UNIVERSIDADE POTIGUAR - UNP

Mossoró - 2008

CRÔNICAS PRINCIPIOLÓGICAS –

DOS CONTRATOS E SEUS PRINCÍPIOS

Rommel Costa Furtado

Graduando em Direito

SINOPSE: O objetivo deste presente artigo é fazer uma breve abordagem sobre a principiologia contratual, procurando enfatizar a importância de cada princípio perante o contrato e onde cada um se aplica, para que se busque a partir destes preceitos uma melhor compreensão da formação deste vínculo em questão, para que assim possa-se celebrar uma relação jurídica pura e simples, livre de vícios e maus valores.

Palavras-Chave: Direito Civil. Contratos. Principiológia.

  1. INTRODUÇÃO

Princípios, segundo o Dicionário Aurélio (2004) este pode ser entendido como sendo: 1- Momento ou local ou trecho em que algo tem origem; começo; 2- Causa primária; 3- Elemento predominante na constituição de um corpo orgânico; 4- Preceito, regra, lei.

Tudo em nossa vida é regido por princípios, desde critérios mais subjetivos e metafísicos, como por exemplo, a religião, até os mais normativos, como a nossa Constituição. Não é diferente com os contratos, em razão de tamanha responsabilidade e competência que este vincula as partes nele envolvidas. Por esta razão, tal objeto deve observar inúmeros requisitos para que venha a se tornar possível e não cabível de nulidade.

Os princípios que norteiam os contratos gozam de enorme significação, já que, aplicados às situações concretas, permitem a prevalência do equilíbrio entre os contratantes. E isso é de fundamental importância diante da primazia da dignidade humana, conforme preceito constitucional. Logo, estudar os princípios contratuais é dialogar com a Constituição.

2.DO SURGIMENTO DOS PRINCÍPIOS

Nenhuma criação humana surgiu pronta e acabada, com a principiolgia dos contratos não foi diferente. As normas que regem as relações contratuais passaram por dadas fases históricas para assumir a forma que a conhecemos hoje em dia. Quanto às estas fases em questão podemos dividi-las como sendo, os princípios clássicos e a dos modernos.

2.1 PRINCÍPIOS CLÁSSICOS DOS CONTRATOS

Os princípios clássicos, isto é, as primeiras formas de "regimento" nos contratos, tiveram como fundamentos as ideologias liberais de John Locke e Adam Smith, onde a chave mestra da sociedade era a liberdade do cidadão em face da perca, mesmo que parcial, do controle do estado.

Em face disto, a vontade, ou o comum acordo destas, começava a tomar um status de lei e desta forma, o Estado-juiz sofreu as conseqüências do liberalismo. A liberdade passou a ser tratada sob um aspecto formal, ou seja, a preocupação em garantir, e ser amparado por dispositivos legais, desta forma possuindo liberdade de poder firmar contrato com quem o cidadão quisesse. Esta mesma forma de pensar também englobou a igualdade, sendo assim, bastava-se presumir que todos os indivíduos eram iguais para que assim se possa ter como presente o principio da igualdade.

Em decorrência destes pensamentos que perduraram até o início do século XIX, podemos caracterizar como sendo extraídos destes os quatro os princípios clássicos a quais regem os contratos, estes sendo: o da autonomia da vontade; o da obrigatoriedade dos contratos; o da relatividade dos contratos; e o do consensualismo.

2.2 PRINCÍPIOS MODERNOS

Advindas da revolução industrial, a sociedade como um todo sofreu mudanças bruscas na sua forma de pensar e a partir destes novos valores surgiram dois fenômenos que agitariam bruscamente com o meio, sendo estes: a urbanização e a concentração capitalista. Posteriormente a este fenômeno, contudo advindo dele, vieram às massificações das cidades, das fábricas, das relações de trabalho e de consumo e da própria responsabilidade civil. Portanto, a massificação dos contratos surgiu em conseqüência da crescente concentração industrial e comercial, que, quão mais crescia, diminuía o número de empresas e em contrapartida as aumentava em tamanho.

Ao passo em que ocorria a massificação das comunicações e o crescimento da globalização, a concorrência e as relações de consumoaumentavam paralelamente e, juntamente com esta, o automatismo da vontade ganhava ainda mais força. Daí então surgiu às cláusulas contratuais gerais e os contratos de adesão.

Diante disto, os juristas evidenciaram que devido a estas crescentes evoluções as pessoas já não celebravam mais os contratos como antes, estes agora passaram de meros acordos de vontades onde as próprias partes discutiam sobre as cláusulas que seriam impostas, para um instrumento de massas, aonde este já vinha escrito em formulários expresso.

Os contratos agora não podiam se basear apenas na vontade, e passaram a ser concebidos mediante termos econômicos e sociais. Nasce então a teoria preceptiva, que prega que as obrigações provenientes dos contratos possuem valor, não porque partes as assumiram, mas porque interessa à sociedade o encargo da situação criada, por suas conseqüências econômicas e sociais. Portanto, os interesses individuais devem estar sempre em harmonia com os gerais.

Segundo Stein e Shand, como cita Anna Carolina Resende de Azevedo Maia em seu artigo "a evolução principiológica dos contratos", a sociedade ocidental possui três valores como base, sendo estes, ordem (segurança), justiça e liberdade. E, a partir deles que advêm os princípios modernos, visando promover nos contratos o bem comum, o progresso econômico e o bem-estar social.

3. DOS PRINCÍPIOS CONTRATUAIS

Os princípios contratuais são de importância singular, tendo em vista que estes são fundamentais para se estabelecer um equilíbrio sólido e justo na elaboração do contrato.

Partindo desta premissa, iremos agora analisar, um por um, os preceitos que regem a formação dos contratos.

3.1 PRINCÍPIO DA AUTONOMIA DA VONTADE

Nascido dos ideais burgueses pós-revolucionários o princípio da autonomia da vontade está presente em todos os sistemas do mundo ocidental. Afirmando, que a todo o cidadão, em pleno gozo de suas capacidades, lhe é conferido o poder de firmar pacto da maneira que o quiser, com quem quiser, e sobre o que desejar, firmando o conteúdo a qual o contrato disparará e inclusive criando novas modalidades contratuais, desde que observados os requisitos legais para tal.

3.2 PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE DAS CONVENÇÕES

Tendo sua origem no direito romano graças ao caráter personalíssimo que cercava suas obrigações, este princípio funda-se na idéia de que os contratos só surtem efeitos nas partes por ele vinculadas, não vindo a afetar terceiros. Desta forma, este, assegura que ninguém ficará vinculado a um contrato, salvo quando a lei determine ou a própria pessoa assentar.

Entretanto, há algumas exceções que excluem este princípio, sendo estas reguladas pelo nosso código civil, permitindo assim o contrato em favor de terceiro e convenções coletivas de trabalho, por exemplo, em que os acordos celebrados pelos sindicatos privilegiam a toda uma categoria.

3.3 DA FORÇA VINCULANTE DA CONVENÇÃO

O princípio da força vinculante da convenção, também denominado Pacta Sunt Servanda, princípio da Força obrigatória dos Contratos, princípio da Intangibilidade dos Contratos ou princípio da Obrigatoriedade das Convenções, encontra sua base existencial na vontade que dela faz surgir o contrato.

Os romanos atribuíam a este principio um rigor em especial, que chegavam a responsabilizar corporalmente devedores inadimplentes

Levando em conta que os contratos são instrumentos bilaterais ou plurilaterais nas quais as partes envolvidas dirigem suas vontades a fim de obter patrimônio especifico, uma vez fixado os limites contratuais, as partes se unem pelo vínculo da vontade.

Este vínculo em questão não esta positivado em nosso ordenamento jurídico, mas isto não se faz necessário, pois a própria doutrina o considera como sendo um princípio geral do Direito, de caráter universal transcendente e dessa forma presente em todas as culturas. Graças a este, o credor dispõem de certa segurança, pois lhe é de conhecimento o vinculo entre sujeito passivo e sua responsabilidade patrimonial.

Dessa forma, o ordenamento deverá conferir à parte meios judiciários que obriguem o contratante a cumprir com sua obrigação, lhe sendo cabíveis perdas e danos ou indenização caso haja o inadimplemento desta. Se advinda do contrato também não viesse à força obrigatória nosso ordenamento estaria em completa desordem.

Desse princípio também decorre a intangibilidade do contrato, que afirma que ninguém poderá vir a alterar de forma unilateral o contrato, já que este instrumento a qual une duas partes. Esta vedação será aplicada inclusive ao juiz.

3.4 FUNÇÃO SOCIAL

Fundamentado na existência da dignidade da pessoa humana, este princípio surgiu pela primeira vez com São Tomás de Aquino, quando este por sua vez, afirmou que os bens apropriados individualmente teriam um destino comum, que o homem deveria respeitar. No entanto, este ideal somente ganhou força muito posteriormente a isso, mais precisamente no século XIX, graças às profundas mudanças que ocorreram tanto no meio econômico, quanto no social, em virtude da revolução industrial.

Nos dias de hoje, compreendemos que os contratos não partem somente da pura e simples autonomia de vontades, este já não vigora mais livremente como em outros tempos encontrando fortes e expressos limites. O acordo de vontades ainda possui importância fundamental para a celebração deste ato jurídico, sendo inclusive o elemento subjetivo essencial ao contrato, já que este somente se origina perante a declaração de vontades. Esta liberdade individual e de iniciativa pessoal continua sendo a razão existencial dos contratos, contudo, diante do Estado Democrático de Direito e sua visão mais humanista das relações jurídica, nos foi imposto, por parte do Estado certa intervenção, pela qual a simples autonomia não possui mais a mesma plenitude de outrora.

O princípio em questão a ser tratado, se encontra expressamente previsto pelo nosso código civil em seu artigo 421 da seguinte forma "A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social dos contratos".

Dessa forma, podemos compreender que é por meio desta o contrato passa a não ser mais entendido como uma relação jurídica existente apenas para sanar os interesses exclusivos das partes a quem o contrato se vincula, mas sim, este encontrasse inserido em um contexto social que o influencia e altera.

Segundo THEODORO JÚNIOR, podemos definir dado princípio da seguinte forma:

"A função social do contrato consiste em abordar a liberdade contratual em seus reflexos sobre a sociedade (terceiros) e não apenas no campo das relações entre partes que estipulam (contratantes)."

Portanto, este princípio é uma norma geral do ordenamento jurídico de ordem pública, e que a partir dele o contrato deve ser visualizado e interpretado de acordo com o contexto social a qual se insere, sendo este não a razão, mas sim o limite contratual.

3.6 BOA-FÉ

Não é de hoje que se indaga sobre a importância da boa-fé em matéria contratual. No direito romano, este respectivo princípio era correspondente ao estado íntimo das pessoas. Era necessária a exigência de agir-se com cautela, para que dessa forma a relação entre as partes não afetasse de maneira danosa a terceiros. Portanto, bastava que não houvesse provocação de dano.

Este princípio assegura as partes o acolhimento do que é licito e a repulsa do que é ilícito, encontrando previsão legal no artigo 422 do código civil, possuindo aspectos de uma norma de conduta, segundo este, cada um deverá ser fiel à palavra dada e não vir a quebrar, ou abusar, da confiança do próximo.

Dado princípio é divido em dois tipos, sendo estes a boa-fé subjetiva e a boa-fé objetiva.

Podemos entender como sendo boa-fé subjetiva a intenção, propriamente dita, do contratante, em celebrar o contrato, ou seja, a sua compreensão de que aquilo que está sendo feito é o correto, de acordo com o seu grau de conhecimento.

Assim, o saudoso autor Sílvio de Salvo Venosa denota o seu entendimento:

"Na boa-fé subjetiva, o manifestante de vontade crê que sua conduta é correta, tendo em vista o grau de conhecimento que possui de um negócio. Para ele há um estado de consciência ou aspecto psicológico que deve ser considerado".

Já a boa-fé objetiva possui caráter de princípio geral a qual se aplica nos Direitos das Obrigações, para que assim as partes envolvidas na celebração do contrato ajam de forma honesta e de recíproca colaboração, para que desta forma, elas venham a alcançar seus objetivos. Diante disto, o que realmente se leva em questão na boa-fé objetiva é o conhecimento que deve ser intrínseco ao homem, para que desta forma, seus atos se ajustem ao que a sociedade o convencionou, de modo que, a ausência de desta possa vir a demonstrar má-fé.

Diante a afirmação, mais uma vez Sílvio de Salvo Venosa expressa:

"A boa-fé objetiva, por outro lado, tem compreensão diversa. O intérprete parte de um padrão de conduta comum, do homem médio, naquele caso concreto, levando em consideração os aspectos sociais envolvidos. Desse modo, a boa-fé objetiva se traduz de forma mais perceptível como uma regra de conduta, um dever de agir de acordo com determinados padrões sociais estabelecidos e reconhecidos".

Portanto, o nosso Código Civil expressa que esta se faz necessária em todas as fases contratuais sob pena de tornar o contrato vicioso, uma vez que este é um dos princípios contratuais que guiam a relação jurídica.

Sendo assim, desde a formação dos contratos, as partes devem manter-se leais, esclarecendo de forma recíproca os fatos de principal relevância a prestação, cedendo informações, procurando, desta maneira, expressar-se com clareza perante o conteúdo do contrato, para que assim, possam evitar interpretações divergentes, bem como cláusulas fraudulentas, somente em favor a uma das respectivas partes, pois, visa-se com a observância destes requisitos o cumprimento da obrigação contratual, para que assim venha a ocorrer a extinção do contrato normalmente, para que este não venham a provocar resíduos ou determinadas situações onde predomina a má-fé.

4.CONCLUSÃO

O mundo moderno é o universo dos contratos. Celebramos contratos desde o momento em que nos levantamos até irmos dormir. Se o fenômeno contratual deixasse de existir, também o deixaria nossa sociedade.

Contudo, é preciso, para que se haja um efetivo cumprimento deste, a observância de determinados aspectos jurídicos, daí então o surgimento dos princípios contratuais.

Estes por sua vez, devem ser encarados como norteadores da relação jurídica existente, pois nos servem como guia diante do vasto, e muitas vezes subjetivo, universo contratual, nos indicando o melhor caminho a ser tomado e a forma mais sensata (e devidamente legal) de se agir, estabelecendo barreiras e ditando regras que devem ser cumpridas, pois somente com a devida observância destas, é que podemos ter uma relação contratual pura e imaculada, livre de vícios e da possível ganância dos Homens.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 6ª. ed. São Paulo: Atlas, 2006 (coleção direito civil; v.2)

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Teoria geral dos contratos típicos e atípicos. 2ª. ed.São Paulo: Atlas, 2004.

SIMÃO, José Fernando. Direito civil: Contratos. 2ª.ed. São Paulo: Atlas, 2007.

GUIMARARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário compacto Jurídico. 9ª.ed. São Paulo: Rideel, 2006.

MAIA, Ana Carolina de Azevedo. Evolução principiológica dos contratos. Revista CEJ, Brasília, n. 24, p. 62-66, jan./mar. 2004. Disponível em: < http://www.cjf.jus.br/Revista/numero24/artigo11.pdf >. Acesso em: 6 Nov. 2008.

MENEZES, Rinaldo Mendonça Biatto de. Os modernos princípios contratuais e o Código Civil de 2002. A boa-fé objetiva e a função social dos contratos. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 468, 18 out. 2004.Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5844>. Acesso em: 10 nov. 2008.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Op. cit. p. 31.

Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, op. cit., p. 378;

Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, op. cit., p. 379;