DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO ÂMBITO DO DIREITO CONSUMERISTA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

YURI LENNON MOURÃO LOBO MELO

Acadêmico de Direito da Universidade Federal do Ceará

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fortaleza

2013

 

SUMÁRIO

 

 

 

1.Introdução.....................................................................................................................03

2. Histórico......................................................................................................................04

3. Desconsideração da Personalidade Jurídica no Plano do Direito Consumerista.........05

4. Conclusões...................................................................................................................12

Referências......................................................................................................................13


1. INTRODUÇÃO

As inovações imprimidas pelas relações humanas, principalmente no tocante as práticas comerciais desenvolvidas ao longo dos séculos, trouxeram um novo entendimento sobre a concepção de pessoas e personalidades, principalmente na seara do Direito.

Vislumbra-se, sob a ótica jurídica, com toda facilidade possível, a existência de dois tipos de pessoas em nossa sociedade organizada: a pessoa natural (tratando-se de nós, serem humanos) e a pessoa jurídica (entendendo-se como a reunião de pessoas físicas a fim de formar um novo “ser”).

O instituto da pessoa jurídica não é tão recente como poder-nos-ia parecer a primeiro momento. Trata-se de figura já conhecida e entendida pelo direito romano, com um melhor desenvolvimento pelo direito canônico; e se baseava, principalmente, em estruturas coletivas que se diferiam pela distinção do direito público e privado.

O Código Civil vêm a disciplinar as relações das pessoas jurídicas, concebendo-a como qualquer outra pessoa, sendo, inclusive, responsável civilmente por todos os seus atos e omissões.

O novel Código Civil buscou disciplinar, como muito bem o fez, o instituto da desconsideração da personalidade jurídica, quando houvesse desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial por parte de seus administradores ou sócios. Bem leciona o artigo 50 do Código Reale:

“Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.”

(Lei 10.406 - Código Civil Brasileiro, de 10 de janeiro de 2002.)

 

Tal instituto visa coibir a prática abusiva que algumas pessoas físicas adotam que podem se favor pela fato de imputações que podem atingir outras pessoas que não a dos reais autores. É possível perceber que diversos campos do direito se prevalecem da aplicação da despersonalização, inclusive alguns ramos onde há a necessidade de proteção da pessoa física contra a má-fé de outras pessoas ante a atuação de pessoas físicas, como no caso do Direto Consumerista.

 

Em breve explanação acerca do que é a desconsideração da personalidade jurídica temos que essa se trata de levantamento do “véu” fictício que reveste a pessoa jurídica, a fim de que se atinja os, até então, “bens particulares” dos administradores ou sócios da pessoa jurídica, em razão da responsabilidade por certas e determinadas relações de obrigações, quando nestas tiver havido abuso da personalidade jurídica caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial.

Sob a ótica especifica do Código de Defesa do Consumidor, o fim da desconsideração é o mesmo, porém as causas ensejadoras são as mais diversas.

 

O presente estudo tem por finalidade apresentar o instituto da desconsideração da personalidade jurídica dentro da seara do Direito Consumerista, analisando o seu histórico, a sua finalidade, os seus requisitos e a possibilidade de incidência.

 

 

2. HISTÓRICO

 

O embrião da teoria da desconsideração da personalidade da pessoa jurídica foi a Inglaterra, através dos precedentes de julgados exarados pelas Cortes daquele país. Logo em seguida a teoria se espalhou pelos países da Europa, chegando, inclusivo, aos Estados Unidos da América.

A principal da razão da expansão desse conceito, que começa a se formar, foram as inovações produzidas pelo capitalismo industrial, que há época ditavam os rumos da economia conforme suas características, dentre elas a mais marcante seria a busca incessante e até mesmo inescrupulosa por lucro.

Nesse quadro, os administradores e sócios passaram a fazer uso indevido de suas corporações, com o intuito de atingir lucro pessoal, utilizando para tal seus empreendimentos comerciais.

Diante dessa situação, passou-se a desconsiderar a pessoa jurídica, quando houvesse indícios de que a personalidade da empresa estaria sendo utilizada indevidamente para camuflar atos de responsabilidade de seus sócios. Assim, tendo como fundamento a equity, passou-se a admitir a desconsideração da pessoa jurídica para atingir a pessoa dos sócios, responsáveis pelos atos ali perpetrados.

No plano doutrinário seu berço teórico foi a Alemanha pós-guerra, onde uma tese pioneira, defendida pelo Prof. Rolf Serick na Universidade de Tubingen, teve a primeira apresentação no mundo jurídico, tornando-se, desse modo, o precursor, no campo científico, da teoria.

Os debates doutrinários e jurisprudenciais levaram a formação da teoria do Disregard of legal entity, inicialmente nos Estados Unidos, expandindo-se ainda para a Alemanha (durchrigft der juristischen Person), Itália (superamento della personalità giuridica), Espanha (teoria de la penetración) e outros países da Europa.

Em nosso país, coube primeiramente ao Prof. Rubens Requião abordar o presente tema, em conferência intitulada “Abuso de direito e fraude através da personalidade jurídica”, realizada na Universidade Federal do Paraná em 1969. Contudo, o tema ainda era bastante polêmico, aqui, uma vez que nosso ordenamento era, mais ainda a época, balizado por normas escritas, diferentemente dos países do Common law.

O antigo Código Civil, de 1916, já fazia expressa distinção entre a Pessoa Jurídica e seus membros, conforme lecionava o seu artigo 20:

“Art. 20. As pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros.”

(Lei 3.071 – Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, de 1º de janeiro de 1916)

Contudo, tal previsão legal não ilidia, no plano da eficácia, a conduta indevida de alguns administradores ou sócios que viessem a se utilizar da personalidade jurídica da empresa para afastar as suas responsabilidades pessoais, uma vez que na seara cível e criminal nada era imputado a estes agentes.

Como forma de legitimar e atendendo a organização jurídica brasileira, buscou o Legislador regulamentar tal instituto através dos diversos ramos mais variados do direito, onde se fazia imprescindível a aplicação de tal instituto nas relações onde fosse cabível. Disciplinou, portanto, no Direito Civil, no Direito Trabalhista, no Direto Comercial (ou Empresarial), no Direito Ambiental, no Direito Tributário e no Direito Consumerista.

3. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO PLANO DO DIREITO CONSUMERISTA

 

A desconsideração da personalidade jurídica, como trazido à baila, tem por finto despir temporariamente, do véu que a encobre, a ficção jurídica da pessoa jurídica, principalmente quando se há confusão patrimonial ou desvio de finalidade desse ente.

Almeja, portanto, ilidir possíveis condutas abusivas ou fraudulentas que venham a ser perpetradas por administradores ou sócios da empresa, que tentem se valer de sua condição para que imputação alguma recaia sobre essas mesmas pessoas.

A doutrina brasileira vê a finalidade do instituto da desconsideração da personalidade jurídica, do seguinte modo:

“a teoria tem o intuito de preservar a pessoa jurídica e sua economia, enquanto instrumentos jurídicos indispensáveis à organização da atividade econômica, sem deixar ao desabrigo terceiros vítimas de fraude.”

(COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 14 ed. Editora Saraiva: São Paulo. 2003. p. 35)

A rigor, devem ser cumprido um dos requisitos expressos no artigo 50 do código civil para que seja deferido o pedido de desconsideração jurídica. A Pessoa Jurídica deve, pois, apresentar desvio de finalidade (o que caracteriza o abuso) ou confusão patrimonial.

Caracterizando uma das duas figuras apresentadas pelo art. 50 do CDC, o juiz poderá determinar, temporariamente, a extensão de certas obrigações que se projetarão no patrimônio pessoal dos administradores e dos sócios, desde que haja a requisição das partes ou do Ministério Público, quando intervir no processo.

Duas subteorias se ramificam da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, sendo: A Teoria Maior e a Teoria Menor. Essas duas espécies sugiram a parir de controvérsias doutrinarias que existiram quanto aos requisitos essenciais para configuração de hipótese incidência da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.

A Teoria Maior consiste na demonstração de fraude ou abuso do instituto da pessoa jurídica. Aqui, não cabe tão somente estar presente a insolvência da emprese, deve restar presente, também, indícios e provas de que os acionistas ou administradores de Pessoa Jurídica estão se valendo desta para perpetrar atos abusivos ou fraudulentos.

As provas utilizadas para a comprovação da teoria maior fizeram surgir dois novos ramos desse entendimento, a Teoria Maior Subjetiva da Desconsideração e a Teoria Maior Objetiva da Desconsideração.

Consiste a primeira na comprovação do desvio de finalidade, ou seja quando os representantes da empresa tentam fraudar terceiros interessados com uso indevido e abusivo da personalidade jurídica própria da empresa.

A segunda, trata-se da demonstração de que há confusão patrimonial dos bens da Pessoa Jurídica e dos seus sócios ou acionistas, ou seja, existe no plano fático quando não se é possível vislumbrar ou inexiste limites entre o patrimônio da pessoa jurídica com as pessoas físicas que a representam ou compõem.

A Teoria Menor da Desconsideração da Pessoa Jurídica, a seu turno, visa desconsiderar a pessoa jurídica por qualquer hipótese de execução contra a empresa, atingindo assim os sócios diretamente. Tal teoria encontra-se diametralmente oposta a anterior apresentada, bastando para incidir apenas a prova de insolvência da empresa em cumprir suas obrigações assumidas.

Segundo a teoria menor, o risco empresarial, inerente à atividade econômica, não pode ser suportado por terceiros que contrataram com a empresa insolvente, devendo sempre ser cumpridos pelos sócios e administradores, como bem disciplina o art. 28, § 5º do nosso Código de Defesa do Consumidor.

Sobre a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, entendeu o Excelso Superior Tribunal de Justiça – STJ, assim:

“Responsabilidade civil e Direito do consumidor. Recurso especial. Shopping Center de Osasco-SP. Explosão. Consumidores. Danos materiais e morais. Ministério Público. Legitimidade ativa. Pessoa jurídica. Desconsideração. Teoria maior e teoria menor. Limite de responsabilização dos sócios. Código de Defesa do Consumidor. Requisitos. Obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores. Art. 28, § 5º.

 

- Considerada a proteção do consumidor um dos pilares da ordem econômica, e incumbindo ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, possui o Órgão Ministerial legitimidade para atuar em defesa de interesses individuais homogêneos de consumidores, decorrentes de origem comum.

 

- A teoria maior da desconsideração, regra geral no sistema jurídico brasileiro, não pode ser aplicada com a mera demonstração de estar a pessoa jurídica insolvente para o cumprimento de suas obrigações. Exige-se, aqui, para além da prova de insolvência, ou a demonstração de desvio de finalidade (teoria subjetiva da desconsideração), ou a demonstração de confusão patrimonial (teoria objetiva da desconsideração).

 

- A teoria menor da desconsideração, acolhida em nosso ordenamento jurídico excepcionalmente no Direito do Consumidor e no Direito Ambiental, incide com a mera prova de insolvência da pessoa jurídica para o pagamento de suas obrigações, independentemente da existência de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial.

 

- Para a teoria menor, o risco empresarial normal às atividades econômicas não pode ser suportado pelo terceiro que contratou com a pessoa jurídica, mas pelos sócios e/ou administradores desta, ainda que estes demonstrem conduta administrativa proba, isto é, mesmo que não exista qualquer prova capaz de identificar conduta culposa ou dolosa por parte dos sócios e/ou administradores da pessoa jurídica.

 

- A aplicação da teoria menor da desconsideração às relações de consumo está calcada na exegese autônoma do § 5º do art. 28, do CDC, porquanto a incidência desse dispositivo não se subordina à demonstração dos requisitos previstos no caput do artigo indicado, mas apenas à prova de causar, a mera existência da pessoa jurídica, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.

 

- Recursos especiais não conhecidos.”

(REsp 279.273-SP. 3ª Turma. Rel. Min. Ari Pargendler. Rel. para o Acórdão Min. Nancy Andrighi.)

Diante de todo o exposto, prevaleceu, no âmbito do direito do consumidor, a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, conforme disciplinou o art. 28, § 5º, reverberado pelas nossas Cortes Pátrias.

É compreensível tal medida de proteção, haja vista que nossa Magna Carta elenca como um dos princípios gerais da nossa ordem econômica a defesa do consumidor. Nada mais adequado, para se dar efeito à norma Constitucional, que a proteção à satisfação do crédito do consumidor ainda não cumprido, através da desconsideração da personalidade da empresa.

No Código de Defesa do Consumidor, extraem-se ainda outras possibilidades que vêm disciplinadas em sua Secção V, no artigo 28, que assim prelecionam:

“SEÇÃO V

Da Desconsideração da Personalidade Jurídica

 

  Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

 

  § 1° (Vetado).

 

  § 2° As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.

 

  § 3° As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.

 

  § 4° As sociedades coligadas só responderão por culpa.

 

  § 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.”

(Lei nº 8.078 – Código de Defesa do Consumidor, de 11 de setembro de 1990.)

O Código de Defesa do Consumidor ampliou as hipóteses conhecidas e elencou novas possibilidades em seu caput para a desconsideração da personalidade jurídica. Podemos pontuar essas possibilidades em quatro, conforme leciona Sérgio Cavalieri[1], sendo: a) Abuso do direito; b) Excesso de Poder; c) Infração da Lei ou Prática de Ato Ilícito; d) Violação dos Estatutos ou Contrato Social; e) Má Administração.

O Abuso de Direito está descrito no artigo 187 do Código Civil, assim reza: “o titular de um direito, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. Portanto, trata-se de conduta na qual os representantes, legalmente instituídos pela Pessoa Jurídica, valem-se de suas prerrogativas para agirem de modo arbitrário.

O Excesso de Poder também é descrito no Código Civil, em seu art. 50. O ato pode até ser legal, mas o agente se devia ou vai além da finalidade das normas regentes – estas entendidas como as normas legais, os estatutos e os contratos sociais – tornando a conduta ilícita. Embora o ato aparentemente venha a cumprir as disposições legais, a conduta não se ajusta aos valores morais, éticos, sociais e econômicos.

A Infração da Lei ou a Prática do Ato Ilícito é entendida pelo ato que por si só já é contrário a normas regentes, estas, como já apresentado, entendidas como normas legais, os estatutos e os contratos sociais.

A última possibilidade, a ser aqui tratada, é a Violação dos Estatutos ou Contrato Social. Parte da doutrina entende que esta opção já se insere no excesso de poder ou desvio de finalidade. Em outro importante aspecto. Sustenta parte da doutrina que essa hipótese não seria essencialmente de desconsideração da pessoa jurídica, mas sim de responsabilização legal daquele agente autor da omissão ou ação violadora do estatuto ou do contrato social, o qual esteja na qualidade de sócio, representante legal ou controlador da empresa.

O Código Consumerista, apresenta, ainda, na segunda parte do caput do artigo 28, uma hipótese de desconsideração da personalidade jurídica em razão da Má Administração da empresa. Inovou o Legislador, nesse ponto, definindo a má administração da empresa, que acarrete em falência, como um requisito para a desconsideração da empresa nesse aspecto. Desse modo, demonstrando que tão somente o consumidor esteja sendo violado no seu direito a satisfação do crédito ou em direito, será possível a desconsideração da personalidade jurídica da empresa falida, atingindo, assim, o patrimônio pessoal dos representantes legais daquela.

Outrossim, importante caso a ser, também, apresentado no presente estudo é o da inversão da desconsideração jurídica. Nesse caso, age o representante legal da empresa age de má-fé transferindo ou atribuindo ao patrimônio empresa, algo que lhe é de sua propriedade, no intuito de fraudar quem dele poder-se-ia beneficiar. Trata-se de conduta, também, fraudulenta, com intuito, muitas vezes, de frustrar execução ou meação de quem poderia dessas se favorecer.Tem entendido assim nossos Tribunais sobre esse caso:

“PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL. ART. 50 DO CC/02. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA INVERSA. POSSIBILIDADE.

 

I - A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados impede o conhecimento do recurso especial. Súmula 211/STJ.

 

II - Os embargos declaratórios têm como objetivo sanear eventual obscuridade, contradição ou omissão existentes na decisão recorrida. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal a quo pronuncia-se de forma clara e precisa sobre a questão posta nos autos, assentando-se em fundamentos suficientes para embasar a decisão, como ocorrido na espécie.

 

III - A desconsideração inversa da personalidade jurídica caracteriza-se pelo afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, contrariamente do que ocorre na desconsideração da personalidade propriamente dita, atingir o ente coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabilizar a pessoa jurídica por obrigações do sócio controlador.

 

IV - Considerando-se que a finalidade da disregard doctrine é combater a utilização indevida do ente societário por seus sócios, o que pode ocorrer também nos casos em que o sócio controlador esvazia o seu patrimônio pessoal e o integraliza na pessoa jurídica, conclui-se, de uma interpretação teleológica do art. 50 do CC/02, ser possível a desconsideração inversa da personalidade jurídica, de modo a atingir bens da sociedade em razão de dívidas contraídas pelo sócio controlador, conquanto preenchidos os requisitos previstos na norma.

 

V - A desconsideração da personalidade jurídica configura-se como medida excepcional. Sua adoção somente é recomendada quando forem atendidos os pressupostos específicos relacionados com a fraude ou abuso de direito estabelecidos no art. 50 do CC/02. Somente se forem verificados os requisitos de sua incidência, poderá o juiz, no próprio processo de execução, ?levantar o véu? da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja os bens da empresa.

 

VI - À luz das provas produzidas, a decisão proferida no primeiro grau de jurisdição, entendeu, mediante minuciosa fundamentação, pela ocorrência de confusão patrimonial e abuso de direito por parte do recorrente, ao se utilizar indevidamente de sua empresa para adquirir bens de uso particular.

 

VII - Em conclusão, a r. decisão atacada, ao manter a decisão proferida no primeiro grau de jurisdição, afigurou-se escorreita, merecendo assim ser mantida por seus próprios fundamentos.

 

Recurso especial não provido.

(REsp. 948.117/MS. Rel. Min. Nancy Andrighi. Superior Tribunal de Justiça)

Alfim, cumpre-nos destacar que a desconsideração da pessoa jurídica não torna nulo tal instituto, trata-se, na verdade de afastamento temporário, para o caso concreto, desse instituto jurídico, com o intuito de tornar ineficaz alguns atos perpetrados pela Pessoa Jurídica, em razão de abuso ou ilicitude de seus representantes, para que seja atribuído a quem realmente perpetrou, os atos indevidos. Desse modo, não se extingue a pessoa jurídica, somente se retira o véu que a reveste, imputando aos representantes que tenham agido com a abuso a responsabilização que lhe são cabíveis.

4. CONCLUSÃO

 

Temos que o instituto da Desconsideração da Personalidade Jurídica é um importante mecanismo contra fraude e má-fé de alguns empresários. Servindo como meio de proteção do consumidor e, principalmente, do seu crédito inadimplido.

Contudo, deve-se ponderar a aplicação de tal instituto, pois a mesma má-fé de que se valem muitos empresários, também se valem alguns consumidores.

A aplicação da lei, portanto, deve atender a justiça, sempre com um olhar mais cuidadoso com o hipossuficiente e mais acurado com as provas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

  • COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 14 ed. Editora Saraiva: São Paulo. 2003.
  • FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Direito do Consumidor. 3ª ed. Editora Atlas S.A.: São Paulo. 2011.
  • ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Jurídico Acquaviva. 3ª ed. São Paulo: Rideel. 2009.
  • http://www4.planalto.gov.br/legislacao. Acesso em novembro/2013.


[1]              FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Direito do Consumidor. 3ª ed. Editora Atlas S.A.: São Paulo. 2011. p. 361 e 362.