Ancel Keys, pesquisador da Universidade de Minnesota, reparou no início dos anos 40 que as doenças cardiovasculares estavam relacionadas ao modo de vida e à forma como as pessoas nos Estados Unidos se alimentavam. Naquela época, o número de mortes por ataque cardíaco em homens de meia-idade já se revelava alto em comparação com outros países onde as pessoas tinham uma dieta mais simples. A fim de analisar essa relação, Keys conduziu um estudo internacional e de longo prazo em vários países do mundo. Chamado de Seven Countries Study (Estudo dos Sete Países), o trabalho foi conduzido a partir dos anos 50 nos Estados Unidos, Finlândia, Holanda, Itália, Iugoslávia, Grécia e Japão. Após muita análise e críticas sobre o espaço amostral utilizado (sete países era considerado pouco para a consideração dos resultados) Keys descobriu uma surpreendente dieta que incluía alimentos capazes de manter uma vida saudável e mais duradoura, a chamada dieta do Mediterrâneo.

O mar mediterrâneo é cercado por três continentes cujas diferenças culturais são díspares, o sul da Europa, o Oriente Médio e o norte da África. No entanto, as condições climáticas e a geografia em comum permitiram o desenvolvimento de culturas semelhantes que influenciaram seu padrão alimentar desde a antiguidade. Por isso, identifica-se o mesmo tipo de alimentação desde a Espanha, França e Itália até o Marrocos e a Grécia. Uma dieta que inclui no cardápio frutas, verduras, cereais integrais, sementes oleaginosas (castanhas, nozes), plantas leguminosas (lentilha, grão-de-bico), peixes e laticínios. Tudo temperado com azeite extravirgem à vontade e uma taça diária de vinho tinto.

Keys percebeu que os habitantes dessa região apresentavam baixos índices de doenças crônicas e alta expectativa de vida. Tudo graças ao seu hábito alimentar tradicional e ao fato de evitarem o consumo de carnes vermelhas, gorduras saturadas, refrigerantes, doces e produtos industrializados, tudo aquilo que os americanos mais apreciam. A partir desta constatação, Keys anunciou ao mundo a dieta como um conjunto de hábitos alimentares essencial à saúde, uma dieta capaz de prevenir doenças e manter uma vida com mais qualidade e vitalidade.

Para entender como essa dieta funciona, evitando doenças cardíacas, acidentes vasculares e cânceres, devemos compreender o potencial nutritivo dos itens alimentícios consumidos.

Frutas e hortaliças possuem alto teor de fibras, que ajudam na motilidade intestinal e na excreção de colesterol e gorduras através das fezes. Além disso, contam com boas concentrações de substâncias antioxidantes capazes de retardar o envelhecimento das células e evitar o câncer, tais como as vitaminas C e E, o licopeno e o beta-caroteno. Os cereais, por sua vez, tais como o trigo e o arroz, são excelentes fontes de carboidratos e calorias. O fato de serem consumidos na forma integral inclui a ingestão de vitaminas do complexo B, como a tiamina (B1), e fibras. Isso garante energia, vitalidade e boa digestão.

Lentilhas, ervilhas e grão-de-bico são sementes de vegetais leguminosos e apresentam alto teor de proteína vegetal, além de fibras. Os povos mediterrâneos costumam ingeri-los diariamente, bem como nozes e castanhas. Carnes vermelhas, que são as principais fontes protéicas nas dietas ocidentais, são consumidas com extrema parcimônia na dieta mediterrânea, algo em torno de duas a três vezes por mês. A substituição da carne vermelha pelas leguminosas como fonte de proteínas é uma das principais vantagens da dieta, pois evita os conhecidos malefícios da ingestão frequente de carne bovina e suína.

As atividades pesqueiras da costa mediterrânea garantem o fornecimento de pescado de qualidade, o que justifica um amplo consumo de peixes e frutos-do-mar. Esses alimentos, combinados com nozes e castanhas, oferecem proteínas e lipídios essenciais. Os peixes e as oleaginosas possuem gorduras poliinsaturadas como o ômega-3 que reconhecidamente ajudam a prevenir a hipercolesterolemia, ou seja, o aumento do colesterol no sangue. Com os níveis de colesterol sanguíneo sob controle, o indivíduo fica menos propenso a ser vitimado por doenças cardiovasculares. Além disso, os ômegas dos peixes garantem a saúde das células nervosas, auxiliando a memória.

Além dos peixes, a região também possui condições adequadas para a produção de azeite extravirgem, um dos principais símbolos da dieta do Mediterrâneo. Desde a antiguidade, esses povos mantêm a tradição de temperar alimentos e saladas com azeite e esse hábito, da mesma forma que a ingestão de pescado, controla o colesterol, evitando problemas cardíacos. Sabe-se que o azeite aumenta os níveis de HDL (High Density Lipoprotein), o chamado “colesterol bom”, mantendo a corrente sanguínea livre das placas de ateroma responsáveis pelos infartos e acidentes vasculares. Outra vantagem do azeite está na sua concentração de polifenóis, substâncias antioxidantes que, como já vimos, retardam o envelhecimento e previnem o desenvolvimento do câncer.

A ingestão de vinho tinto ou suco de uva, muito comum durante ou após as refeições, coroa a dieta do Mediterrâneo como a mais saudável do mundo. As uvas também possuem polifenóis antioxidantes, como os flavonóides e o resveratrol, que atuam da mesma forma que o azeite. Portanto, mantêm uma aparência jovial e um sangue livre de colesterol ruim.

Diante de tantos benefícios, a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco) declarou em novembro de 2010 a dieta do Mediterrâneo como Patrimônio Imaterial da Humanidade. Foi a primeira vez que uma tradição alimentar passou a figurar numa lista de patrimônios da humanidade, reforçando mais ainda o seu valor tanto na manutenção da qualidade de vida e saúde como na manifestação cultural de uma região. O reconhecimento dessa dieta nos mostra que é possível viver mais e melhor apenas com uma alimentação balanceada e adequada. Pense bem nisso quando for fazer sua próxima refeição. Salute e buon appetito!!

Fabrício Proença

Biólogo, Professor e Redator-Chefe da Revista Vita Naturalis



Leia mais: http://www.revistavitanaturalis.com/artigos/saude-e-bem-estar/dieta-do-mediterr%c3%a2neo/