DELAÇÃO PREMIADA E SUA VIABILIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO Laryssa Vicente Kretchetoff Barbosa 1- CONCEITO DE DELAÇÃO PREMIADA A delação premiada, também chamada de colaboração espontânea por parte da doutrina, consiste no instituto de Direito Penal que visa estimular com a concessão de um prêmio, a resolução de crimes, através da colaboração espontânea de denunciado ou acusado, que revele o tramite criminoso, assim como, os coautores, atendendo as especificidades da legislação pertinente. Nesse sentido significa uma expressão que significa troca de favores, entre o juiz e o réu. Caso o réu colabore fornecendo informações importantes que ajudem a resolver o crime, o juiz pode reduzir a pena quando for julgado. O doutrinador Renato Brasileiro de Lima conceitua a delação como uma possibilidade do partícipe ou coautor obter a redução da sua pena, ou de tê-la substituída por restritivas de direitos, ou ainda, de não ser processado ou ter sua pena extinta, devido a sua colaboração, denunciando coautores e resultando na descoberta de toda trama delituosa, assim como outros resultados pertinentes a cada crime. Consoante conceitua Nucci, a delação premiada: “(...) significa a possibilidade de se reduzir a pena do criminoso que entregar o(s) comparsa(s). É o ‘dedurismo’ oficializado, que, apesar de moralmente criticável, deve ser incentivado em face do aumento contínuo do crime organizado. É um mal necessário, pois trata-se da forma mais eficaz de se quebrar a espinha dorsal das quadrilhas, permitindo que um de seus membros possa se arrepender, entregando a atividade dos demais e proporcionando ao Estado resultados positivos no combate à criminalidade.” Desse modo, concluímos que quando o indiciado imputar a autoria do crime a um terceiro, coautor ou partícipe com a possibilidade de mostrar a sua ocorrência quando o sujeito está sendo investigado ou processado, de forma voluntária, fornece informações às autoridades no que diz respeito das práticas delituosas promovidas pelo grupo criminoso, permitindo a localização da vítima ou a recuperação do produto do crime. Configuramos o titulo de indiciado o delator em virtude de o instituto da delação se constituir durante a fase de inquérito policial ou na fase processual. Usualmente é comum ocorrer na fase inquisitiva, devido o delator ser mais útil, sendo capaz de fornecer ao órgão acusador mais elementos da materialidade e da autoria do crime para consubstanciar a denúncia. 2- NATUREZA JURÍDICA De acordo com Valdir Sznick trata a delação como um prêmio, concedido pela colaboração. Para o autor, é uma medida de política criminal, já que interessa ao Estado, que o criminoso interrompa sua ação delituosa e, de outro, a descoberta de crimes e organizações que se dedicam a ele. Renato Brasileiro de Lima afirma que a natureza jurídica da delação ocorre no âmbito do Direito Penal e no Direito Processual Penal. Do ponto de vista do Direito Penal, a delação premiada “ora funciona como causa extintiva da punibilidade, causa de diminuição de pena, ora como causa de fixação de regime inicial aberto ou de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos”. No que se refere ao Direito Processual Penal, o autor já mencionado entende que configura meio de obtenção de prova, afinal, através do acordo de cooperação, o acusado presta auxílio aos órgãos oficiais de persecução penal na obtenção de fontes materiais de prova. Entretanto devemos ressaltar a inadequação das alegações de ofensa a ampla defesa e ao contraditório, visto que a delação configura um caminho para se atingir a prova, de forma que não é um elemento capaz de, exclusivamente, condenar alguém. Desse modo concluímos que a delação premiada se perfaz num acordo entre o Ministério Público e o acusado, onde este recebe uma vantagem em troca das informações que fornecerá. Quanto mais informação for concedida pelo delator será maior o beneficio que será lhe proporcionado. Sendo assim, a natureza jurídica da delação premiada variará de acordo com a situação do caso concreto, podendo ser uma causa de diminuição de pena, que incide na terceira etapa do sistema trifásico de aplicação da pena, podendo até ser uma causa de extinção da punibilidade, quando resultar em perdão judicial, conforme o artigo 13 da Lei 9.807/99: “Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a conseqüente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado: I - a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa; II - a localização da vítima com a sua integridade física preservada; III - a recuperação total ou parcial do produto do crime. Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.” A delação premiada também tem viés processual, pois pode constituir como meio de prova na instrução processual penal. A delação não deverá pode servir como prova absoluta contra aquele que está sendo delatado. Apenas servirá indicando a materialidade e a autoria do crime, devendo o processo ser instruído com outras provas que corroborem as informações apresentadas pelo delator. 3- HISTORIDADE Na Itália figurou um exemplo do direito de emergência necessário ao combate, inicialmente à máfia. De acordo com Luiz Flavio Gomes , as principais alterações legais, que no princípio eram excepcionais, foram incorporadas ao Código de Processo Penal. Dentre as medidas adotadas, está o direito premial. Além da Itália, outros países também adotaram o acordo de cooperação como medida de apoio ao combate ao crime organizado, máfia e terrorismo, como os Estados Unidos, Espanha, dentre outros. O instituto da delação premiada foi trazido ao Brasil com inspiração na legislação italiana, que prevê a delação como forma de aumentar a eficácia do aparato estatal no combate à criminalidade, quando se vislumbra uma situação de criminalidade organizada, caso das famosas máfias daquele país. 4- DELAÇÃO PREMIADA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO A regulamentação do Sistema de Proteção a vítimas e testemunhas que regulamentava a delação premiada era somente aplicada esse instituto nas leis especiais que tinha previsão, isso foi antes da edição da Lei 9.807/99. Entretanto, com o surgimento da norma, o beneficio daquele que delata e ajuda a justiça foi estendido a todos os tipos penais. Por mais que parte minoritária da doutrina defender que a Lei 9.807/99 foi editada com o foco do tipo penal previsto no artigo 159 do Código Penal, a maioria da doutrina tem o entendimento de que a aplicação da delação premiada passou a ser geral e irrestrita, devido a esse instrumento normativo não especificar expressamente quais tipos penais estaria destinado. Com a entrada da Lei nº 9.807/99 em vigor a aplicação do instituto da delação premiada não está limitada a tipos penais específicos. Essa ampliação foi necessária, sendo que não faz sentido o benefício ser restrito somente a alguns delitos quando a razão desse instituto é proporcionar ao Estado uma aplicabilidade melhor da lei penal, facilitando a persecução penal. Podemos confirmar esse posicionamento com os ensinamentos do doutrinador Rogério Greco, ao tratar da possibilidade de concessão do perdão judicial, prevista no artigo 13 da Lei 9.807/99, decorrente da delação premiada: “Pela redação do mencionado artigo 13, tudo indica que a lei teve em mira o delito de extorsão mediante sequestro, previsto no art. 159 do Código Penal, uma vez que todos os seus incisos a ele se parecem amoldar. Contudo, vozes abalizadas em nossa doutrina já se levantaram no sentido de afirmar que, na verdade, a lei não limitou a sua aplicação ao crime de extorsão mediante sequestro, podendo o perdão judicial ser concedido não somente nesta, mas em qualquer outra infração penal, cujos requisitos elencados pelo artigo 13 da Lei nº 9.807/99 possam ser preenchidos.” A aplicação do instituto da delação premiada não só facilita o trabalho das autoridades policiais e a instrução probatória, mas também tem potencial para ter celeridade na solução do litigio. Quando o Estado utiliza aplicando esse instituto no seu ordenamento não está dizendo que é ineficaz na persecução penal, na investigação da autoria e do fato delitivo, mas com certeza o Estado esta aprimorando os instrumentos capazes de alcançar com celeridade e da melhor forma possível à verdade real do fato. Os efeitos positivos que esse instituto fornece não somente abrange ao acusado, mas também se destina efeitos a sociedade no que se refere a real e efetiva punibilidade dos agentes e no combate a criminalidade. Devido a isso é que a utilização da delação premiada em qualquer delito, sem restrição é importante. Concluímos que não há razão para limitar a aplicação do instituto da delação premiada, a Lei 9.807/99 veio atender a necessidade do ordenamento jurídico em relação a punibilidade dos agentes, tornando legal a posição doutrinária que entende ser possível a extensão dos efeitos da delação premiada a todos os tipos penais. 5- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ALENCAR, Rosmar Antonni; TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 3ª Ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2009. CARVALHO, Salo de; LIMA, Camile Eltz de. Delação premiada e Confissão: Filtros constitucionais e adequação sistemática. Disponível em: http://msmidia.profissional.ws/awsc/artigos/05.PDF. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 18ª Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011. CAVALCANTI, Fernando da Cunha. A delação premiada e sua (in)conformidade com a Constituição Federal. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 87, 01/04/2011. Disponível em http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9380. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 12ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2010. JESUS, Damásio E. de. Estágio atual da "delação premiada" no Direito Penal brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 854, 4 nov. 2005. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/7551. MELLO, Ricardo de Freitas. Delação premiada: Do aspecto jurídico a sua eficácia. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 51, 31/03/2008 [Internet]. Disponível em http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=4661. MOREIRA FILHO, Agnaldo Simões. Delação premiada – Breves considerações. Disponível em: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/3902/Delacao-premiada-Breves-consideracoes. LESCANO, Mariana Doernte. A delação premiada e sua (in)validade à luz dos princípios constitucionais. 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