CRÔNICA DE UMA GUERRA (NEM TÃO PARTICULAR ASSIM)

Por Márcio Melo*

EU QUE NADA MAIS AMO

Eu, que nada mais amo

Do que a insatisfação com o que se pode mudar

Nada mais detesto

Do que a profunda insatisfação com o que não pode ser mudado.

(Bertolt Brecht, dramaturgo e poeta alemão; um dos melhores do século passado)

1. DROGAS: UMA GUERRA QUE NUNCA SERÁ RESOLVIDA COM VIOLÊNCIA!

Nós só andamos armados. Nossas armas: livros, caneta, papel e computador! Precisamos armar mais as nossas cabeças, com conhecimento. E nós traficamos informação, sim! Se quiserem nos prender por isso, estamos preparados; nossos advogados juram!

A maioria da nossa população já se acostumou a ver nos jornais a violência da polícia na repressão contra as drogas. Mas entendemos que os jovens, demais cidadãos de bem e jornalistas que resolvem lutar pela legalização da maconha, por exemplo, não devem sofrer violência ou perseguição. O tema é mesmo polêmico, claro, como a questão do aborto, mas consideramos que o que está por trás mesmo de toda essa problemática da maconha é todo um lobby da indústria do cigarro! Já pensou se legalizar? O rapper Mv Bill questiona numa música: "O que causa mais estrago: um maço de cigarro ou um quilo de maconha?" Por que não proibem também o cigarro e o álcool, que são mais prejudiciais para a saúde do país? E convenhamos: droga não é caso de polícia, mas sim de saúde pública! Os jovens não podem continuar sendo agredidos! Cenas como aquelas que aconteceram no início do ano, da polícia impedindo a “Marcha Pela Legalização da Maconha”, agredindo os manifestantes, ou aquelas da semana passada, na Universidade de São Paulo (USP) dos policiais agredindo os estudantes e vice-versa, precisam acabar! Coisas dessa natureza não podem mais acontecer, pois vivemos num Estado Democrático de Direitos! Existe a nova Lei de Drogas, a 11.343/2006 que precisa ser melhor estudada/conhecida. A polícia deve prender os verdadeiros traficantes, os verdadeiros bandidos, pois são eles que fazem emboscadas para matar juízes que mandam prendê-los!

Quando é que a direita mais radical, PSDB e DEMo (e que tem o Bolsonaro como o seu mais radical porta-voz) vão entender que vivemos num país democrático?  A NOSSA LUTA É PELA DEMOCRACIA! O ex-presidente da República, FHC, um conservador clássico, é um dos que já se colocaram a favor da regulamentação em torno da maconha e de outras drogas, pois, segundo ele, essa é uma guerra perdida. Não somos a favor de nenhum tipo de droga, nem das que a sociedade aceita (álcool e cigarro); somos a favor, sim, de uma discussão mais democrática sobre a questão. Os políticos precisam aprender a ouvir os jovens! Nós precisamos ouvir os jovens! Precisamos explicar-lhes melhor por que devem ficar longe das drogas - qualquer droga! Se fosse coisa boa, não era droga.

2. SOLIDARIEDADE EM ALTA 

Depois do assassinato brutal da juíza Patrícia Accioly, o serviço de inteligência da polícia avisou ao deputado do PSOL/Rio de Janeiro Marcelo Freixo que o mesmo está correndo o risco de também ser assassinado. Após presidir a CPI das Milícias, Marcelo já andava escoltado por seguranças – isso por si só, já é um absurdo! Acontece que ele foi convidado pela Anistia Internacional a se retirar do país por um tempo. Vivemos mesmo num Estado Democrático de Direitos?

Mas a solidariedade em torno da luta do deputado só deixa-o mais confiante. Reproduzimos abaixo trecho extraído do site do deputado:

 “A cada dia cresce o número de pessoas, de entidades da sociedade civil e governamentais que reconhecem a ameaça à vida do deputado Marcelo Freixo como uma afronta ao Estado Democrático de Direitos. Tanto que a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), o Coletivo RJ Memória, Verdade e Justiça e a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal aprovaram moções em solidariedade ao deputado. Esta última, inclusive, se reporta à recente ameaça anunciada na noite de terça-feira (25/10), através do disque-denúncia, de que havia um grupo de milicianos planejando o assassinato, ainda para essa semana, de Freixo e do secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame. A moção em questão ainda solicita que “o governo estadual empenhe maior esforço protetivo e de combate às milícias, inclusive com a colaboração do governo federal no que couber”. (Fonte: www.marcelofreixo.com.br – acesso em 01/11/2011). 

3. NÃO DESCANSEMOS NA PRÁTICA DO BEM

Segundo matéria do Jornal Globo News, do dia 06/10 (21 horas), o Brasil é o campeão mundial de homicídios em números absolutos...

Lembremos aqui, pela enésima vez, daquele velho poema do Maiakovski, muito conhecido e que mostra a passividade com que vamos nos adaptando à miséria do roubo, da violência, da impunidade...

“Tu sabes, conheces melhor do que eu

a velha história.

Na primeira noite eles se aproximam

e roubam uma flor do nosso jardim.

E não dizemos nada.

Na segunda noite, não se escondem:

Pisam as flores, matam o nosso cão,

e não dizemos nada.

Até que um dia, o mais frágil deles

Entra sozinho em nossa casa,

rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo,

arranca-nos a voz da garganta.

E já não podemos dizer nada.”

O que os governos têm feito com nossas escolas públicas! Vão nos cozinhando em banho-maria! E todo mundo vai aceitando isso, principalmente os mais jovens, que acham que estudar hoje não vale mais a pena...

Chega de tanta alienação, de tanta babaquice, de tanta caretice, de tanta força bruta! Desarmem os bandidos! Desarmem os espíritos!

Como afirma o cientista social Marco Magri, em artigo no site da revista Caros Amigos:

“No Brasil, somos, igual e perigosamente, incapazes de enfrentar os fantasmas e herança das masmorras das ditaduras. Isto fica claro na recusa do STF em abrir processos para punir torturadores, que cometiam crimes de lesa humanidade e continuam impunes, caminhando pelas ruas. E não são apenas as pessoas físicas que cometeram tais crimes que têm livre circulação - o que é mais preocupante são suas ideias, que permanecem e dão margem aos mais terríveis arbítrios. No Brasil, os casos de tortura aumentaram consideravelmente após o fim da ditadura, desta vez direcionada principalmente contra a população pobre. E também temos um sistema judiciário extremamente leniente com massacres contra os trabalhadores pobres, como vemos no caso do Eldorado de Carajás (impune), Massacre do Carandiru (impune), crimes de maio de 2006 (impune)”.

No início da semana, um colega da faculdade, que me viu lendo, perguntou se eu nunca cansava. Automaticamente, lembrei-me de uma história que aconteceu com o Bob Marley e que nós, os fãs dele, conhecemos bem. Essa história é contada pelo personagem do Will Smith no filme “Eu Sou a Lenda”. Certa vez, Bob foi fazer um show pela paz na Jamaica, e pistoleiros atiraram nele, quase matando-o. Mesmo assim, ele fez o show depois. E fizeram-lhe essa mesma pergunta, que Bob prontamente respondeu: os que praticam o mal nunca descansam, então nós também não devemos descansar na prática do bem. Mahatma Gandhi, Martin Luther King e Nelson Mandela também nos ensinaram isso.

O nosso mestre Paulo Freire nos ensinou que “a melhor maneira que a gente tem de fazer possível amanhã alguma coisa que não é possível de ser feita hoje, é fazer hoje aquilo que hoje pode ser feito. Mas se eu não fizer hoje o que hoje pode ser feito e tentar fazer hoje o que hoje não pode ser feito, dificilmente eu faço amanhã o que hoje também não pude fazer.”

Márcio Melo, professor na rede pública do estado da Bahia; professor na Faculdade Cenecista de Senhor do Bonfim (FACESB); especialista em Ensino de História e da História Africana e Afro-Brasileira (IBPEX); estudante de Direito (UNEB).