DA CONCESSÃO DE AUXÍLIO DOENÇA PARA SEGURADOS COM DOENÇA PREEXISTENTE À FILIAÇÃO AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL 

1.1.     Conceito e Requisitos de Concessão de Auxílio Doença

Destaca Fábio Zambitte Ibrahim[1]sobre o conceito de auxílio doença, “é benefício não programado, decorrente da incapacidade temporária do segurado para seu trabalho habitual”. Tal incapacidade deverá ser superior a 15 dias, pois após este período o empregador não tem obrigatoriedade de pagar o salário do empregado. Após este lapso temporal, o empregado deve encaminhar-se até a pericia médica do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.

E mesmo após a concessão, o segurado é obrigado a ir periodicamente a aquela Autarquia Federal para ser reexaminado, para renovação deste benefício, sob pena de suspensão.

A simples doença do segurado não configura o direito a requer este benefício previdenciário, é necessário a comprovação da incapacidade para atividade laborativa. Como mencionado, a incapacidade poderá ser total ou parcial, caso seja aquela, o segurado terá direito a concessão da Aposentadoria por Invalidez.

Ademais, para que o segurado obtenha êxito nesta concessão, é necessário que o mesmo possui o número exigido de contribuições (carência), neste caso será de 12 (doze) meses, esta é a regra (artigo 25, inciso II, da Lei n°. 8.213/1991). Esta condição há uma exceção, que é encontrada no artigo subsequente aquele, onde traz os casos que independem de carência para requerer benefícios previdenciários, conforme se verifica in verbis:

Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:

II - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como nos casos de segurado que, após filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e do Trabalho e da Previdência Social a cada três anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência, ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado;

Cabe introduzir, que em caso do empregado for doméstico, a rito diferente do que o acima mencionado, pois o auxílio doença para esta classe de trabalhadores inicia no primeiro dia de afastado do labor, por consequência o empregador não tem a responsabilidade de arcar com as despesas dos primeiros 15 (quinze) dias do inicio da incapacidade.

“O segurado empregado em gozo de auxílio doença é considerado pela empresa como licenciado”[2].

O valor pago ao segurado será:

De 91% (noventa e um por cento) do salário de benefício. Conforme o site da previdência social, “o salário de benefício dos trabalhadores inscritos até 28 de novembro de 1999 corresponderá à média dos 80% maiores salários de contribuição, corrigidos monetariamente, desde julho de 1994. Para os inscritos a partir de 29 de novembro de 1999, o salário de benefício será a média dos 80% maiores salários de contribuição de todo o período contributivo. O segurado especial (trabalhador rural) terá direito a auxílio-doença no valor de um salário mínimo, se não contribuiu facultativamente.[3]

O beneficiário do auxílio doença, que porventura recupere sua capacidade para exercer o labor habitual, terá seu benefício cessado. Más se o segurado for  “insusceptível de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade. Não cessará o benefício até que seja dado como habilitado para o desempenho de nova atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não-recuperável, for aposentado por invalidez”, como bem ensina o artigo 62 da Lei n°. 8.213/1991. Bem como o segurado é considerado não suscetível de recuperação, portanto incapacitado permanente, será devido a Aposentadoria por Invalidez.

 No que trata sobre o segurado com mais de uma atividade remunerada:

O auxílio-doença do segurado que exercer mais de uma atividade abrangida pela previdência social será devido, mesmo no caso de incapacidade apenas para o exercício de uma delas, devendo a perícia médica ser conhecedora de todas as atividades que o próprio estiver exercendo”. Nesta mesa diapasão, “quando o segurado exercer mais de uma atividade inpacitar-se definitivamente para uma delas, deverá o auxílio-doença ser mantido indefinidamente, não cabendo sua transformação em aposentadoria por invalidez, enquanto essa incapacidade não se estender às demais atividades.[4]

Demonstrados o conceito, os requisitos, a carência, o valor e as possibilidades da concessão deste benefício ora comentado. Partirei para o núcleo deste trabalho, qual seja, a concessão de auxílio-doença para doentes esquizofrênicos. Partindo da premissa que a maior dificuldade encontrada para requerer tal direito previdenciário, se encontra no artigo 59, parágrafo primeiro, onde se depara com uma restrição/impedimento. No tópico seguinte esmiuçarei de forma detalhada e precisa, inclusive colacionado jurisprudências sobre este tema, e sobre tal direito.

1.2.     Da Concessão de Auxílio Doença para Segurado com Doença Preexistente à Filiação ao RGPS

 

Conquanto pelo que já fora elucidado nos capítulos pretéritos, irei apenas adentrar ao tema do mérito deste trabalho. É precípuo citar o caso da doença esquizofrenia, que será tratada neste tópico, ao tratar de doença preexistente. A definição de esquizofrenia, tem sua origem em dois termos gregos: schizo (“divisão”, “cisão”) e phrenos (“mente”)[5].

É peremptório trazer o conhecimento profundo sobre a realidade da doença, ora abordada:

Pessoas com diagnóstico de esquizofrenia são conduzidas a um longo afastamento da realidade externa, com enorme desgaste emocional e econômico para si, suas famílias e sociedade (NUNES FILHO BUENO E NADRI, 2005). A esquizofrenia é uma doença abrangente que afeta todas as dimensões do ser humano. Define-se como a ausência da capacidade de executar o autocuidado associado a distúrbios sócio ocupacionais que duram em torno de no mínimo seis meses e que também incluem sintomas positivos como delírios, alucinações, discurso e comportamento desorganizado, e sintomas negativos como na definição de si mesmo, como no âmbito do afeto, na ausência do comportamento esperado, na avolia, e nas relações interpessoais devendo estar presentes dois ou mais destes sintomas por pelo menos um mês. (DSM IV TR, 2002)[6].

Neste contexto, os doentes esquizofrênicos deparam com um impedimento e restrição no momento de requerer a concessão de um benefício previdenciário, mas precisamente um auxílio-doença, Neste contexto, o artigo 59, paragrafo único, da Lei n° 8.213/1991, diz “não será devido auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício”. Desta maneira que o Instituto Nacional de Seguro Social – INSS posiciona-se referente a cerca do indeferimento deste benefício, com o posicionamento do artigo supra citado, ou seja, alegando que o segurado/contribuinte, inscreveu no RGPS, com a finalidade apenas de almejar um benefício devido sua incapacidade de labor.

Acontece que no momento da inscrição no RGPS, que é ato meramente formal, pelo qual o segurado fornece dados pessoais para sua identificação à autarquia previdenciária (artigo 17 do Regulamento da Previdência Social - RPS), nada de comprovação de alguma doença grave ou simplesmente um atestado médico, declarando que o segurado não possui nenhuma enfermidade grave. Pois somente assim poderia o ente previdenciário alegar que o contribuinte filiou-se ao RGPS, portador de doença ou lesão.

Tudo que foi relatado supra, trata-se da regra geral, e adotada e pelo INSS, más, neste mesmo artigo em comento, encontra-se o amparo legal que fortalece a tese que todos os doentes esquizofrênicos possuem o direito liquido e cristalino de requerer a concessão do Auxílio-Doença.

Na segunda parte do parágrafo único, traz a exceção da regra geral, quando relata “salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão”, essa exceção deixa margem a uma interpretação favorável ao segurado esquizofrênico, pois tal doença com o passar do tempo, na maioria dos casos, sofre uma progressão dos sintomas, levando o individuo à incapacidade mental, ocasionando, consequentemente o agravamento da doença. Este entendimento coaduna com as lições do Ilustre Prof. Hélio Gomes, que assim ensina:

A esquizofrenia é uma psicose endógena, caracterizada essencialmente por um enfraquecimento psíquico especial, de marcha progressiva, sobrevindo em geral na adolescência, sem nunca comprometer a saúde física do doente (in MEDICINA LEGAL, Freitas Bastos, 18ª Edição, pág. 175)[7].

Nesta esteira, do direito previdenciário pátrio, adota o princípio da norma mais benéfica, devido o caráter alimentar de tal demanda, com o objetivo de fornecer uma vida digna ao contribuinte.

 A jurisprudência do Turma Nacional de Uniformização (TNU), que tem a competência de apreciar os incidentes de uniformização de interpretação de lei federal, já pronunciou favorável em casos de concessão de benefício previdenciário para segurados filiados ao RGPS com alguma enfermidade, conforme se vê:

PROCESSO: 2004.61.84.059713-2

ORIGEM: SP - SEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO

REQUERENTE: ANGELA MARIA ELIAS LEONARDI

PROC./ADV.: TIAGO DE OLIVEIRA BUZZO

REQUERIDO(A): INSS

PROC./ADV.: ALEXANDRE AZEVEDO

RELATOR(A): JUIZ FEDERAL SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ASSUNTO: Previdênciário - Auxílio-Doença (Art. 59/64) - Benefícios em Espécie/ Concessão/ Conversão/ Restabelecimento/ Complementação

EMENTA

PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DA INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL (LEI N.º 8.213/91, ART. 42, § 2.º). CONTRARIEDADE À JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA CARACTERIZADA. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO ADMITIDO. UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS, NA LINHA DOS PA RADIGMAS INVOCADOS.

Demonstrado que o acórdão que deu origem ao pedido de uniformização contraria a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça, e preenchidos os demais requisitos legais, admite-se o pedido de uniformização.

Uniformização da interpretação do artigo 42, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, no sentido de que, preenchidos os demais requisitos legais, a doença de que o segurado é portador, ao filiar-se ao RGPS, não obsta a concessão da aposentadoria por invalidez, se a incapacidade decorre da progressão ou agravamento dessa doença, e é superveniente a essa filiação.[8]

 

Esta decisão nada mais é, do que a reiteração de um direito, do qual o Instituto Nacional do Seguro Social, nega a enxergar. Deixando vários segurados a mercê do Poder Judiciário.

Adiciono ainda o entendimento pacificado entre os Tribunais Federais, acerca da progressão ou agravamento de doença preexistente ao inicio de filiação a Previdência Social, e a concessão de Auxílio Doença:

PREVIDENCIÁRIO. CONCESÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. PROGRESSÃO E AGRAVAMENTO DA DOENÇA. ESQUIZOFRENIA. APLICAÇÃO DO ART. 42, PARÁGRAFO 2º, DA LEI 8.213/91. 01. SE O SEGURADO, À ÉPOCA DA SUA FILIAÇÃO AO REGIME PREVIDENCIÁRIO, JÁ SOFRIA DE ALGUM MAL, MAS QUE, COM O PASSAR DOS ANOS, SOREU AGRAV AMENTO OU PROGRESSÃO, TEM ELE DIREITO A REQUERER O BENEFÍCIO DE AUXÍ LIO-DOENÇA, SE ESTA PROGRESSÃO DA DOENÇA ACARRETOU SUA INCAPACIDADE LABORATIVA TEMPORÁRIA. 02. INTELIGÊNCIA DO ART. 42, PARÁGRAFO 2º, DA LEI 8.213/91 (PLANO DE BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA). 03. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.42PARÁGRAFO 2º8.21342PARÁGRAFO 2º8.213 (95950 PE 96.05.06795-1, Relator: Desembargador Federal Araken Mariz, Data de Julgamento: 16/09/1996, Segunda Turma, Data de Publicação: DJ DATA-11/10/1996 PÁGINA-77329).[9]

PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA. PROGRESSÃO OU AGRAVAMENTO DE DOENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.1- Constatando o perito judicial a incapacidade do segurado para sua atividade habitual, deverá ser restabelecido o benefício de auxílio-doença.2 - A legislação previdenciária permite a sua concessão quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento de doença ou lesão.3 - Honorários advocatícios reduzidos ao percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, de acordo com os ditames do art. 20, § 4.º do Código de Processo Civil. Precedentes deste Tribunal.20§ 4.ºCódigo de Processo Civil4- Apelação e Remessa Necessária parcialmente providas para reduzir os honorários advocatícios ao percentual de 10% sobre o valor da condenação.(292458 2002.02.01.030947-4, Relator: Desembargador Federal ABEL GOMES, Data de Julgamento: 30/09/2003, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJU - Data::12/11/2003 - Página::60).[10]

Por fim, a conclusão é que o disposto no parágrafo único do artigo 59, da Lei n°. 8.213/1991, o qual trata de enfermidade ou doença preexistente à filiação do segurado, situação em que o segurado não estará protegido e não será possível requerer o auxílio-doença, salvo se o motivo da concessão do benefício for o agravamento dessa doença ou lesão que veio a incapacitar o indivíduo para seu trabalho.  Registre-se que não pode haver impedimento algum à filiação junto ao Regime Geral de Previdência Social de pessoa portadora de doença, mas que tenha condições de trabalhar, pois entendimento contrário configuraria uma discriminação.



[1] IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 14ª Edição. Niterói – RJ: Editora Impetus Ltda, 2009. p. 646-647

[2] MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 26ª Edição. São Paulo: Editora Atlas S.A, 2008. p. 322.

[3] Disponível em: <http://www.previdencia.gov.br/conteudoDinamico.php?id=431> Acesso em: 12 de Junho de 2013.

[4] IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 14ª Edição. Niterói – RJ: Editora Impetus Ltda, 2009. p. 652.

[5] Disponível em: <http://conceito.de/esquizofrenia> Acesso em 12 de Junho de 2013.

[6] Disponível em: <http://ged.feevale.br/bibvirtual/Monografia/MonografiaAndreSantos.pdf> Acesso em 13 de Junho de 2013.

[7] BASTOS, Freitas. In Medicina Legal, 14ª Edição. Niterói – RJ. Livraria Freitas Bastos. p. 175.

[8] Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/5515586/pedido-de-uniformizacao-de-interpretacao-de-lei-federal-200461840597132-sp-tnu> Acesso em: 13 de Junho de 2013.

[9] Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/96512/apelacao-civel-ac-95950-pe-960506795-1-trf5> Acesso em 13 de Junho de 2013.

[10] Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/864110/apelacao-civel-ac-292458-20020201030947-4-trf2> Acesso dia 13 de Junho de 2013.