Muriely Salviano de Faria

 

 

Direito das Obrigações

Obrigações de Meio e Resultado

 

 

Para compreender as obrigações de meio e resultado, é necessário, primeiramente, conhecer o conceito e o âmbito do direito das obrigações. Segundo o doutrinador Gonçalves (2011), o direito das obrigações refere-se às relações jurídicas que envolvam direitos de crédito, também conhecidos como direitos obrigacionais ou pessoais.

O termo “obrigação”, por sua vez, comporta inúmeros significados e formas de interpretação, mas, de acordo com a mais ampla concepção é qualquer tipo de vínculo que leve a submissão a uma regra, podendo essa se encontrar em questões religiosas, morais, sociais etc.

Porém, o direito das obrigações não utiliza a ampla acepção, limitando-se ao conceito em seu sentido estrito, que, segundo Gonçalves (2011, p. 17), são “apenas aqueles vínculos de conteúdo patrimonial, que se estabelecem de pessoa a pessoa, colocando-as, uma em face da outra, como credora e devedora”. Sendo assim, a primeira, possuindo direito de crédito, pode exigir o cumprimento da prestação, enquanto a última deve cumpri-la.

Uma vez esclarecido, é necessário lembrar que o direito se divide em dois grandes grupos: direitos não patrimonais (como os personalíssimos, que se referem aos direitos imprescritíveis, inalienáveis e imateriais, como à vida, à liberdade, à filiação, ao nome etc.) e direitos patrimonais, que, por sua vez, se subdivide em reais e obrigacionais (também chamados de pessoais).

Os direitos reais são aqueles que se referem a relação entre o homem e a propriedade (ou a coisa), sendo eternos, como um direito de usufruto, e a ação pode ser movida contra quem deter a coisa. Enquanto os direitos obrigacionais, por sua vez, trata da relação entre os homens, tendo como base a vontade humana em realizar o ato jurídico, e não a lei, como é característica dos direitos reais, sendo também transitórios, como um contrato de comodato.

Os obrigacionais, então, sendo também chamados de relativos, sendo, conforme explica Diniz (2007) não são oponíveis a erga omnes, como o absoluto (real), uma vez que a prestação não poderá ser exigida de qualquer pessoa que a detenha, mas apenas do devedor. Além disso, a mesma autora acrescenta que os relativos são direitos que podem se referir a uma prestação positiva (obrigação de dar ou fazer, por exemplo), ou negativa (como a obrigação de não fazer).

Logo, uma obrigação, pode, quanto ao sujeito, se classificar em: de dar (sujeito passivo se compromete a entrega e restituição da coisa ao sujeito ativo); de fazer (passivo deve realizar serviço em benefício do ativo) e de não fazer (devedor se compromete em abster de fazer algo que, se não fosse por essa obrigação, poderia realizá-lo livremente). Quanto à multiplicidade de objetos, dividi-se em: cumulativa (devem ser realizadas/entregues todas as prestações para que a obrigação se dê como cumprida); alternativa (o devedor pode escolher – quando o contrato não estipular o contrário – realizar/entregar apenas uma prestação); facultativa (o objeto é único, porém o devedor tem a faculdade de não entregar o objeto principal, podendo entregar outro em vez dele). Quanto à exigibilidade, são classificadas em civis (podem ser exigidas) e naturais, como as gorjetas, as dívidas de jogo e as dívidas já prescritas. Porém, deve se frisar que, em uma obrigação natural, não se deve exigir pagamento, mas, quando ele acontece, é válido, podendo o credor retê-lo.

Quanto à multiplicidade de sujeito, há obrigações divisíveis e indivisíveis, que, como o próprio nome já adianta, podem ser divididas ou não. Nessa categoria também há obrigações solidárias, que, apesar de haver mais de um credor ou devedor, um único credor pode receber a prestação em sua totalidade e um único devedor também é responsável por prestá-la por completo, conforme explica Gonçalves (2011).

Já, quanto à finalidade (ou fim), pode-se configurar uma obrigação de meio, de resultado ou de garantia. A primeira é quando o devedor, sem se responsabilizar pelo resultado, se compromete alcançá-lo utilizando seus meios e suas técnicas.

[...] É o caso, por exemplo, dos advogados, que não se obrigam a vencer a causa, mas a bem defender os interesses dos clientes; bem como dos médicos, que não se obrigam a curar, mas a tratar bem os enfermos, fazendo uso de seus conhecimentos científicos. (GONÇALVES, 2011, p. 190-191)

A de resultado, por sua vez, é aquela em que o devedor só se livra dela quando o fim prometido é alcançado. De forma que, caso isso não aconteça, irá responder pelos prejuízos decorrentes. Para ilustrar essa obrigação há o transportador, que se compromete, a partir do momento em que o credor (passageiro) compra o bilhete, em levá-lo são e salvo até seu local de destino. Vale acrescentar também, nessa obrigação, o empreiteiro e cirurgião plástico quando o trabalho deriva de uma natureza estética ou cosmetológica.

Logo, a principal diferença entre as duas modalidades se encontra nos jurídicos do não cumprimento. Quando se configurar uma obrigação de meio, o devedor só arcará com os prejuízos decorrentes se comprovada a sua negligência ou imperícia ao realizar o trabalho, enquanto o devedor de uma de resultado só não deverá arcar com os danos ocorridos quanto provado que não houve culpa por parte dele e o resultado deveu-se às circunstâncias alheias a ele, seja por força maior ou por culpa exclusiva da vítima (credor).

Sobre o transporte de pessoas ou coisas, há jurisprudências e normas que tem ressaltado as hipóteses de quebra do nexo de causalidade, não constituindo, assim, culpa do devedor, no caso, o motorista, conforme pode se observar no excerto abaixo:

A jurisprudência, inclusive a do Superior Tribunal de Justiça, tem considerado causa estranha ao transporte, equiparável ao fortuito, disparos efetuados por terceiros contra trens, ou pedras que são atiradas nas janelas ferindo passageiros ou, ainda, disparos efetuados no interior de ônibus, inclusive durante assaltos aos viajantes. (GONÇALVES, 2011, p. 192)

Entretanto, é incorreto afirmar que, no caso de dano causado por terceiro, deve-se o transportador exonerar-se da obrigação imediatamente. Pelo contrário, ele deve, primeiro, indenizar as vítimas, segundo artigo do Código Civil e Súmulas do STF (Supremo Tribunal Federal), como pode ser analisado no trecho a seguir:

Prescreve o art. 735 do Código Civil que a “responsabilidade contratual do transportador por acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva”. Esse dispositivo tem a mesma redação da Súmula 187 do Supremo Tribunal Federal. Ocorrendo um acidente de transporte, não pode, o transportador, assim, pretender eximir-se da obrigação de resultado tacitamente assumida, atribuindo culpa ao terceiro (ao motorista do caminhão que colidiu com o ônibus, p. ex.). Deve, primeiramente, indenizar o passageiro para depois discutir a culpa pelo acidente, na ação regressiva movida contra o terceiro. (GONÇALVES, 2011, p. 192)

Importa ressaltar, além disso, que, apesar de cirurgiões plásticos, ao realizarem cirurgia de natureza puramente estética e não alcançarem o resultado prometido, estejam obrigados a prestação indenizatória a vítima, configurando uma obrigação de resultado, pode haver casos em que se haja uma obrigação de meio. Essa acontecerá quando as cirurgias ocorrerem para corrigir deformações ou queimaduras.

No entanto, há doutrinadores que compreendem que as plásticas e outras correções em nome da estética, na verdade, pertencem à categoria de meio, uma vez que é impossível assegurar que determinado resultado será atingindo, já que o organismo de cada pessoa é diferente e não há como prever sua reação ao ato cirúrgico.

Por fim, há a de garantia, que também está inclusa na categoria de obrigações quanto ao seu fim, que tem como objetivo eliminar do credor um risco e dar a ele maior segurança no momento em que se for realizar negócio jurídico com o devedor. Como exemplos, podem ser citados o segurador e o fiador. Neste caso, mesmo que, por motivo alheio ao devedor, a obrigação não possa ser cumprida, ele não está liberado da prestação.

Sobre esse mesmo assunto também há decisões reiteradas nos tribunais, conforme o trecho:

O Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu a responsabilidade de estabelecimento bancário por roubo de valores guardados em cofres-fortes, considerando não escrita cláusula excludente de responsabilidade, “por frustrar os objetivos da avença, pois o banco vende segurança. Caso contrário, ninguém se valeria de seus serviços”. (GONÇALVES, 2011, p. 194)

Uma vez conhecido alguns tipos de obrigações, é importante frisar que são inúmeras classificações que se estendem por longas páginas. Assim como é necessário se atentar para as numerosas jurisprudências que decidem sobre assuntos pertinentes ao que foi mencionado. O entendimento, tanto dos tribunais, quanto dos doutrinadores, divergem-se, e, vez em quando a culpa é declarada como do sujeito passivo, porém, há situações em que a presunção de culpa é arrematada pela comprovação de inocência do devedor.

Referências

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil. 22. ed. 2. vol. São Paulo: Saraiva, 2011.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 8. ed. 2. vol. São Paulo: Saraiva, 2011.

SALOMÃO, Lídia. Obrigações de meio e obrigações de resultado. Disponível em: < http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=109>. Acesso em: 17 de março de 2014, às 00h52.