Natália Santos Bonfim

Resumo: Este artigo objetiva analisar as diversas hipóteses de prazos prescricionais a serem aplicados na ação indenizatória por dano moral na Justiça do Trabalho. Para tanto, ressalta-se, primeiro, a análise do instituto do dano moral em sua essência, o seu conceito a difícil estipulação da reparação adequada para o dano moral, tendo-se em vista, sempre, o princípio da razoabilidade, onde, por fim, se verifica a comparação deste instituto com o dano material. Em seguida, será ponderada a competência para processar tal demanda. Depois, passa-se a analisar as diversas correntes existentes acerca do prazo prescricional a ser aplicado. A divergência existente é de cunho teórico, haja vista que não há entendimento pacificado na doutrina, que, em verdade, se divide em três posicionamentos: a prescrição cível, a prescrição trabalhista e a imprescritibilidade da pretensão.

Palavras-chave: dano moral; competência da Justiça do Trabalho; prazo prescricional; direito do trabalho.

Sumário: 1 INTRODUÇÃO. 2 CONCEITO DE DANO MORAL. 2.1 DANO MORAL X DANO PATRIMONIAL. 2.2 QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL. 3 FORO COMPETENTE PARA APRECIAR AS DEMANDAS DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL DECORRENTE DA RELAÇÃO DE TRABALHO. 4 PRAZO PRESCRICIONAL DA AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO. 4.1 A PRESCRIÇÃO DO DANO MORAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO. 4.2 DIFERENTES PERSPECTIVAS 4.1.1 Prescrição cível 4.1.2 Regras de transição 4.1.3 Imprescritibilidade da pretensão 4.1.4 Prescrição trabalhista 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

1 INTRODUÇÃO

O direito brasileiro, desde a sua primeira codificação, está em constante evolução, para regular as relações interpessoais e do indivíduo com o Estado em prol do bem estar da sociedade. Logo, o instituto do dano não poderia ficar alheio ou à margem dessa evolução científica.

Dogmaticamente, o dano pode ser classificado como moral ou material. A primeira classificação, parte do objeto deste artigo, é o que atinge a honorabilidade, o crédito, o bom nome profissional, o conceito social, resultando dor profunda e grande tristeza. É o atentado contra a individualidade, a personalidade, a dignidade e o respeito de que é merecedor a vítima; seria o sofrimento humano causado pelo ilícito, ferindo valores íntimos da pessoa e sua personalidade.

Já o dano material, consiste em todos os prejuízos causados pela ilegalidade praticada e que tiveram repercussão patrimonial, ou seja, a extensão do dano pode ser calculada pelo valor monetário perdido.

Inicialmente, quando havia a necessidade da reparação do dano moral a ação deveria ser processada na Justiça Comum, independendo da qualificação das partes, ou seja, por mais que o dano moral adentrasse na esfera trabalhista, seu julgamento seria de competência da justiça comum.

Porém, com o advento da Emenda Constitucional (EC) nº 45, foi ampliada a competência material da Justiça do Trabalho, inclusive para processar e julgar ações de reparação por dano moral nas relações de trabalho, objeto desta monografia (art. 114, inciso VI, CF/1988).

Na justiça comum, a matéria era tratada sob as regras jurídicas atinentes à responsabilidade civil, solucionando-se as questões prescricionais com a aplicação do Direito Civil. Agora, no âmbito da Justiça do Trabalho, surgem discussões acerca da natura civil ou trabalhista dos danos morais e conseqüentemente, das regras prescricionais a serem aplicadas. Eis que surge o problema norteador deste artigo: Qual o prazo prescricional nas ações de reparação por dano moral na Justiça do Trabalho?

A prescrição, que está diretamente relacionada ao tempo, considerando o interesse da sociedade em tornar pacíficas determinadas situações que se estendem por tempo indeterminado, consuma-se se alguém deixa de reclamar ou postular determinado direito durante certo lapso de tempo; decorrido o prazo estabelecido em lei, o direito torna-se inexigível.

A divergência existente não se restringiu à jurisprudência, sendo também de cunho teórico, haja vista que não há entendimento pacificado na doutrina, que, em verdade, se divide em três posicionamentos.

Uma corrente entende que o prazo prescricional a ser aplicado é o previsto no art. 7º, inciso XXIX, da CF/1988 sempre, por tratar-se de genuíno crédito trabalhista em qualquer situação, inclusive nas lides sobre acidente de trabalho. Torna-se válido observar que o Tribunal Superior do Trabalho (TST) vem se firmando no sentido de aplicar o supracitado prazo trabalhista.

Por sua vez, a segunda corrente acredita que o prazo é o estabelecido no Código Civil de 2002 (CC/2002), pois se trata de ação de reparação de dano decorrente de ato ilícito, ou seja, baseada na responsabilidade civil (art. 206, § 3o, inciso V do Novo Código Civil).

No entanto, sob a égide do Código Civil de 1916 (CC/1916), o prazo prescricional seria de 20 anos (art. 177), a depender do lapso temporal decorrido até a vigência do Novo Código Civil que estabelece a seguinte regra de transição: "Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada".

Uma parcela minoritária desta corrente acredita que o prazo prescricional a ser aplicado deve ser o do Código Civil, fundamentam que esta ação não tem natureza trabalhista e nem civil, mas sim pessoal, e como inexiste dispositivo legal regulando de outra forma o prazo de prescrição para as pretensões decorrentes dos danos à pessoa, por eliminação utiliza-se o prazo geral de 10 anos, como previsto no artigo 205 do Novo Código Civil.

Outro argumento contra a classificação da reparação por danos morais decorrentes da relação de trabalho como simples crédito trabalhista é que este direito está assegurado a todo cidadão, nos termos do art. 5º, inciso X, da Carta Magna. Ou seja, trata-se de direito que vai além da relação de trabalho, de forma que parece impróprio qualificar tal direito como trabalhista.

A escolha de um prazo prescricional único traria como a maior beneficiada a sociedade, posto que a mesma é basicamente formada pelos dois pólos que integram as lides trabalhistas, sendo assim diretamente afetada.

Por fim, e não menos importante, identifica-se o interesse pessoal sobre o tema, pois a autora tem a intenção de se dedicar à magistratura trabalhista, de modo que terá contato, seguramente, com diversos litígios que envolverão a discussão sobre diversos aspectos abordados neste trabalho.

No que tange aos objetivos deste trabalho, o enfoque principal é identificar as diferentes correntes a respeito do prazo prescricional a que estão sujeitas as ações que pleiteiam reparação por dano moral na Justiça do Trabalho, trazendo argumentos para identificação de que a prescrição civil seria a mais adequada.

E para um maior detalhamento do tema é necessário executar os seguintes objetivos específicos: a) investigar os principais conceitos, classificações e naturezas jurídicas dos institutos atinentes ao tema, tais como dano moral e prescrição; b) investigar o problema sob a ótica doutrinária e jurisprudencial no Brasil.

Ao final a autora apresentará sua posição, adotando a tese que melhor se harmoniza com a natureza jurídica do instituto do dano moral, qual seja, a da prescrição civil, pois acredita ser a mais acertada. Adianta-se que, à primeira vista, a corrente defendida não integra a doutrina majoritária.

2 CONCEITO DE DANO MORAL

A priori, é necessário expor os significados de "dano" e "moral" separadamente, para então compreender o significado da expressão "dano moral".

Dano, na visão de Gardênia Borges Moraes (2003, p.26) é caracterizado de forma mais restrita, quando entendido como o "prejuízo experimentado por alguém, em decorrência da ação ou omissão de outrem, em seu patrimônio material ou em sua personalidade (...)".

Já Sérgio Cavalieri Filho (2007, p. 71) conceitua o dano como sendo "a subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial, quer se trate de um bem integrante da própria personalidade da vítima (...)".

É relevante também trazer o posicionamento de Arnaldo Rizzardo (2005, p.15), quando descreve o dano como "um comportamento contrário ao jurídico. A nota da antijuridicidade o caracteriza, de modo geral. Mas não emana, necessariamente, de um desrespeito à lei ou de uma conduta antijurídica".

Por sua vez, a moral é entendida gramaticalmente, segundo Aurélio Buarque de Holanda (1993, p.371) como sendo "o conjunto de regras de condutas ou hábitos julgados válidos, quer de modo absoluto, quer para um grupo ou pessoa determinada".

Assim, a moral é o conjunto das faculdades morais de um indivíduo, sua dignidade, hombridade, brio. É o que está relacionado aos bons costumes.

Destarte, a junção desses dois termos para a formação de um único conceito, qual seja o "dano moral", não é tarefa simples e por sua vez ainda não esta sedimentada, sendo passível de constantes mutações, porém é necessário e indispensável para a compreensão do instituto.

Pois bem. O dano moral pode ser conceituado de duas formas, há quem parta de um conceito negativo, ou seja, por exclusão, assim o dano moral seria todo o dano não patrimonial. E quem utilize um conceito positivo, assim teríamos o dano moral como o vexame, a humilhação, o desconforto, o sofrimento provocado em alguém.

Orlando Gomes (2001, p 34) nos deixou transmitida a lição de que o "dano moral é, portanto, o constrangimentoque alguém experimenta em conseqüência de lesão em direito personalíssimo, ilicitamente produzida por outrem".

Sérgio Cavalieri Filho (2007, p. 77) numa visão abrangente, acredita que "o dano moral não mais se restringe à dor, tristeza e sofrimento, estendendo a sua tutela a todos os bens personalíssimos – os complexos de ordem ética – razão pela qual revela-se mais apropriado chamá-lo de dano imaterial ou não patrimonial (...)".

Nessa mesma linha, Rodolfo Pamplona Filho (2002, p. 53) entende que a expressão "dano moral" não seria a mais adequada tecnicamente para expressar as formas de prejuízo não mensurável pecuniariamente:

Mesmo a expressão "danos extrapatrimoniais", também de uso comum na linguagem jurídica, pode se tornar equívoca, principalmente se for comparada com a concepção de "patrimônio moral", [...], que supostamente abrangeria, entre outros direitos tutelados pelo ordenamento jurídico, a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem da pessoa.

Melhor seria utilizar-se o termo "dano não-material" para se referir a lesões do patrimônio imaterial, justamente em contraponto ao termo "dano material", como duas facetas da mesma moeda, que seria o "patrimônio jurídico" da pessoa, física ou jurídica.

Assim, pode-se dizer que o dano moral é o atentado contra a individualidade, a personalidade, a dignidade e o respeito de que é merecedor a vítima. É o sofrimento que atinge valores íntimos da pessoa e a sua personalidade nas relações sociais.

O instituto da reparação do dano moral no Brasil teve suas primeiras vozes com o Código Civil de 1916, mas num primeiro momento, predominou a tese restritiva da ressarcibilidade do dano moral.

Apenas com a chegada da Constituição Federal de 1988 que tornou possível a referência, sem receios, ao direito à reparação pelo dano moral, vez que este foi inserido no rol de Direitos e Garantias Fundamentais.

Assim, a CF/1988 fez com que doutrinadores passassem a se dedicar com profundidade ao tema e à definição do instituto.Nesse sentido Caio Mário da Silva Pereira (2001, p. 58) afirma que:

Constituição Federal de 1988 veio pôr uma pá de cal na resistência à reparação do dano moral. [...]. Destarte, o argumento baseado na ausência de um princípio geral desaparece. E assim, a reparação do dano moral integra-se definitivamente em nosso direito positivo. [...]. É de se acrescer que a enumeração é meramente exemplificativa, sendo lícito a jurisprudência e a lei ordinária aditar outros casos. [...]. Com as duas disposições contidas na Constituição de 1988 o princípio da reparação do dano moral encontrou o batismo que a inseriu em a canonicidade de nosso direito positivo. Agora, pela palavra mais firme e mais alta da norma constitucional, tornou-se princípio de natureza cogente o que estabelece a reparação por dano moral em nosso direito. Obrigatório para o legislador e para o juiz. (sic)

Por fim, o CC/2002, acompanhando a Carta Magna, legitimou, expressamente, o instituto do dano moral e a sua reparabilidade.

Ainda faz-se necessário tecer distinções entre o dano moral e material, a fim de evitar confusão entre os institutos.

2.1 DANO MORAL X DANO PATRIMONIAL

Como anteriormente demonstrado, o dano divide-se em moral e material, sendo o último mais fácil de ser pecuniariamente mensurado.

O dano moral, por se tratar de lesão à honra, a dignidade, a sentimentos íntimos do individuo torna-se mais difícil o restabelecimento ao status anterior, assim como a conversão deste em uma indenização pecuniária.

Sergio Cavalieri Filho (2007, p. 71) demonstra a maior facilidade no cálculo de danos materiais quando afirma que ele atinge "os bens integrantes de patrimônio da vítima, entendendo-se como tal o conjunto de relações jurídicas de uma pessoa apreciáveis em dinheiro".

Portanto, o dano material é aquele suscetível de avaliação pecuniária, sendo reparado predominantemente de forma direta, através da restauração natural ao estado anterior. Assim, enquanto na reparação do dano material predomina a restituição ao status quo ante, no dano moral a indenização consiste no pagamento de sanção em pecúnia de valor específico que possibilite ao atingido restabelecer, de alguma forma, o seu estado primitivo, predomina a reparação indireta.

A forma mais comum de apreciação do dano material é um cálculo entre o patrimônio pré e o pós ao ato ilícito, ou seja, como a conduta danosa afetou o patrimônio final do lesado.

Por sua vez, o dano moral também é suscetível de reparação pecuniária, porém nem sempre se reduz ao pagamento de certa quantia em dinheiro, face à impossibilidade de restabelecer as coisas ao seu estado anterior.

Enquanto no dano material há a reposição do patrimônio afetado, no dano moral isso não é possível, pois enseja apenas uma forma de compensação pela dor suportada.

Porém, nada impede que um mesmo ato dê ensejo à indenização, concomitantemente, por dano moral e material, como disciplinam o art. 5º, inciso V da CF/1988, e o art. 186 do CC/2002.

Vale ressaltar por fim o grande aumento do número de litígios que alimentam a indústria da dor, já que a avaliação do dano moral tem natureza subjetiva e por isso, atualmente, serve de pretexto para reivindicar vultosa indenização à custa de suposta ofensa moral.

Assim, tem-se que as possibilidades de configuração do dano moral devem ser estudadas, para que este não sirva de pretexto para enriquecimentos ilícitos.

2.2 QUANTIFICAÇÀO DO DANO MORAL

Em que pese as inúmeras maneiras criadas para a quantificação do dano moral, acredita a autora ser o arbitramento judicial o meio mais eficiente para se fixar uma indenização justa.

Assim, caberá ao Juiz, de acordo com o seu bom senso e ponderado arbítrio, atentando para a repercussão do dano e a possibilidade econômica do ofensor, avaliar uma quantia a título de reparação por dano moral.

Com o advento da Constituição Federal de 1988 os critérios quantificadores da indenização pelo dano moral criados por leis infraconstitucionais foram eliminados. Sendo assim, após a CF/1988 não mais prevaleceu nenhum limite legal prefixado, nenhuma tabela ou tarifa a ser observada pelo juiz.

Ressalte-se que se o Juiz não fixar com a devida prudência o dano moral, este irá se tornar injusto e insuportável. A indenização deve ser suficiente para reparar o dano o máximo que for possível, e nada mais, vez que qualquer quantia a maior importaria em enriquecimento sem causa.

Assim, os Magistrados devem ter como bússolas norteadoras o princípio da razoabilidade, entendido pela autora como sinônimo do princípio da proporcionalidade, adequando a conclusão estabelecida com os motivos que a determinaram, ou seja, que a sanção seja proporcional ao dano.

Ao comentar a respeito do supracitado princípio Sergio Cavalieri Filho (2007, p. 90) aduz que:

Importa dizer que o Juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e a duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido, e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes.

Por fim, se por um lado a indenização deva ser a mais justa e completa possível, por outro, não se pode tornar-se fonte de enriquecimento sem causa, de lucros indevidos. Portanto, a melhor maneira de fixar uma indenização por dano moral é levar em conta o critério da razoabilidade na apuração do quantum.

3 FORO COMPETENTE PARA APRECIAR AS DEMANDAS DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL DECORRENTE DE RELAÇÃO DE TRABALHO

Este capítulo vai tratar sobre a atual competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar as ações indenizatórias por dano moral, abordando o panorama depois da Emenda Constitucional nº 45.

Com o advento a EC nº 45/2004 houve um significativo acréscimo das atribuições conferidas à Justiça do Trabalho, como se infere do novo art. 114 da CF, que antes continha apenas o caput e três parágrafos. Hoje possui nove incisos e do texto original remanesceu apenas o parágrafo 1º, pois foram modificados os parágrafos 2º e 3º.

Essas mudanças não se restringiram à matéria, pois atingiu a pessoa do trabalhador que é o novo sujeito tutelado: "ressalta-se, por oportuno, que a pretensão da reparação civil, por culpa ou por dolo do empregador na causação da infortunística trabalhista, decorre, sem sombra de dúvidas, da relação de trabalho firmada entre patrão e operário", como afirma Luciana Cardoso (2007, p.324).

José Augusto Rodrigues Pinto (2005, p 189) comenta o novo paradigma:

[...] a EC n. 45/04 abrangeu, sem dúvida, todas as pessoas físicas prestadoras de atividade pessoal, subordinada ou não, voltada para a produção de bens e prestação de serviços. Tal abrangência aglutinou na competência da Justiça do Trabalho relações jurídicas de direito material comum e trabalhista.

Ao abranger "os entes de direito público externo e da administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios", a EC n. 45/04 também aglutinou na competência da Justiça do Trabalho a Administração pública e seus servidores em suas relações de direito material estatutário ou trabalhista, incluindo os Estados soberanos estrangeiros.

Com a promulgação da EC/45 foi necessário estabelecer critérios para remessa (ou migração) dos processos que já se encontravam em trâmite na Justiça Comum. Luciana Cardoso (2007, p. 324), seguindo o mesmo critério que o STJ e STF em suas decisões, adotou a seguinte postura:

A ampliação da competência trazida pela EC 45 alcança todos os processos que estejam em trâmite na Justiça Cível Comum, desde que pendentes de julgamento de mérito. As ações que ainda não tiveram o seu mérito apreciado pela Justiça Ordinária devem ser imediatamente remetidas à Justiça do Trabalho, no estado em que se encontram, sendo que todos os atos praticados até o momento serão aproveitados. As ações que tramitam na Justiça Estadual e que possuem sentença de mérito anterior a aludida emenda devem continuar sob a égide desta justiça, até o seu trânsito em julgado e posterior execução.

Esta mudança provocada pela EC/45 foi, para muitos, salutar, pois é sabido por todos que a justiça do trabalho é mais eficiente e produtiva, de acordo com dados estatísticos divulgados periodicamente pelos próprios Tribunais.

Insta salientar que a incompetência em função da matéria deve ser suscitada de ofício pelo Juiz, uma vez que a mesma tem caráter absoluto. Já ao Réu cabe suscitá-la sob a forma de preliminar, pois caso contrário há a preclusão deste direito.

Por derradeiro, é oportuno lembrar que, sendo o objeto deste trabalho o prazo prescricional das ações indenizatórias por dano moral, passa-se a concentrar o estudo no inciso VI da nova redação do art. 114 da CF/1988, que nada mais é do que uma ampliação da competência da Justiça Obreira em razão da matéria.

4. PRAZO PRESCRICIONAL DA AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO

Diante da proximidade da analise das correntes de prazos prescricionais que podem ser aplicados na ação indenizatória por dano moral na Justiça do Trabalho, faz-se necessário um estudo prévio do próprio instituto da prescrição a fim de embasar os posicionamentos que serão posteriormente defendidos.

Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1993, p. 440) a define como a "perda de um direito pelo não uso dele durante determinado tempo".

O instituto da prescrição não possui definição peculiar no Direito do Trabalho, de modo que sua disciplina encontra-se na parte geral do Código Civil (1916 e 2002).

No entanto, o conceito se adapta à evolução das relações humanas e sociais, mas sempre se relacionando à "ação", com enfoques distintos, que são o da "exigibilidade" ou "pretensão" (ALENCAR, 2004, p.70). Essa mudança pode ser percebida com a mudança na codificação civil (CC/ 1916 E 2002).

Na vigência do Código Civil de 1916, Clóvis Beviláqua (1980, p.286) conceituava a prescrição como "a perda da ação atribuída a um direito, e de toda a sua capacidade defensiva, em conseqüência do não-uso delas, durante um determinado espaço de tempo".

Antônio Luiz Câmara Leal (1982, p.26), também na vigência do código anterior, definiu a prescrição assim:

É a extinção de uma ação ajuizável, em virtude da inércia do seu titular durante um certo lapso de tempo, na ausência de causas preclusivas de seu curso. [...] Seu objeto – a ação ajuizável; sua causa eficiente – a inércia do titular; seu fator operante – o tempo; seu fator neutralizante – as causas legais preclusivas de seu curso; seu efeito – extinguir ações.

Todavia, são conceitos clássicos que se baseiam apenas na idéia imediatista da ação, idéia abandonada pela doutrina moderna, que passou a associar o termo "ação" à "exigibilidade" do direito que a lei confere ao legítimo titular. Já o direito de exigir do ofensor uma ação ou omissão entende-se como "pretensão". De onde se conclui que o objeto da prescrição é a própria exigibilidade (pretensão).

Por óbvio que, inexistindo a pretensão ou a exigibilidade, o próprio direito desaparece. No entanto, nada obsta a que o potencial titular ajuíze a ação cabível.

Wilson de Souza Campos Batalha (1995, p.619), mesmo antes da chegado do CC/2002 já manifestava sua opinião em consonância com o que ainda viria a ser legislado:

Deve-se distinguir a prescrição do direito postulado em juízo da prescrição do direito de ação. Objeto do direito de ação é a prestação da atividade jurisdicional, que tem por conteúdo a declaração ou a realização coativa dos direitos substanciais, públicos e privados. [...] Uma coisa é, portanto, a prescrição do direito que constitui a matéria sobre a qual se exerce a atividade jurisdicional de cognição ou de exceção; outra coisa é a prescrição do direito de ação, como direito a obter a prestação da tal atividade, por parte do órgão jurisdicional.

Para corroborar este posicionamento é válido transcrever as palavras de Sergio Cavaliere Filho (2007, p. 117) que ensina:

A noção de prescrição esta ligada à lesão de direito, cuja ocorrência faz surgir um novo deve jurídico para o transgressor – a responsabilidade – e novo poder jurídico para aquele que sofreu a lesão – a pretensão, devendo esta ser entendida como o poder de invocar a tutela do estado. Se essa pretensão não for exercida num prazo legal, ocorre a prescrição. (...) defini-se a prescrição como sendo a convalescença de uma lesão de direito pela inércia do seu titular e o decurso do tempo.

O direito de ajuizar uma ação não pode ser cessado mesmo com o decurso do prazo legal, porém isso não assegura ao demandante o exame do pedido (procedência ou não), sobretudo a partir da vigência da Lei 11.280/2006, que introduziu o §5º no art. 219 do CPC, de discutível incidência no processo do trabalho.

Controvérsias à parte, o certo é que a prescrição acaba com a pretensão, mas não com o exercício do direito da ação, garantida pela Constituição Federal (art. 5º, inciso XXXV).

Assim, a noção da prescrição como a perda do direito de ação é retrógrada. Modernamente assentou-se que a prescrição se refere à pretensão em si, vale dizer, à exigibilidade do cumprimento da obrigação inadimplida e/ou sua satisfação.

Imprescindível se faz também tecer comentários sobre os motivos que justificam o instituto da prescrição.Antônio Luiz Câmara Leal (1982, pp. 14-16) demonstra que já no Direito Romano eram apontados três fundamentos para a prescrição: a) necessidade de fixar as relações jurídicas incertas, de modo a evitar controvérsias; b) castigo à negligência, transparecendo sua finalidade objetiva; c) priorizar o interesse público, que é o fundamento maior para a doutrina moderna.

Eduardo Fornazari Alencar (2004) também referenda a tese de que há um interesse público subjacente à prescrição, pois visa, antes de mais nada, a segurança nas relações jurídicas que é imprescindível para a paz e harmonia social.

Por sua vez, Sérgio Pinto Martins (2007) entende que a prescrição engloba unicamente a inércia do titular do direito. A questão fundamental, em matéria de prescrição, é a segurança jurídica.

Os distintos fundamentos trazidos pela doutrina revelam que autores miram o mesmo objetivo, porém sob óticas diferentes. Enquanto uma corrente realça o interesse público, a outra fala em inércia do titular do direito, mas ambas almejam a mesma coisa: a segurança jurídica.

Por fim, cabe ressaltar a diferença entre o instituto da prescrição e da decadência, onde na primeira a inércia diz respeito ao exercício da ação e o tempo opera os seus efeitos em cima desta ação, enquanto que na segunda a inércia diz respeito ao exercício do direito e o tempo produz efeitos deste o nascimento deste direito.

4.1 A PRESCRIÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

O prazo prescricional hoje vigente para o ajuizamento de ações referentes a créditos trabalhistas é trazido pela Constituição Federal de 1988, quando o seu art. 7º, inciso XXIX, dispõe que os trabalhadores rurais e urbanos possuem um lapso temporal de 5 anos para levar a juízo suas pretensões, sendo de 2 anos o prazo após a rescisão do contrato de trabalho.

Pois bem. Existe uma discussão a respeito da prescrição acima trazida na vigência do contrato trabalhista, dado o temor do empregado em perder o emprego por represália do empregador.

Sergio Pinto Martins (2007, pp. 141-142) entende que o prazo prescricional não pode transcorrer durante a vigência do contrato de trabalho, vez que existe a subordinação do empregado ao empregador, desta forma afirma que é necessária a revisão do art. 7º, XXIX da CF/1988.

Assim, cabe a ponderação que o mais adequado seria que o prazo prescricional tivesse início apenas com a extinção do contrato de trabalho, como se verifica no direito comparado, sobretudo na Itália e em Portugal, em prol dos trabalhadores.

Eduardo Fornazari Alencar (2004, p. 84) também censura o regime da prescrição:

Evidente que, para o empregado, seria mais vantajoso se não houvesse a fluência de prazo prescricional algum no decorrer do contrato de trabalho, como prega a doutrina em sua grande maioria, mas não foi essa a solução que prevaleceu em nossa Constituinte. Aliás, diante da regra trazida pela Emenda Constitucional n. 28/2000, aprovada pelo Congresso Nacional mais de dez anos após a entrada em vigor da Constituição Federal, verifica-se que o interesse público que tem prevalecido atualmente em nosso país, é em sentido contrário à posição defendida pela doutrina, admitindo o transcurso da prescrição na vigência do pacto laboral.

Desta forma, cabe a doutrina permanecer defendendo o seu posicionamento, que é de fato mais favorável ao empregado, com o intuito de ver o legislativo promovendo as devidas alterações no texto constitucional.

4.2 DIFERENTES PERSPECTIVAS

Se por um lado a questão da competência material para apreciar as ações com pedido de indenizações por danos morais já está superada, por outro existe a divergência a respeito do prazo prescricional para intentá-la.

Indaga-se se o prazo seria o previsto no Código Civil, de vinte anos (CC/1916, art. 177) ou de três, ou ainda de dez pelo CC/2002 (arts. 206, §3º, V e 205, respectivamente), se seria o prazo trabalhista, ou seja, de cinco anos na vigência do contrato de trabalho e até dois anos após sua extinção (art. 7º, XXIX, CF/1988), ou, por fim, tratar-se-ia de uma ação imprescritível (art. 5º, X, CF/1988).

Os argumentos variam de acordo com a natureza do instituto do dano moral, ora tem a ver com deslocamento da competência material para a justiça do trabalho, ora com a suposta característica fundamentalista e o seu alcance.

Assim, faz-se imperioso examinar cada uma das correntes.

4.1.1 Prescrição cível

Essa corrente acredita que mesmo com o deslocamento da competência para a Justiça do Trabalho deve ser aplicada a prescrição cível para as lides cujo pedido recaia sobre o dano moral. A prescrição cível é defendida através de diversas fundamentações, dentre as quais: a) trata-se de um instituto civil e não trabalhista; b) a reparação do dano moral decorrente da relação de trabalho não constitui crédito trabalhista, mas verba indenizatória com assento em norma civil; c) é uma ação de caráter pessoal, com a finalidade de garantir os direitos nascidos de um ato ilícito; d) a prescrição é instituto de direito material e não processual, dentre outros.

Rodrigo Dias da Fonseca (2005, p.02), na sua defesa pela aplicação do prazo civil, acredita que "a prescrição é instituto de direito material, em que pese a sua evidente repercussão e relevância sobre o processo. Daí, não sofre influencia, para efeitos da norma aplicável ao caso concreto, da definição do órgão jurisdicional encarregado pelo legislador de apreciar determinadas ações".

Vale dizer, a competência material não deve interferir na definição da regrar prescricional a ser aplicada, sendo plenamente razoável que a Justiça do Trabalho seja competente para julgar determinadas demandas em que o prazo trabalhista não se aplique.

A estipulação do prazo prescricional não tem relação direta com a competência para apreciar a causa, mas sim com a natureza do crédito ou da matéria. Diz-se que tanto a prescrição como o dano moral são institutos de direito material, de modo que o instituto da competência não pode definir suas próprias regras (MELO, 2007).

Outro argumento seria a respeito do dano moral não se configurar como crédito trabalhista. A prescrição trabalhista de 05 anos na vigência do contrato de trabalho e até o limite de 2 anos contados a partir da extinção deste é regulada para os créditos decorrentes das relações de trabalho. Desta forma, não se pode ampliar a interpretação ou o campo de aplicação do dispositivo além da restrição à obtenção.

Nei Messias Vieira fundamenta (2007, p.13), com propriedade, este entendimento arguindo o seguinte:

Impossível e antijurídico, então aplicar a mesma restrição a direitos que não correspondem meros créditos correspondentes às contraprestações do contrato de trabalho. Há direitos que antecedem a formação da relação laboral, qualquer que seja a espécie jurídica dessa relação. Tais direitos, de ordem fundamental (ou de ordem civil em sentido mais amplo, alguns deles compondo os chamados "direitos civis" em sentido mais amplo, alguns deles compondo os chamados "direitos civis" em sistemas jurídicos alienígenas), integram o patrimônio jurídico da pessoa humana, seja em sua dimensão individual, seja em sua dimensão social; não tem, pois, a relação contratual trabalhista como pressuposto de existência ou de obrigação do dever de respeito e guarda.

Nessa esteira, imprescindível se faz analisar a distinção realizada pela doutrina e jurisprudência a respeito da existência do crédito trabalhista típico e do atípico. O primeiro possui natureza pura, gerando interesse apenas para o trabalhador, sendo o único a se submeter à regra geral da prescrição. Já o segundo, apesar de poderem ter revestimento patrimonial e guardar origem na relação de trabalho, são de interesse social, não só da classe trabalhadora, não se aplicando à regra geral se houver regra análoga própria.

Assim, apesar da regra geral atrair direitos patrimoniais e não patrimoniais, deve-se entender que essa atração somente acontece em relação aos créditos trabalhistas de natureza típica, enquanto os atípicos, de natureza híbrida, escapam desta regra, atraídos por normas prescricionais mais apropriadas à preservação da ação jurídica.

Raimundo Simão de Melo (2000, p.1372), em um dos seus primeiros estudos sobre esta matéria, também pactuava deste entendimento e assim lecionava:

É certo que a Constituição Federal, ao tratar da prescrição, fala em créditos resultantes da relação de trabalho. Porém, como é por demais evidente, a reparação do dano moral, mesmo praticado em face da relação de emprego, não constitui crédito trabalhista stricto sensu, mas sim de natureza civil, decorrente de ato ilícito [...]. Na verdade, nem de credito propriamente se trata, quanto mais de credito trabalhista; quando a constituição tratou da prescrição no inciso XXIX do art. 7º, cuidou, na verdade, de direito de credito, destinado ao restabelecimento de um estado anterior, o que não ocorre com a reparação do dano moral, cuja natureza jurídica não é indenizatória no sentido de restauração do statu quo, mas reparatória/compensatória.

Por sua vez, Marcelo Pessoa (2007, p.03) reafirma ser o prazo aplicável o cível, tendo em vista o dano moral não se qualificar como crédito trabalhista típico, senão vejamos:

O erro está simplesmente no fato de considerarem a reparação pecuniária um crédito decorrente da relação de trabalho. Esta posição em hipótese nenhuma corresponde a verdade, posto que a indenização é simplesmente um quantum compensatório que tem como causa um evento antijurídico e lesivo, portanto, constitui uma satisfação ao ofendido e uma responsabilidade do causador, consequentemente, não se trata de parcela ou contraprestação garantida legalmente aos empregados e que notoriamente se encontram elencadas em leis específicas, principalmente, na Consolidação das Leis do Trabalho [...].

Outro argumento reside na necessidade de aplicação do princípio constitucional da isonomia, posto que o dano moral que um cidadão comum sofre não é diferente do dano moral sofrido por um trabalhador, não sendo possível a imposição de prazos prescricionais distintos.

Sendo assim, acredita a autora que interpretação contrária violaria o princípio da igualdade, garantia fundamental encartada pela Constituição federal.

Em abono a esta tese, Marco Antônio Mendes (2007) traz um exemplo de um mecânico autônomo que ao realizar manutenção em uma máquina do tomador do serviço, solicita o auxílio de um empregado. Desavisado, o proprietário religa a máquina que mutila a mão direita dos dois (cidadão comum e empregado).

Diante disso não se pode questionar que seria uma violação ao princípio da isonomia a aplicação de prazos prescricionais distintos, ainda mais ao demonstrar danos decorrentes do mesmo fato gerador.

Sendo assim, por todos os argumentos acima expostos, acredita a autora ser a prescrição civil, trazida pelo art. 206, § 3o, inciso V, a mais adequada a ser aplicada nas lides em que houver pedidos de indenização por danos morais.

Por oportuno, ainda se faz necessário explanar a respeito de outra corrente doutrinaria, esta não recepcionada pela autora, que acredita que deve ser aplicado o prazo civil, mas não o do art. 206, §3º, V, e sim o do art. 205, que se refere à reparação de danos quando a lei não tiver fixado lapso menos ou quando inexistir previsão expressa sobre o assunto.

Esta corrente é representada por Raimundo Simão de Melo (2007, p.05), para quem a prescrição é, de fato, a de 10 (dez) anos:

É exatamente a hipótese vertente. Como já aludimos, não se esta a tratar de um "crédito trabalhista". Igualmente não se cuida de uma pretensão de reparação civil stricto sensu, envolvendo dano patrimonial material. Estamos a falar de direito humanos fundamentais decorrentes da violação dos direitos da personalidade [...]. Como é certo, os direitos da personalidade têm como uma de suas características a imprescritibilidade. Não se trata de direitos trabalhistas ou civis, no sentido estrito, mas de direitos de índole constitucional-fundamental, considerados como cláusulas pétreas protegidas até mesmo contra o legislador constituinte (CF, art.60, § 4º, inciso IV). Os danos decorrentes, no caso, são pessoas, não se lhe aplicando, por isso, o prazo de 3 anos (CC, art.206, § 3º, inciso V), o qual se refere às reparações civis inerentes aos danos causados ao patrimônio material. O dano pessoal, ao contrário, atinge a pessoa humana nas suas diversas facetas.

Frise-se que o prazo de 10 (dez) anos, defendido por esta corrente, deve ser aplicado apenas em face dos danos ocorridos após a vigência do CC/2002, que ocorreu em 10 de janeiro de 2003, pois na vigência do CC/1916 permanece a viger o prazo de 20 (vinte) anos estabelecido pelo art. 177 do CC/1916 (MELO, 2007). No entanto, resta a necessidade de verificação das regras de transição previstas no art. 2.028 do CC/2002, que serão devidamente explanadas no próximo tópico.

Irany Ferrari e Melchíades Rodrigues Martins (2006, p.466) apresentam a justificativa da aplicação deste prazo geral, contido no art. 205, CC/2002, afirmando:

Portanto, não se trata de direito de natureza trabalhista nem civil, e, como não existe qualquer dispositivo legal regulando de outra forma o prazo de prescrição para as pretensões decorrentes dos danos à pessoa (moral, material e estético), por exclusão aplica-se o prazo geral de 10 anos, como previsto no art. 205, do Código Civil. A norma civil está sendo aplicada, repita-se, não porque se trate de uma reparação civil no sentido estrito, mas porque é a lei civil que nos socorre nos casos de omissão regulatória sobre a prescrição no Direito brasileiro, ou seja, quando não há prazo expresso de prescrição sobre determinado dano, aplica-se o geral, de 10 anos, previsto no art. 205 do CC.

Através deste argumento configura-se a fragilidade desta corrente, pois é indiscutível a existência de previsão expressa sobre a delimitação do prazo prescricional civil de 03 (três) anos trazido pelo art. 206, §3º, V, vez que o dano moral configura-se como um ato ilícito de onde se origina a responsabilidade civil.

4.1.2 Regras de transição

Existe ainda a necessidade de se observar as regras de transição que o novo código estabeleceu. De onde conclui-se que prescrição iniciada e não consumada não representa direito adquirido, mas mera expectativa de direito, pois é passível a ocorrência de sua interrupção ou até suspensão. Antes do advento da consumação não é possível invocar o direito à prescrição.

Assim, a nova norma do Código Civil/2002 não pode ser aplicada retroativamente em face das situações já consumadas, não importando se o novo prazo estabelecido é maior ou menor que o anterior. No entanto, se começando a fluir a prescrição sob a égide do CC/2002 e terminar de acordo com ele, observar-se-á as normas nele contidas.

Diante da possibilidade da lei nova aumentar ou diminuir a prescrição, são válidas as seguintes considerações: quando a lei nova aumentar o prazo prescricional, ela tem aplicação imediata, contando-se o prazo já decorrido na vigência da lei anterior (MARTINS, 2007); já nas hipóteses em que a lei nova reduz a prescrição, como o caso que aqui está sendo estudado, é necessária uma análise mais específica.

Sendo assim, prevalecerá o prazo do CC/1916 apenas se já decorrida mais da metade do prazo nele previsto; caso contrário, aplica-se o prazo previsto no CC/2002, cuja contagem iniciará justamente da data de início de sua vigência.

Rodrigo Dias da Fonseca (2005, p.09), ao ponderar sobre a regra aduz:

Se já decorreram-se mais de dez anos da violação do direito, prevalecerá a prescrição vintenária, prevista no código revogado. Caso contrário, se ainda não se atingiu a metade do prazo previsto no CC/1916, isto é, dez anos, contados da violação do direito, então o prazo prescricional será o do novo código, ou seja, três anos, tendo por dies a qou a data de entrada em vigência do CC de 2002, diz 10.1.2003, conforme art. 2.044 do mesmo diploma legal.

4.2.3 Imprescritibilidade da pretensão

Uma corrente minoritária acredita ser a pretensão por indenização a título de dano moral imprescritível à luz do art. 5º da constituição federal. Esse entendimento é embasado na idéia do dano moral estar relacionada a direitos da personalidade, de modo que o seu exercício não estaria sujeito à prescrição.

Assim, sustentam a independência dos requisitos da condição de trabalhador ao dano moral sofrido. Francisco Lima Chagas Filho (2007, p.02) defende esta tese argüindo o seguinte:

Essa categoria dos direitos fundamentais constitucionalmente é garantida ao ser humano enquanto pessoa e não porque ostenta a condição de cidadão trabalhador ou empregado. Por conseguinte, de natureza indisponível, não podendo o seu titular a eles renunciar. Essa indisponibilidade dos direitos fundamentais se mostra sob duplo aspecto: o ativo, na medida em que os direitos humanos são inalienáveis pelo seu titular, bem como o passivo, já que não podem ser expropriados por outros sujeitos, começando pelo próprio Estado que tem o dever de garanti-los e protegê-los.

Desse modo, são irrenunciáveis, por isso, imprescritíveis.

Os artigos 1º, III, 5º, X da CF preceituam que todos são iguais perante a lei, sem qualquer distinção de sexo, cor de pele, crença religiosa ou profissão e asseguram a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem.

Assim, exsurge como principal característica dos direitos da personalidade a imprescritibilidade, ao lado da irrenunciabilidade. Os poucos doutrinadores que defendem esta corrente entendem que não se trata de meros direitos trabalhistas, mas de direitos fundamentais previstos em cláusulas pétreas na CF/1988.

Caio Mário da Silva Pereira (2004, p.687) demonstra sua cognação a esta corrente quando relata:

A prescritibilidade alcança todos os direitos subjetivos patrimoniais de caráter privado. Escapam-lhe aos efeitos aqueles direitos que se prendem imediatamente à personalidade ou ao estado das pessoas. Os direitos à vida, à honra, à liberdade, à integridade física ou moral não estão sujeitos a qualquer prescrição, em razão de sua própria natureza. Por maior que seja o tempo decorrido de inatividade do titular, nunca perecerão os direitos respectivos que sempre se poderão reclamar pelas ações próprias, uma vez que não é ilícita a constituição de um estado que lhes seja contrário.

No entanto, em sentido diametralmente oposto, a doutrina e a jurisprudência majoritária rechaçam esta teoria defendendo que a ação de reparação por dano moral é, de fato, prescritível. Sendo assim, a tese da imprescritibilidade não se coaduna com a natureza do instituto.

4.2.4 Prescrição trabalhista

Esta corrente defende que o prazo prescricional a ser aplicado é o trabalhista, previsto expressamente no art 7º, inciso XXIX da CF/1988. Acredita-se que o dano moral decorrente de uma relação de trabalho caracteriza-se como um crédito trabalhista.

Assim, defendem que se o dano emerge de uma relação de trabalho, a natureza do crédito a que ele corresponde é eminentemente trabalhista (ALENCAR, 2004).

Na tentativa de fundamentar a sua posição pela aplicação da prescrição trabalhista Luiz de Pinho Pedreira da Silva (2004, p.152) aponta:

a) quando litigam as partes do contrato de trabalho na condição de empregado e empregador objetivando a indenização por dano moral, decorrente de ato ilícito patronal, a pretensão do direito material deduzido na reclamatória possui natureza de crédito trabalhista [...]; c) nos termos do art. 8º da CLT, é condição para que o direito comum constitua fonte subsidiária do Direito do Trabalho quando omisso este, o que não acontece no caso, pois a Constituição regula a prescrição dos créditos trabalhistas, em norma, portanto, de Direito Constitucional do Trabalho; d) é contraditório com o reconhecimento da competência da Justiça do Trabalho para as ações por dano moral, porque derivadas de relações do trabalho, embora regulada a matéria pelo direito civil, asseverar que a prescrição das referidas ações se rege pelo Código Civil.

Assim, acredita-se que se o dano ocorreu no âmbito da relação de trabalho conclui-se que o crédito aflora de um contrato de trabalho e assim deve ser considerado, como assinala José Affonso Dallegrave Neto (2007, p. 49):

[...] todos os direitos exigíveis em juízo, que se manifestam na execução do contrato de trabalho subordinado e que são decorrentes da inadimplência de deveres principais, secundários ou acessórios, sejam eles previstos em lei, no contrato ou nos instrumentos normativos da categoria, constituem-se créditos trabalhista, atraindo-se a competência para a Justiça do Trabalho e a responsabilidade civil contratual. Por serem pretensão de natureza trabalhista, o prazo prescricional aplicável será o qüinqüenal do art. 7º, XXIX, da Constituição Federal.

Porém, como visto no tópico referente à prescrição civil, esta indenização supracitada jamais poderá ser qualificada como crédito trabalhista, mas sim um instituto de natureza civil, vez que a reparação do dano trabalhista não constitui crédito típico trabalhista, mas sim verba indenizatória com assento em norma civil.

A Constituição Federal (art. 7º, inciso XXIX), ao tratar da prescrição trabalhista, refere-se a "créditos resultantes das relações de trabalho". No entanto, a reparação do dano moral, mesmo praticado em face da relação de emprego, não constitui crédito trabalhista stricto sensu. Ou melhor, não se trata nem de crédito, quanto mais de crédito trabalhista.

Com efeito, há exemplo na Justiça do Trabalho em que o prazo prescricional não é o trabalhista. É o caso do não recolhimento do FGTS, sobre o que entendem os tribunais que o prazo prescricional para se reclamar a sua regularização é trintenário, como consta do parágrafo 5º do artigo 23 da Lei 8.036/90 e reconhece o Enunciado 362/TST.

Outro caso em que não se aplica a prescrição qüinqüenal trabalhista diz respeito à complementação de aposentadoria assegurada pelo empregador em contratação coletiva, ao longo da relação de emprego, para ser usufruída após a aposentação, quando a ação para pleitear as diferenças correspondentes pode ser ajuizada a qualquer tempo, mesmo depois do prazo bienal posterior à rescisão contratual. Os dois casos citados, de prescrição com prazos diferentes dos trabalhistas, são aplicados normalmente na Justiça do Trabalho, sem problema.

Desta forma, pode-se concluir, com o devido respeito, que os argumentos utilizados por essa corrente não resistem a uma análise mais aprofundada. Como já demonstrado, o prazo prescricional para o exercício de uma pretensão não se fixa levando em conta a competência do juízo para conhecer do pedido respectivo. A prescrição decorre da natureza do direito material discutido, independentemente do órgão do Judiciário que deva apreciar o litígio, devendo, portanto ser aplicada a prescrição civil.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante o exposto, conclui-se:

Dano é a ofensa causada a um patrimônio material ou imaterial de outra pessoa, que merece uma reparação justa ou compensação. O dano material consiste em todos os prejuízos causados pelo ilícito praticado com repercussão material. Enquanto o dano moral é a ofensa que atinge a honrabilidade, o bom nome profissional, o conceito social, resultando profunda dor;

Dentre os critérios de quantificação do dano moral o arbitramento se apresenta como o melhor. O magistrado é dotado de poder discricionário para estipular o valor da indenização que julga ser devida, de acordo com suas regras de experiência;

A competência da justiça do trabalho para dirimir questões relativas à indenização por dano moral na relação de trabalho tornou-se pacífica através da EC/45.

Determinada a competência surge a controvérsia acerca de qual o prazo prescricional a ser aplicado nestas demandas. São três as correstes: aquela que acredita na prescrição cível trazida pelo art. 206, §3º, V CC/2002, a trazida pelo art. 205 CC/2002 e por fim a trazida pelo art. 7º, XXIX, CF/1988.

Cada uma das perspectivas apresenta raciocínios distintos, sendo estes relativos à natureza do instituto, ao alcance deste instituto e ao deslocamento da competência material para dirimir tais questões para a justiça do trabalho.

Desta analise, conclui-se que a prescrição mais adequada a ser aplicada é a cível, vez que o prazo prescricional para o exercício de uma pretensão não se fixa levando em conta a competência do juízo para conhecer do pedido respectivo. A prescrição decorre da natureza do direito material discutido, independentemente do órgão do Judiciário que deva apreciar o litígio.

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Trabalho de conclusão de curso da graduanda em Direito do Centro Universitário Jorge Amado, 9º semestre, noturno.

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

II as ações que envolvam exercício do direito de greve;

III as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;

IV os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data , quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;

V os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, o;

VI as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;

VII as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;

VIII a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a , e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;

IX outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.

§ 1º - Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros.

§ 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente.

§ 3º Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito.

Art. 219 § 5o O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição.

Art. 5º, XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.