1. INTRODUÇÃO

O artigo 1.784 do Código Civil disciplina o princípio da saisine, em que a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros. Dessa forma, assim que aberta a sucessão, a propriedade e a posse da herança são transmitidas aos herdeiros, como se o próprio de cujos o tivesse feito.
No entanto, há casos em que não há herdeiros, legítimos ou testamentários, conhecidos, que possam representar à herança, temos a chamada herança jacente, e posteriormente, a herança vacante.

2. DA HERANÇA JACENTE

2.1. Conceito

O conceito de herança jacente está descrito no artigo 1.819 do Código Civil: "Falecendo alguém sem deixar testamento nem herdeiro legítimo notoriamente conhecido, os bens da herança, depois de arrecadados, ficarão sob a guarda e administração de um curador, até a sua entrega ao sucessor devidamente habilitado ou à declaração de sua vacância".
Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves: "Quando se abre a sucessão sem que o de cujus tenha deixado testamento, e não há conhecimento da existência de algum herdeiro, diz-se que a herança é jacente".
O período de jacência tem caráter temporário e visa evitar o perecimento ou ruína dos bens pertencentes a determinado espólio, para posterior entrega aos herdeiros legítimos ou testamentários que vierem a provar seu interesse e qualidades naquela herança. Caso não haja quem se habilita a receber a herança, será declarada vacante, com incorporação daqueles bens ao patrimônio do poder público.
Como ensina Maria Helena Diniz: "Infere-se daí que a jacência é tão somente uma fase do processo que visa declarar a vacância da herança, daí ser um estado de fato meramente transitório que perdura até o momento da entrega da herança aos herdeiros, que comprovarem sua condição, ou da declaração judicial de vacância".

2.2. Natureza Jurídica

A herança jacente não tem personalidade jurídica, não representa o defunto nem tão pouco os herdeiros. Segundo Caio Mario: "é uma universalidade, sem qualidade para agir, adquirir direitos e contrair obrigações. Nas suas relações, é, contudo, representada pelo curador, a quem incumbem os atos conservatórios (Código de Processo Civil, art. 12)".
Ainda de acordo com Maria Helena Diniz: "Constitui, apenas, um acervo de bens arrecadados por morte do de cujus sujeito à administração e representação, judicial ou extrajudicial, de um curador, a quem incumbem os atos conservatórios."

2.3. Diferença entre herança jacente e espólio

Tanto a herança jacente quanto o espólio, são entes despersonalizados juridicamente, no entanto, o segundo, com a abertura da sucessão, são conhecidos os herdeiros legítimos ou testamentários, enquanto a herança jacente não possui representante, quem tenha interesse por ela.

2.4. Hipóteses de Jacência

De acordo com o art. 1.819 do Código Civil, a primeira hipótese é quando sem testamento, inexistir herdeiros conhecidos, (ascendentes, descendentes, cônjuges e colaterais até o 4º grau). Vale ressaltar que se conhecidos, mas todos renunciarem, a herança será declarada vacante. (art. 1.823 do Código Civil).
A segunda hipótese é quando há testamento, porém inexiste aqueles herdeiros nomeados ou a herança tenham renunciado. Além do defunto não possuir herdeiros legítimos supramencionados. Esclarece Maria Helena Diniz que: "se não houver herdeiro nem testamenteiro, será jacente, por falta de herdeiro e não de testamenteiro; se houver herdeiro e não testamenteiro, não se terá a jacência, pois o herdeiro não deixa de herdar por não haver testamenteiro, e, finalmente, apesar de haver testamenteiro e não existir herdeiro, a herança será jacente, apesar de haver testamenteiro, porque, verificada a inexistência de herdeiro testamentário, o testamenteiro nada tem a fazer".

2.5. Da Arrecadação dos bens e Habilitação dos Herdeiros

Declarada jacente, o juiz deverá determinar as devidas diligências para arrecadação de todos os bens do de cujus, com o devido arrolamento, descrição e avaliação de cada item do patrimônio. Ficará a cargo do juiz dar continuidade ao inventário, nos termos do art. 1.820, do Código Civil.
Serão publicados 3 editais, com intervalo de 30 dias entre cada um, com um prazo total de 6 meses contados a partir do primeiro, para a habilitação de possíveis herdeiros.


3. DA HERANÇA VACANTE

3.1. Conceito

Nos termos do art. 1.820 do Código Civil, será declarada vacante herança que não tenha habilitado herdeiros sucessíveis, decorrido o prazo de um ano de jacência. A vacância é, pois, quase sempre o estado definitivo da herança que foi jacente, nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves.
Assim, os bens serão devolvidos ao poder público, com o prazo de 5 anos, a contar da abertura da sucessão, com a sua final incorporação ao patrimônio publico, de acordo com o art. 1.822 do Código Civil. Esse período é uma garantia para herdeiros que ainda possam se habilitar a receber aquela herança.

3.2. Efeitos

Os principais efeitos da sentença declaratória de vacância, são:
1) Fim dos deveres do curador, como guarda, conservação e administração dos bens;
2) O poder público recebe a herança com propriedade resolúvel, que se tornará definitiva, após passados 5 anos da abertura da sucessão, sem que tenha surgido herdeiro sucessível;
3) Transitada em julgada sentença declaratória de vacância, os herdeiros nada perderão dentro do prazo de 5 anos, podendo reclamar seus bens de direito, com exceção dos colaterais (art. 1.822, §único do Código Civil).


4. CONCLUSÃO

Com a abertura da sucessão, os bens devem ser transmitidos desde logo aos herdeiros, porém há casos em que não se tem conhecimento sobre esses herdeiros, ou estes tenham renunciado a seus direitos sucessórios. São casos em que a herança deverá seguir o processo de vacância, com o devido período de jacência, com o objetivo de retornar ao patrimônio do poder público.


5. BIBLIOGRAFIA
Diniz, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, Vol. 6: Direito das Sucessões. 24. Ed. ? São Paulo: Saraiva, 2010.
Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Vol. 7: Direito das Sucessões. 4. Ed. ? São Paulo: Saraiva, 2010.
Pereira, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil, Vol. VI: Direito das Sucessões. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2009.