As ciências tem um dado metafísico subestimado por nós. Embora seus objetos de estudos sejam progressivamente delimitados em prol da objetividade de suas pesquisas, de tal forma que antes havia o médico e hoje há o pediatra, o cirurgião, o cirurgião pediatra, etc; a ciência não é exata em sua totalidade.

Em nós é incutido o que se conhece por cientificismo, que é a crença na infalibilidade das ciências. Desde cedo aprendemos a tomar a ciência como sólida base de tudo, e não desconfiamos de que algo na ciências de nossa época possa ter bases não tão sólidas quanto pensamos. A experiência sensível primeiramente nos concede a veracidade dessa ingênua observação nossa. Ora, se estou doente, vou ao médico e me curo, é porque a ciência do médico deve estar correta. Quando sofremos novamente dessa doença, antes mesmo de novamente passarmos ao médico, já iniciamos o tratamento com a medicação prescrita d'antes, daquela primeira vez em que adoecemos.

Sem saber, nós estamos adotando uma postura de clausura e redução quanto a ciência, que é mais profunda e mais subjetiva do que o que a nossa mera observação sensível pode reconhecer.

Analisando a filosofia entendemos que desde a época pré-socrática houve uma busca pela causa primeira, aquele princípio do qual precederiam todas as coisas e inclusive o conhecimento. Tal princípio foi nomeado pelos gregos como Arché.

Pois bem, se a Arché houvesse sido encontrada não existiria mais a filosofia e a metafísica teria desaparecido. Entretanto o estudo dessa disciplina é desenvolvido pelos pensadores modernos. Uma vez que a filosofia jamais termina. A filosofia se reconstrói com cada interpretação (hermenêutica) nova, mesmo que sobre os velhos assuntos. Séculos se passaram de Platão a Kant sem que a filosofia atingisse uma resposta para as questões como "o que é o ser?" e "qual é a causa primeira de todas as coisas?".

Dito isto, afirmo que essa capacidade de reformulação e desenvolvimento da filosofia é comum as ciências. Se a ciência já houvesse explicado todas as questões sobre tudo, não existiria mais a ciência. A diferença, é que para o filósofo é evidente e natural a compreensão do movimento conceitual dentro da filosofia. Nada é perene, nenhuma corrente filosófica poderá atingir a qualidade de "resposta última" a todas as questões da filosofia. Para o cientista, e aí existem cientistas e cientistas, a ciência pode ser para um exata, de uma forma que tudo o que já foi respondido é estático e verdadeiro, como por exemplo, de que a luz possuí a maior velocidade do universo, e que não existe nada mais veloz do que a luz. Não existe e nem vai existir. E há o cientista que, já com bom senso, sabe que até onde a ciência chegou e se não houveram enganos, a velocidade da luz é, até o momento, a maior do universo. Isto quanto ao que já supostamente já fora respondido pela ciência, quanto ao novo, a ciência é cética, no sentido em que antes de haver uma profunda e exaustiva investigação, sob diversos métodos e rigores, o que se sabe de ante-mão é que algo pode ser assim, como pode não ser assim.

Para a ciência e para a filosofia, e desconfio que para tudo o que é conhecimento, não há, no sentido absolutizante do termo, o erro propriamente dito. O que há são verdades sazonais. Em determinada época, determinada teoria se enquadrava como a mais avançada e convincente, e em uma outra época, está obsoleta.

Por mais que o empirismo possa fornecer certeza de algo, jamais poderá afirmar que o método científico para averiguar esta certeza é infalível, visto que seria necessário prever o futuro da própria ciência para se ter certeza de que o método utilizado na comprovação de determinado é infalível, tanto quanto aos seus predecessores, quanto aos seus sucessores. O empirismo compreende que a grama é verde, aqui, em Paris e em Madagascar, e em um estudo descobriu-se que a grama é verde por causa do elemento clorofila, que é um pigmento que reflete uma luz de determinada cor que nós universalmente reconhecemos e nomeamos como verde. Isto nos responde a questão sobre o porque a grama é verde hoje. Como poderemos afirmar que em um futuro, uma nova técnica, com novas ferramentas, e com novas teorias não vá descobrir que, na realidade, a grama não é verde por causa do seu elemento clorofila, mas por causa de um outro fator? E posteriormente uma outro instrumental científico desminta a verdade deste outro fator?

O certo é que, por mais segurança que nos cause a ciência, e que efetivamente ela funciona, não podemos esquecer de destacar que ela funciona hoje. Funcionou esse ano, funciona na nossa geração, funcionará neste século; porém não há meios de se afirmar que funcionará para sempre. De que nós, o mundo, a natureza não vai mudar, de que novas teorias mais convincentes vão surgir, novos campos, novas áreas, e porque não, novos objetos de estudo.

Esta exposição não se deu ao acaso, o filósofo Brechelard que também se preocupava com a questão da ciência, em seu texto A filosofia do não, diz:

Existe pois, pelo menos, uma rotura na objetividade e é por isso que temos razões para dizer que a experiência nas ciências físicas têm um além, uma transcendência, que ela não está fechada sobre si própria. Portanto o racionalismo que informa esta experiência deve aceitar uma abertura correlativa desta transcendência empírica.1

Conluímos que Darwin não errou, e jamais estará errado. Sua teoria acerta da evolução das espécies foi verdade enquanto duraram as teorias científicas que o serviram de base, e na medida em que seus estudos tiveram um impacto efetivamente bom para o avanço da compreensão – ainda que incompleta, mas ainda sim, um avanço – acerca do mundo físico que nos rodeia.

O que tornou a teoria de Darwin insatisfatória e causou furor e polêmica no mundo, tanto nos debates sérios das revistas científicas como no tablóide popular sensacionalista, configura-se como um novo desafio, tanto para a ciência, quanto para a filosofia. A ciência tem agarrado com unhas, dentes, e jalecos as novas descobertas, o DNA, a quântica, estão buscando uma nova resposta àquilo que parecia encerrado, e a filosofia têm o desafio ético de restaurar ou reformar, como sempre fez, a racionalidade e iluminar conceitualmente a sempre escura estrada do que é novo. Brindes ao DNA, brindes a bioética. Ciência e filosofia são complementares!

1 BRECHELARD, Gaston; A filosofia do Não. P.7. 1978. Abril Cultural.