DA ORGANIZAÇÃO DA JUSTIÇA DESPORTIVA NO BRASIL

 

Lucas Rodrigues Oliveira

Márcia Laís Soares de Sá

Maryhá Henriques de Morais

RESUMO

 O Direito Desportivo regula as relações desportivas e as disposições concernentes ao regulamento e à disciplina das competições, sendo que a justiça desportiva é o órgão previsto constitucionalmente para processar e julgar as lides desportivas de maneira célere e eficiente. Desse modo, o Poder Judiciário não está autorizado a apreciar matérias essencialmente desportivas de imediato. O presente trabalho tem o objetivo de apresentar os instrumentos jurídicos da justiça desportiva. A partir da compreensão da sua jurisdição, competência e estrutura organizacional é possível determinar os limites de atuação da justiça desportiva e as condições para acesso à jurisdição estatal, alcançando a decisão mais adequada e, consequentemente, a harmonia entre o desporto e o direito.

PALAVRAS-CHAVE: Direito Desportivo. Justiça desportiva. Jurisdição. Competência.

 

INTRODUÇÃO      

O Direito Desportivo, tema central da presente pesquisa, é considerado uma seara do direito relativamente nova. Em virtude disso, a produção doutrinária a respeito do tema ainda é escassa.

Os novos ramos das ciências jurídicas surgiram para regular valores atuais da sociedade, valores estes antes desconhecidos ou sem a relevância necessária para serem especificamente apreciados pelo direito. Essas áreas recentes do direito estão em desenvolvimento. Demanda, assim, estudos aprofundados para estabelecer suas definições, seus princípios e demarcar sua área de atuação.

O desporto atende a anseios e cumpre finalidades inerentes à saúde, à educação, à sociabilidade e à cultura. Promove a circulação de valores e riquezas. Envolve interesses políticos e mercadológicos. Logo, é notória a solidificação do desporto enquanto fenômeno social, projetando-se, consequentemente, no âmbito jurídico, motivo pelo qual não há como o Direito ignorá-lo.

Diante da evidente evolução da prática esportiva, acompanhada da necessidade de regulamentos mais técnicos e claros dentro das competições, bem como em relação às questões que cercam a prática esportiva, a Constituição Federal da República Federativa do Brasil (CRFB/88) conferiu uma atenção especial ao direito ao desporto. Entendendo ser o esporte uma forma de consolidação da dignidade humana, o legislador constitucional inseriu essa prerrogativa no capítulo “Da Ordem Social”, juntamente com os direitos à saúde e educação.

Ademais, por exigência constitucional, a Justiça Comum só acolherá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva que terá prazo máximo de sessenta dias para proferir decisão final. Trata-se, da única hipótese constitucional em que, para habilitar-se a acionar o Poder Judiciário, o interessado deve, primeiramente, procurar a instância administrativa, comprovando o imenso prestígio que o desporto possui junto à atual Constituição.

Assim sendo, o Direito Desportivo se consolida como o instrumento para assegurar a concretização e a proteção da prática desportiva. Nesse sentido, é indispensável a capacitação, o conhecimento e o estudo do Direito Desportivo garantindo-se, assim, o acompanhamento das transformações ocorridas nos modelos de organização e profissionalização dos espetáculos esportivos.

DIREITO DESPORTIVO                                                                      

O direito é um conjunto de preceitos, regras e leis que regulam as relações individuais e coletivas, com o objetivo de garantir a harmonia entre os interesses distintos de uma coletividade.

O desporto, ao seu turno, é a manifestação humana de competição, realizada socialmente e estruturada sobre um conjunto de regras. A prática do desporto implica, obrigatoriamente, na existência de arbitragem imparcial e resultados imprevisíveis. Igualmente, é fundamental que sejam obedecidas as divisões por categoria, como, por exemplo, idade, gênero e peso, a fim de que se confira à competição isonomia técnica e que os atletas atuem paritariamente.

Sendo o desporto um fato social, não pode o direito escusar-se de discipliná-lo, surgindo, assim, o Direito Desportivo, entendido como o complexo de técnicas e normas reguladoras das diversas manifestações esportivas, como conceitua Álvaro de Melo Filho:

"Pode dizer-se que Direito Desportivo é o conjunto de técnicas, regras, instrumentos jurídicos sistematizados que tenham por fim disciplinar os comportamentos exigíveis na prática dos desportos em suas diversas modalidades" (MELO FILHO, 1986, p. 12).

O DIREITO DESPORTIVO E A CRFB/88

 A CRFB/88, “Constituição cidadã”, protetora dos Direitos Fundamentais, foi também a responsável por elevar o desporto ao patamar de norma constitucional. Antes da sua promulgação, em 05 de outubro de 1988, o desporto só havia sido contemplado em caráter infraconstitucional, como destaca Barreiros Neto:

 "Em uma clara demonstração do prestígio alçado pelo desporto como questão de grande relevância para a ordem social, a Constituição Federal de 1988, em uma atitude pioneira em nossa história constitucional, reservou, em seu art. 217, uma seção para o desporto, no capítulo em que também trata da educação e da cultura, no título VIII, referente à ordem social" (BARREIROS NETO, 2010, p. 47).

Destarte, a atual Constituição inovou não só ao dispor acerca do desporto, mas também ao colocá-lo ao lado de garantias como a saúde, a educação e a cultura, direitos que tem como propósito a integração social do homem. A conjugação dessas prerrogativas constitui a formação integral do ser humano.

O Texto Maior, mais uma vez, em uma atitude vanguardista, concebe expressamente a Justiça Desportiva, com competência para processar e julgar os conflitos de interesses relativos às competições esportivas, visando ao equilíbrio entre o desporto e o direito.

A Justiça Desportiva foi institucionalizada como instância inicial e obrigatória para apreciar das questões inerentes à atividade esportiva. Atende a necessidade da rápida solução dos litígios desse tipo. Na lição de Scheyla Althoff Decat:

 "A Constituição Federal vislumbrou toda uma problemática com relação ao congestionamento da Justiça Comum o que dificultaria a tramitação rápida e célere, já que na prática desportiva a demora no andamento das demandas desportivas prejudicaria sobremaneira os atletas como também o andamento das competições, partidas ou equivalentes, que possuem um calendário inadiável e que não poderiam ficar a mercê de sua morosidade, aliado ao fato do despreparo da Justiça Estatal no que diz respeito às questões jurídicas desportivas, uma vez que é exigido dos julgadores o conhecimento da técnica jurídica desportiva, sendo certo que há peculiaridades da legislação desportiva afeitas somente por quem milita nos desportos" (DECAT, 2008, p. 21).

A consagração de um órgão julgador específico para o universo desportivo fundamenta-se, portanto, no congestionamento da Justiça Estatal, que prejudica a celeridade do processo, compromete o andamento da competição, aliado ao despreparo dos seus julgadores por se tratar de questões peculiares ligadas ao desporto.

 Evidencia-se, que a Justiça comum, em verdade, não é a mais apropriada para cuidar dos assuntos esportivos. Além da deficiência de conhecimentos específicos, os procedimentos jurídicos adotados não favorecem a prática desportiva, que, em razão da velocidade com que se realizam as competições, devem ter pronta solução, de modo a evitar a inocuidade da decisão.

Não obstante a necessária atuação da Justiça Desportiva, vale destacar que, qualquer decisão que extrapole a competência definida constitucionalmente autoriza o ingresso ao Poder Judiciário, com fundamento no princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, consagrado no inciso XXXV do artigo 5º da CRFB/88.

NATUREZA JURÍDICA DA JUSTIÇA DESPORTIVA

Instituída pela CRFB/88, a justiça desportiva é o conjunto de instâncias desportivas que integram um sistema de justiça reguladora, fiscalizadora e disciplinadora das ações praticados no campo desportivo e que contrariam a normatização nacional aplicada ao tema.

A justiça desportiva, autônoma e independente dos órgãos de administração desportiva, definida constitucionalmente para processar e julgar fatos decorrentes da atividade desportiva, possui caráter administrativo, extrajudicial, envolve pessoas físicas e jurídicas registradas nas federações e atos realizados nas competições promovidas por estas. A caracterização dos tribunais desportivos como instâncias administrativas visa, meramente, diferenciá-los das instâncias do Poder Judiciário, uma vez que a atuação da justiça desportiva é na esfera privada, sem vinculação alguma com o Direito Administrativo.

Dessa forma, apesar do caráter administrativo dos tribunais desportivos, sua competência está delimitada na Constituição e seus membros devem, necessariamente, observar os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, bem como os demais princípios gerais do direito, sob pena de anulação dos atos pela justiça comum.

AUTONOMIA DAS ENTIDADES DESPORTIVAS

Como explicitado, os primeiros passos da legislação esportiva pátria foram marcados pela intervenção estatal, muito em função dos governos ditatoriais que utilizavam o desporto como um instrumento de manipulação popular. Nesse período, as políticas relativas ao esporte eram adotadas pelo Estado, que tomava todas as decisões de acordo com os seus interesses.

Somente após o advento da CRFB/88, as entidades esportivas passaram a gozar da autonomia organizacional e funcional. O Estado fomenta as políticas públicas para o segmento, como maneira de promoção da cidadania, do lazer, da educação e do completo desenvolvimento humano.

Com efeito, segundo o ensinamento de Piraci Oliveira, “o desporto deve ser encarado como instituição de direito privado, logo, fora do alcance normativo estatal, que deve apenas averiguar o atendimento dos princípios do Estado Democrático de Direito, todos expressos na Constituição” (OLIVEIRA, 2005, p. 106). Assim, ao conferir autonomia aos entes desportivos, o objetivo precípuo do legislador constitucional é evitar que o Estado possa interferir nas questões internas das agremiações esportivas, principalmente no que diz respeito à sua organização e funcionamento.

Prevista no artigo 217, I da CRFB/88, essa autonomia consiste, em termos práticos, na liberdade de a entidade desportiva organizar sua administração, definir seus objetivos, eleger os dirigentes, dispor dos seus recursos. É a garantia que as entidades esportivas possuem para se posicionarem em relação aos rumos que irão seguir, conforme as particularidades da sua organização e funcionamento, observadas as restrições constantes no sistema jurídico-desportivo nacional.

Embora considerada um dos princípios basilares do ordenamento desportivo nacional, a autonomia das associações esportivas não pode contrariar o aparato jurídico vigente. As entidades do desporto não possuem soberania, poderes ilimitados. Suas atividades devem estar em conformidade com as normas jurídicas fundamentais, com a Constituição e com as leis do país, pois estão sujeitas à apreciação judicial como qualquer outra instituição de caráter privado.

Álvaro de Melo Filho, grande doutrinador do Direito Desportivo brasileiro e consultor da Organização das Nações Unidas (ONU) na área do esporte, avalia a autonomia desportiva como “pedra basilar” do ordenamento desportivo brasileiro. Assim discorre o autor sobre o tema:

"(...) ao ser elevada ao patamar constitucional, a autonomia desportiva propicia às entidades desportivas dirigentes e associações uma plástica organização e um flexível mecanismo funcional que permitam o eficiente alcance de seus objetivos. Ou seja, com autonomia os entes desportivos estão aptos a buscar fórmulas capazes de resolver seus problemas, enriquecendo a convivência e acrescentando à sociedade desportiva idéias criativas e soluções inovativas mais adequadas às peculiaridades da sua conformação jurídica (organização) e de sua atuação (funcionamento), desde que respeitados os limites da legislação desportiva nacional e resguardados os parâmetros das entidades desportivas internacionais" (MELO FILHO, 2006, p. 34).

 Acerca do avanço que a constitucionalização da autonomia das entidades desportivas representa, afirma Emile Boudens:

"Não há dúvida de que sua proclamação rompeu com uma relativamente longa tradição de institucionalização do desporto sob tutela estatal e amarrada em políticas paternalistas que tratavam as entidades desportivas como meras executoras das ordens governamentais e se traduziam em isenções fiscais e subvenções, além de numa vasta rede de controles burocráticos" (BOUDENS, 2002, p. 07).

 Essa garantia constitucional da qual gozam as Confederações, Federações, ligas e clubes, confere ao desporto a liberdade necessária para o seu pleno desenvolvimento e modernização. A autonomia permite que as entidades organizem-se no sentido de alcançarem os objetivos que impulsionaram a sua fundação, o que beneficia a prática desportiva sem desconsiderar as diversidades regionais presentes na realidade brasileira (SOUZA, 2005, p. 86).

INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO

 O artigo 5º da CRFB/88, em seu inciso XXXV, assevera que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, garantia conhecida como Princípio da Inafastabilidade de Controle Jurisdicional. Contudo, o próprio texto constitucional guarda uma única exceção a esse mandamento fundamental: quando se tratar de demandas relativas à disciplina e às competições esportivas.

A ressalva consta nos dois primeiros parágrafos do artigo 217, condicionando o conhecimento dessas questões pelo Poder Judiciário ao esgotamento das instâncias da justiça desportiva (§ 1º), que terá o prazo máximo de sessenta dias para proferir a decisão final (§ 2º).

De tal modo, enquanto não percorridos todos os níveis da justiça desportiva ou enquanto o prazo estabelecido não for ultrapassado, o Judiciário estará impedido de apreciar a matéria. Lado outro, advindo qualquer das situações, o interessado estará imediatamente autorizado a socorrer-se ao Judiciário. Cabe salientar que incumbe ao autor da ação na justiça comum provar o exaurimento das instâncias desportivas ou o encerramento do lapso temporal.

Essa restrição consiste em um pressuposto processual, sendo que o seu desrespeito enseja a extinção do processo sem julgamento do mérito ou o indeferimento da inicial.

Decorrido o prazo de sessenta dias, a parte estará livre para abdicar do processo desportivo e formular pretensão junto ao Poder Judiciário, mesmo não havendo decisão da justiça desportiva. O limite de tempo para atuação da instância inicial visa evitar que o processo se prolongue na justiça desportiva sem a oportunidade de ser decidido na via judicial. Nesse sentido, reiteram Alexandre Hellender de Quadros e Paulo Marcos Schmitt: “(...) para impedir que a instância desportiva durasse eternamente e, assim, ficasse esvaziada a possibilidade de acesso ao Judiciário, a Constituição impõe o prazo de sessenta dias para o esgotamento da instância desportiva” (QUADROS; SCHMITT; 2003, p. 22).

No entanto, a justiça desportiva não está proibida de prosseguir com o andamento do feito após o fim do referido prazo. O termo apenas dá ao interessado a prerrogativa de ter o seu litígio contemplado pela justiça estatal. Logo, o processo desportivo pode perfeitamente perdurar por mais de sessenta dias sem prejuízo para a legitimidade das suas decisões, ainda que posteriores ao prazo estipulado pela Constituição.

Transitada em julgado a decisão da justiça desportiva, da mesma forma que acontece com qualquer instância administrativa, esta sujeita-se ao crivo do Poder Judiciário. Ocorrerá o trânsito em julgado do pronunciamento da justiça desportiva quando for proferida decisão da qual não exista mais recurso. Porém, essas determinações só fazem coisa julgada no âmbito desportivo, pois não possuem a definitividade das deliberações do Poder Judiciário. Assim, este deverá cuidar da matéria sempre que provocado (BOGDAN, 2009, p. 57).

O Poder Judiciário poderá, então, anular qualquer ato dos membros da justiça desportiva em que sejam verificados vícios ou irregularidades processuais, tais como a inobservância dos princípios do contraditório, ampla defesa e do devido processo legal.

Ressalte-se, que a garantia do ingresso ao Poder Judiciário após o esgotamento das instâncias jurídico-desportivas é apenas uma alternativa para a parte que se sentir lesada. Enquanto não houver pronunciamento da justiça comum em sentido contrário, as decisões da justiça desportiva são válidas e de cumprimento obrigatório, não sendo necessária confirmação pela via judiciária para que produza os seus efeitos.

As condições de acesso à tutela jurisdicional alcançam somente as lides relacionadas à disciplina e às competições esportivas. Por se tratar de conflitos de outra natureza, mesmo que resultantes de atividade esportiva, não há que se falar na prévia análise da justiça desportiva, sendo que a matéria deverá ser direcionada à justiça comum de imediato.

Com efeito, não se pode olvidar que a prática do esporte pode gerar consequências que extrapolam a competência da justiça desportiva e que, portanto, devem ser apreciados pelo Poder Judiciário.

ESTRUTURA ORGANIZACIONAL

 A LGSD prevê, em seu artigo 52, uma estrutura orgânica e hierárquica para organização da justiça desportiva, nos moldes do Poder Judiciário. Os entes desportivos, a despeito de estarem vinculados às entidades de administração, são autônomos e independentes dessas, operando com plena liberdade decisória.

O artigo 3º do CBJD indica que a justiça desportiva é composta pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), pelos Tribunais de Justiça Desportiva (TJD) e pelas Comissões Disciplinares nacionais e regionais. A jurisdição do STJD corresponde à da entidade nacional de administração do desporto, os TJD possuem a mesma jurisdição das entidades regionais de administração do desporto e, enfim, as Comissões Disciplinares são órgãos colegiados de primeira instância de cada tribunal.

Nesse sentido, existirá um STJD para cada entidade nacional de administração do desporto das diversas modalidades e, ao lado de cada Federação Estadual, haverá um TJD para analisar os fatos relativos a determinado esporte dentro do território da Unidade Federativa. À título exemplificativo, junto à Confederação Brasileira de Futebol (CBF) funciona um STJD que julga em âmbito nacional apenas as questões relativas ao futebol. Do mesmo modo, a Federação Mineira de Futebol (FMF) possui o seu TJD que julga na esfera estadual as questões ligadas às competições futebolísticas por ela realizadas. Logo, não há um STJD unificado, uma vez que cada tribunal atua no âmbito de sua respectiva entidade administradora.

Os artigos 4º e 5º do CBJD abordam a composição dos tribunais desportivos. Os membros que compõem as três instâncias da justiça desportiva são chamados de auditores, que desempenham função delegada pela CRFB/88. O STJD e os TJD de cada modalidade são constituídos por nove membros, dos quais dois são indicados pela entidade de administração do desporto a qual pertence o tribunal, dois são de indicação das entidades de prática desportiva, dois advogados indicados pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), um representante dos árbitros e outros dois indicados pela entidade representativa dos atletas.

Ao seu turno, as Comissões Disciplinares, conforme o art. 4º-A, são compostas por cinco membros indicados pela maioria dos membros dos plenos dos respectivos tribunais desportivos, com a ressalva de que não podem ser componentes dos referidos tribunais. As comissões funcionam com primeira instância junto ao STJD e aos TJD, são responsáveis pela aplicação das penalidades cabíveis às infrações oriundas das competições e que estiverem relatadas na súmula dos certames, bem como às violações ao regulamento da disputa. Poderá ser constituída a quantidade de comissões que o tribunal julgar necessária para suportar sua demanda, possibilitando a celeridade indispensável ao processo desportivo.

Os órgãos judicantes terão um presidente e um vice-presidente, eleitos na forma do seu regimento interno. Os julgamentos exigem a participação da maioria dos auditores. Assim, o quórum mínimo para julgamento no STJD e nos TJD é de cinco auditores e nas Comissões Disciplinares de três.

Frise-se que, com exceção dos membros dos conselhos deliberativos dos clubes, é defeso aos dirigentes desportivos das entidades de administração e de prática esportiva o exercício de cargo ou função na justiça desportiva. Ademais, na forma do artigo 55, § 2º da LGSD, o “mandato dos membros dos Tribunais de Justiça Desportiva terá duração máxima de quatro anos, permitida apenas uma recondução”.

 

PROCESSO E PROCEDIMENTOS DESPORTIVOS                     

O instrumento utilizado pelos órgãos da Justiça Desportiva para a aplicação da legislação, produção de decisões que solucionem a demanda e aplicação da norma desportiva ao caso concreto é o processo desportivo.

O processo desportivo tem por finalidade principal a proteção dos direitos dos atletas, das entidades de prática desportiva e das entidades de administração. Além disso, objetiva a observância das regras de competições, reprimindo as atitudes antidesportivas (DECAT, 2008, p.44).

Decat ressalta as características desse processo:

"O processo desportivo adota um sistema concentrado de instrução e julgamento, que se desenvolve com brevidade, sem comprometer a segurança na apuração dos fatos e na correta aplicação da instrução procedimental, mediante reunião de elementos probatórios, admitindo todas as provas legais, para que no final seja proferida uma decisão fundamentada, clara e precisa." (DECAT, 2008, p. 44).

 De acordo com o artigo 36 do CBJD, os atos do processo desportivo não tem forma determinada, reputando-se válidos os atos que alcancem a sua finalidade essencial. Repise-se que devem ser observadas as garantias do contraditório, da ampla defesa e do duplo grau de jurisdição, além dos demais princípios constitucionais.

O processo desportivo terá seu desenvolvimento por dois procedimentos distintos, como determina o artigo 34. O procedimento sumário é adotado para o julgamento de processos que tratam das infrações disciplinares. Já o procedimento especial visa o processamento de casos mais complexos, como os processos de inquérito, impugnação, mandado de garantia, reabilitação, dopagem, suspensão, desfiliação, revisão, medidas inominadas e transação disciplinar desportiva.

REFERÊNCIAS

 BARREIROS NETO, Jaime. Direito Desportivo. Curitiba: Joruá, 2010.

BOGDAN, Felipe Branco. A Justiça Desportiva e o Poder Judiciário: Uma análise à luz do Princípio da Inafastabilidade do Controle Jurisdicional. In: http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/33839-44319-1-PB.pdf. Acesso em 21 nov. 2012, à 01h.

BOUDENS, Emile. CPI CBF/Nike: Textos e Contexto III – Justiça Desportiva. In: http://www2.camara.leg.br/documentos-e-pesquisa/publicacoes/estnottec/pdf/200437.pdf. Acesso em: 16 jun. 2013, às 20h.

 DECAT, Scheyla Althoff. Direito Processual Desportivo. 1. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008.

 MELO FILHO, Álvaro. Direito Desportivo atual. Rio de Janeiro: Forense, 1986.

 ______. Da Autonomia Desportiva no contexto constitucional. Revista de Direito da UFC, Fortaleza, v. 25, p. 33-46, 2006.

 OLIVEIRA, Piraci. Breves Considerações sobre a Autonomia das Entidades Desportivas na Vigente Ordem Constitucional em Face da Inovação da Lei nº 11.127/05. Revista Brasileira de Direito Desportivo, São Paulo, n. 07, p. 97-106, 2005.

 QUADROS, Alexandre Hellender de; SCHMITT, Paulo Marcos. Comentários ao CNOJDD. In: http://www.esporte.gov.br/arquivos/snear/juventude/codigoDisciplinar.pdf. Acesso em 26 ago. 2013, às 16h.

______. Justiça desportiva vs. Poder Judiciário: um conflito constitucional aparente. In: http://www.esporte.pr.gov.br/arquivos/File/justica_desportiva.pdf. Acesso em 04 ago. 2013, às 09h.

 SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.

 SOUZA, Pedro Trengrouse Laignier de. Princípios de Direito Desportivo. Revista Brasileira de Direito Desportivo, São Paulo, n. 07, p. 61-97, 2005.