Luana de Sousa Martins  

Desapropriação no Direito Público 

Mineiros-Goiás

2013

Centro Universitário de Mineiros

Pró-Reitoria de Ensino, de Pesquisa e de Extensão

Diretoria de Ensino

Unidade Básica das Ciências Sociais Aplicadas

Curso: Bacharelado em Direito 

Desapropriação no Direito Público

Luana de Sousa Martins

Monografia apresentada ao Curso Bacharelado em Direito, oferecido pela Unidade Básica das Ciências Sociais Aplicadas, mantido pelo Centro Universitário de Mineiros, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharelado em Direito, sob a orientação do Prof. (Esp.) Fernando Rocha Abrão.

Mineiros-Goiás

2013

Centro Universitário de Mineiros

Pró-Reitoria de Ensino, de Pesquisa e de Extensão

Diretoria de Ensino

Unidade Básica das Ciências Sociais Aplicadas

Curso: Bacharelado em Direito

Desapropriação no Direito Público 

Monografia aprovada pela Banca Examinadora, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharelado em Direito, oferecido pela Unidade Básica de Ciências Sociais Aplicadas, mantido pelo Centro Universitário de Mineiros.

Mineiros-GO, 29 de novembro de 2013. 

Prof. (Esp.)Fernando Rocha Abrão

Orientador

Prof. (Esp.)Jairo Antônio Ribeiro

Avaliador

Prof.ª (Esp.) Sebastiana Cristina Carvalho Carrijo

Avaliadora 

A Deus, pela vida.

Ao meu pai, Hamilton da Cruz Martins, cuja ausência é sentida a todo momento.

À minha mãe, Maria de Fátima de Sousa, pela amizade e amor incondicional.

Ao meu esposo, Randes Lima Machado, pelo companheirismo, compreensão e apoio constante.

Agradeço, de coração, ao Professor Fernando Rocha Abrão, que, apesar da distância, não poderia estar mais presente. Obrigada pelas sábias interferências e prontidão de sempre.

 

 

Resumo

 

Este trabalho apresenta como tema central a desapropriação no direito público, forma de aquisição da propriedade do particular pelo Poder Público de forma compulsória. Mas como pode o Estado intervir na propriedade privada sendo esta uma garantia fundamental? Isto se justifica pela necessidade pública, utilidade pública ou pelo interesse social. Assim, através de pesquisa bibliográfica, o presente trabalho visa demonstrar que, diante do bem-estar social e das exigências coletivas, a intervenção do estado na propriedade privada é medida que se faz necessária. Através de pesquisa embasada na Constituição Federal, em leis infraconstitucionais, em doutrinas e artigos, este trabalho visa abordar o instituto da desapropriação, seu procedimento e a justa indenização.

Palavras-chaves: Intervenção do Estado. Interesse público. Propriedade privada.

Sumário

Introdução. 9

1 Intervenção do Estado na Propriedade Privada. 11

1.1 Evolução Histórica do Direito de Propriedade nas Constituições Pátrias. 11

1.2 A Propriedade e o Direito de Propriedade. 14

1.3 Princípio da Função Social da Propriedade. 16

1.3.1 Função Social da Propriedade Urbana. 17

1.3.2 Função Social da Propriedade Rural. 18

1.4 Intervenção do Estado na Propriedade Privada. 18

1.5 Fundamento da Intervenção. 19

1.5.1 Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o Particular. 20

1.6 Modalidades de Intervenção. 21

1.6.1 Intervenção Restritiva. 22

1.6.2 Intervenção Supressiva. 22

2 Desapropriação. 24

2.1 Conceito. 24

2.2 Fundamentos. 25

2.3 Características. 26

2.5 Objeto. 31

2.6 Desapropriação de Bem Público. 32

2.7 Competência. 33

2.7.1 Competência Legislativa. 34

2.7.2 Competência Declaratória. 34

2.7.3 Competência Executória. 35

2.8 Polo Passivo. 35

2.9 Espécies de Desapropriação. 36

2.9.1 Desapropriação Ordinária. 36

2.9.2 Desapropriação Extraordinária. 36

2.9.3 Desapropriação Confiscatória. 40

2.10 Casos Especiais de Desapropriação. 42

2.10.1 Desapropriação Indireta. 42

2.10.2 Desapropriação por Zona. 44

3 Procedimento Expropriatório e Respectiva Indenização. 46

3.1 Procedimento Administrativo. 46

3.1.1 Fase Declaratória. 47

3.1.2 Fase Executória. 49

3.2 Procedimento Judicial – Ação de Desapropriação. 50

3.2.1 Imissão Provisória na Posse. 51

3.2.2 Observações Procedimentais. 52

3.3 Consumação da Desapropriação. 54

3.4 Desistência da Desapropriação. 55

3.5 Anulação da Desapropriação. 56

3.6 Da Indenização. 57

3.6.1 Juros Compensatórios e Moratórios. 58

3.6.2 Honorários Advocatícios. 59

3.6.3 Benfeitorias. 60

3.6.4 Correção Monetária. 61

3.6.5 Forma de Pagamento. 61

3.7 O Instituto da Retrocessão. 62

Considerações Finais. 63

Referências Bibliográficas. 66

 

Introdução

O direito de propriedade consiste em um direito real que traz consigo os poderes de usar, gozar e dispor do bem, de forma absoluta, exclusiva e perpétua, bem como de persegui-lo das mãos de quem quer que injustamente o detenha.

Contudo, tal direito não é absoluto, pois, excepcionalmente, o Estado necessitará intervir na propriedade do particular.

Por intervenção do Estado na propriedade privada, entende-se ser a atividade do Poder Público ou de seus delegados onde estes restringem o seu uso, impõe algum dever sobre ela ou a retiram compulsoriamente do domínio do particular, como ocorre na desapropriação.

Assim, o presente trabalho ostenta o seguinte tema: Desapropriação no Direito Público.

O instituto da desapropriação ou expropriação pode ser considerado como o procedimento administrativo de que vale o Poder Público para transferir compulsoriamente a propriedade do particular para as suas mãos quando esta lhe é necessária, útil ou de interesse social, mediante prévia e justa indenização.

Partindo destas premissas, importante responder a seguinte pergunta: como é possível que o Estado intervenha na propriedade do particular sendo esta uma garantia fundamental do homem?

Parte-se da hipótese de que é possível a interferência do Estado no bem privado ante os reclamos do interesse público, levando-se em conta o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, bem como o princípio da função social da propriedade.

A importância deste trabalho se reflete em demonstrar que mesmo o direito de propriedade sendo um direito absoluto, exclusivo e perpétuo, diante do bem-estar social e das exigências coletivas, a intervenção do Estado na propriedade privada é medida que se faz necessária.

A presente pesquisa também tem como objetivos: demonstrar as hipóteses que autorizam que o Estado intervenha na propriedade privada; detalhar as diferentes espécies de desapropriação; indicar quais bens são passíveis de desapropriação; compreender o seu procedimento e abordar sobre a justa indenização.

A metodologia adotada foi a pesquisa bibliográfica, embasada na Constituição Federal, em leis infraconstitucionais, em doutrinas e artigos.

Tal trabalho está organizado em três capítulos, sendo que no Capítulo 1, será exposto sobre a evolução histórica do direito de propriedade nas Constituições Pátrias, bem como sobre a definição de propriedade. Além disso, neste capítulo, haverá uma abordagem sobre princípios de suma importância, como o princípio da função social da propriedade urbana e rural e o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular. Por fim, serão expostas as modalidades de intervenção, dividindo-as em restritiva e supressiva, dando ênfase para a modalidade supressiva, ou seja, para a desapropriação.

Já no segundo capítulo, será analisado o conceito de desapropriação, seus fundamentos, características, requisitos constitucionais, objeto e competência. Também, nesta etapa, será tratado sobre as espécies de desapropriação e de alguns casos especiais, como a desapropriação indireta e por zona.

Por derradeiro, o Capítulo 3 será focado no procedimento expropriatório, tanto administrativo quanto judicial, e na respectiva indenização. Ao final, haverá uma breve análise sobre o instituto da retrocessão.

Seguirá, por fim, as considerações finais e as referências bibliográficas.

 

1 Intervenção do Estado na Propriedade Privada

1.1     Evolução Histórica do Direito de Propriedade nas Constituições Pátrias

O direito de propriedade, direito real que confere ao seu titular a faculdade de usar, gozar, dispor e reaver o bem de quem quer que injustamente o detenha, desenvolveu-se do sentido individual para o coletivo.

A esse propósito, Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2010) preconiza que:

A propriedade, como o mais amplo direito real, que congrega os poderes de usar, gozar e dispor da coisa, de forma absoluta, exclusiva e perpétua, bem como de persegui-la nas mãos de quem quer que injustamente a detenha, e cujo desmembramento implica a constituição de direitos parciais, evoluiu do sentido individual para o social. (DI PIETRO, 2010, p. 123).

No Brasil, é possível visualizar o direito de propriedade desde a instituição da primeira Carta Magna, em 1824.

Tal Constituição, fortemente influenciada pelo liberalismo francês, apresentava caráter individualista, uma vez que garantia o direito de propriedade em toda a sua plenitude, sem qualquer restrição ou limitação, ressalvando a hipótese de desapropriação por necessidade ou utilidade social. (QUARESMA, 2010, p. el.). 

O artigo 17 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão definia que a propriedade era um direito inviolável e sagrado, e que ninguém dela poderia ser privado, a não ser quando a necessidade ou utilidade social legalmente o exigisse e sob a condição de justa e prévia indenização.

Mais adiante, a Constituição de 1891 seguiu a mesma concepção da Carta Política anterior, pois garantia o direito de propriedade em toda a sua plenitude, salvo na hipótese de desapropriação por necessidade pública mediante prévia indenização.

Estabelecia o artigo 72, §17 da Constituição de 1891:

[...] Art. 72. A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

§ 17 O direito de propriedade mantém-se em toda a sua plenitude, salvo a desapropriação por necessidade ou utilidade pública, mediante indenização prévia. [...]

A seguir, a Lei Maior de 1934, elaborada após a Revolução de 1930, modificou o conceito de propriedade e inseriu pela primeira vez a idéia de função social. (QUARESMA, 2010, p. el.).

Além disso, à exigência de indenização prévia acrescentou-se a de indenização justa. (DI PIETRO, 2010).

Pela leitura do artigo 113, § 17, nota-se que a Constituição de 1934 assegurava a predominância do interesse público sobre o particular:

[...] § 17. É garantido o direito de propriedade, que não poderá ser exercido contra o interesse social ou coletivo, na forma que a lei determinar. A desapropriação por necessidade ou utilidade pública far-se-á nos termos da lei, mediante prévia e justa indenização. Em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina, poderão as autoridades competentes usar da propriedade particular até onde o bem público o exija, ressalvado o direito à indenização posterior. [...]

Em seguida, a Constituição de 1937 continuou resguardando o direito à propriedade.  Contudo, deixou ao encargo do legislador ordinário o dever de regulamentá-lo, definindo o seu conteúdo e fixando seus limites (artigo 122, § 14).

Sobre a Carta Política que veio a seguir, qual seja, a de 1946, exigia que a indenização fosse prévia, justa e em dinheiro.

Ademais, o artigo 147 previa a justa distribuição da propriedade em consonância com a idéia de supremacia do interesse social que então prevalecia. Foi nessa Constituição que se instituiu a desapropriação por interesse social, sob inspiração do princípio da função social da propriedade, embora não se empregasse essa expressão no texto constitucional. (DI PIETRO, 2010).

Importante considerar as lições da advogada Heloísa Helena Quaresma:

Elaborada após a queda do Estado Novo instituído por Getúlio Vargas, a Constituição de 1946 não se afastou do que já vinha disposto sobre o direito de propriedade nas Constituições de 1934 e 1937, mas, conferiu ao direito de propriedade um sentido social amplo. Este Diploma foi de grande importância para a evolução do direito de propriedade no Brasil, pois, através de seu artigo 141, §16, acresceu às hipóteses autorizadoras da desapropriação – necessidade e utilidade pública - o interesse social (QUARESMA, 2010, p. el.).

O artigo 141, § 16 assim estabelecia:

[...] Art. 141. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

§ 16 É garantido o direito de propriedade, salvo o caso de desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro. Em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina, as autoridades competentes poderão usar da propriedade particular, se assim o exigir o bem público, ficando, todavia, assegurado o direito a indenização ulterior. [...]

Prosseguindo na linha do tempo, o golpe militar de 1964 levou à promulgação da Constituição de 1967. Esta, apesar de ter restringido os direitos individuais, garantia o direito de propriedade e, em seu art. 150, caput e § 22, tratava sobre a desapropriação por necessidade, utilidade pública ou por interesse social, bem como sobre a requisição administrativa.

De acordo com Di Pietro (2010, p. 158), na vigência desta Constituição:

[...] foi instituída outra modalidade de desapropriação por interesse social, que visava especificamente à reforma agrária, permitindo-se que a indenização fosse feita em títulos da dívida pública quando se tratasse de latifúndio como tal definida em lei, excetuadas as benfeitorias úteis e necessárias, que seriam pagas em dinheiro.

Urge destacar também que a função social ganhou status de princípio da ordem econômica e social, visando promover o desenvolvimento nacional e a justiça social. (QUARESMA, 2010, p. el.).

Logo após, a Constituição de 1969, referiu-se ao direito de propriedade reproduzindo, literalmente, o previsto no Texto Constitucional de 1946 (artigo 153, § 22). Todavia, conforme Heloísa Helena Quaresma:

[...] o mesmo texto, em seu artigo 160 evoluiu, legislativamente, acerca do reconhecimento do princípio da função social da propriedade. Por conseguinte, manteve mesma linha de garantir principalmente o direito de propriedade com as ressalvas da desapropriação e da requisição. (QUARESMA, 2010, p. el.).

Por derradeiro, importante dispor sobre a atual Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Constituição que incluiu o direito de propriedade no capítulo “Dos Direitos Fundamentais”.

A Constituição Pátria vigente garante o direito de propriedade em seu artigo 5º, XXII, e, no inciso XXIII condiciona tal instituto ao atendimento da função social.

A Lei Maior também trata da função social quando estabelece a política de desenvolvimento urbano, exigindo o cumprimento do plano diretor (art. 182, § 2º). O legislador ainda dispõe sobre esse instituto ao conferir a possibilidade de intervenção do Estado na propriedade privada, por necessidade ou utilidade pública ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro (artigo 5º, inciso XXIV).

Nota-se, portanto, que o direito de propriedade evoluiu do sentido individual para o social. Nesse ínterim, impende-se citar os ensinamentos de Di Pietro (2010):

Apenas, enquanto naquela época essas leis e regulamentos se limitavam, quase exclusivamente, aos direitos de vizinhança, aos poucos o seu campo foi se ampliando, com a tendência para condicionar, cada vez mais, o exercício do direito de propriedade ao bem-estar social O princípio permanece, mas o seu alcance alterou-se profundamente, dando à propriedade sentido social então desconhecido. Hoje, prevalece o princípio da função social da propriedade, que autoriza não apenas a imposição de obrigações de não fazer, como também as de deixar de fazer e, hoje, pela Constituição, a obrigação de fazer, expressa no artigo 182, § 4º, consistente no adequado aproveitamento do solo urbano. (DI PIETRO, 2010, p. 123-124).

Dessa forma, conclui-se que o direito de propriedade, direito este assegurado desde a Constituição de 1824, desenvolveu do sentido particular para o coletivo. Isso porque, antes, era garantido o direito de propriedade em toda a sua plenitude. Este era um direito inviolável e sagrado. Contudo, com o surgimento dos princípios da Função Social e da Supremacia do Interesse Público sobre o Particular, o direito de propriedade ficou condicionado aos interesses coletivos e a promoção do desenvolvimento social.

1.2       A Propriedade e o Direito de Propriedade

“A propriedade é o direito que a pessoa física ou jurídica tem, dentro dos limites normativos, de usar, gozar e dispor de uma coisa corpórea ou incorpórea, bem como de reivindicar de quem injustamente a detenha.” (DINIZ, 2010, p. 848).

Nesse rumo, a professora Fernanda Marinela (2010) dispõe que:

O direito de propriedade consiste em um direito individual que assegura a seu titular uma série de poderes de cunho privado, civilista, dentre os quais estão os poderes de usar, gozar, usufruir, dispor e reaver um bem, de modo absoluto, exclusivo e perpétuo, com fundamento no artigo 5º, XXII e XXIII da CF. (MARINELA, 2010, p. 783).

Logo, são características do direito de propriedade: o caráter absoluto, exclusivo e perpétuo.

O caráter absoluto da propriedade assegura ao proprietário o direito de dispor da coisa da forma que melhor lhe aprouver. Ou seja, o proprietário tem liberdade sobre o bem e pode usá-lo como bem entender.

Quanto ao caráter exclusivo, Marinela o define da seguinte forma: “O caráter exclusivo significa exercer sozinho o direito (sem interferência de outros), portanto um mesmo bem não pode pertencer com exclusividade e simultaneamente a suas pessoas, já que o direito de um exclui o direito do outro.” (MARINELA, 2010, p. 785).

A respeito da perpetuidade ou irrevogabilidade, importante defini-la como algo que tem duração ilimitada, que permanecerá sob a titularidade do proprietário enquanto este assim desejar. 

Essas características podem ser vislumbradas no Código Civil de 2002, em seu artigo 1231, in verbis: “A propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário”.

Entretanto, nos dias atuais, o direito de propriedade não pode ser considerado um direito absoluto, uma vez que está condicionado ao cumprimento da função social, sob pena de intervenção do Estado para suprimir seu descumprimento.

Nesse ínterim, Diogenes Gasparini (2010) ensina que:

A propriedade privada não é mais absoluta. Seu uso, gozo, fruição e disposição não podem opor-se aos interesses gerais. Mesmo em países como o nosso, em que a Constituição assegura a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, ela está condicionada a uma função social (CF, art. 170, III). (GASPARINI, 2010, p. 866).

Vale ratificar, também, as lições de Benjamin Villegas Basavilbaso (1956, apud MEIRELLES, 2011, p. 646): “O direito de propriedade é um direito individual, mas um direito individual condicionado ao bem-estar da comunidade. É uma projeção da personalidade humana e seu complemento necessário, mas nem por isso a propriedade privada é intocável.”

Portanto, o direito de propriedade, direito real que traz consigo os poderes de usar, gozar e dispor do bem, de forma absoluta, exclusiva e perpétua, bem como de persegui-lo das mãos de quem quer que injustamente o detenha não é absoluto, pois, conforme dito anteriormente, está condicionado ao bem-estar da coletividade. Assim, excepcionalmente, o caráter absoluto, exclusivo e perpétuo será limitado e o Estado necessitará intervir na propriedade privada.

1.3   Princípio da Função Social da Propriedade

O inciso XXII do artigo 5º da Carta Magna (1988) garante o direito de propriedade. Mais adiante, o inciso XXIII do mesmo dispositivo legal determina que a propriedade atenderá a sua função social, condicionando-a ao bem-estar social.

Marinela (2010, p. 786) destaca a necessidade da função social da propriedade estar em “consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitar a poluição do ar e das águas.”

Di Pietro (2010), em sua obra Direito Administrativo, faz menção ao entendimento de Ferreira de Souza, que reconhece que o homem possua:

[...] como seu, de forma absoluta, aqueles bens necessários à sua vida, à sua profissão, à sua manutenção e à de sua família, mesmo os que constituem economias para o futuro. Mas além desse mínimo, a propriedade tem uma função social de modo que ou o seu proprietário a explora e a mantém dando-lhe utilidade, concorrendo para o bem comum, ou ela não se justifica. A emenda não chega ao extremo de negar a propriedade, mas, superpondo o bem comum ao bem individual, admite a expropriação das propriedades inúteis, das que poderiam ser cultivadas e não o são, daquelas cujo domínio absoluto chega a representar um acinte aos outros homens. (SOUZA apud DI PIETRO, 2010, p. 127).

Assim, a Carta Magna prevê que a propriedade deve atender a sua função social, estando em consonância com as finalidades econômicas e sociais, bem como em conformidade com o meio ambiente. Caso seu proprietário não cumpra essa função social, é possível que o Poder Público intervenha, tendo em vista o bem comum.

Para uma melhor compreensão do princípio ora em análise, importante considerar o tipo do bem, ou seja, se trata de um bem localizado em área urbana ou rural.

 

 

1.3.1  Função Social Da Propriedade Urbana

Em se tratando de propriedade urbana, a matéria está prevista no Estatuto da Cidade (Lei 10.257, de 10 de julho de 2001), que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal e estabelece diretrizes gerais da política urbana.

Consoante a dicção do artigo 182 da Constituição Federal (1988) combinado com o artigo 39 do Estatuto da Cidade (2001):

A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas [...].

Assim, pode-se dizer que a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.

Este instrumento básico de política de desenvolvimento e de expansão urbana é obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes e é aprovado por lei municipal, devendo ser revisto a cada dez anos (artigo 182, § 1º, CF/88 combinado com artigo 41, I, do Estatuto da Cidade).

Além disso, o Plano Diretor deve conter regras mínimas de convivência, como pavimentação asfáltica, limitação urbana, rede de esgoto, salubridade, saneamento básico, dentre outras.

Logo, a função social da propriedade urbana é cumprida quando é observado o previsto no plano diretor, tendo por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.

1.3.2  Função Social da Propriedade Rural

A propriedade rural possui seu fundamento no artigo 186 da Constituição Federal (1988), na Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra), na Lei nº 8.629/93, bem como na Lei Complementar 76/93, alterada pela Lei Complementar 88/96.

Conforme o disposto no artigo 186 da Constituição Federal (1988) combinado com o artigo 9º da Lei nº 8.629/93:

[...] Art. 186 A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo graus e critérios estabelecidos nesta lei, os seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional e adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. [...]

Em suma, corresponde a ideia de “correta utilização econômica da terra e sua justa distribuição, de modo a atender ao bem-estar social da coletividade, mediante o aumento da produtividade e da promoção da justiça social.” (ARAUJO apud DI PIETRO, 2010, p. 130).

Logo, obedecer as regras ambientais e a vedação ao trabalho escravo observando-se as normas relativas às relações de trabalho são exemplos que representam a função social da propriedade rural.

Desse modo, a função social da propriedade rural é cumprida quando obedece os requisitos previstos no artigo 186 da Constituição Federal de 1988, que se resumem em correto aproveitamento do solo, utilização consciente dos recursos naturais, observância das regras concernentes às relações de trabalho e preservação do meio ambiente.

1.4     Intervenção do Estado na Propriedade Privada

Como já mencionado, o direito de propriedade compreende os poderes de usar, gozar e dispor da coisa, de modo absoluto, exclusivo e perpétuo. Todavia, excepcionalmente, o Estado intervirá na propriedade privada.

Meirelles (2011, p. 649) assim define a intervenção na propriedade: “Entende-se por intervenção na propriedade privada todo ato do Poder Público que, fundado em lei, compulsoriamente retira ou restringe direitos dominiais privados ou sujeita o uso de bens particulares a uma destinação de interesse público.”

Nesse diapasão, Fernanda Marinela (2010) estabelece que:

A intervenção na propriedade pode ser conceituada como toda e qualquer atividade estatal que, amparada em lei, tenha por objetivo ajustá-la à função social à qual está condicionada ou condicioná-la ao cumprimento de uma finalidade de interesse público. Em regra, o Poder Público não intervirá na propriedade do particular, só sendo isso possível excepcionalmente, nas hipóteses autorizadas pelo ordenamento jurídico. (MARINELA, 2010, p. 786).

Vale destacar também as lições de Paulo Roberto de Souza Junior (2003):

A Constituição Federal de 1988 lança as bases dessa intervenção, ao capitular, em seus artigos, o comportamento estatal na busca da satisfação social, mesmo com o sacrifício da propriedade particular, garantindo, assim, esse direito à propriedade, mas com um marco fundamental, qual seja, o atendimento a sua função social afetando, por conseguinte, suas características fundamentais: absoluta, exclusiva e perpétua. (SOUZA JUNIOR, 2003, p. 195).

Assim, em algumas situações, o Estado terá que intervir na propriedade privada, restringindo seu uso, impondo algum dever ao proprietário ou mesmo transferindo-a para seu domínio, por razões de interesse público. (PAVIONE, 2012).

Nota-se, portanto, que quando for necessário haverá intervenção do Estado, instituída pela Constituição e regulada pelas leis federais que disciplinam as medidas interventivas e estabelecem o modo e forma de sua execução, para condicionar o atendimento do interesse público, respeitando as garantias individuais elencadas na Carta Maior.

1.5   Fundamento da Intervenção

O principal fundamento que autoriza a intervenção estatal na propriedade privada é a supremacia do interesse público sobre o particular.

Todavia, Marinela (2010) entende ser necessário mais um fundamento: a prática de uma ilegalidade. Como exemplo da prática de ilegalidade, vale citar uma plantação de psicotrópicos proibida em que há a desapropriação (confisco) sem indenização do proprietário.

Para certos doutrinadores, haveria necessidade, ainda, de um terceiro fundamento, qual seja, a obediência à função social da propriedade. Contudo, outros acreditam que esse fundamento já está incluído na caracterização da prática de ilegalidade e, portanto, não há que se falar em um terceiro fundamento (MARINELA, 2010).

Para melhor compreender o fundamento da intervenção, importante discorrer sobre o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular.

1.5.1  Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o Particular

Diante de um conflito entre o interesse público e o interesse do particular, aquele prevalecerá. Trata-se de um elemento de suma importância ao convívio social.

Por interesse público, entende-se ser o “pertinente à sociedade como um todo, e só ele pode ser validamente objetivado, pois este é o interesse que a lei consagra e entrega à compita do Estado como representante do corpo social.” (MELLO, 2011, p. 99).

Tal princípio está previsto no artigo 2º, caput, da Lei nº 9.784/99 como um dos princípios de observância obrigatória pelo Estado. Assim, a Administração Pública deve zelar pelo “atendimento a fins de interesses gerais, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competência, salvo autorização em lei.” (art. 2º, parágrafo único, inciso II, da Lei 9.784/99).

Urge salientar que, embora tal princípio não esteja previsto em um artigo específico da Constituição Federal, é possível percebê-lo, explicitamente, em diversos dispositivos, como por exemplo, no artigo 170, incisos III, V e VI, que trata dos princípios da função social da propriedade, do consumidor e do meio ambiente.

Conforme Meirelles (2011, p. 105-106): “a primazia do interesse público sobre o privado é inerente à atuação estatal e domina-a, na medida em que a existência do Estado justifica-se pela busca do interesse geral”.

O ilustre Ministro Celso Antônio Bandeira de Mello bem ensina que:

[...] a Administração Pública está, por lei, adstrita ao cumprimento de certas finalidades, sendo-lhe obrigatório objetivá-las para colimar interesse de outrem: o da coletividade. É em nome do interesse público – o do corpo social – que tem de agir, fazendo-o na conformidade da intentio legis. Portanto, exerce “função”, instituto que se traduz na idéia de indeclinável atrelamento a um fim preestabelecido e que deve ser atendido para o benefício de um terceiro [...] (MELLO, 2011, p. 98).

Outrossim, importante destacar que:

A aplicabilidade desse princípio, por certo, não significa o total desrespeito ao interesse privado, já que a Administração deve obediência ao direito adquirido, à coisa julgada e ao ato jurídico perfeito, consoante prescreve a Lei Maior da República (art. 5º, XXXVI). De sorte que os interesses patrimoniais afetados pela prevalência do interesse público devem ser indenizados cabalmente. (GASPARINI, 2010, p. 74).

 Desse modo, o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, princípio previsto implicitamente na Lei nº 9.784/99 e explicitamente na Carta Política, se justifica na busca do interesse geral. Levando-se em conta o bem estar social e as exigências coletivas, cabe ao Estado intervir na conduta antissocial do particular.

1.6   Modalidades de Intervenção

Hoje, no direito brasileiro, podem ser indicadas várias modalidades de restrição do Estado sobre a propriedade privada, cada qual afetando de modo diverso o direito de propriedade. (DI PIETRO, 2010, p. 124).

Fernanda Marinela (2010) ensina que:

Vale lembrar que, nas inúmeras formas de intervenção, o Poder Público vai atingir elementos diferentes do direito de propriedade, o que significa dizer que a restrição ora atinge o caráter absoluto restringindo a liberdade do proprietário em face do bem, ora atingirá a exclusividade, deixando o proprietário de ter o uso exclusivo. Por fim, e no mais extremo dos casos, a intervenção estatal poderá atingir a perpetuidade, hipótese na qual o proprietário perderá o seu direito e o bem será transferido para o Estado. (MARINELA, 2010, p. 788).

Esses meios de intervenção vão desde os mais brandos até os mais extremos. Para uma melhor abordagem, faz-se necessário dividi-los em duas modalidades: restritiva e supressiva.

1.6.1  Intervenção Restritiva

Como o próprio nome já diz, nessa modalidade de intervenção há a restrição ao direito de propriedade sem, contudo, retirá-la do particular.

Trata-se de:

[...] hipótese em que o Estado impõe restrições e condiciona o uso da propriedade, sem, no entanto, retirá-la de seu dono. O proprietário, apesar de conservar a propriedade, não poderá utilizá-la a seu exclusivo critério, devendo subordinar-se às imposições emanadas pelo Poder Público. (MARINELA, 2010, p. 787).

Destacam-se as seguintes modalidades restritivas, sendo que cada qual afeta de modo diverso o direito de propriedade: limitação administrativa, servidão administrativa, requisição, ocupação temporária e tombamento.

1.6.2  Intervenção Supressiva

Atinge a faculdade que tem o proprietário de dispor da coisa segundo a sua vontade, implica a transferência compulsória, mediante indenização, para satisfazer o interesse público. (DI PIETRO).

Nessa modalidade de intervenção, “o Estado transfere coercitivamente para si a propriedade de terceiro, em virtude de um dos fundamentos previstos em lei.” (MARINELA, 2010, p. 787).

É o caso da desapropriação, modalidade mais drástica de intervenção na propriedade, onde há a perda do domínio.

Devido a sua extrema importância, o instituto da desapropriação será estudado mais detalhadamente nos próximos capítulos.

2 Desapropriação

 

2.1   Conceito

Inicialmente, é importante considerar que, dentre as diversas modalidades de intervenção do Estado na propriedade privada, destaca-se a desapropriação, que é considerada a mais drástica das formas de manifestação do poder de império, ou seja, da Soberania interna do Estado no exercício de seu domínio eminente sobre todos os bens existentes no território nacional. (MEIRELLES, 2011).

A desapropriação, também conhecida como expropriação, é assim definida por Meirelles (2011):

Desapropriação ou expropriação é a transferência compulsória da propriedade particular (ou pública de entidade de grau inferior para a superior) para o Poder Público ou seus delegados, por utilidade ou necessidade pública ou, ainda, por interesse social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro (CF, art. 5º, XXIV), salvo as exceções constitucionais de pagamento em títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, no caso de área urbana não edificada, subtilizada ou não utilizada (CF, art. 182, § 4º, III), e de pagamento em títulos da dívida agrária, no caso de Reforma Agrária, por interesse social (CF, art. 184). (MEIRELLES, 2011, p. 650).

Nesse rumo, Di Pietro (2010) a conceitua como sendo:

[...] o procedimento administrativo pelo qual o Poder Público ou seus delegados, mediante prévia declaração de necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, impõe ao proprietário a perda de um bem, substituindo-o em seu patrimônio por justa indenização. (DI PIETRO, 2010, p. 159).

Da mesma forma, dispõe Marinela (2010):

A desapropriação é um procedimento administrativo em que o Poder Público adquire a propriedade do particular de forma compulsória, para fins de interesse público, atingindo-se assim a faculdade que tem o proprietário de dispor da coisa segundo sua vontade, afetando o caráter perpétuo e irrevogável do direito de propriedade com a conseqüente indenização. (MARINELA, 2010, p. 817).

Importante destacar, também, o entendimento do ilustre Ministro Celso Antônio Bandeira de Mello (2011):

À luz do Direito Positivo brasileiro, desapropriação se define como procedimento através do qual o Poder Público, fundado em necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, compulsoriamente despoja alguém de um bem certo, normalmente adquirindo-o para si, em caráter originário, mediante indenização prévia, justa e pagável em dinheiro, salvo no caso de certos imóveis urbanos ou rurais, em que, por estarem em desacordo com a função social legalmente caracterizada para eles, a indenização far-se-á em títulos da dívida pública, resgatáveis em parcelas anuais e sucessivas, preservando seu valor real. (MELLO, 2011, p. 872-873).

Gasparini (2010) destaca ainda que:

Essa faculdade constitucional para desapropriar é necessária, visto que nem sempre o Estado pode alcançar os fins a que se propõe pelos meios que o Direito Privado oferece e regula. O proprietário do bem necessário, útil ou de interesse social para o Estado resiste às suas pretensões de compra, por não querer vender ou por não lhe interessar o preço oferecido, impedindo, com essa resistência, a realização do bem comum. Nesses casos, como em outros, só a desapropriação restaura a prevalência do interesse público sobre o interesse particular, retirando do proprietário, mediante indenização a sua propriedade. (GASPARINI, 2010, p. 885-886).

Nas palavras de Meirelles (2011), é o meio de que se vale o Estado para remover obstáculos à execução de obras e serviços públicos; para propiciar a implantação de planos de urbanização; para preservar o meio ambiente contra devastações e poluições; e para realizar a justiça social, com a distribuição de bens inadequadamente utilizados pela iniciativa privada.

É de ver-se, portanto, que o instituto da desapropriação ou expropriação consiste em um procedimento administrativo de que vale o Poder Público para transferir compulsoriamente a propriedade do particular para as suas mãos quando esta lhe é necessária, útil ou de interesse social, mediante prévia e justa indenização.

2.2   Fundamentos

Pode-se dizer que três são os fundamentos da desapropriação: um político, um constitucional e um legal.

O fundamento político está consubstanciado na supremacia do interesse público sobre o interesse privado, sempre que inconciliáveis. (GASPARINI, 2010).

No plano constitucional, a desapropriação possui como principais fundamentos os artigos 5º, XXIV, 182, § 4º, III e 184 e parágrafos, todos da Constituição Federal (1988).

Por último, sobre o fundamento legal destacam-se os seguintes diplomas: Decreto-lei 3.365/41 (Lei Geral das Desapropriações), a Lei 4.132/62 (desapropriação por interesse social), Decreto-lei 1.075/70 (imissão provisória na posse de imóveis residenciais urbanos), Lei 8.629/93 (regulamenta dispositivos constitucionais da reforma agrária), Lei Complementar 76/93 (procedimento especial para desapropriação de imóveis rurais, visando à reforma agrária) e Lei 10.257/01 (Estatuto das Cidades).

2.3   Características

Várias são as características da desapropriação. Contudo, o procedimento administrativo e a forma originária de aquisição da propriedade são as que mais se destacam.

Como dito anteriormente, a expropriação trata-se de um procedimento administrativo, o que demonstra seu aspecto formal, composto de duas fases: uma declaratória e uma executória.

Nesse passo, Meirelles ensina que:

A desapropriação é um procedimento administrativo que se realiza em duas fases: a primeira, de natureza declaratória, consubstanciada na indicação da necessidade ou utilidade pública ou do interesse social; a segunda, de caráter executório, compreendendo a estimativa da justa indenização e a transferência do bem expropriado para o domínio do expropriante. É um procedimento administrativo (e não um ato), porque se efetiva através de uma sucessão ordenada de atos intermediários (declaração de utilidade, avaliação, indenização), visando à obtenção de um ato final, que é a adjudicação do bem ao Poder Público ou ao seu delegado beneficiário da expropriação. (MEIRELLES, 2011, p.650).

Quanto a forma originária de aquisição da propriedade, Meirelles (2011, p. 650) dispõe que esta “não provém de nenhum título anterior, e, por isso, o bem expropriado torna-se insuscetível de reivindicação e libera-se de quaisquer ônus que sobre ele incidissem precedentemente, ficando os eventuais credores sub-rogados no preço”.

Isso significa dizer que a desapropriação independe de títulos e proprietários anteriores, ônus reais deixam de existir e perdem o sentido as discussões sobre a titularidade do domínio (por isso o bem se torna insuscetível de reivindicação). No caso de eventuais credores, estes terão que buscar sua indenização pelo valor da indenização paga pelo Estado ao expropriado. (PAVIONE, 2012).

Di Pietro (2010, p. 177) complementa que: “[...] não interessa, para fins de expropriação, verificar se se tratava de título justo ou injusto, de boa ou má-fé.”

Nota-se, portanto, que o procedimento administrativo advém de seu aspecto formal, composto por uma fase declaratória e uma executória, visando, ao final, a adjudicação do bem para o Poder Público. Sobre a aquisição de forma originária, vale dizer que a propriedade é transferida desacompanhada de qualquer nexo com a relação anterior, diferentemente do que ocorre na aquisição derivada.

2.4   Requisitos Constitucionais

A Constituição Federal (1988) indica como requisitos para que ocorra a desapropriação: necessidade pública, utilidade pública ou interesse social (arts. 5º, inciso XXIV, e 184).

Urge destacar que:

As hipóteses legais de desapropriação são taxativas porque o art. 5º do Decreto-lei 3.365, ao enunciar os casos que embasam a desapropriação, na letra “p” indica: “os demais casos previstos por leis especiais”. Logo, só se pode desapropriar fundado nas hipóteses previstas em lei, isto é, nas consideradas expressamente no Decreto-lei 3.365 ou em demais leis que regem a matéria. (MELLO, 2011, p. 880).

Logo, trata-se de um rol taxativo, não podendo lei estadual ou municipal ampliá-lo, nem a autoridade expropriante promover a desapropriação para outro fim que não um dos previstos em lei, sob pena de nulidade. (GASPARINI).

A dúvida quanto à inobservância desses limites autoriza o Poder Judiciário a examinar se a desapropriação está ou não fundada em um dos casos de necessidade pública, utilidade pública ou interesse social. (GASPARINI).

Nesse diapasão, Souza Junior (2003, p. 202) prevê que: “Caso não sejam apreciados tais pressupostos, cabe ao Judiciário apreciar tal ato, já que não se estará decidindo sobre a ocorrência do caso do pressuposto, mas sim seu fundamento [...]”

Sobre a necessidade pública, utilidade pública e interesse social, mister se faz esclarecer o significado de tais requisitos constitucionais.

2.4.1  Necessidade Pública

A desapropriação por necessidade pública está prevista no art. 5º do Decreto-lei nº 3.365/41.

“A necessidade pública surge quando a Administração defronta situações de emergência, que, para serem resolvidas satisfatoriamente, exigem a transferência urgente de bens de terceiros para o seu domínio e uso imediato.” (MEIRELLES, 2011, p. 657).

“Existe necessidade pública quando a Administração está diante de um problema inadiável e premente, isto é, que não pode ser removido, nem procrastinado, e para cuja solução é indispensável incorporar, no domínio do Estado, o bem particular.” (DI PIETRO, 2010, p. 169).

Marinela (2010) define que a necessidade pública será utilizada nas hipóteses previstas no decreto desde que represente situação inesperada, emergencial, um problema inadiável e que a desapropriação seja um rol indispensável.

Em suma, a desapropriação por necessidade pública advém de situações anormais, de problemas urgentes e inadiáveis, onde a transferência do bem do particular para o domínio público é indispensável. Aqui, não há juízo de discricionariedade, pois o Poder Público tem a obrigação de agir. Como exemplo, cite-se uma casa que está prestes a desmoronar. O Estado tem o dever de intervir com base na necessidade pública. Caso contrário, as pessoas que moram nesta propriedade bem como as que moram ao redor podem vir a ser atingidas e até morrer.

2.4.2  Utilidade Pública

 

 

Também está prevista no art. 5º do Decreto-lei nº 3.365/41.

“A utilidade pública apresenta-se quando a transferência de bens de terceiros para a Administração é conveniente, embora não seja imprescindível.” (MEIRELLES, 2011, p. 657-658).

“Há utilidade pública quando a utilização da propriedade é conveniente e vantajosa ao interesse coletivo, mas não constitui um imperativo irremovível.” (DI PIETRO, 2010, p. 169).

Marinela (2010, p. 824) prescreve que: “[...] a utilidade pública é caracterizada como uma situação vantajosa para o interesse coletivo, mas não urgente. Nesse contexto, a doutrina conclui que as hipóteses de necessidade estão embutidas no conceito de utilidade pública que é mais abrangente.”

Consoante a dicção do artigo 5º do Decreto-lei 3.365/1941:

[...]

Art. 5º  Consideram-se casos de utilidade pública:

a) a segurança nacional;

b) a defesa do Estado;

c) o socorro público em caso de calamidade;

 d) a salubridade pública;

e) a criação e melhoramento de centros de população, seu abastecimento regular de meios de subsistência;

f) o aproveitamento industrial das minas e das jazidas minerais, das águas e da energia hidráulica;

g) a assistência pública, as obras de higiene e decoração, casas de saude, clínicas, estações de clima e fontes medicinais;

h) a exploração ou a conservação dos serviços públicos;

i) a abertura, conservação e melhoramento de vias ou logradouros públicos; a execução de planos de urbanização; o parcelamento do solo, com ou sem edificação, para sua melhor utilização econômica, higiênica ou estética; a construção ou ampliação de distritos industriais;

j) o funcionamento dos meios de transporte coletivo;

k) a preservação e conservação dos monumentos históricos e artísticos, isolados ou integrados em conjuntos urbanos ou rurais, bem como as medidas necessárias a manter-lhes e realçar-lhes os aspectos mais valiosos ou característicos e, ainda, a proteção de paisagens e locais particularmente dotados pela natureza;

 l) a preservação e a conservação adequada de arquivos, documentos e outros bens moveis de valor histórico ou artístico;

m) a construção de edifícios públicos, monumentos comemorativos e cemitérios;

n) a criação de estádios, aeródromos ou campos de pouso para aeronaves;

o) a reedição ou divulgação de obra ou invento de natureza científica, artística ou literária;

p) os demais casos previstos por leis especiais. [...]

Portanto, a desapropriação por utilidade pública não é imprescindível, mas sim conveniente, fundamentando-se na comodidade da sociedade. Nessa modalidade, o Estado fica preso a um juízo de discricionariedade, ou seja, age de acordo com um juízo de valor.

2.4.3  Interesse Social

 

 

Regulada pela Lei 4.132/62, tem por objetivo promover a justa distribuição da propriedade urbana ou rural ou prestigiar certas camadas socias. Consideram-se de interesse social, para fins desta modalidade de desapropriação, as situações arroladas no art. 2º da Lei 4.132/62. (PAVIONE, 2012, p. 484).

Por força do art. 2º da Lei 4.132/62, considera-se de interesse social:

[...]

I - o aproveitamento de todo bem improdutivo ou explorado sem correspondência com as necessidades de habitação, trabalho e consumo dos centros de população a que deve ou possa suprir por seu destino econômico;

II - a instalação ou a intensificação das culturas nas áreas em cuja exploração não se obedeça a plano de zoneamento agrícola,

III - o estabelecimento e a manutenção de colônias ou cooperativas de povoamento e trabalho agrícola:

IV - a manutenção de posseiros em terrenos urbanos onde, com a tolerância expressa ou tácita do proprietário, tenham construído sua habilitação, formando núcleos residenciais de mais de 10 (dez) famílias;

V - a construção de casa populares;

VI - as terras e águas suscetíveis de valorização extraordinária, pela conclusão de obras e serviços públicos, notadamente de saneamento, portos, transporte, eletrificação armazenamento de água e irrigação, no caso em que não sejam ditas áreas socialmente aproveitadas;

VII - a proteção do solo e a preservação de cursos e mananciais de água e de reservas florestais.

VIII - a utilização de áreas, locais ou bens que, por suas características, sejam apropriados ao desenvolvimento de atividades turísticas. [...]

Com efeito, Meirelles (2011) preconiza que:

O interesse social ocorre quando as circunstâncias impõem a distribuição ou o condicionamento da propriedade para seu melhor aproveitamento, utilização ou produtividade em benefício da coletividade ou de categorias sociais merecedoras de amparo específico do Poder Público. (MEIRELLES, 2011, p. 658).

Assim, na desapropriação por interesse social, o Estado, objetivando reduzir as desigualdades sociais, prestigia certas camadas sociais ou impõe um melhor aproveitamento da terra rural, adquirindo a propriedade de alguém e a repassando a terceiros. Cumpre observar que essa modalidade, diferentemente das duas primeiras, é de interesse da coletividade.

2.5   Objeto

Conforme o disposto no art. 2º do Decreto-lei 3.365/41: “Mediante declaração de utilidade pública, todos os bens poderão ser desapropriados pela União, pelos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios.”

Di Pietro (2010, p. 170) afirma que:

[...] todos os bens poderão ser desapropriados, incluindo coisas móveis e imóveis, corpóreas e incorpóreas, públicas ou privadas. O espaço aéreo e o subsolo também podem ser expropriados, quando da utilização do bem puder resultar prejuízo patrimonial ao proprietário do solo (§ 1º).

“Pode ser objeto da desapropriação tudo aquilo que seja objeto de propriedade. Isto é, todo bem, imóvel ou móvel, corpóreo ou incorpóreo, pode ser desapropriado.” (MELLO, 2011, p. 883)

Assim, “são expropriáveis os bens apropriáveis que possam ser definidos por seu conteúdo econômico, salvo as proibições legais.” (GASPARINI, 2010, p. 907).

Também são passíveis de desapropriação os direitos reais, como é o caso do domínio útil resultado da enfiteuse, além dos direitos pessoais inerentes ao contrato de compra e venda. Admite-se ainda a expropriação do direito à posse, desde que legítima e de boa-fé. (MARINELA, 2010).

Meirelles (2010), no mesmo sentido, leciona que a posse legítima ou de boa-fé é expropriável por ter valor econômico para o possuidor, principalmente quando se trata de imóvel utilizado pelo posseiro.

Entretanto, há situações em que a desapropriação é impossível.

Meirelles (2010, p. 651) destaca que:

[...] Excluem-se desse despojamento compulsório os direitos personalíssimos, indestacáveis do indivíduo ou irretiráveis de sua condição cívica. Também não se desapropria a moeda corrente do País, porque ela constitui o próprio meio de pagamento da indenização, mas podem ser expropriadas moedas raras, nacionais ou estrangeiras. [...]

Assim, não são desapropriáveis os bens e direitos personalíssimos, como a honra, liberdade, a cidadania, os títulos profissionais, o direito à vida, à imagem e aos alimentos.

Também não podem ser expropriados os bens que podem ser encontrados facilmente no mercado. “Por conseguinte, não se podem desapropriar ônibus, carteiras escolares, móveis de escritórios, caminhões, tratores e tantos outros bens encontráveis ordinariamente no comércio. [...]” (GASPARINI, 2010, p. 908).

Cabe anotar que um dado bem pode ser inexpropriável para uma finalidade, mas não para outra.

É o que acontece com a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra, e com a propriedade produtiva (art. 185, I e II, da CF), que são inexpropriáveis para fins de reforma agrária, mas não para fins de urbanização (construção de obra pública). (GASPARINI, 2010, p. 908).

Conclui-se que pode ser objeto de desapropriação tudo aquilo que pode ser objeto de propriedade, ou seja, os bens móveis e imóveis, corpóreos e incorpóreos, públicos e privados, o espaço aéreo e o subsolo. Por outro lado, são inexpropriáveis os bens e direitos personalíssimos e os bens encontrados facilmente no mercado. Além disso, um bem pode ser desapropriável para uma finalidade, mas não para outra.

2.6   Desapropriação de Bem Público

De acordo com o art. 2º, § 2º do Decreto-lei 3.365/41: “Os bens do domínio dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios poderão ser desapropriados pela União, e os dos Municípios pelos Estados, mas, em qualquer caso, ao ato deverá preceder autorização legislativa.”

Pavione (2012, p. 483) prevê que:

[...] mediante autorização legislativa admite-se a desapropriação de bens públicos, desde que observada a “hierarquia constitucional”. A União pode desapropriar bens dos Estados, DF e Municípios; os Estados podem desapropriar bens dos Municípios. O caminho inverso, todavia, não é possível, conforme entendimento dominante.

Desse modo, Marinela (2010) ensina que:

Os bens públicos podem ser desapropriados desde que respeitada, em razão do princípio da “hierarquia federativa” a seguinte ordem: a União poderá desapropriar bens dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios e os Estados só poderão desapropriar bens dos seus Municípios, conforme previsão do art. 2º, § 2º, do DL 3.365/41, que visa proteger a autonomia desses entes. Sendo assim, bem da união não poderá sofrer desapropriação, um Estado não poderá desapropriar bem de outro Estado, assim como de um Município situado em território de outro Estado e o Município não poderá desapropriar bens dos demais entes, nem mesmo de outro Município. Nessas hipóteses, por serem bens públicos, há exigência de autorização legislativa da mesma ordem política do expropriante. (MARINELA, 2010, p. 819).

Ademais, impende destacar que “se dois entes políticos tiverem interesse em desapropriar o mesmo bem privado, também com fundamento na ordem federativa, a jurisprudência orienta que prevalece o de maior ordem.” (MARINELA, 2010, p. 820).

A respeito dos bens que pertencem à Administração Indireta, Di Pietro (2010, p. 171) prevê que: “[...] aplica-se, por analogia, o artigo 2º do Decreto-lei nº 3.365/41, sempre que se trate de bem afetado a uma finalidade pública.”

Assim, mediante autorização legislativa e desde que observada a hierarquia funcional, é possível a desapropriação de bens públicos. Conforme a hierarquia funcional, o ente político de maior ordem pode desapropriar o de menor ordem. Nesse passo, a União não poderá sofrer desapropriação, contudo, poderá desapropriar bens do domínio dos Estados-Membros, dos Municípios e do Distrito Federal. No mesmo sentido, os Estados-Membros poderão desapropriar bens pertencentes aos seus Municípios, mas não bens da União.

2.7   Competência

A competência em matéria expropriatória pode ser dividida em legislativa, declaratória e executória.

2.7.1  Competência Legislativa

 

 

A competência para legislar sobre o instituto da desapropriação está prevista no art. 22, II, da Constituição Federal, e prevê que compete privativamente à União legislar sobre desapropriação.

O parágrafo único do referido artigo estabelece que: “Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo.”

Gasparini (2010, p. 890) complementa que:

A competência para legislar (fazer leis) sobre desapropriação é exclusiva da União (art. 22, da CF). Destarte, à União também cabe disciplinar o procedimento administrativo e o processo judicial necessários para que o expropriamento possa acontecer. Ressalvem-se dessa exclusividade a possibilidade de lei complementar autorizar os Estados-Membros e o Distrito federal a legislar sobre questão específica ligada à desapropriação, como prevê o parágrafo único desse preceptivo constitucional, e o fato de que os Estados-Membros e o Distrito Federal podem legislar sobre “procedimento em matéria processual” (art. 24, XI, da CF). [...]

Portanto, a competência para legislar sobre desapropriação é privativa da União, podendo esta ser delegada para os Estados e Distrito Federal por meio de lei complementar.

2.7.2  Competência Declaratória

“Competentes para submeterem um bem à força expropriatória, isto é, competentes para declararem a utilidade pública ou o interesse social de um bem para fins de desapropriação, são a União, Estados, Distrito Federal e Territórios.” (MELLO, 2011, p. 882).

Além disso, as pessoas indicadas em lei, como a ANEEL (Lei 9.074/99, art. 10) e o DNIT (Lei 10.233/01, art. 82, IX) podem declarar áreas para fins de desapropriação, visando à consecução de seus objetivos específicos. (PAVIONE, 2012).

Assim, a competência declaratória é concorrente, isto é, das pessoas políticas dentro de suas respectivas jurisdições.

2.7.3  Competência Executória

 

 

Segundo Mello (2011, p. 882-883):

Podem promover a desapropriação, isto é, efetivar a desapropriação, ou seja, praticar os atos concretos para efetuá-la [...], além da União, Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios, as autarquias, os estabelecimentos de caráter público em geral ou que exerçam funções delegadas do Poder Público e os concessionários de serviço, quando autorizados por lei ou contrato.

Nesse sentido, Gasparini (2010) ensina que a competência para promover a desapropriação é concorrente. Qualquer pessoa política ou administrativa pode executar ou promover o expropriamento, devendo esta última estar autorizada em lei ou contrato, por força do artigo 3º do Decreto-lei 3.365/41.

Dessa forma, é competente para promover a desapropriação, tomando os atos materiais para a transferência do bem para o domínio público: a União, os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios, bem como os concessionários e permissionários de serviços públicos.

2.8   Polo Passivo

“Sujeito passivo da desapropriação é o expropriado, que pode ser pessoa física ou jurídica, pública ou privada. Quanto às pessoas jurídicas públicas, deve ser observada a norma do artigo 2º, § 2º, do Decreto-lei nº 3.365/41.” (DI PIETRO, 2010, p. 168).

O artigo 2º, § 2º, da Lei das Desapropriações dispõe sobre a obediência à hierarquia federativa, já mencionada no item 2.6.

Nesse rumo, pode-se dizer que o sujeito ativo é o Poder Público e seus delegados, ao passo que o sujeito passivo é o proprietário de um bem.

2.9   Espécies de Desapropriação

2.9.1  Desapropriação Ordinária

 

Também denominada de desapropriação comum ou geral, está consubstanciada no art. 5º, XXIV da Constituição Federal e prevê que: “a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição.”

Dessa forma, a desapropriação ordinária tem como fundamento a necessidade pública, utilidade pública ou o interesse social.

Além disso, pode recair sobre qualquer bem, salvo as vedações legais.

A indenização deve ser prévia, justa e em dinheiro. Marinela (2010) explica que:

[...] Indenização prévia significa que deve ser realizada antes da consumação da transferência do bem, o que na prática acaba acontecendo em um só momento como uma relação de causa e efeito. Indenização justa é aquela que corresponde ao valor do bem expropriado, ou seja, importância que deixe o expropriado plenamente indenizado, sem qualquer prejuízo em seu patrimônio. Por fim, a indenização deve ser em dinheiro, devendo o expropriante pagá-la ou depositá-la judicialmente em espécie. (MARINELA, 2010, p. 823).

Por fim, urge destacar que “pode ser efetivada pela União, Estado-Membro, Distrito Federal e outras pessoas a quem a lei reconheça tal competência.” (GASPARINI, 2010, p. 887).

Logo, a desapropriação ordinária, comum ou geral é aquela que se fundamenta na necessidade pública, na utilidade pública ou no interesse social, podendo recair sobre qualquer bem, sendo que a indenização deverá ser prévia, justa e em dinheiro. Ademais, poderá ser efetivada pelos entes políticos e por outros órgãos previstos em lei.

2.9.2  Desapropriação Extraordinária

 

 

A desapropriação extraordinária ou sancionatória possui como “[...] fundamento um interesse social, qual seja, o cumprimento da função social da propriedade e o bem estar social. Por não cumprir este princípio, a indenização será paga em títulos especiais da dívida pública.” (PAVIONE, 2012, p. 484).

Pode ser dividida em desapropriação urbana e desapropriação rural.

2.9.2.1 Desapropriação urbana

Também conhecida como desapropriação para fins de urbanização, está prevista no art. 182, § 4º, III da Constituição Federal e disciplinada pela Lei nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade).

De acordo com o art. 182, § 4º, III da Constituição Federal (1988):

[...]

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.

[...]

§ 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:

I - parcelamento ou edificação compulsórios;

II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;

III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais. [...]

Assim,

[...] Só pode incidir sobre propriedade urbana não edificada, subutilizada ou não utilizada, incluída no Plano Diretor, cujo proprietário não promoveu o seu adequado aproveitamento ou após o decurso de cinco anos de cobrança de IPTU progressivo sem que o proprietário tenha cumprido a obrigação de parcelamento, edificação ou utilização compulsórios. (SILVA, 2006, p. el.).

Importante destacar as lições de Di Pietro (2010, p. 161):

[...] trata-se de modalidade de desapropriação somente aplicável nos Municípios que tenham plano diretor aprovado por lei; além disso, exige-se lei específica determinando o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios; cumpridos esses requisitos, tem de haver notificação ao proprietário averbada no registro de imóveis; desatendida a notificação nos prazos legais, o proprietário fica sujeito ao IPTU progressivo no tempo pelo prazo máximo de cinco anos; só após esse prazo é que o Município poderá efetuar a desapropriação com pagamento em títulos. [...]

“Essa modalidade de desapropriação para obediência do Plano-Diretor só poderá ser realizada pelos Municípios e pelo Distrito Federal no exercício de sua competência municipal [...]” (MARINELA, 2010, p. 826).

Desse modo, essa modalidade de desapropriação é de competência exclusiva dos Municípios.

A indenização “[...] é paga com títulos da dívida pública municipal de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurado o valor da indenização e os juros [...]” (GASPARINI, 2010, p. 886).

Consoante a dicção do art. 8º, § 2º do Estatuto da Cidade, o valor real da indenização refletirá o valor da base de cálculo do IPTU, descontado o montante incorporado em função de obras realizadas pelo Poder Público. Nesse valor, não se computarão expectativas de ganhos, lucros cessantes e juros compensatórios.

“Quanto ao processo de desapropriação, a Lei nº 10.257/01 não contém normas específicas, razão pela qual se aplica o mesmo procedimento previsto no Decreto-lei nº 3.365/41.” (DI PIETRO, 2010, p. 161).

Como se verifica, a desapropriação urbana somente será efetivada em último caso, quando as outras medidas não tiverem se mostrado eficientes. Nesse passo, visando garantir o bem-estar de seus habitantes e ordenar o pleno desenvolvimento da cidade, o Poder Público poderá determinar o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios caso o particular não esteja atendendo as limitações do plano diretor. Se o proprietário não cumprir, ele fica sujeito ao IPTU progressivo no tempo pelo período de 5 (cinco) anos. Se mesmo assim ele não conseguir, o Município poderá promover a desapropriação, sendo que a indenização será realizada através de títulos da dívida pública municipal, com prazo de resgate de até dez anos.

2.9.2.2 Desapropriação rural

A desapropriação rural ou para fins de reforma agrária está consolidada no art. 184 da Constituição Federal, na Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra), na Lei nº 8.629/93 (reforma agrária) e na Lei Complementar 76/93 (procedimento especial).

Como já mencionado no item 1.3.2 e, segundo o disposto no art. 9º da Lei nº 8.629/93, a função social da propriedade é cumprida quando seu proprietário atende, simultaneamente, os seguintes requisitos:

[...]

I - aproveitamento racional e adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. [...]

Caso seu proprietário não cumpra os requisitos supramencionados, a propriedade rural será desapropriada e destinada à reforma agrária.

Importante anotar que “Não se sujeitam a esta desapropriação a propriedade produtiva e a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra.” (PAVIONE, 2012, p. 484).

É o que dispõe o art. 185 da Carta Magna (1988):

[...]

Art. 185 - São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária:

I - a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra;

II - a propriedade produtiva. [...]

Nesse sentido, Marinela (2010) prevê que:

Não cumprida a função social, o proprietário fica sujeito à desapropriação para fins de reforma agrária, escapando dessa propriedade caso se trate de pequena e média propriedade rural, desde que seu proprietário não possua outra propriedade rural e se essa se tornar produtiva, conforme regra do art. 185, da CF e conceitos legais dos arts. 4º e 6º da Lei nº 8.629/93. (MARINELA, 2010, p. 828).

Em relação a indenização:

[...] será prévia e justa, mas paga em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei, exceto as benfeitorias úteis e necessárias que serão pagas em dinheiro. (PAVIONE, 2012, p. 485).

Ademais, essa modalidade de desapropriação só poderá ser efetivada pela União e seus delegados que no caso é o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).

Frise-se que nem toda desapropriação para fins de reforma agrária será paga em títulos da dívida pública. Esta será tão somente para aquela que não esteja exercendo a sua função social. Entretanto, se a desapropriação para fins de reforma agrária tiver objeto diverso do descumprimento da função social, a indenização será prévia, justa e em dinheiro.

Dessa forma, a desapropriação rural ocorre quando o proprietário de imóvel rural não cumpre sua função social, sendo tal área destinada à reforma agrária, ressalvado o caso da pequena e da média propriedade rural e da propriedade produtiva. Tal desapropriação somente poderá ser realizada pela União e seus delegados e a indenização será paga com títulos da dívida agrária, resgatáveis em até 20 (vinte) anos.

2.9.3  Desapropriação Confiscatória

Há duas hipóteses em que pode ocorrer a desapropriação confiscatória: no caso de plantação de psicotrópicos proibidos e em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins.

A desapropriação de glebas de terra em que sejam cultivadas plantas psicotrópicas tem previsão na Lei 8.257/91 e no artigo 243 da Constituição Federal (1988). Este último dispõe que:

[...]

Art. 243. As glebas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas serão imediatamente expropriadas e especificamente destinadas ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. [...]

Sobre a definição de plantas psicotrópicas, Marinela ensina que:

[...] são aquelas que permitem a obtenção de substância entorpecente proscrita, plantas essas elencadas no rol emitido pelo órgão sanitário competente do Ministério da Saúde, cujo cultivo depende de autorização de tal órgão, atendendo exclusivamente às finalidades terapêuticas e científicas.

Frise-se que não é qualquer cultura de plantas psicotrópicas que enseja essa modalidade de desapropriação, mas tão somente aquela que seja ilegal, ou seja, aquela não autorizada pelo Ministério da Saúde.

Ademais, nesse caso, a destinação de tais glebas será para o assentamento de colonos para plantação de produtos alimentícios e medicamentosos.

Quanto a desapropriação em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, esta está prevista no art. 243, parágrafo único da CF/88 e assim prevê:

[...] Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins será confiscado e reverterá em benefício de instituições e pessoal especializados no tratamento e recuperação de viciados e no aparelhamento e custeio de atividades de fiscalização, controle, prevenção e repressão do crime de tráfico dessas substâncias.

Como se vê, nesta hipótese, tais bens serão destinados à implementação da fiscalização e casas de recuperação de viciados.

Impende-se destacar que a desapropriação confiscatória se equipara ao confisco, pois não assegura ao expropriado o direito à indenização.

Moreira Neto (2009) ressalta que como não há indenização, há de ser entendida como um confisco, medida excepcional no sistema constitucional. Acrescenta ainda que se assim não fosse, estaria beneficiando um infrator, pagando-lhe uma indenização pelo justo valor do bem, do mesmo modo que ocorre em uma desapropriação regular.

A competência para esse tipo de desapropriação é da União, cujo processo segue as regras específicas constantes da Lei nº 8.257/91, aplicando subsidiariamente o Código de Processo Civil.

Desse modo, a desapropriação confiscatória ocorre no caso de plantação de psicotrópicos proibidos e em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins. No primeiro caso, as áreas expropriadas serão destinadas ao assentamento de colonos. Já no segundo, os bens apreendidos serão revertidos em benefício de instituições especializadas na recuperação de viciados. Importante anotar que é a única hipótese em que a União irá desapropriar sem indenizar. Será o confisco.

2.10 Casos Especiais de Desapropriação

2.10.1 Desapropriação Indireta

Nos ensinamentos de Souza Junior (2003, p. 208): “Esse tipo de desapropriação é realizado pelo Poder Público sem a observância das formalidades e cautelas do procedimento expropriatório, configurando um ato abusivo e irregular [...]”

Na desapropriação indireta, o Poder Público se apossa de um bem sem cumprir os dois requisitos constitucionais essenciais da desapropriação, quais sejam: a declaração e a justa indenização. (MOREIRA NETO, 2009).

“Neste caso, o Estado se apossa do bem particular sem a observância dos requisitos procedimentais e da prévia e justa indenização. É um verdadeiro esbulho praticado pelo Estado.” (PAVIONE, 2012, p. 485).

Marinela (2010) acrescenta que:

É um comportamento irregular da Administração Pública. Na prática é muito comum a Administração disfarçar uma modalidade restritiva de intervenção na propriedade, escapando muitas vezes do dever de indenizar através de um procedimento mais simples, quando na verdade está tomando para si a propriedade, impedindo o exercício do direito, efetivamente, desapropriando o bem. [...] (MARINELA, 2010, p. 830).

Dessa forma, pode-se concluir que é a desapropriação que se processa sem observância do procedimento legal; costuma ser equiparada ao esbulho e pode ser obstada por ação possessória. No entanto, se o proprietário não impedir no momento adequado deixando que o Poder Público dê uma destinação pública ao bem, não mais poderá reivindicar o imóvel, pois os bens expropriados desde que sejam incorporados ao patrimônio público não poderão ser objetos de reivindicação. (DI PIETRO, 2010).

É o que prescreve o artigo 35 do Decreto-lei 3.365/41: “Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos.”

Nesse sentido é o disposto no artigo 21 da LC 76/93: “Os imóveis rurais desapropriados, uma vez registrados em nome do expropriante, não poderão ser objeto de ação reivindicatória.”

Como ensina Marinela (2010), ocorridos o esbulho e a incorporação ao patrimônio público, a afetação do bem ao atendimento de uma finalidade pública impede que o Estado devolva o bem a seu titular, restando ao proprietário o recurso à via judicial, objetivando receber a indenização pela perda do direito de propriedade. Nesse caso, a medida cabível é a Ação de Desapropriação Indireta.

Como exemplo, observe a seguinte hipótese: o Poder Público ocupa uma área e faz uma escola sem, contudo, obedecer o devido processo legal da desapropriação e, consequentemente, sem indenizar o particular. Nessa situação, o expropriado não poderá pedir a reintegração, uma vez que a Administração deu finalidade pública ao terreno desapropriado. A solução cabível ao particular é ajuizar uma Ação de Desapropriação Indireta visando indenização por perdas e danos.

Urge destacar ainda que se ajuizada qualquer uma das medidas possessórias e, durante o trâmite do processo ocorrer a incorporação ao patrimônio público, essa ação deve ser transformada em ação de desapropriação indireta, com o objetivo único de indenização, afastando-se a possibilidade de devolução do bem. (MARINELA, 2010).

Segundo a jurisprudência do STJ, a competência para julgamento da ação de desapropriação indireta é o local da situação do imóvel, aplicando o disposto no artigo 95 do CPC.

No que diz respeito à indenização, esta será posterior à perda da posse e, como será resultado de provimento jurisdicional, está sujeita ao regime de precatório. (MARINELA, 2010).

“Pago o proprietário, a sentença transitada em julgado deve ser transcrita no Registro de Imóveis, para incorporação do bem ao patrimônio público.” (DI PIETRO, 2010, p. 185).

Conforme a Súmula 119 do STJ, o prazo para a interposição da ação de desapropriação indireta prescreve em vinte anos.

Caso o proprietário deixe prescrever o seu direito, o Estado, para regularizar a situação patrimonial do imóvel, terá que recorrer à ação de usucapião, uma vez que a simples afetação do bem particular a um fim público não constitui forma de transferência da propriedade. (DI PIETRO, 2010).

Em suma, na desapropriação indireta há a retirada do bem das mãos do particular sem a observância do devido processo legal e sem que haja a justa indenização. Trata-se de uma forma de esbulho que pode ser impedida por meio de ação possessória. Contudo, se o Poder Público já tiver dado uma destinação pública ao bem, restará ao proprietário ajuizar uma Ação de Desapropriação Indireta, pleiteando perdas e danos.

2.10.2. Desapropriação por Zona

 

 

Também conhecida como desapropriação extensiva, “consiste na ampliação da expropriação às áreas que se valorizem extraordinariamente em conseqüência da obra ou do serviço público.” (MEIRELES, 2011, P. 653).

Está prevista no art. 4º do Decreto-lei 3.365/41:

[...]

Art. 4º A desapropriação poderá abranger a área contígua necessária ao desenvolvimento da obra a que se destina, e as zonas que se valorizarem extraordinariamente, em conseqüência da realização do serviço. Em qualquer caso, a declaração de utilidade pública deverá compreendê-las, mencionando-se quais as indispensáveis à continuação da obra e as que se destinam à revenda. [...]

Portanto, o Poder Público desapropria uma área maior do que a necessária para a realização da obra ou do serviço para a utilização futura da área excedente ou para revendê-la por ter havido supervalorização em razão da obra ou serviço.

Conforme estabelece Gasparini (2010, p. 913), “[...] três poderão ser as áreas objeto da desapropriação: a) a necessária à obra ou ao serviço; b) a destinada ao prosseguimento da obra ou serviço; c) a reservada para revenda.”

“Nesta última hipótese, o bem não é expropriado para integrar o patrimônio público, mas para ser revendido, com lucro, depois de concluída a obra que valorizou o imóvel.” (DI PIETRO, 2010, p. 182).

Há autores que criticam essa modalidade de desapropriação, uma vez que a cobrança da contribuição de melhoria (art. 145, III, da CF/88) é uma forma menos prejudicial ao proprietário do bem.

Por fim, importante ressaltar que não se deve confundir a desapropriação por zona ou extensiva com o direito de extensão. Este último consiste na “possibilidade de o proprietário exigir que o Poder Público desaproprie todo o imóvel, quando a desapropriação abranger apenas em parte do bem e deixar o restante inaproveitável”. (PAVIONE, 2012, p. 485).

Portanto, a desapropriação por zona ou extensiva consiste na ampliação da área a ser desapropriada por ter havido supervalorização em razão da obra ou do serviço público, com o intuito de utilizá-la futuramente ou revendê-la.

 

 

3 Procedimento Expropriatório e Respectiva Indenização

 

 

3.1   Procedimento Administrativo

“A desapropriação desenvolve-se por meio de uma sucessão de atos definidos em lei e que culminam com a incorporação do bem ao patrimônio público.” (DI PIETRO, 2010, p. 163).

Este procedimento administrativo é composto por duas fases: uma fase declaratória, onde o Poder Público declara seu interesse no bem, daí começando as providências para sua transferência, e uma fase executória, onde se tem o pagamento e a efetiva entrada do bem. (MARINELA, 2010).

Gasparini (2010) ressalta que:

Essas fases só existem no procedimento expropriatório normal. Não existem na chamada desapropriação indireta. Nesta, o Poder Público não toma qualquer iniciativa para formalizar a transferência do bem para o seu patrimônio ou para indenizar o proprietário, aguarda que este tome as medidas necessárias à defesa de seus direitos. Essas medidas, regra geral, estão consubstanciadas na ação de indenização. A ação reivindicatória nem sempre têm êxito, dado que, uma vez integrado ao patrimônio público, o bem dele não pode, em princípio, sair. Se apesar disso for interposta, costuma-se convertê-la em indenizatória. (GASPARINI, 2010, p. 920).

Por fim, “importante lembrar que a desapropriação, por gerar obrigação do pagamento de indenização, deve atender às exigências orçamentárias, observando as condições do art. 167, da CF e a Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/00, art. 16).” (MARINELA, 2010, p. 836).

Portanto, o procedimento administrativo se divide em duas fases: uma declaratória, onde o Estado declara seu interesse no bem do particular; e uma fase executória, em que há a efetiva retirada do bem e o pagamento da indenização. A seguir, estas duas fases serão estudadas com mais detalhes.

3.1.1  Fase Declaratória

 

 

Constitui “[...] ato administrativo discricionário através do qual o Poder Público ou quem lhe faça às vezes manifesta sua intenção de adquirir, compulsoriamente certo bem e o submete ao regime expropriatório.” (GASPARINI, 2010, p. 920).

Se declara por meio de decreto expropriatório, ato típico do Poder Executivo (art. 6º do Decreto- lei de 3.365/41), ou, por meio de lei de efeitos concretos, quando a decretação é realizada pelo Poder Legislativo, que significa um ato com formato de lei, mas com características de ato administrativo (art. 8º do Decreto- lei de 3.365/41). (MARINELA, 2010).

Como ensina Marinela (2010), o decreto expropriatório ou a lei de efeitos concretos deverá ter como conteúdo obrigatório: a) o fundamento legal que justifica a desapropriação; b) a identificação do bem que está sendo desapropriado, sob pena de ilegalidade do ato; c) a destinação que vai ser dada ao bem a fim de verificar a obediência a uma das hipóteses da lei e afastar qualquer desvio de finalidade; d) o sujeito passivo; e) os recursos orçamentários, para garantir o cumprimento da sua fase executiva com a devida indenização.

Publicado o decreto, a declaração de utilidade pública produz os seguintes efeitos:

a) submete o bem à força expropriatória do Estado;

b) fixa o estado do bem, isto é, suas condições, melhoramentos, benfeitorias existentes;

c) confere ao Poder Público o direito de penetrar no bem a fim de fazer verificações e medições, desde que as autoridades administrativas atuem com moderação e sem excesso de poder;

d) dá início ao prazo de caducidade da declaração. (DI PIETRO, 2010, p. 163).

Quanto ao dever do expropriante de fixar o estado do bem, este é de suma importância, uma vez que

[...] o estado em que se encontra nesse momento será levado em consideração no cálculo da indenização: dentre as benfeitorias feitas posteriormente a essa declaração, somente serão indenizadas as necessárias e, desde que autorizadas pelo Poder Público, as benfeitorias úteis (art. 26, § 1º, da Lei de Desapropriação); as voluptuárias feitas após a declaração não serão indenizadas. As benfeitorias existentes no imóvel antes da declaração serão todas indenizadas, uma vez que a indenização deve recompor integralmente o patrimônio do expropriado. (DI PIETRO, 2010, p. 164).

Logo, “as benfeitorias necessárias são sempre indenizáveis, as benfeitorias voluptuárias não o serão nunca e as benfeitorias úteis serão indenizadas desde que hajam sido autorizadas pelo poder competente.” (MELLO, 2011, p. 887).

Ademais, como a declaração expropriatória não possui o condão de transferir o domínio do bem para o Poder expropriante, o proprietário continua a valer-se dos direitos de usar, gozar e dispor do bem alcançado pela desapropriação. Por tal motivo, não pode o Poder Público negar o alvará de licença para construir, quando requerido pelo proprietário que, no bem objeto da declaração expropriatória, deseja edificar obras de seu interesse. Todavia, conforme entendimento da Súmula 23 do STF, na indenização, não serão incluídos os valores das construções verificadas após a declaração, salvo assentimento do expropriante. (GASPARINI, 2010).

Quanto ao direito de penetrar no imóvel, prescreve o art. 7º do Lei de Desapropriação:

[...]

Art. 7º. Declarada a utilidade pública, ficam as autoridades administrativas autorizadas a penetrar nos prédios compreendidos na declaração, podendo recorrer, em caso de oposição, ao auxílio de força policial. Aquele que for molestado por excesso ou abuso de poder, cabe indenização por perdas e danos, sem prejuízo da ação penal. [...]

Importante mencionar também que o decreto declaratório não valerá indefinidamente, existindo para o expropriante um prazo para adotar medidas concretas, quais sejam: acordo com o desapropriado ou ação judicial. (PAVIONE, 2012, p. 486).

Dessa forma, a declaração de utilidade pública tem um prazo de validade e, passado este, ela caduca.

“Caducidade da declaração de utilidade pública é a perda de validade dela pelo decurso do tempo sem que o poder Público promova os atos concretos destinados a efetivá-la.” (MELLO, 2011, p. 888).

Assim, em relação ao prazo de caducidade, o artigo 10 do Decreto-lei nº 3.365/41 prevê que a desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente dentro de cinco anos, contados da data da expedição do respectivo decreto e findos os quais este caducará. Todavia, este prazo de caducidade não é fatal, o mesmo dispositivo prescreve que “decorrido um ano poderá ser o mesmo bem objeto de nova declaração.”

Quanto a desapropriação por interesse social regida pela Lei nº 4.132/62, o prazo de caducidade se reduz a dois anos a partir da decretação da medida (art. 3º); e essa caducidade refere-se não apenas à efetivação da desapropriação, mas também às providencias de aproveitamento do bem expropriado; aqui difere do Decreto-lei nº 3.365/41, que nenhum prazo estabelece para utilização do bem expropriado. Além disso, o dispositivo não prevê um período de carência para a renovação da declaração. (DI PIETRO, 2010, p. 165).

No que tange a reforma agrária, o prazo de caducidade também é de dois anos, segundo o art. 3º da Lei Complementar nº 76/93.

Em relação à desapropriação por descumprimento da função social da propriedade urbana e expropriação de terras onde se cultivam plantas psicotrópicas, as Leis nº 10.257/01 e nº 8.257/91 não estabelecem prazo de caducidade do decreto.

Resumindo, pode-se dizer que a fase declaratória consiste em um ato administrativo através do qual o Poder Público declara sua intenção de adquirir determinado bem. Tal ato é declarado por meio de decreto ou de lei de efeitos concretos, devendo conter seu fundamento, a identificação do bem, sua destinação, o sujeito passivo e os recursos orçamentários. Este decreto confere ao expropriante o direito de penetrar no imóvel a fim de fazer medições e verificações. Contudo, o expropriado continua com a posse e domínio do bem. Este somente passa a integrar o patrimônio público concluída a fase executória.

3.1.2  Fase Executória

 

 

Também denominada como fase executiva, “compreende os atos pelos quais o Poder Público promove a desapropriação, ou seja, adota as medidas necessárias à efetivação da desapropriação, pela integração do bem ao patrimônio público.” (DI PIETRO, 2010, p. 165).

Para Gasparini (2010, p. 924): “É a ação do expropriante necessária a cumprir a declaração expropriatória.”

“Aqui, o poder expropriante e o expropriado acordam com relação ao preço e pode, por isso, concretizar-se a aquisição compulsória mediante acordo no que respeita à indenização, operando-se, então, sem intervenção do Poder Judiciário.” (MELLO, 2011, p. 885).

 Nesse sentido Di Pietro (2010) assim dispõe:

“A fase executória será administrativa quando houver acordo entre expropriante e expropriado a respeito da indenização, hipótese em que se observarão as formalidades estabelecidas para a compra e venda, exigindo-se, em caso de bem imóvel, escritura transcrita no Registro de Imóveis.” (DI PIETRO, 2010, p. 166).

Portanto, nesta fase ocorrem as devidas providências para que o bem seja transferido para o domínio do Poder expropriante. Este oferecerá ao proprietário o valor que entende ser o do bem. Se o proprietário aceitar a avaliação, ocorrerá um acordo entre as partes e o valor apurado será depositado e o bem transferido para o domínio do expropriante. (PAVIONE, 2012).

Assim, nesta fase, o poder expropriante e expropriado acordam quanto ao preço a ser pago pelo bem objeto da desapropriação e este efetivamente passa a integrar o patrimônio público. Entretanto, caso não haja acordo ou sendo desconhecido o proprietário do bem, o expropriante deverá buscar as vias judiciais, assunto este que será discutido no item seguinte.

3.2   Procedimento Judicial – Ação de Desapropriação

Não havendo acordo, segue-se a fase judicial, que obedecerá o procedimento especial previsto no Decreto-Lei nº 3.365/41 e, no que for omisso, aplicar-se-á, subsidiariamente, o Código de Processo Civil.

“O foro para o ajuizamento da ação é o da situação do bem expropriado, inclusive para a chamada desapropriação indireta, salvo os casos de interesse da União, em que o foro competente é o da Justiça Federal.” (GASPARINI, 2010, p. 925).

Em relação a petição inicial, esta “[...] deve obedecer aos requisitos previstos no CPC, além de algumas exigências específicas como a oferta do preço, ser instruída com o jornal oficial contendo o decreto de desapropriação, ou cópia autenticada dos mesmos, e a planta ou descrição dos bens e suas confrontações.” (MARINELA, 2010, p. 839-840).

Urge salientar que: “Interposta a ação expropriatória, não fica vedada a celebração de acordo para pôr fim à expropriação, que, para surtir os efeitos de direito, deve ser homologado pelo juízo competente.” (GASPARINI, 2010, p. 925).

Dessa forma, “iniciado o processo judicial, se as partes fizerem acordo quanto ao preço, a decisão judicial será apenas homologatória, valendo como título para transcrição no Registro de Imóveis.” (DI PIETRO, 2010, p. 166).

É de ver-se, portanto, que, não havendo acordo quanto ao preço a ser pago pelo bem, deve-se ajuizar uma ação de desapropriação que, em regra, será proposta no foro da situação do bem, devendo observar os requisitos do Código de Processo Civil, bem como outras peculiaridades citadas acima. Por fim, vale lembrar que a qualquer tempo poderá ser celebrado acordo entre as partes.

3.2.1  Imissão Provisória na Posse

 

 

Se o expropriante alegar urgência e depositar a quantia arbitrada, o juiz mandará imiti-lo provisoriamente na posse dos bens. (MARINELA, 2010).

Conforme lição de Mello (2011):

Imissão provisória de posse é a transferência da posse do bem objeto da expropriação para o expropriante, já no início da lide, concedida pelo juiz, se o Poder Público declarar urgência e depositar em juízo, em favor do proprietário, importância fixada segundo critério previsto em lei. (MELLO, 2011, p. 889).

Do mesmo modo, Marinela (2010, p. 840), dispõe que consiste na:

“[..] prerrogativa conferida ao expropriante que lhe dá a possibilidade de entrar na posse do bem a qualquer momento, durante a tramitação do procedimento expropriatório, viabilizando a transferência da posse do bem desde o início da demanda, atendendo a situações urgentes da Administração.”

Assim, de acordo com o artigo 15 do Decreto-lei nº 3.365/41, a imissão provisória na posse fica condicionada à alegação de urgência e ao pagamento de quantia arbitrada pelo juiz.

Conforme prescrevem os §§ 2º e 3º do artigo 15 do Decreto-lei nº 3.365/41, uma vez manifestada, a declaração de urgência vigorará por cento e vinte dias.

Isso significa que o pedido de imissão e o necessário depósito devem ser feitos dentro desse tempo. Ultrapassado esse prazo sem utilização, ocorre a caducidade da declaração de urgência e esta não pode ser renovada. (GASPARINI, 2010, p. 927).

Se o expropriado concordar com o valor depositado, cuidará para levantá-lo integralmente, consumando-se, assim, a desapropriação. No entanto, se o expropriado discordar do valor ofertado, poderá levantar 80% do montante depositado, mediante a prova de propriedade, da negativa de dívidas fiscais, da publicação de editais para conhecimento de terceiros, e prosseguir na lide discutindo o valor da justa indenização. (GASPARINI, 2010, p. 928).

“O direito a levantar 80% do depósito, quando discordar da oferta está consagrado no art. 33, § 2º, do Decreto-lei 3.365.” (MELLO, 2011, p.890).

Assim,

“Para compensar a perda da posse, a lei permite que o expropriado faça o levantamento parcial do depósito feito provisoriamente, ainda que discorde do preço oferecido, ou do arbitrado ou do fixado pelo juiz, podendo levantar até 80% (oitenta por cento) do depósito feito, conforme previsão do art. 33, § 2º, DL 3365, desde que preencha alguns requisitos enumerados no art. 34, do mesmo Decreto. O levantamento do preço será deferido mediante prova de propriedade, quitação de dívidas fiscais que recaiam sobre o bem expropriado e publicação de editais, com o prazo de 10 dias para conhecimento de terceiros.” (MARINELA, 2010, p. 841).

Marinela (2010, p. 841) destaca ainda que “com a imissão na posse, o proprietário ficará totalmente impedido de voltar a usufruir a propriedade, o que também exclui algumas obrigações que eram a ele atribuídas, como por exemplo, o pagamento de IPTU.”

Nota-se, portanto, que é possível que o juiz autorize a imissão do expropriante na posse do bem durante a tramitação do processo, desde que comprovada a urgência e depositado o valor arbitrado, podendo o expropriado levantar integralmente o valor, resolvendo-se a lide, ou, então, levantar 80% (oitenta por cento) do valor depositado e prosseguir discutindo sobre o preço da indenização.

3.2.2  Observações Procedimentais

A citação, conforme ensina Marinela (2010), far-se-á por mandado, na pessoa do proprietário dos bens. Quando não encontrar o citando, mas ciente de que se encontra no território da jurisdição do juízo, o oficial, portador do mandado, marcará desde logo hora certa para a citação. Se a ação não for proposta no foro do domicílio ou da residência do réu, a citação far-se-á por precatória. Sendo o citando desconhecido, ou se estiver em lugar ignorado, incerto ou inacessível, ou, ainda, no estrangeiro, a citação será realizada por edital, circunstâncias essas certificadas por dois oficiais do juízo.

“Quando desconhecido o proprietário, a ação judicial segue normalmente e, mesmo sem contestação, a condenação final deve ser com indenização justa, observada também a devida motivação.” (MARINELA, 2010, p. 842).

Na contestação, o expropriado somente poderá alegar vícios do processo judicial ou impugnação do preço ofertado, conforme estatui o artigo 20 da Lei Geral das Desapropriações.

“Isso ocorre porque o juiz não poderá entrar no mérito da declaração de utilidade pública, necessidade pública ou interesse social.” (PAVIONE, 2012, p. 486).

Meirelles (2011) destaca que:

No processo de desapropriação o Poder Judiciário limitar-se-á ao exame extrínseco e formal do ato expropriatório e, se conforme à lei, dará prosseguimento à ação para admitir o depósito provisório dentro dos critérios legais, conceder a imissão na posse quando for o caso e, a final, fixar a justa indenização e adjudicar o bem ao expropriante. [...] [MEIRELLES, 2011, p. 662).

Dessa forma, o controle jurisdicional na ação de desapropriação incide apenas sobre a fixação do preço e sobre os vícios processuais.

Qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta, que poderá ser tanto uma ação ordinária declaratória de nulidade, como mandado de segurança, se houver lesão a direito individual líquido e certo, como até mesmo ação popular, se se verificarem os pressupostos previstos no artigo 5º, inciso LXXIII, da CF, quais sejam: lesão ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. (DI PIETRO, 2010).

Ao despachar a inicial, o juiz designará um perito de sua livre escolha para proceder à avaliação dos bens, podendo esse perito contar com o apoio de assistentes técnicos apresentados pelo autor e pelo réu. (MARINELA, 2010).

A seguir, será realizada audiência de instrução e julgamento, finda a qual o juiz proferirá sentença fixando o valor do bem e demais parcelas incluídas na indenização.

O juiz indicará na sentença os fatos que motivaram o seu convencimento e deverá atender, especialmente, à estimação dos bens para efeitos fiscais; ao preço de aquisição e interesse que deles aufere o proprietário; à sua situação, estado de conservação e segurança; ao valor venal dos da mesma espécie, nos últimos cinco anos, e à valorização ou depreciação de área remanescente, pertencente ao réu. (PAVIONE, 2012, p. 487).

Da sentença que fixar o preço da indenização caberá apelação com efeito simplesmente devolutivo, quando interposta pelo expropriado, e com ambos os efeitos, quando o for pelo expropriante. (PAVIONE, 2012, p. 487).

Resumindo, pode-se dizer que, em regra, a citação será realizada por mandado. Além disso, na contestação, somente poderá ser discutido vícios do processo e o valor da indenização. Qualquer outra questão deverá ser discutida por meio de ação direta. Da sentença cabe apelação com efeito devolutivo quando interposta pelo expropriado; entretanto, se proposta pelo expropriante, cabe apelação com efeito devolutivo e suspensivo.

3.3   Consumação da Desapropriação

A consumação da desapropriação, ou seja, a transferência da propriedade, se perfaz com o pagamento da justa indenização, quando é admitida a transferência da propriedade para o Estado. (MARINELA, 2010).

“A imissão definitiva na posse, em qualquer hipótese, só se dará após o integral pagamento do preço, conforme o fixado no acordo ou na decisão judicial final, que adjudicará o bem ao expropriante, transferindo-lhe o domínio com todos os seus consectários.” (MEIRELLES, 2011, p. 664).

Mello (2010, p. 895-896) complementa que:

Tendo em vista o texto do art. 5º, XXIV, da Carta Constitucional, que subordina a desapropriação à “prévia e justa indenização...”, desde logo depreende-se que não se pode consumar antes do pagamento da indenização. Em conseqüência, o Poder Público só adquirirá o bem e o particular só o perderá com o pagamento da indenização. Isto só é excepcionado nos casos invulgares em que a Constituição admite desapropriação paga com títulos, desde que o resgate se faça ao longo do tempo (arts. 182, § 4º, III, c/c arts. 185 e 186).

Outrossim, o artigo 29 da Lei Geral das Desapropriações prescreve que: “Efetivado o pagamento ou a consignação, expedir-se-á, em favor do expropriante, o mandado de imissão de posse, valendo a sentença como título hábil para a transcrição no registro de imóveis.”

Nesse ínterim, a desapropriação se consuma com o pagamento integral da indenização, momento em que ocorre a imissão definitiva na posse.

3.4   Desistência da Desapropriação

“A desistência da desapropriação é possível até a incorporação do bem ao patrimônio do expropriante, ou seja, para o móvel, até a tradição, e, para o imóvel, até o trânsito em julgado da sentença ou o registro do título resultante do acordo.” (MEIRELLES, 2011, p. 673).

Gasparini (2010, p. 932) ressalta ainda que só é “[...] possível a desistência se o expropriante assume a responsabilidade por todos os danos que causou e puder devolver o mesmo bem, ou seja, o que recebeu e nas condições em que recebeu.”

“À desistência em tais termos não se pode opor o expropriado, já que não tem direito subjetivo à desapropriação. Este só tem direito a perdas e danos.” (GASPARINI, 2010, p. 933).

“Opera-se a desistência da desapropriação pela revogação do ato expropriatório (decreto ou lei) e devolução do bem expropriado, o que acarreta a invalidação do acordo ou a extinção do processo, se já houver ação ajuizada.” (MEIRELLES, 2011, p. 673).

Nesse sentido, Gasparini (2010) destaca que:

A desistência da desapropriação, que pode ser total ou parcial, opera-se pela revogação ou modificação da declaração expropriatória. Pela revogação há desistência total, enquanto pela modificação há desistência parcial. Ocorrida uma ou outra, peticiona-se junto ao juízo da expropriação a homologação da desistência. Esta, por certo, implica a devolução do valor recebido [...] (GASPARINI, 2010, p. 933).

Além disso, para que ocorra a desistência, é necessária a homologação do juiz. Por sua vez, deve o expropriado devolver a importância recebida pela imissão na posse.

Importante ressaltar que também pode haver a desistência da aquisição do bem na desapropriação indireta, observando, no que couber, as disposições acima expostas. (GASPARINI).

Dessa forma, pode o expropriante desistir de forma total ou parcial da desapropriação, desde que restitua o expropriado o bem tal qual o recebeu, ressarcindo o proprietário de todas as despesas.

3.5    Anulação da Desapropriação

A anulação da desapropriação é obtida mediante ação direta, nas mesmas condições em que a Justiça invalida os demais atos administrativos ilegais. (MEIRELLES, 2011).

Nesse sentido,

A ilegalidade da desapropriação tanto pode ser formal quanto substancial, pois em certos casos resulta da incompetência da autoridade ou da forma do ato, e noutros provém do desvio de finalidade ou da ausência de utilidade pública ou de interesse social, caracterizadora do abuso de poder. Esta, aliás, é a ilegalidade mais comum nas desapropriações. Assim, se, ao invés de utilidade ou necessidade pública ou de interesse social, se deparar na desapropriação motivo de favoritismo ou de perseguição pessoal, interesse particular sobrepondo-se ao interesse da coletividade e qualquer outro desvio de finalidade ou imoralidade administrativa, o ato expropriatório é nulo e deverá ser invalidado pelo Judiciário, por divorciado dos pressupostos constitucionais e legais vinculadores de sua prática. [...] (MEIRELLES, 2011, p. 672).

A ação anulatória da desapropriação prescreve em cinco anos. Todavia, “[...] se, ajuizada temporaneamente, vier a ser julgada posteriormente à incorporação do bem ao patrimônio do expropriante, resolve-se em perdas e danos, nos expressos termos do art. 35 do Dec.-lei 3.365/41.” (MEIRELLES, 2011, p. 672).

Desse modo, a anulação da desapropriação é possível, desde que o faça o expropriado por meio de ação direta, provando que a mesma foi ilegal. Contudo, como já mencionado, uma vez incorporado ao patrimônio público, a ação se resolve em perdas e danos.

3.6   Da Indenização

Como estudado, a forma de indenizar vai depender do fundamento da desapropriação. Em regra, será prévia, justa e em dinheiro nas hipóteses de desapropriação comum ou ordinária que ocorre por necessidade, utilidade e interesse social. Contudo, será através de títulos da dívida agrária no caso de descumprimento da função social da propriedade rural; e, em títulos da dívida pública pela inobservância da função social da propriedade urbana. Também há a desapropriação confiscatória, onde o proprietário não tem direito a qualquer indenização.

Nas palavras de Marinela (2010),

A indenização representa medida de justiça para restabelecer o tratamento isonômico nas medidas de intervenção na propriedade. Considerando que toda sociedade ganha com a aquisição de um novo bem via desapropriação, nada mais justo que essa mesma sociedade arque com o ônus da indenização, com o uso do dinheiro público para pagamento. A orientação decorre dos princípios da isonomia e da justiça distributiva, em que o ônus advindo de um benefício público deve ser suportado por toda a coletividade que recebeu esse benefício. (MARINELA, 2010, p. 843).

Indenização justa é a que cobre não só o valor real e atual dos bens expropriados, à data do pagamento, como, também, os danos emergentes e os lucros cessantes do proprietário, decorrentes do despojamento do seu patrimônio. Se o bem produzia renda, essa renda há de ser computada no preço, porque não será justa a indenização que deixe qualquer desfalque na economia do expropriado. Tudo que compunha seu patrimônio e integrava sua receita há de ser reposto em pecúnia no momento da indenização [...] (MEIRELLES, 2011, p. 665).

Para Mello (2011),

“é aquela que corresponde real e efetivamente ao valor do bem expropriado, ou seja, aquela cuja importância deixe o expropriado absolutamente indene, sem prejuízo algum em seu patrimônio. Indenização justa é a que se consubstancia em importância que habilita o proprietário a adquirir outro bem perfeitamente equivalente e o exime de qualquer detrimento.” (MELLO, 2011, p. 891).

Portanto, para que a indenização seja realmente justa, deve ser composta pelo valor do bem, pelos lucros cessantes e danos emergentes, pelos juros compensatórios e moratórios, pelos honorários advocatícios, pelas despesas processuais e pela correção monetária.

3.6.1  Juros Compensatórios e Moratórios

 

 

A finalidade dos juros moratórios é recompor a perda decorrente do atraso no pagamento da indenização, enquanto a dos juros compensatórios é compensar o proprietário pela perda antecipada da posse do imóvel no caso de imissão provisória na posse ou desapropriação indireta. (PAVIONE).

Juros compensatórios são os devidos pelo expropriante ao expropriado, a título de compensação pela perda antecipada da posse que este haja sofrido. (MELLO, 2010, p. 892).

A Súmula nº 164 de STF prevê que: “No processo de desapropriação, são devidos juros compensatórios desde a antecipada imissão de posse, ordenada pelo juiz, por motivo de urgência.”

Nesse sentido, é a Súmula nº 69 do STJ: “Na desapropriação direta, os juros compensatórios são devidos desde a antecipada imissão na posse e, na desapropriação indireta, a partir da efetiva ocupação do imóvel.”

Sobre a alíquota dos juros compensatórios, a Súmula nº 618 do STF preconiza que: “Na desapropriação, direta ou indireta, a taxa dos juros compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano.”

Portanto, os juros compensatórios possuem uma alíquota de 12% (doze por cento) ao ano, incidindo sobre a diferença entre 80% do preço ofertado e o valor fixado na sentença ou o valor da indenização, em caso de desapropriação indireta. Estes são devidos desde a ocupação do bem, ou seja, desde a imissão provisória na posse ou do apossamento administrativo.

Sobre os juros moratórios, Mello ensina que “[...] são os devidos pelo Poder Público ao expropriado pela demora no pagamento do valor da indenização.” (MELLO, 2010, p. 892).

A alíquota dos juros moratórios é de 6% ao ano sobre o valor da indenização fixada na decisão final de mérito. (PAVIONE)

Conforme ensina o art. 15-B do Decreto-lei 3.365/41, estes se destinam a recompor a perda decorrente do atraso no efetivo pagamento da indenização fixada na decisão final de mérito, e somente serão devidos à razão de até seis por cento ao ano, a partir de 1o de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do art. 100 da Constituição.

Por fim, urge destacar que, conforme entendimento da Súmula nº 12 da STJ, “Em desapropriação, são cumuláveis juros compensatórios e moratórios.”

Esses juros são cumuláveis, porque se destinam a indenizações diferentes: os compensatórios cobrem lucros cessantes pela ocupação do bem; os moratórios destinam-se a cobrir a renda do dinheiro não pago no devido tempo. (MEIRELLES, 2011, p. 666).

Assim, os juros compensatórios têm o condão de compensar o expropriado pela perda antecipada da posse no caso de imissão provisória, sendo que sua alíquota é de 12% (doze por cento) ao ano. Já os juros moratórios são aqueles devidos pelo atraso no pagamento da indenização e sua alíquota é de 6% (seis por cento) ao ano. Como visto, estes dois juros podem ser cumulados.

3.6.2  Honorários Advocatícios

   

 

Conforme o disposto no art. 27 do Decreto-lei 3.365/41:

A sentença que fixar o valor da indenização quando este for superior ao preço oferecido condenará o desapropriante a pagar honorários do advogado, que serão fixados entre meio e cinco por cento do valor da diferença, observado o disposto no § 4o do art. 20 do Código de Processo Civil, não podendo os honorários ultrapassar R$ 151.000,00 (cento e cinqüenta e um mil reais).

Nesse sentido, a Súmula nº 617 do STF estabelece que: “A base de cálculo dos honorários de advogado em desapropriação é a diferença entre a oferta e a indenização, corrigidas ambas monetariamente.”

Da mesma forma, Mello (2011) ensina que:

Sendo a Fazenda condenada a pagar valor superior ao oferecido, são devidos honorários advocatícios. Se assim não fora, o expropriado teria que suportar um desfalque patrimonial proveniente das despesas com seu patrono e, em conseqüência, a indenização deixaria de ser “justa”, por não cobrir os ônus diretamente acarretados pela desapropriação. (MELLO, 2011, p. 894).

Marinela (2010) ainda ressalta que:

“Os honorários advocatícios incidirão sobre a diferença entre o valor fixado na sentença, e o ofertado pelo expropriante no início do processo, o que é diferente das demais ações judiciais em que o percentual incide sobre o valor total da condenação. A regra ocorre dessa maneira considerando que a conquista do advogado está no que foi obtido na decisão judicial, vez que o valor inicial o Estado já o tinha dado desde a via administrativa.” (MARINELA, 2010, p. 847-848).

No caso de sucumbência recíproca, os honorários advocatícios devem ser compensados, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo sem excluir a legitimidade da própria parte (Súmula nº 306 do STJ).

Assim, o valor dos honorários advocatícios incide sobre a diferença entre o preço oferecido pelo expropriante e o valor fixado na sentença, sendo que, se houver sucumbência recíproca, compensa-se os honorários.

 

 

3.6.3  Benfeitorias 

 

      

Como já estudado, “[...] às benfeitorias devem ser pagas somando-se todas as preexistentes por ocasião da decretação; após esse momento, só devem ser incluídas as benfeitorias necessárias e as benfeitorias úteis previamente autorizadas, ficando excluídas as de mero deleite, as voluptuárias.” (MARINELA, 2010, p. 844).

Nesse sentido, Di Pietro ensina que as benfeitorias que já existiam no imóvel antes do ato expropriatório são indenizáveis. Quanto às benfeitorias feitas posteriormente, serão pagas as benfeitorias necessárias; as úteis, somente se realizadas com autorização do expropriante. A respeito das construções feitas posteriormente, não são incluídas no valor da indenização, conforme Súmula nº 23 do STF.

Conclui-se, portanto, que as benfeitorias já existentes ao tempo da declaração declaratória são todas indenizáveis. Quanto às benfeitorias posteriores ao ato, são indenizáveis as necessárias; as úteis desde que tenham sido autorizadas; e as voluptuárias não o serão nunca.

3.6.4  Correção Monetária

De acordo com o artigo 26 § 2º do Decreto-lei 3.365/41, “Cabe correção monetária do valor da indenização quando transcorra mais de um ano, contado a partir do laudo de avaliação do bem, antes do efetivo pagamento dela.”

Da mesma forma, a Súmula nº 561 do STF dispõe que: “Em  desapropriação, é devida a correção monetária até a data do efetivo pagamento da indenização, devendo proceder-se à atualização do cálculo, ainda que por mais de uma vez.”

Portanto, decorridos mais de um ano entre o laudo de avaliação do bem e o efetivo pagamento da indenização, cabe correção monetária do valor da indenização.

3.6.5  Forma de Pagamento

 

 

O pagamento da indenização expropriatória faz-se na forma do acordo, ou nos termos do julgado em execução. (MEIRELLES, 2011, p. 670).

Se houver acordo, Marinela (2010) destaca que:

“Na via administrativa, existindo acordo, é possível que a desapropriação se consuma, sendo, nesse caso, a indenização paga diretamente. Reduz-se a termo o acordo e serão tomadas as providências para o pagamento. Não se utiliza nesse caso o regime de precatório.” (MARINELA, 2010, p. 848).

Todavia,

“Quando a forma amigável não for possível, os valores definidos pelo Estado desde o início do processo serão pagos em dinheiro e levantados pelo expropriado ao final do processo, exceto nos casos de imissão provisória em que há antecipação das providências. Ressalte-se, entretanto, que os valores conquistados na sentença são resultados de débitos judiciais e devem ser pagos pelo regime de precatório.” (MARINELA, 2010, p. 848).

Desse modo, em havendo acordo, a indenização será paga diretamente ao expropriado. Entretanto, caso o acordo não seja possível, o pagamento da indenização será realizado ao final do processo, salvo se houver imissão provisória na posse.

3.7   O Instituto da Retrocessão

Por derradeiro, imperioso abordar sobre o instituto da retrocessão, caracterizado como: “[...] o direito que tem o expropriado de exigir de volta o seu imóvel caso o mesmo não tenha o destino pra que se desapropriou.” (DI PIETRO, 2010, p. 185).

Pavione (2012, p. 488) assim o conceitua: “é o direito de o expropriado reaver o bem desapropriado que não tiver sido utilizado ou tiver sido empregado em finalidade diversa da que foi inicialmente prevista [...]”.

Frise-se que a retrocessão somente é possível em caso de desvio de poder, onde a utilização do imóvel não atingiu um interesse público, também chamado de tredestinação ilícita.

Não se deve confundir a retrocessão com a tredestinação lícita. Esta última não enseja o direito de retrocessão, uma vez que embora o expropriante dê destinação pública diversa daquela mencionada no ato expropriatório, o imóvel foi utilizado para um fim público. (DI PIETRO, 2010).

“O direito de retrocessão deve ser utilizado pelo expropriado dentro de cinco anos contados do momento em que o expropriante deixa de utilizá-lo numa finalidade pública ou demonstra essa intenção.” (GASPARINI, 2010, p. 905)

Em síntese conclusiva, a retrocessão é o direito que tem o particular de exigir de volta o seu bem caso o expropriante não o dê a finalidade que motivou a desapropriação. Entretanto, a alteração específica da finalidade da desapropriação não enseja a retrocessão se sua destinação tiver as finalidades de necessidade pública, utilidade pública e interesse social. Nesse último caso, cabe ao expropriado pleitear o direito a uma indenização.

 

 

Considerações Finais

 

 

Pela exposição inserta no presente TCC, é possível concluir que a intervenção do Estado na propriedade privada é necessária tendo em vista o princípio da função social da propriedade bem como o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular.

Sobre as diversas modalidades de intervenção, se destaca a desapropriação, forma mais drástica de intervenção e tema de estudo deste trabalho.

O instituto da desapropriação consiste em um procedimento administrativo, onde o Poder Público, ou quem lhe faça às vezes, retira compulsoriamente a propriedade do particular.

Dentre as características da desapropriação, importante citar a forma originária de aquisição da propriedade, ou seja, o bem é transferido para o domínio do poder expropriante desacompanhada de qualquer nexo com a relação anterior.

Pode ser objeto de desapropriação bens móveis e imóveis, corpóreos e incorpóreos, públicos e privados, o espaço aéreo e o subsolo. Contudo, não podem ser expropriados os bens e direitos personalíssimos e aqueles encontrados facilmente no mercado.

Para que haja a desapropriação de bens públicos, deve-se observar a hierarquia funcional, ou seja, o ente político de maior ordem pode desapropriar o de menor ordem. Além disso, é necessária autorização legislativa.

Sobre a competência legislativa, esta é privativa da União. Já a competência declaratória e executória é concorrente dos entes políticos.

Quanto as espécies de desapropriação, têm-se a desapropriação ordinária, a extraordinária e a confiscatória.

A desapropriação ordinária, comum ou geral se fundamenta na necessidade pública, na utilidade pública ou no interesse social.

Já a desapropriação extraordinária ou sancionatória se divide em urbana ou rural. A desapropriação urbana ou para fins de urbanização ocorre quando o proprietário não promove o adequado aproveitamento do solo urbano ou após o decurso de cinco anos de cobrança de IPTU progressivo sem que o proprietário tenha cumprido a obrigação de parcelamento, edificação ou utilização compulsórios. Por outro lado, a desapropriação rural ou para fins de reforma agrária se configura quando o proprietário não cumpre sua função social, sendo que tal área será destinada à reforma agrária, salvo a pequena e a média propriedade rural e a propriedade produtiva.

Sobre a desapropriação confiscatória, esta ocorre no caso de plantação de psicotrópicos proibidos e em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, sendo que, no primeiro caso, as áreas expropriadas serão destinadas ao assentamento de colonos e, no segundo, os bens apreendidos serão revertidos para instituições especializadas na recuperação de viciados.

Urge citar também casos especiais de desapropriação, como a desapropriação indireta e a desapropriação por zona.

Na desapropriação indireta há a retirada do bem das mãos do particular sem a observância do devido processo legal e sem que haja a justa indenização. Trata-se de uma forma de esbulho que pode ser impedida por meio de ação possessória. Contudo, se o Poder Público já tiver dado uma destinação pública ao bem, restará ao proprietário ajuizar uma Ação de Desapropriação Indireta, pleiteando perdas e danos.

Por sua vez, a desapropriação por zona ou extensiva consiste na ampliação da área a ser desapropriada por ter havido supervalorização em razão da obra ou serviço público, com o intuito de utilizá-la futuramente ou revendê-la.

Em regra, a indenização será prévia, justa e em dinheiro. Contudo, será paga através de títulos da dívida pública resgatáveis em até dez anos no caso de desapropriação extraordinária urbana; e, em títulos da dívida agrária resgatáveis em até vinte anos se decorrente da desapropriação extraordinária rural. Por último, na desapropriação confiscatória, o proprietário não terá direito a qualquer indenização. Trata-se de confisco.

Em relação ao procedimento expropriatório, este pode ser administrativo ou judicial.

O procedimento administrativo é aquele amigável, onde as partes acordam quanto ao valor da indenização. Se divide em uma fase declaratória, em que o Estado declara o seu interesse no bem; e, em uma fase executória, onde há a efetiva retirada do bem e o pagamento da indenização.

O procedimento judicial tem lugar quando não há acordo quanto ao preço a ser pago pelo bem ou sendo desconhecido o seu proprietário.

A ação de desapropriação deve ser proposta no foro do domicílio do bem. Além disso, observar-se-á o procedimento especial previsto no Decreto-lei nº 3.365/41.

É possível que o juiz autorize a imissão provisória na posse, desde que o poder expropriante comprove urgência e deposite o valor arbitrado, podendo o expropriado levantar integralmente o valor, resolvendo-se a lide, ou, levantar 80% (oitenta por cento) do valor depositado e prosseguir discutir o preço da indenização.

Na contestação, somente poderá ser alegado vícios do processo ou o valor da indenização. Qualquer outra questão deverá ser discutida por meio de ação própria.

A desapropriação se consuma com o pagamento integral da indenização, momento em que ocorre a imissão definitiva na posse.

Para que a indenização seja justa, deve englobar o valor do bem, lucros cessantes e danos emergentes, juros compensatórios e moratórios, honorários advocatícios, despesas processuais e correção monetária. Em havendo acordo, ela será paga diretamente ao expropriado. Entretanto, se o acordo não for possível, o pagamento da indenização será realizado ao final do processo, salvo no caso de imissão provisória na posse.

Por fim, importante mencionar sobre o instituto da retrocessão, que se caracteriza pelo direito que tem o particular de exigir de volta seu bem caso o expropriante não dê a ele a finalidade que motivou a desapropriação. Contudo, o particular apenas terá direito a uma indenização se a desapropriação, embora alterada sua finalidade específica, se destinar a necessidade pública, utilidade pública ou ao interesse social.

Assim, diante de todo o exposto, conclui-se que o instituto da desapropriação no direito público é de suma importância no contexto atual, sempre levando-se em conta as exigências coletivas e o bem-estar social.

 

 

 

 

 

 

Referências Bibliográficas

 

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