1. INTRODUÇÃO

O sistema de proteção ao silêncio é objeto tanto do Direito Processual Penal quanto do Direito Constitucional, estando, inclusive, consagrado como garantia fundamental elencada no artigo 5º, LXIII da Carta Magna. Dessa forma, não resta dúvida acerca da sua importância para o ordenamento jurídico pátrio. 

Faz-se imprescindível salientar que esta garantia é, também, objeto de proteção de tratados internacionais como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e da Convenção Americana de Direitos Humanos, sendo este último superior àquele, uma vez que apresenta texto protetivo mais amplo. Este sistema consagra o direito à não autoincriminação (nemo tenetur se detegere), conhecido como a máxima de que “ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo”, guardando estrita relação com o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. 

Neste viés, cumpre destacar que o objetivo principal do sistema de proteção ao silêncio encontra-se voltado para a busca da verdade real no processo, intentando-se evitar a punição de inocentes que apresentam confissões irreais, vítimas, muitas vezes, de técnicas de indução, ou até mesmo de coação. 

  1. DESENVOLVIMENTO

 2.1 CONCEITO

O que é o direito ao silêncio? Ainda é um direito novo e que gera muitas discussões.Basicamente é o direito que o indivíduo tem de não produzir provas contra si mesmo, podendo até mesmo mentir ou negar um fato criminoso que lhe foi imputado (no Brasil não existe a figura do perjúrio).  Busca fundamento no princípio da dignidade humana, o qual leciona que ninguém pode ser submetido a tratamento degradante e ter sua intimidade violada. 

2.2 PREVISÃO LEGAL

O direito ao silêncio está previsto no Art. 5º da CF/88, ou seja, é um direito fundamental (o que também o torna cláusula pétrea, ou seja não pode ser modificado) e está localizado no inciso LXIII deste mesmo dispositivo legal, inferindo que a pessoa presa tem o direito de ficar calado e ter a assistência de sua família e advogado. Encontra previsão legal no art. 8 da Convenção Americana de Direitos Humanos e também no art. 186 do Código de Processo Penal, que afirma que o juiz não pode proferir sentença pelo mero silêncio por parte do acusado, até porque todo processo necessita-se de uma fundamentação. O direito ao silêncio é uma verdadeira conquista histórica que proveio da evolução do direito e da sociedade, é uma forma poderosa de defesa do indivíduo perante o Estado. 

Tal instituto é de extrema importância, já que é uma oportunidade que o cidadão tem de não se auto incriminar, sendo-lhe facultado reservar-se momentaneamente de sua defesa, a fim de que esta seja mais bem formulada por seu advogado, uma vez que até mesmo a verdade deve ser bem avaliada antes de ser dita. A fim de que o acusado não se sinta acuado e venha a mentir, ele necessita de um advogado para que seja instruído de seus direitos. Em conformidade com o princípio da presunção de inocência, o direito ao silêncio vem para oferecer ao investigado certa assistência,visto que até mesmo agentes do Estado podem “tornar” uma pessoa inocente em culpada, devido ao alto espírito de vingança por parte da população, e isso inclui os agentes do Estado que o podem fazer até mesmo por interesses. 

2.3 UM POUCO DA HISTÓRIA 

É possível observar tal situação no seriado Game of Thrones, em que a Alto Septão utiliza da tortura infinita, para que indivíduos da nobreza confessem seus crimes e pecados, e pela lógica, com essa atuação, os seguidores dos Sete conseguem ter poder para incriminar qualquer pessoa, já que nenhum ser humano aguenta ser torturado (autotortura), e sua única saída é se declarar culpado (antigamente era a prova de maior valor, hoje a confissão deve ser analisada pois é prova sui generis) para acabar com seu sofrimento, ferindo assim o princípio da dignidade humana. Com a série temos uma visibilidade maior, mas de fato essa autoincriminação acontecia de verdade há séculos atrás, a igreja católica utilizava da tortura e inquisição (tribunal eclesiástico que perseguia e condenava todos aqueles que iam contra os interesses da igreja católica), ocorreu também em Estados absolutistas, e até hoje em certas investigações criminais. Existe aquele estereótipo do bom e mal policial onde acontece a tentativa de intimidação contra o acusado, para que aja uma confusão mental, e logo o acusado fale coisas que não deviam ou crie incertezas em sua história. Se o direito ao silêncio se fizesse presente, a justiça seria mais justa para todos. 

2.4 PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

Deve-selembrar de que não existe pena se não houver culpabilidade. Em razão do princípio da presunção de inocência (consagrada no art. 11 da Declaração de Direitos Humanos da ONU de 1948), a palavra réu ou ré não pode ser sinônima de criminoso e culpado. 

A pessoa só se torna condenada depois de assegurado o contraditório, a ampla defesa e depois de proferida a decisão condenatória com seu respectivo trânsito em julgado, emanada da autoridade competente. O direito ao silêncio é um modo de defesa do indivíduo contra o Estado, em que a pessoa não é obrigada a responder questionários para policiais ou órgãos jurídicos. Antigamente, o réu tinha que provar a sua inocência, mas dependendo do caso concreto, isso poderia se fazer impossível, já que certas provas poderiam nem existir, e pela lógica, como qualquer um poderia acusar qualquer um, venceria aquele com mais poder de convencimento sobre a sociedade, ou mesmo quem primeiro apresentasse a acusação. 

2.5 UM EXEMPLO NO BRASIL 

Um exemplo do direito ao silêncio, que não necessariamente significa ficar em silêncio, é quando,numa blitz, é exigidoque se sopre o bafômetro. Essa é claramente uma forma do Estado fazer com que a pessoa produza provas contra si mesmo, e seja incriminada. Assim sendo, o cidadão tem o direito de se recusar a fazer o teste e, em contrapartida, o Estado não pode punir o indivíduo por essa recusa, mesmo com a multa prevista no Art. 277 do CTB, por exemplo.Se o fizer, esta multa estará sendo inconstitucional, e já existem decisões judiciais nessa questão, que podem ser utilizadas para a defesa.Insta lembrar, também, que a mera recusa não pode caracterizar prova juris et de jure quanto à embriaguez do indivíduo. 

Desta forma, deve-se fazer com que os agentes administrativos estejam de acordo com as decisões judiciais, para que se faça valer o bom senso, e também o bom uso dos princípios administrativos como o da moralidade, eficiência e economia.

 

Porém, como nem tudo são flores, uma nova lei de nº 13.281 foi aprovada, e está no período chamado de vacatio legis, entrando em vigor em setembro de 2016,e no seu art. 165-A, traz uma pena gravosa para a recusa ao teste do bafômetro.E como dito anteriormente, está claro a inconstitucionalidade dessa lei. Porém a primavera sempre chega, e temos ao judiciário para recorrer dessa lei que fere os nosso direito fundamental ao silêncio. 

2.6 ATÉ QUE PONTO O DIREITO AO SILÊNCIO CHEGA 

O direito ao silêncio vem crescendo e ganhando certa amplitude, e também vem sendo criticado, já que em alguns momentos, a busca pela verdade vem sendo prejudicada.Não obstante, um exemplo novo e contrário a essa amplitude é a colheita de material genético para provar paternidade, em que o acusado recusa fazer o exame, afim de que não se saiba se ele é pai ou não.Nesse sentido, o STF pronunciou na súmula de número 301 que se houver recusa, haverá a presunção relativa de paternidade. Outro fato a se destacar é quanto à prova de datiloscopia, em que o acusado pode recusar, porém é obrigado a fazer nas hipóteses do art. 3 da lei 10.054/2000. 

2.7 DIREITO DO INDIVÍDUO 

Algo interessante a se destacar é que o direito ao silêncio é personalíssimo, ou seja, cabe apenas ao próprio indivíduo, não podendo ser estendido a terceiros.A título de exemplo, tem-se o caso de uma pessoa que está na posição de testemunha; esta não pode silenciar a verdade ou nega-la, conforme previsão expressado art. 342 do Código Penal que diz que fazer afirmação falsa, ou negar, ou calar a verdade como testemunha gera uma pena de reclusão de 1 a 3 anos e multa. O direito ao silêncio é inerente somente ao próprio indivíduo, logo, você não é obrigado a se incriminar, mas outra pessoa com conhecimento dos fatos é obrigada a apresentar esses fatos. Vale salientar que essas apresentações de fatos não podem causar prejuízo à pessoa que a apresentou, visto que restaria caracterizada a ofensa ao direito de silêncio, garantia de proteção inerente à pessoa. Um fato curioso está relacionado à não obrigatoriedade de se testemunhar contra conjugue e parentes de linha reta, assim como pessoas que, em razão do ofício, devam guardar segredo.Isso se deve pelo motivo de que o prejuízo possa se arrastar a quem testemunhou. 

2.8 NADA É ABSOLUTO 

Mesmo o direito ao silêncio sendo um direito previsto, ele não é absoluto. Às vezes o depoimento do réu é muito necessário para a apuração dos fatos (como uma reconstituição do crime art. 7º, CPP). No entanto, no exercício da má fé, ele pode negá-lo,podendo essa negativa entrar em conflito com interesses da sociedade e do processo penal e caso o réu tente prejudicar as fases do processo ele irá responder de acordo com os art. 186 e 927 do CC.

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