Currículo na Educação Infantil

A questão curricular habita constantemente os debates educacionais. A busca de um currículo ideal que contemple uma realidade mais global articulado a partes que dediquem atenção a determinadas especificidades locais ainda se faz presente nas falas de especialistas e educadores. Pensar num currículo que retrate uma determinada realidade social e cultural é um desafio em um contexto em que as relações de poder perpassam as relações sociais.

Mais do que um simples recorte de conhecimentos produzidos pela humanidade, o currículo é um instrumento ideológico e de poder que muitas vezes é instrumentalizado para a manutenção de certas posições e privilégios. Por um período tenebroso da história brasileira, à época da ditadura militar, o currículo escolar, por exemplo, através do ensino moral e cívico esteve à disposição de certa domesticação de consciências. Da mesma maneira, o currículo da época, veio priorizar a formação de quadros técnicos a serviço do capitalismo industrial.

O currículo escolar como elemento sistematizador de ações muitas vezes dá lugar a certo espontaneísmo pedagógico a serviço de uma gestão educacional comprometida com interesses privados. Outras vezes quando uma proposta curricular ou mesmo pedagógica é elaborada é por certa imposição legal (leis, decretos, resoluções) que impõem ao sistema de ensino ou a escola uma ruptura no modo operandi no tocante a educação.

Pensar num currículo para a Educação Infantil é pensar na sua etimologia que é trajetória, percurso, articulada a uma perspectiva mais ampla de ação. O currículo escolar na educação infantil deve ser um elemento sistematizador que abarque diversas nuances e elementos pertinentes a ação educativa. O currículo não representa apenas uma trajetória fria em que educandos passam e saem, ele é instrumental pedagógico a serviço de uma escola ou sistema de ensino que busque de fato proporcionar aprendizados significativos para o desenvolvimento integral (bio-psiquico-social) das crianças.

Um currículo escolar na educação infantil para além do mero formalismo documental ou imposição política é algo amplo que contempla muitas facetas. O currículo comprometido tem “um que” de reflexão sobre o mundo, o homem, educação, a escola, o ensino. Ele busca esclarecer qual educação queremos, que adulto desejamos, e escola para o futuro projetamos. No entanto, para a concretização de um currículo comprometido faz-se necessário uma formação docente com essa postura visionária de projeção de intenções.

O currículo na educação infantil como ponto de partida deve abarcar a complexidade de ações necessárias ao desenvolvimento infantil. O currículo como um meio busca a articulação e sistematização de ações que privilegie um cabedal de aprendizados significativos para as crianças. Um currículo deve articular políticas, intenções, concepções, teorias e perspectivas sobre os processos educacionais a serem desenvolvidos.

Cuidar e educar devem perpassar as intenções e ações quando falamos em currículo na educação infantil. O currículo aberto deve está a serviço de uma perspectiva mais ampla do processo e práticas educativas. Os esforços devem estar para além das burocratizações curriculares e focar em elementos infra-estruturais que fundem e alicercem um fazer pedagógico comprometido com a mudança social.

O currículo não é algo a-histórico, é influenciado pelo momento e pelas contradições existentes e pela percepção que os agentes proponentes do currículo tem em relação à crianças, à infância e seu desenvolvimento. O currículo não pode negligenciar os traços marcantes que foram elementos fundantes da sociedade brasileira que reverberam até hoje. Pensar em currículo ou proposta pedagógica descolada da história política e das relações sociais é reduzir a complexidade do fenômeno educacional a um mero olhar simplista do presente.