Desobediência civil e justiça

            Thoureau, um intelectual franco-americano oitocentista bastante desajustado que morreu de tuberculose aos 35 anos, recusou-se a pagar seus impostos, alegando que estaria sendo cúmplice de um estado que promovia a escravidão e estava em guerra contra o México. A alegação não foi acolhida e ele acabou na cadeia onde passou uma noite inesquecível, até que foi liberado após uma tia pagar a fiança e o imposto. O autor então escreveu um manifesto sobre a desobediência civil. Ele prega que ao invés de uma resistência armada ou de uma submissão, o cidadão deveria simplesmente descumprir o que o estado mandava, fosse lutar na guerra, financiá-la ou qualquer outra coisa imoral.

            Alega que nenhum homem ou governo pode ter o controle sobre as finanças, a vida ou o pensamento das pessoas e reconhece que nos EUA da época se tinha mais liberdade do que em qualquer outra nação do mundo. Ele prega uma época em que os homens seriam totalmente livres do controle do autoritarismo de um estado.

            Este artigo se tornou um ícone do anarquismo individualista e influenciou pensadores como Mahatma Gandhi e Martin Luther King.

            Seu pensamento faz pensar que não se devem seguir as decisões de seu estado nem se acomodar ao pensamento de um rebanho irracional que age de forma irrefletida guiada por um líder carismático como Hitler, Vargas, Perón ou Putin. A maioria dos que estão dentro de uma sociedade injusta não percebem as contradições ou se acomodam.

            No âmbito da justiça, se deve pensar sobre as contradições legais. As leis refletem os interesses das classes dominantes ou influentes de uma sociedade na época. Assim, a escravidão foi legal em países como Brasil e os EUA, hoje lá existe um presidente negro, e em todo o mundo é proibido tanto a escravidão como a discriminação de um grupo étnico. A prostituição é legal em alguns países e proibida em outros, o que sempre foi e será ilegal é matar ou roubar. Mas um soldado pode matar um inimigo na guerra, e um burguês pode se apropriar de boa parte da produção de seus funcionários, alguns podem se apropriar dos bens de uma pessoa por um problema legal e se é crime discriminar um grupo étnico porque o estado as classifica em raças?

            Se nossas leis fossem justas, elas não seriam modificadas com o passar do tempo, mas é preciso a sensibilidade de um Thoureau para perceber o erro de uma sociedade quando se está inserido nela. Claro que aqueles que sentem esta realidade se revoltam, mas não estão intelectualmente preparados para contestá-las.