DIREITO DE PROPRIEDADE E USUCAPIÃO: uma análise da aplicação do princípio Função Social da propriedade em imóveis dominicais na atual sociedade brasileira
Publicado em 08 de dezembro de 2015 por Nórton Nil Lima Clarentino
DIREITO DE PROPRIEDADE E USUCAPIÃO: uma análise da aplicação do princípio Função Social da propriedade em imóveis dominicais na atual sociedade brasileira
Dermison Cunha Monteiro[2]
Nórton Nil Lima Clarentino[3]
Sumário: Introdução. 1. Breve histórico do direito de Propriedade enquanto direito fundamental. 2. Limites impostos ao direito de propriedade: uma análise do princípio da função social da propriedade. 3 Apontamentos sobre a ação de usucapião 4. A (in) aplicabilidade da usucapião em bens dominicais diante da inobservância do princípio da função social da propriedade. Considerações finais. Referências.
RESUMO
A usucapião é instrumento de aquisição de propriedade. Baseia-se no princípio da função social elemento balizador do direito a propriedade. Nesse contexto, é previsto como sendo impossível a usucapião de bens públicos, com vista ao interesse social, já que se trata de um bem coletivo. Sob esse ínterim, o presente trabalho dissecar o conceito de bem público, para tratar em especial dos bens dominicais, ou seja, aqueles que possuem apenas uma função patrimonial. Sobre essa senda, configura-se que existe um controverso entre o princípio da Função Social e o posicionamento estatal, este prevê a impossibilidade de usucapião aos bens públicos, com vista à característica que rege os bens públicos a imprescritibilidade.
Palavras-chave: Usucapião, Propriedade, Função Social.
Introdução
O presente trabalho trata de uma questão sensível ao ramo do direito público, em especial direito civil, a aquisição de propriedade pública por meio do instituto da usucapião, visto que envolve interesses contrapostos, os estatais e os particulares.
Essa pesquisa tem por escopo a compreensão do instrumento da usucapião, sob a modalidade de aquisição da propriedade pelo uso, e a sua correlação com princípio balizador da propriedade, a função social. Sobre esse enfoque, é possível verificar no ordenamento jurídico brasileiro uma vedação legal à usucapião na propriedade pública, sobre o fundamento de defesa do interesse coletivo, e a outro giro um viés patrimonial.
Sobre essa reflexão, a doutrina e a jurisprudência mantêm-se no caminho previsto na Constituição Federal de 1988, ou seja, entendem pela impossibilidade de usucapião do bem público. Contudo, é verificável que o Estado é detentor de inúmeras propriedades que não estão concretizando o princípio da função social, como exemplo, alguns bens dominicais. Destarte, justifica-se a importância em analisar os fundamentos para que tais bens não sejam passíveis da usucapião, mesmo sem desempenharem uma finalidade social.
Diante disso, verifica-se na atual sociedade brasileira um paradoxo, qual seja: propriedades estatais sem nenhuma destinação social e inúmeras pessoas necessitando de terra para fins de moradia, plantação e etc..
Sobre perspectiva acima mencionada essa pesquisa tende a desmembrar a propriedade pública, sobre dois vieses, um formal e outro material, bem como questionar-se-á, embasado na doutrina, se a postura Estatal, relação vertical diante do particular, é o melhor caminho pavimentado diante do clamor social.
Em seguida, a apresentação do direito a propriedade, com o foco aos fundamentos constitucionais e apresentação do mesmo como sendo um direito fundamental demonstrando assim a titularidade desse direito.
Nessa linha de intelecção, este tópico discorre brevemente, pois serão analisadas em outro ponto, com uma perspectiva histórica. Pontuam, para isso, referências sobre o direito à propriedade previstas no ordenamento jurídico vigente anteriormente ao Código Civil de 2002 e a Constituição Federal de 1988.
Sobre esta ótica, configura-se a seguinte problemática de aplicação ou não da usucapião diante de bens públicos sob a modalidade bens dominicais, visto trata apenas de patrimônio.
1 Breve histórico do direito de Propriedade enquanto direito fundamental
Desde o princípio quando o homem passou a se organizar em sociedade tal qual como vivemos hoje, o mesmo começou a pensar em separação e delimitação do que pertence a cada pessoa, desta forma então uma das primeiras coisas que o homem fez foi definir um conceito muito simples: o de proprietário, ou seja, o de dono de determinados objetos ou coisas, como os homens passaram a se agrupar e viver mais próximo. Diante disso, surge então a necessidade de o homem ser dono de um pedaço de terra onde ele possa plantar e conseguir sobreviver sem entrar em confronto com quem está por perto.
No começo se tornava dono da terra aquele que se apoderasse de um pedaço de terra e o defendesse contra os outros, além de usá-la para tirar seu sustento, também era necessário que as outras pessoas reconhecessem aquela pessoa que estava ali naquele pedaço de terra como dona da mesma, e dessa forma não invadissem o que era do outro, e a propriedade então passou a servir para dar status às pessoas quem tinha mais terra mais tinha valor perante a sociedade. (BRAGA, 2009)
Isto ocorre lá no princípio quando o homem começa a se organizar em sociedade e mais tarde com o advento do fortalecimento do sistema capitalista que trouxe consigo um novo significado para a propriedade esta agora passa a não ser mais o único responsável por dar status social dessa forma esta acaba cedendo espaço e não reina mais sozinha, mais ainda continua sendo protegida pelo Estado.
A propriedade é tutelada e resguardada por leis desde o império romano, lá os proprietários já tinham seus direitos reconhecidos e por consequência os mesmos eram protegidos, com o passar do tempo isso foi se aperfeiçoando e o direito a propriedade passou a ter mais reconhecimento, nesse sentido discorre Alexandre de Morais:
Foi o Direito romano que estabeleceu um complexo mecanismo de interditos visando tutelar os direitos individuais em relação aos arbítrios estatais. A Lei das doze tábuas pode ser considerada a origem dos textos escritos consagrados da liberdade, da propriedade e da proteção aos direitos do cidadão. (MORAES, 2001, p. 7)
Houve também o fortalecimento do direito a propriedade com a Revolução Francesa, embora o direito a propriedade nesse período não tenha passado por nenhuma grande transformação, a propriedade passa a não ser mais exclusividade do clero e da nobreza passando agora para as mãos da burguesia e a mesma ainda passa a ser protegida contra todos como podemos ver na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão e a Revolução Francesa que dispõe:
Art. 17.º Como a propriedade é um direito inviolável e sagrado, ninguém dela pode ser privado, a não ser quando a necessidade pública legalmente comprovada o exigir evidentemente e sob condição de justa e prévia indenização.
No Brasil o direito a propriedade passa a ser visto quando os portugueses chegaram por aqui e encontraram somente os índios logo a coroa portuguesa se apodera das terras por meio da força e passa a ser dona de tudo, para facilitar o aproveitamento dessas terras também protegê-las a corroa resolve fazer doações da mesma e divide o Brasil em capitânias hereditárias, estas eram doadas através das cartas de doação que instituíam as capitânias hereditárias, e para manter um determinado controle sobre as terras distribuídas eram instituídos os forais que traziam os tributos que os recebedores daquelas terras iam ter que pagar a coroa portuguesa pela sua cessão.( ANDRÉ, 20[?])
Os proprietários dessas capitânias tinham poder sobre aquelas terras que a eles foram cedidas podendo atuar da maneira que quisessem, tendo poder inclusive militar devendo obediência apenas ao rei.
Desta forma se ver de onde surgiu a forma de manutenção da propriedade no Brasil. Com o passar do tempo as capitânias hereditárias foram extintas mais a forma de manutenção da propriedade baseada no acumulo de terra na mão de grandes proprietários persiste até os dias atuais.
O direito a propriedade então ganho uma dicotomia muito importante para a toda a sociedade ocidental sendo protegida de muitas maneiras e no Brasil não poderia ser diferente, todas as nossas constituições seguindo a tendência trouxeram em seu texto a previsão do direito a propriedade, desta maneira sempre se valorizou a figura do proprietário não se dando a menor importância para qualquer outra coisa e não se permitia a limitação do poder do proprietário sobre a coisa que o mesmo detinha. ( ANDRÉ, 20[?])
Em 1916 quando foi instituído o Código Civil o proprietário poderia usar, gozar e dispor de sua propriedade sem se preocupar com qualquer penalidade, ou seja se oficializou o direito subjetivo do proprietário sobre a coisa que o pertencia, aproximando-se dessa forma do Código de Napoleão de 1804 e indo contra tendência mundial que fora instituída pela constituição do México que vinculava a propriedade com o bem estar social e coletivo. ( BRAGA, 2009).
Conforme apresentado, corrobora o pensamento Mendes, Coelho e Branco (2009):
O conceito de propriedade sofreu profunda alteração no século passado. A propriedade privada tradicional perdeu muito do seu significado como elemento fundamental destinado a assegurar a subsistência individual e o poder de autodeterminação como fator básico da ordem social. (p. 467)
Dessa forma, verifica-se que tal direito é essencial a humanidade, sendo portanto, viável a sua classificação como sendo um direito fundamental, previsto no rol dos direitos fundamentais apresentado no artigo quinto da constituição federal.
2 Limites impostos ao direito de propriedade: uma análise do princípio da função social da propriedade.
Sabe-se que a propriedade é protegida constitucionalmente, enquanto direito fundamental. No entanto, tal direito não é absoluto, sofrendo restrições, sobretudo impostas pela Carta Magna de 1988, quando consagrou em seu texto a necessidade de a propriedade cumprir uma função social. A função social da propriedade se tornou um princípio de grandes debates e críticas, de sobremaneira porque limitou consideravelmente o direito de propriedade.
Como já vimos o direito a propriedade é uma unanimidade para as sociedades ocidentais sendo que esta ganhou muita proteção quando a vida passou a ser baseada em leis o surgimento das legislações escritas fizeram esse direito passar a ser uma figura frequente nas constituições dos países capitalistas.
Com o passar do tempo e a evolução social percebe-se que o direito a propriedade não pode ser exercido de maneira arbitrária e este tem que atender algumas regras para que não passe a se tornar apenas um instrumento de acumulo de bens, e esse acumulo acabar gerando desigualdade, principalmente no capitalismo onde se valoriza o ter. Com vista nisso no sistema capitalista não adianta ter terra e não faze-la produzir isso então se torna prejudicial para a manutenção do sistema. (FILHO, 20[?])
Observando isso é que surge a chamada função social da propriedade que é na verdade a observação que vai se fazer para saber se o proprietário está dando a destinação correta a sua propriedade não a deixando improdutiva, uma vez que a função social da propriedade parte do pressuposto que agora a propriedade não serve apenas ao proprietário mais sim para a toda a sociedade. ( BRAGA, 2009)
Este princípio aqui em nosso país passa a ganhar importância e ser mais estudado e aplicado a partir da Constituição de 1988, onde á uma vinculação direta entre o direito do proprietário e o atendimento da função social da propriedade:
Art 5º incisos, XXII - é garantido o direito de propriedade;
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
Desta forma o a propriedade deixa de ter um caráter absoluto e passa a ter um caráter relativo seguido uma tendência que vinha acontecendo mundo afora. (LENZA, 2012)
Extrai-se dai então que a função social da propriedade trata-se na verdade de uma limitação do direito a propriedade funcionando como um pré-requisito que tem que ser atendido pelo proprietário para que o mesmo não possa sofrer qualquer tipo de sanção.
Mas embora também o direito a propriedade se encontre limitado pela função social da terra percebe-se que há um proprietário que pode não usar a terra de maneira adequada a sua propriedade que não terá a mesma ofendida, contestada ou tomada que é o poder público, tal fato é observado quando a constituição traz previsto que o bens públicos não serão passíveis de usucapião.
É nesse ponto em que se faz presente uma contradição em nossa Constituição onde por um lado ela prever que as propriedades tem que atender uma função social e por outro lado deixa impossibilitando a usucapião de bem público em qualquer hipótese.
Nesse ponto a jurisprudência ainda é quase unanime em deixar prevalecer o entendimento de que não é possível se usucapir bem público emborra o mesmo não esteja cumprido a sua função social e isso é explicável pelos mesmos por que seria impossível para a entidades públicas fiscalizarem o que se passa em toda as suas propriedades uma vez que são muitas as propriedades ficando dessa maneira impossível controlar tudo.
3 Apontamentos sobre a ação de usucapião.
A Usucapião é um modo de aquisição originária da propriedade, tanto de bens móveis quanto de bens imóveis (art. 1260 do CC/02), mas não só isso essa ação pode alcançar também “ (...) outros direitos reais, como a servidão art. 1.379 do CC e o usufruto (art. 1.391, CC).” (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 322).
O instituto da usucapião já existia antes a Constituição de 1988, com essa última é identificável que o instituto adquiriu um caráter mais significativo, pois acoplou o conceito de função social da propriedade para se legitimar e, em muitos casos, configurar-se enquanto forma originária de aquisição da propriedade.
Ressalta-se que a usucapião tem um caráter punitivo, haja vista que retira do proprietário o seu direito de titular da propriedade que antes lhe pertencia e transfere à outrem que detinha a posse daquele bem. Entende-se assim, que
o fundamento deste modelo jurídico é dúplice: representa um prêmio àquele que por um período significativo imprimiu ao bem uma aparente destinação de proprietário: mas também importa em sanção ao proprietário desidioso e inerte que não tutelou o seu direito em face da posse exercida por outrem. (FARIAS; ROSENVALD 2011, p. 322)
Vale citar as palavras de Farias e Rosenvald (2011, p. 321), para quem a usucapião é um “modo originário de aquisição de propriedade e de outros direitos reais, pela posse prolongada da coisa, acrescida de demais requisitos legais”. Esse entendimento reflete a redação do Código Civil de 2002, em que se “reafirma a usucapião como modo de aquisição de propriedade imobiliária”. (FARIAS; ROSENVALD 2011, p. 321).
Nesse ponto, corrobora o entendimento de Salles (2009) que apresenta dois elementos como sendo essencial a caracterização da usucapião, o tempo e a posse. Dessa forma, o autor conceitua usucapião como sendo “[...] a aquisição do domínio ou de um direito real sobre coisa alheia, mediante posse mansa e pacifica, durante o tempo estabelecido em lei.” (p. 48).
Salles (2009) apresenta que a propriedade gera um ônus ao proprietário, que é sua função social, ou seja, que a propriedade atenda a necessidade de um contexto social. Dessa maneira, o autor constitui a função social como sendo fundamento para a constituição da usucapião.
Todo bem, móvel ou imóvel, deve ter uma função social. Vale dizer, deve ser usado pelo proprietário, direta ou indiretamente, de modo a gerar utilidades. Se o dono abandona esse bem, e se descuida, no tocante à sua utilização deixando-o sem uma destinação e se comportando desinteressadamente como se não fosse o proprietário, pode, com tal procedimento, proporcionar a outrem a oportunidade de se apossar da aludida coisa (SALLES, 2009, p. 49).
Portanto, a ação de usucapião é constituída sobre o fundamento do princípio da função social, como visto ela é apresentada sob a natureza punitiva, ou seja, visa um dever ser para a propriedade.
Assim, o proprietário que não atribuiu à sua propriedade uma finalidade social, mesmo que não quisesse abandonar o seu bem, poderá perder a sua propriedade em favor de outro que uma vez estando na posse do bem, mansa e pacificamente, durante o tempo previsto em lei, com o animus de dono passa a ser titular do direito de propriedade (SALLES, 2010, p. 49).
Diante disso, Salles (2009) discorre que ação de usucapião visa à coletividade, com a finalidade da pacificação dos conflitos, sob esse prisma entende que a usucapião visa também um bem coletivo. Assim, o fundamento estatal da não usucapião sob a égide do interesse coletivo sucumbir a partir do ponto apresentado anteriormente, ou seja, se um ente estatal for desidioso quanto a sua propriedade não empreendendo nenhuma destinação social é possível cogitar entendimento da possibilidade de usucapião.
4 A (in) aplicabilidade da usucapião em bens dominicais diante da inobservância do princípio da função social da propriedade.
Sobre o caminho pavimentado até então o questionamento principal desse estudo é aplicação ou não de usucapião a bem público dominical. Dessa forma, é essencial o desmembramento do conceito de bem público, em especial o dominical.
Carvalho Filho (2012) apresenta a priori sobre a definição em tela, a seguinte questão em relação ao domínio público, para ela a sistematização proposta pelo legislador é incerta, uma vez que é entendido sob a ambivalência: estatal e a coletividade. Dessa maneira, é possível a existência de bens que sejam exclusivamente dotados de interesses estatal em detrimento a coletividade e, por conseguinte a função social da propriedade.
Dessa maneira, Carvalho Filho (2009) discorre sobre os bens dominicais, “destacando a existência desses bens como mera função patrimonial, sendo exemplo deles: [...] as terras sem destinação pública específica (entre elas, as terras devolutas, [...] ), os prédios públicos desativados, os bens moveis inservíveis e a dívida ativa.” (p. 1130).
O autor supracitado divide esses bens quanto a sua disponibilidade, disponíveis e indisponíveis. Este último possui alguma relevância social, apesar das características patrimoniais. Quanto os bens disponíveis Carvalho Filho (2009) entende como sendo meramente patrimoniais: “Os bens patrimoniais disponíveis são os bens dominicais em geral, porque nem se destinam ao publico em geral, nem são utilizados para o desempenho normal das atividades administrativas.”( p. 1133).
Sobre a classificação supracitada alguns autores entendem outra nomeação como Farias e Rosenvald (2011): seriam os bens indisponíveis chamados de bens dominicais materiais e os bens disponíveis dominicais materiais.
Os bens públicos poderiam ser divididos em materialmente e formalmente públicos. Estes seriam aqueles registrados em nome da pessoa jurídica de Direito Público, porém excluídos de qualquer forma de ocupação, seja para moradia ou exercício de atividade produtiva. (FARIAS; ROSENVALD 2011, p. 328).
Sob esse prisma, Carvalho Filho (2012) cita que “Há entendimentos no sentido que bens dominicais seriam usucapíveis e que o art. 188 da CF, por ter-se referido conjuntamente a terras publicas e terras devolutas, teria criado outra categoria de bens públicos, admitindo o usucapião dessas ultimas. (p. 1138).
Entendimento esse defendido por Farias e Rosenvald (2011): “[...] a Constituição Federal não atendeu a esta peculiaridade, olvidando-se de ponderar o direito fundamental difuso à função social com o necessário dimensionamento do bem público, de acordo com a sua conformação no caso concreto.” (p. 329). Portanto, acrescenta os autores que em se tratando de bens públicos dominicais formalmente é possível a usucapião com vista que um bem público deve atender um interesse social.
Entretanto, nada obstante a consagração da usucapião em imóveis particulares que não desempenham uma finalidade social pairam alguns questionamentos sobre o caso de imóveis públicos que não desempenham uma função social.
Sobre isso, salienta-se que expressamente a Carta Constitucional de 1988 vedou a possibilidade de usucapião em bens públicos (CF, arts. 183, § 3º, e de 191, paragrafo único), tal vedação também se encontra no Código Civil de 2002, no entanto nem sempre foi assim.
Isto porque: “ Anteriormente ao código civil de 1916, admitia-se a usucapião de bens do domínio público (bens dominiais), desde que a posse do usucapiente se prolongasse por quarenta por quarenta anos.” (SALLES, 2010, p. 80).
Contudo, apesar das vedações previstas pelos legislador é possível encontrar uma possibilidade de usucapião de bem público em um julgado do STJ realizado esse ano trata-se do REsp 1.090.847-SP, que versa sobre a usucapião de terreno de marinha não demarcado, e com a condição que se a marcação for realizada posteriormente a propriedade passa para a união.
[...] Assim, é possível o reconhecimento da usucapião, desde que resguardados expressamente os interesses da União, admitindo que, caso se apure, no procedimento próprio, que a área usucapienda se caracteriza como bem público, não haverá prejuízo ao ente público. Com efeito, a eficácia preclusiva da coisa julgada alcança apenas as questões passíveis de alegação e efetivamente decididas pelo juízo constantes do mérito da causa, não podendo, no caso, ser considerada deduzível a matéria, pois inexistente estudo conclusivo sobre o assunto. (BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp 1.090.847-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2013, grifou-se)
Portanto, como verificado antes se admitia a usucapião em imóvel público dominical, o que atualmente resta impossibilitado haja vista a vedação expressa pela Carta Constitucional, entretanto já é possível cita usucapião de bem público com vista ao julgado supracitado que entende essa possibilidade.
5 Considerações Finais
Ao longo do estudo foi verificado que o direito a propriedade trata-se de um direito fundamental, previsto desde que a humanidade necessitou da demarcação de territórios para a plantação ou moradia. Sendo assim é importante destacar que a própria Constituição Federal de 1988 traz uma vinculação social da propriedade.
Por isso, a criação do princípio da função social da propriedade, sendo este, portanto, o fundamento do instrumento da usucapião, que conforme citado na pesquisa objetiva puni o proprietário, aquele o qual não propicia a propriedade uma devida destinação social.
Nesse ínterim são apresentados os bens públicos que são essenciais para desempenho da função públicas, são constituídos sobre a égide do interesse social. Entretanto, foi verificada a existência de bens públicos que não cumprem com o previsto constitucionalmente, ou seja, um fim social.
Esses bens desempenham função precipuamente patrimonial, diante disso é importante caracteriza como inviável a expressa determinação de não usucapião dos bens públicos.
Sobre esse prisma cria-se uma ponderação de direitos: será que uma função patrimonial do bem vale mais do que moradia para população?
Entende-se que a função social deve prevalecer sobre a imprescritibilidade do bem público, visto que a função social é o fim do estado, é meio precípuo para a harmonia da população e a paz social é essencial, portanto, rever a fraude constituição da não usucapião do bem público.
O argumento do legislador além de não apresenta coerência a função social é também um mandamento de inércia para o Estado diante dos seus bens. Dessa maneira, o Estado fica com propriedade destinada apenas a compor como bens para a pessoa jurídica, esquecendo-se de propiciar à destinação social a propriedade, visto que não é responsabilizado por sua desídia.
Diante disso, é importante lembrar que é legítima a doação de um bem público e conforme cita Carvalho Filho (2012) o estado pode usucapir um bem particular. Então considerando o princípio da função social, a isonomia entre partes e sob o colocando o estado democrático é preciso revê a possibilidade de usucapião de bem público, fato esse primordial ao interesse social.
REFERÊNCIAS
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BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp 1.090.847-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2013
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25 ed. São Paulo: Atlas, 2012.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 7 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
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LENZA Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires & BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 4 ed. São Paulo, Saraiva, 2009.
SALLES, José Carlos de Moraes. Usucapião de bens imóveis e móveis. 7 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
[2] Acadêmico de Direito e-mail: [email protected].
[3] Acadêmico de Direito e-mail: [email protected].