INTRODUÇÃO

É patente a insuficiência e a falibilidade da atuação legislativa frente as incessantes inovações práticas que reclamam composição jurisdicional. Isso deve servir de incentivo, e não de desalento, à tentativa de melhor entrelaçar a lei aos anseios sociais.

Neste passo, deve ser constante a preocupação dos estudiosos do direito em atribuir ao ordenamento jurídico uma interpretação mais condizente com sua real capacidade de propiciar às partes o gozo de seus direitos, proporcionando que a sentença final seja também a mais justa composição da lide.

Induzidos pela tendência que autoriza aos institutos processuais civis a mais ampla irradiação dos efeitos positivos deles decorrentes, parcela dos doutrinadores defende a utilização de medidas antecipatórias em todas as fases processuais, inclusive no juízo recursal, apesar de se tratar de medida prevista no Livro do Processo de Conhecimento.

A inexistência de manifestação expressa do legislador, no próprio artigo 273 do Código de Processo Civil, no que pertine ao momento processual adequado para formulação e apreciação do pedido de antecipação dos efeitos da tutela deu azo à tormentosa discussão até hoje existente em relação à possibilidade, ou não, de aplicação da antecipação dos efeitos da tutela em sede recursal.

É de se ressaltar que essa discussão somente fez-se mais tênue com a gradativa sedimentação da medida antecipatória como espécie do gênero "tutelas de urgência". Infalivelmente, tal verificação conduziu o intérprete a admitir a proposta do legislador de propiciar maior efetividade ao processamento e ao julgamento das demandas judiciais, o que, inclusive, ficou evidenciado na previsão expressa do "efeito ativo" do agravo de instrumento (artigo 527, inciso III, do Código de Processo Civil).

Somente a realização de uma interpretação teleológica e pragmática seria capaz de auxiliar na melhor interpretação do artigo 273 do Código de Processo Civil, pois é justamente o fato de se tratar de uma medida de urgência que lhe confere aplicação durante toda a tramitação processual, inclusive depois de atingida a cognição exauriente, logicamente, desde que comprovada a sua imprescindibilidade.

2 ANÁLISE DA TUTELA ANTECIPATÓRIA À LUZ DO SISTEMA RECURSAL BRASILEIRO

Não se pode olvidar que o tempo despendido com o processamento e julgamento de eventual recurso interposto em uma lide também é computado como parcela do lapso temporal total de tramitação do feito. Seria justo, portanto, fossem disponibilizados às partes meios expeditos visando a aceleração da etapa recursal, pois que, uma vez reduzido o processamento desta, mais garantidos estariam o combate aos efeitos corrosivos do tempo sobre os direitos sub judice ea razoável duração do processo.

Não raro, os recursos são manejados pela parte desprestigiada pela decisão recorrida como forma de postergar a realização fática do direito do litigante já amparado judicialmente. Essa atitude meramente protelatória vai de encontro ao disposto no artigo 14, inciso V, do Código de Processo Civil e ao ditame constitucional insculpido no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Carta Mãe (princípio da razoável duração do processo). Segundo este dispositivo:

Art. 5º (...)

LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Tomadas essas duas justificativas e admitindo que o instituto da antecipação dos efeitos da tutela deve prestigiar a parte que demonstra deter o melhor direito, reforçada está a viabilidade de aplicação da antecipação dos efeitos da tutela como forma de sumarização da tramitação recursal, principalmente porque não há qualquer vedação no artigo 273 do Diploma Processual Civil nesse sentido.

De mais a mais, o recurso não inaugura nova lide entre as partes, ainda quando processado em autos apartados, situação verificável no agravo de instrumento. Assim, em se tratando de mero prolongamento do processo originário, a utilização da antecipação dos efeitos da tutela revela-se plenamente aceitável.

A intenção do legislador parece ter sido mais ampla do que de início se pôde imaginar. A não vinculação da antecipação dos efeitos da tutela ao juízo originário restringiu as hipóteses em que as espécies recursais, por ineficiência de proteção aos direitos subjetivos em conflito, eram substituídas pelas denominadas ações autônomas, nelas compreendidas o mandado de segurança. Essas ações autônomas – muitas vezes admitidas com desvio de finalidade - ocasionavam desgaste ainda maior aos direitos dos litigantes, porquanto facultavam prazo mais dilargado para seu ajuizamento e processamento.

Apesar de suprirem lacuna existente na legislação processual, as características inerentes a essas ações autônomas, por si só, refletem que ocorria, na verdade, intensificação do desgaste experimentado pelas partes. Assim se pode afirmar porque eram necessários inúmeros novos atos de comunicação - inclusive novo ato citatório - e de despesas com custas processuais, honorários advocatícios e outros gastos decorrentes da manutenção do litígio.

Diga-se de passagem, algumas espécies dessas ações autônomas autorizavam, até mesmo, a dilação probatória (o que não se verificava, porém, no mandado de segurança). Nesta esteira, pouco, ou em nada, contribuía a nova lide para o resguardo do direito já ameaçado ou na iminência de sê-lo.

A indignação exasperada de alguns doutrinadores com relação ao desvirtuamento de funções, e até mesmo com a inefetividade das medidas adotadas era manifesto. Vejamos:

Até quando abusarás, ó Catilina! Cautelares e liminares: catástrofe nacional! [...] A cautelar previne (meio) a futura tutela (fim). Antecipar essa tutela é exorbitar. A satisfatividade de cautelar só é admissível quando inexista outro meio de assegurar a efetividade da futura tutela fora da antecipação essa tutela. Aqui, entre antecipar (satisfazer provisoriamente) e deixar sem segurança a efetividade da futura tutela, impõe-se, em favor desta última, aceitar-se a excepcionalidade da primeira. Fora dessa hipótese, cautelar satisfativa é arbítrio sobre arbítrio que, se usássemos analogicamente a linguagem matemática, poderia ser chamado de arbítrio ao quadrado[1].

Há muito, o Diploma Processual Civil Brasileiro reclamava providência para suprir a lacuna em referência, mediante instituição de uma medida capaz de proporcionar a satisfação fática de direitos, inclusive em sede recursal e em ações com processamento originário perante os Tribunais, v.g., a ação rescisória. Não poderiam, portanto, os operadores do direito deixar escorrer por entre os dedos os bons resultados atingíveis mediante a mais ampla aplicação da antecipação dos efeitos da tutela.

É evidentemente contrário à evolução do pensamento processualístico considerar que o instituto da antecipação os efeitos da tutela, que se justifica perante o juízo de verossimilhança e prova inequívoca do alegado direito, verificável muitas das vezes ainda na petição inicial, mantenha-se adstrito ao juízo de 1º grau.

Como medida de urgência que é, e diante da necessidade de fiel observância aos princípios constitucionais do acesso à justiça e da razoável duração do processo, tal instituto deve adaptar-se aos recursos em espécie, colaborando na estruturação sólida de um ordenamento processual civil voltado à consecução da justiça.

Considerando que quando interposto recurso atinge-se o cume da cognição possível de ser desempenhada sobre o feito até aquele dado momento processual, tanto mais elevada a instância recursal, mais restritas são as possibilidades de se recorrer e maiores as oportunidades de o julgador aferir a veracidade das alegações deduzidas em juízo.

Repita-se, impedir que o juízo ad quem se valha do instituto da antecipação dos efeitos da tutela vai de encontro aos princípios da efetividade, da inafastabilidade do poder jurisdicional, do amplo acesso à justiça, da razoável duração do processo e da celeridade, não merecendo, portanto, qualquer amparo.

3 DA TUTELA ANTECIPATÓRIA NO AGRAVO DE INSTRUMENTO

A relevância do agravo reside justamente no fato de ser o recurso manejável contra todos os tipos de atos judiciais de caráter decisório, proferidos em juízo de primeiro grau ou em grau recursal, monocrática ou colegiadamente, desde que esse ato não se enquadre naqueles casos previstos nos artigos 267 e 269 do Código de Processo Civil (sentenças terminativas e extintivas, respectivamente).

Trata-se, portanto, de recurso por meio do qual a lei possibilita a modificação ou substituição do ato judicial que tenha gerado, ou que seja capaz de gerar, prejuízo às partes, para que seja vertida nova manifestação jurisdicional decisória.

Conforme descrito no artigo 522 do Código de Processo Civil, essa espécie recursal divide-se em dois subtipos: agravo retido e agravo de instrumento. Não se pode olvidar, porém, que também o agravo regimental é um subtipo de agravo, mas somente manejável em perante os Tribunais (em ação originária ou em recurso).

Quanto ao agravo retido, afigura-se evidente que não há razão justificadora para formulação de pedido de antecipação da tutela de urgência. Diga-se de passagem, esta última espécie de agravo somente será apreciada por ocasião de eventual interposição de recurso de apelação. Em situações como essa, o pleito antecipatório seria mais justificadamente elaborado nas próprias razões da apelação, vez que a análise do agravo retido está condicionada ao recebimento do recurso de apelação, restando inócua a postergação da apreciação do pedido antecipatório para momento tão tardio do feito.

Em regra, o agravo de instrumento tem apenas o efeito devolutivo. Quanto ao efeito suspensivo, nas hipóteses previstas no artigo 558 do CPC (nos casos de prisão civil, adjudicação, remição de bens, levantamento de dinheiro sem caução idônea e em outros casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação), em havendo requerimento do agravante e relevante fundamentação, pode o relator concedê-lo.

De acordo com o caput do art. 522 do CPC, o agravo só poderá ser do tipo "instrumento" acaso configurada uma das seguintes situações: 1) quando destinado a atacar decisão que se mostre suscetível de causar à parte recorrente lesão grave e de difícil reparação; 2) quando interposto contra a decisão que inadmitir a apelação; e 3) quando o agravo for oposto contra ato judicial que decidir acerca dos efeitos em que a apelação é recebida.

A atribuição de efeito suspensivo nos casos em que a decisão fustigada é indicada também como causadora de lesão grave ou de difícil reparação ao agravante, o que se verifica é que o requisito autorizador do efeito suspensivo (lesão grave e de difícil reparação) coincide com o requisito específico autorizador do agravo por instrumento (dano irreparável ou de difícil reparação).

A existência de identidade entre um dos requisitos da tutela antecipada assecuratória e os pressupostos do efeito suspensivo no agravo de instrumento evidencia uma conseqüência inevitável: todas as vezes em que o pleito antecipatório tiver sido denegado pelo juízo a quo e contra a decisão deste for interposto recurso de agravo, os mesmos motivos justificadores do requerimento da reapreciação do decisum também o serão para requerer seja conferido efeito suspensivo ao recurso manejado.

Desta afirmação extrai-se que todo recurso de agravo que tenha por objeto a decisão de 1º grau, denegatória do pleito antecipatório, será possível de ser interposto por instrumento (formando novos autos e tornando mais morosa a tramitação da ação no juízo originário) e viabilizará o pedido de concessão do efeito suspensivo (evitando que a decisão recorrida surta efeitos), o que, evidentemente, está na contramão da evolução processualística, mantendo morosa e tortuosa a marcha processual.

Diferentemente dos demais recursos previstos na legislação processual civil, não só desses dois efeitos (devolutivo e suspensivo) se reveste o agravo de instrumento. Agora sim, priorizando a rápida atuação do direito em benefício daquele que aparenta de forma verossímil ser merecedor de guarida jurídica, a Lei nº 10.352, de 26 de dezembro de 2001, acrescentou um terceiro tipo de efeito ao agravo de instrumento, o qual, doutrinariamente, convencionou-se denominar de "efeito ativo", alocado no artigo 527, inciso III, do CPC.

Eis a redação do referido dispositivo:

Art. 527 - Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator:

I - [...];

II - [...];

III - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso (art. 558), ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão; [...].

Esse terceiro efeito oportuniza a elaboração de pedido de tutela antecipatória nas próprias razões ou contra-razões recursais, possibilitando a realização antecipada dos efeitos decorrentes do futuro provimento do agravo de instrumento interposto. Trata-se de legítima e incontestável previsão legal para utilização da medida antecipatória também em sede recursal, abrindo autorizado precedente.

O "efeito ativo" se fez premente no ordenamento processual civil porquanto a concomitância do efeito devolutivo com o efeito suspensivo no agravo de instrumento, em determinadas situações, não era capaz de evitar a ocorrência de lesão grave e de difícil reparação[2].

Essa insuficiência da atribuição dos efeitos devolutivo e suspensivo ao recurso de agravo fez com que a doutrina, seguida da legislação, envidasse esforços no sentido de disponibilizar proteção ao direito material da parte agravante quando denegatória a decisão agravada, visando impedir a ocorrência da alegada lesão.

Essa é a característica mais evidente do "efeito ativo" atribuível ao agravo de instrumento: propiciar à parte agravante a tutela do direito subjetivo com celeridade e eficácia, evitando que incidam sobre seus direitos os efeitos corrosivos do tempo e rateando, na medida do possível, os prejuízos decorrentes da morosa tramitação processual[3].

Não bastasse seu alto grau de capacidade de cumprir o seu mister, a previsão deste último efeito preencheu de forma parcial, porém inexorável na parte que o fez, a lacuna relegada pelo legislador no artigo 273 do CPC, no que pertine aos momentos em que seria admissível a antecipação dos efeitos da tutela. Tal permissão processual deixou patente a possibilidade de ser manejada a medida antecipatória em sede recursal, mais especificamente, no agravo de instrumento, concretizando em mais uma esfera processual a realização do princípio do acesso à justiça.

O efeito ativo no próprio recurso impede o manejo do mandado de segurança para esse mesmo fim, reduzindo, com isso, a sua utilização desmedida. Assim, evita o ajuizamento de uma nova ação com o propósito de modificar a decisão interlocutória omissa ou denegatória do pedido, restando dispensadas maiores formalidades no tocante aos atos de comunicação acerca da tramitação e julgamento do incidente, o que, somado, favorece o deslinde mais célere e resumido do feito.

Porém, as divergências acerca do instituto da antecipação dos efeitos da tutela são inúmeras, sendo que os processualistas têm questionado, inclusive, se há discricionariedade na apreciação do pedido de atribuição do "efeito ativo" ao recurso de agravo eventualmente interposto.

Parcela considerável da doutrina, dentre eles Cândido Rangel Dinamarco[4], seguido pela jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás[5], defende que o relator do recurso atua discricionariamente na análise do pleito antecipatório recursal. De outro lado, há doutrinadores, tal como José Roberto dos Santos Bedaque[6] e Antônio Cláudio da Costa Machado[7], que defendem inexistir poder discricionário nesta atuação jurisdicional, aduzindo que, estando preenchidos os requisitos delineados na lei, é dever do julgador conferir o "efeito suspensivo ativo" reclamado[8].

A relevância de investigar a natureza do ato jurisdicional neste caso reside no fato de que somente o ato discricionário de agente público desafiaria a impetração de mandado de segurança.Destarte, a admissibilidade do mandamus contra a decisão denegatória do "efeito suspensivo ativo" está atrelada à existência do caráter discricionário da decisão do relator, dependendo, por assim dizer, da corrente adotada pelo julgador.

Não bastassem as divergências com relação ao pano de fundo da matéria, constata-se que alguns estudiosos apenas divergem da denominação conferida a esta última providência. Dentre eles, Barbosa Moreira defendia a possibilidade de o agravo se revestir dos efeitos devolutivo e suspensivo e da antecipação dos efeitos da tutela, porém, refuta a denominação "efeito ativo", alegando tratar-se de "antecipação da tutela recursal".

Eis aqui sua posição parafraseada por William Santos Ferreira[9]:

Como bem ressalta Barbosa Moreira, evidentemente não se trata de 'suspender' a decisão agravada, eis que suspender o que foi negado nada representa – o que o agravante pretende é substituir uma negação por uma afirmação. Talvez em razão disto é que vem sendo utilizada a equivocada terminologia 'efeito ativo' – equivocada, porque estar-se-ia dizendo que suspender os efeitos de uma decisão seria um 'efeito passivo', o que evidentemente não guarda qualquer sintonia, pois tanto a interposição do recurso quanto a decisão do relator, inclusive suspendendo os efeitos da decisão impugnada são situações processualmente ativas; e, quanto ao 'efeito em si', como se verá, a concessão da tutela antecipada (o batizado 'efeito ativo') é decorrência do efeito devolutivo, daí preferirmos a denominação antecipação da tutela recursal. A relação existente entre os dois – efeito suspensivo e 'efeito ativo' -, que justifica a possibilidade do segundo, é o tratamento desigual decorrente da posição que sustenta o cabimento tão-somente do efeito suspensivo.

Como bem ressalta Barbosa Moreira, evidentemente não se trata de "suspender" a decisão agravada, eis que suspender o que foi negado nada representa – o que o agravante pretende é substituir uma negação por uma afirmação. Talvez em razão disto é que vem sendo utilizada a equivocada terminologia 'efeito ativo' – equivocada, porque estar-se-ia dizendo que suspender os efeitos de uma decisão seria um 'efeito passivo', o que evidentemente não guarda qualquer sintonia, pois tanto a interposição do recurso quanto a decisão do relator, inclusive suspendendo os efeitos da decisão impugnada são situações processualmente ativas; e, quanto ao 'efeito em si', como se verá, a concessão da tutela antecipada (o batizado 'efeito ativo') é decorrência do efeito devolutivo, daí preferirmos a denominação antecipação da tutela recursal. A relação existente entre os dois – efeito suspensivo e 'efeito ativo' -, que justifica a possibilidade do segundo, é o tratamento desigual decorrente da posição que sustenta o cabimento tão-somente do efeito suspensivo.

A manifestação da mais abalizada doutrina e jurisprudência manteve-se, pois, jungida ao propósito de que se valeu o doutrinador quando da introdução da figura do "efeito ativo". Proporciona a redução da utilização desviada de sucedâneos recursais para fins de defesa do direito das partes litigantes e a aceleração e efetividade do processamento e julgamento do feito.

Em sentido avesso, a Lei nº 11.187, de 19 de outubro de 2005, exterioriza andamento retrógrado com relação à nova redação atribuída ao parágrafo único do artigo 527 do Código de Processo Civil. Tal dispositivo impede a rápida realização do direito da parte agravante ao estabelecer que, salvo nos casos em que o próprio relator a reconsiderar, a decisão que decidir acerca da conversão do agravo de instrumento em agravo retido e aquela que atribuir efeito suspensivo e/ou ativo[10] somente será reformável no momento do julgamento do agravo de instrumento.

A manifestação expressa do legislador com relação à impossibilidade de reforma da decisão antes do julgamento final do agravo, exceto nos casos em que o próprio relator reapreciar a decisão prolatada, reabre oportunidade para impetração de mandado de segurança[11].

Existem, porém, alterações viáveis introduzidas por esta mesma Lei nº 11.187/2005 à redação do artigo 527 do CPC. Relevante para o momento indicar que não pairam mais controvérsias no que respeita à competência para a apreciação do pedido de efeito suspensivo e suspensivo ativo no agravo de instrumento.

Eis o dispositivo legal em comento:

Art. 527 - Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator:

I - negar-lhe-á seguimento, liminarmente, nos casos do art. 557;

II - converterá o agravo de instrumento em agravo retido, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, mandando remeter os autos ao juiz da causa;

III - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso (art. 558), ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão;

IV - poderá requisitar informações ao juiz da causa, que as prestará no prazo de 10 (dez) dias;

V - mandará intimar o agravado, na mesma oportunidade, por ofício dirigido ao seu advogado, sob registro e com aviso de recebimento, para que responda no prazo de 10 (dez) dias (art. 525, § 2º), facultando-lhe juntar a documentação que entender conveniente, sendo que, nas comarcas sede de tribunal e naquelas em que o expediente forense for divulgado no diário oficial, a intimação far-se-á mediante publicação no órgão oficial;

VI - ultimadas as providências referidas nos incisos III a V do caput deste artigo, mandará ouvir o Ministério Público, se for o caso, para que se pronuncie no prazo de 10 (dez) dias.

Parágrafo único. A decisão liminar, proferida nos casos dos incisos II e III do caput deste artigo, somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar.(sem grifo no original)

De forma bastante concisa e objetiva, Adriana Estigara[12], em monografia sobre o tema sustenta que:

Demonstra-se, assim, que uma das formas preconizadas pelo sistema recursal brasileiro para se obter a antecipação da tutela jurisdicional, obstando-se os efeitos de uma decisão com ela incompatível ou proporcionando o seu gozo, após seu pedido ter sido negado em primeira instância, é o manejo do recurso de agravo de instrumento, especialmente diante da circunstância de tais providências serem autorizadas pela pessoa do relator, antecipadamente à análise da questão pelo colegiado, afastando-se os efeitos perniciosos do decurso do tempo. (sem grifo no original)

Assim, a nova redação do artigo 527 do Código de Processo Civil registrou, de forma expressa, a competência do relator do agravo de instrumento para apreciação do pedido de concessão de efeito suspensivo e do pleito antecipatório recursal. A inovação não merece reparos neste sentido, pois, ao atribuir a competência ao relator do agravo, retirando-a do colegiado, evita atuação tardia do órgão jurisdicional na apreciação e defesa dos direitos das partes envolvidas na lide.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com espeque nas análises realizadas, extrai-se que a antecipação dos efeitos da tutela é uma das ferramentas processuais disponibilizadas pelo legislador para alcance da eficiência na prestação jurisdicional, muitas das vezes, idônea a impedir a ocorrência dos efeitos corrosivos do tempo sobre os direitos em litígio.

Nesta esteira, em se tratando de tutela de urgência, indiscutível é a sua relevância e a necessidade de sua mais irrestrita aplicação, mediante interpretação eficiente do dispositivo que a regulamenta, tudo, é claro, sem descurar do princípio da segurança jurídica.

Apesar do premente combate à utilização desmedida da antecipação dos efeitos da tutela, vê-se que o seu uso não pode ser um instituto represado em primeira instância, mas que terá sua função marcante, até com maior razão, no âmbito recursal, principalmente perante o agravo de instrumento. É daí que se retira o incentivo ao uso racional e adequado da medida.

Não poderia ser diferente, a possibilidade de recorrer da decisão do juízo a quo é que justifica a extensão da ordinariedade, pois, dessa forma, o mencionado instituto estaria atendendo o desiderato para o qual foi criado, afastando os efeitos perniciosos da protelação que se oportuniza com eventual ajuizamento de recurso e atendendo ao que disciplina os princípios da efetividade, da inasfastabilidade do poder jurisdicional, do amplo acesso à justiça, da razoável duração do processo e da celeridade.

O legislador, em sintonia a necessidade de evitar lesão grave e de difícil reparação ao direito dos litigantes e mediante alteração da redação do artigo 527, inciso III, do Código de Processo Civil, eliminou qualquer dúvida acerca da possibilidade de antecipação dos efeitos da tutela no recurso de agravo de instrumento ao sacramentar a existência do "efeito ativo" para tal espécie recursal, bem como indicou o relator como autoridade competente para respectiva apreciação.

Indubitavelmente, tal previsão legal facilita a concretização do trinômio garantia-efevitidade-celeridade em diversas lides e gera autorizado precedente acerca da utilização da medida antecipatória em sede recursal de forma mais generalizada, o que se defende em prol da incolumidade dos direitos em conflito e da imagem do Poder Judiciário na consecução de seu mister.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela Cautelar e Tutela Antecipada: Tutelas Sumárias e de Urgência (tentativa de sistematização). 2. edição. CIDADE: Ed. Malheiros, 2001.

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil.8. ed. CIDADE: Ed. Lumem juris; 2002.

DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.

MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Tutela antecipada. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998, p. 567.

NERY JÚNIOR, Nelson. Teoria Geral dos Recursos: Recursos no Processo Civil - 1. 6. ed. atualizada e reformulada. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2004.

PASSOS, José Joaquim Calmon de. A crise do poder judiciário e as reformas do poder judiciário e as reformas instrumentais: avanços e retrocessos. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil nº 15 – JAN-FEV/2002.

SANTOS, Ernane Fidelis dos. Manual de Direito Processual Civil. Vol. I. São Paulo: Saraiva, 2000.

THEODORO JUNIOR, Humberto. Tutela Antecipada. Aspectos polêmicos da antecipação de tutela.São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

WAMBIER, Tereza Arruda Alvim (Coord). Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

WATANABE, K. Tutela antecipatória e tutela específica das obrigações de fazer e não fazer (art. 273 e 461 do CPC). Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1996.

ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 2. edição. São Paulo: Saraiva, 1999.


[1]PASSOS, José Joaquim Calmon de, Revista de Processo, nº 71, p. 227, apud, Roberto ARMELIN, Notas sobre antecipação de tutela em segundo grau de jurisdição, In: Aspectos polêmicos da antecipação de tutela, coordenado por Teresa Arruda Alvim Wambier, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 437.

[2]Cite-se, por exemplo, os casos em que a parte recorre de decisão denegatória de um pedido cautelar efetuado em sede da inicial (liminar). Neste caso, a devolução da matéria debatida para reapreciação e a suspensão do ato recorrido não obstam a concretização da lesão grave e de difícil reparação, porque incapaz de gerar alteração no direito material das partes. Diz-se ineficiente porque a suspensão atua sobre os efeitos do ato decisório e, em se tratando de decisão que tenha negado realização de um direito material reclamado, ela simplesmente não possui efeitos a surgir, o que indica a falta de objeto do efeito suspensivo e que o dano que se pretendia evitar permanece ileso.

[3]"AGRAVO DE INSTRUMENTO. LIMINAR CONCEDIDA. MANUTENCAO. Mantem-se a liminar que se mostra oportuna e nos limites do permissivo legal, razão ela qual concede-se o efeito suspensivo ativo para manter suspensa multa imposta ante o perigo de dano irreparável, até a efetiva prestação jurisdicional. Agravo de instrumento conhecido e provido." (Brasil, Tribunal de Justiça do Estado de Goiás - TJGO, 1ª Câmara Cível, Rel. Des. Vitor Barboza Lenza, Agravo de Instrumento nº 48522-2/180, julgado em 28/03/2006, Fonte: DJ 14755 de 11/05/2006)

[4]DINAMARCO, Cândido Rangel, A Reforma do Código de Processo Civil, 2. ed., São Paulo, Malheiros, p. 140.

[5]"AGRAVO DE INSTRUMENTO. INDEFERIMENTO DA ANTECIPACAO DA TUTELA. PODER GERAL DE CAUTELA. LIVRE CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. ILEGALIDADE NAO VERIFICADA. CONTRA-RAZOES. INTEMPESTIVIDADE. I - A atribuição de efeito ativo ao recurso e ato de livre arbítrio do julgador e insere-se no seu poder geral de cautela. na ponderação dos requisito para a concessão da medida liminar, se não ressair de plano a plausibilidade do direito invocado, o pedido de dano irreparável e verossimilhança da alegação, que sao cumulativos e simultâneos, impõe-se a denegação da antecipação da tutela recursal. II - Não visualizada qualquer ilegalidade ou abusividade no pronunciamento jurisdicional, fundamentado no livre convencimento motivado do magistrado e discricionariedade que lhe estão adstritos, incensurável se mostra a decisão que negou a antecipação da tutela jurisdicional, por entender ausentes os pressupostos necessários. III - As contra-razoes ofertadas fora do prazo legal de dez dias, para resposta, não devem ser conhecidas por serem intempestivas. exegese do art. 527, inciso V, do Código de Processo Civil. agravo conhecido e improvido." (Brasil, Tribunal de Justiça do Estado de Goiás - TJGO, 1ª Câmara Cível, Rel. Des. Luiz Eduardo de Sousa, Agravo de Instrumento nº 46982-3/180, julgado em 05/09/2006, Fonte: DJ 14.859 de 16/10/2006).

[6]BEDAQUE, José Roberto dos Santos, Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência. São Paulo, Malheiros, 1998, p. 398.

[7]MACHADO, Antônio Cláudio da Costa, Tutela antecipada, São Paulo, Oliveira Mendes, 1998, p. 567.

[8]Em defesa desta última corrente, Eduardo Talamini afirma que quando o julgador atua definindo os conceitos jurídicos indeterminados e as expressões vagas (por exemplo: prova inequívoca e o juiz poderá, respectivamente), o faz com base em sua vivência e nas circunstâncias sociais, o que descaracteriza a discricionariedade.

[9]BRASÍLIA, Supremo Tribunal Federal. 2ª T. Recurso em Mandado de Segurança n.º 8.516-RS, Rel. Min. Adhemar Maciel. Fonte: DJU 8.9.97, p. 42.435.

[10]PROCESSUAL CIVIL. INDEFERIMENTO DE EFEITO SUSPENSIVO ATIVO. NÃO CABIMENTO DE AGRAVO REGIMENTAL. 1. Da decisão de relator sobre efeito suspensivo em agravo de instrumento não cabe agravo regimental, conforme preceitua o art. 293, § 1º, do Regimento Interno. 2. Agravo regimental não conhecido. (Brasil, Tribunal Regional Federal da 1ª Região - TRF 1ª Região, 8ª Turma, Rel. Des. Federal Leomar Barros Amorim de Sousa, Agravo Regimental nº 2004.01.00.058901-5/MG, julgado em 23/08/2005, Fonte, DJ p. 188, de 16/09/2005).

[11]A admissão de mandado de segurança contra a decisão, neste caso, justifica-se por se tratar de ato judicial sem previsão recursal.

[12]ESTIGARA, Adriana, Da tutela antecipada em sede recursal, 2005.