantido ao indivíduo, plena existência na sociedade global, na medida em que se viabiliza a formação do ser em valores pluralísticos, não sendo a aprendizagem um fim em si, mas um meio de eliminação de violação aos direitos humanos (GOMES, 2001, p. 24).

É por meio de um ambiente multicultural onde as diversas informações trazidas por membros pertencentes aos diversos meios e tradições, que ocorre certa contribuição para uma nova compreensão das relações entre educação e cultura (CANDAU, 2008, p. 15).

A importância de uma educação globalizadora se da na medida em que for intencionalizada pelo conhecimento e pela valoração, sendo esta, uma educação humanizadora, baseada na cultura de respeito e pautada no paradigma dos direitos humanos (SEVERINO, 2001, p. 9).

É na vivência e aprendizado coletivo onde ocorre o desenvolvimento voltado ao conhecimento de outras pessoas, suas tradições e espiritualidade bem como sua história, que deve-se criar um espírito novo, que por meio da notória percepção crescente de interdependências, busca-se a concretização de projetos educativos comuns e sem conflitos (DELORS, 2006, p. 12).

Aprovada em Jomtien em 1990 a Educação para todos revela a preocupação mundial acerca da igualdade de acesso aos sistemas de ensino, como meio fundamental de formação intelectual humana, buscando um comprometimento maior dos estados com a melhoria da qualidade do ensino. Também busca democratizar a educação básica, delimitando uma proposta pedagógica que visa o reconhecimento da educação como processo formativo de valores e atitudes em favor da paz, da democracia, direitos humanos e das liberdades fundamentais do indivíduo (GOMES, 2001, p. 21).

CONCLUSÃO

A Constituição brasileira exerce o papel garantidor do ensino básico aos indivíduos como fonte de conhecimento básico e sólido, visando sua vivência no meio social.

Os conflitos existentes entre as ocorrências práticas e os textos observados nos ditames constitucionais, demonstram as lacunas existentes entre a teoria e a prática, o dever ser e o executar de forma exaurida.

As desigualdades percebidas entre as diversas regiões, não só no campo econômico, mas também no que tange as possibilidades de formação humana além das consideradas básicas, as distâncias entre os povos e a desestrutura ou ainda, o ensino arcaico encontrado, reporta a todos à verdadeira efetividade das garantias expostas na legislação vigente.

Encontram-se muitas localidades com necessidade gritante de investimentos voltados à educação enquanto em outras, tal investimento não é aplicado em sua totalidade ou de forma correta, ocasionando a deseducação crescente no meio populacional.

Leis mais rígidas de aplicabilidade de recursos somadas à fiscalização serena dos atos governamentais em todas as esferas é clamor público, o que certamente ocorrendo, resolveria de forma fática o confronto existente em nosso país, entre o Brasil das leis escritas e o Brasil das leis aplicadas com ações resultantes destas leis.

REFERÊNCIAS

ALVES, J. A. L. A arquitetura internacional dos direitos humanos. São Paulo: FTD, 1997.

ARAÚJO, U. F. A Construção Social e Psicológica dos Valores. In ARAÚJO, Ulisses; PUIG, José Maria. Educação e Valores. São Paulo: Summus, 2007.

BERCOVICI, G. O Subdesenvolvimento no Brasil. Entrevista a Eunice Nunes.In:http://www.tribunadodireito.com.br/2008/agosto/entrevista.html. Último acesso em 10.09.2009.

BONTEMPO, A. G. Direitos sociais: eficácia e acionabilidade à luz da constituição de 1988. Curitiba: Juruá, 2005.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil:promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Luiz Flávio Gomes. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

CANDAU, V. M. Multiculturalismo e Educação: Desafios para a Prática Pedagógica. In________ (org.). Multiculturalismo: diferenças culturais e práticas pedagógicas. Petrópolis: Vozes, 2008.

DELORS, J. et ali. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre educação para o século XXI, 10ª ed. Brasília: UNESCO: MEC, 2006.

DUARTE, C. S. Direito público subjetivo e políticas educacionais. São Paulo em perspectiva. São Paulo, v. 18, n. 2, p. 113-118, 2004.

FREITAG, B. Estado, Escola e Sociedade. São Paulo: Centauro, 2005.

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SEVERINO, A. J.Educação, Sujeito e História. São Paulo: Olho D'Água, 2001.

TORRES, R. L. A Cidadania Multidimensional na Era dos Direitos. In _____ (org.). Teoria dos Direitos Fundamentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2001 Apud DERBLI, Felipe. O Princípio da Proibição do Retrocesso Social na Constituição de 1988. Rio de Janeiro, Renovar, 2007, pg. 92.

KRELL, A. Direitos Sociais e Controle Judicial no Brasil e na Alemanha. Porto Alegre: SAFE, 2002.