Cristãos evangélicos e... Evangélicos*

Sou cristão evangélico. Um termo caro a ser proferido se as vias de nossa frágil memória nos conduzir ao comportamento da Igreja (ekklesia) de Atos** . Devido ao peso do conceito de Evangelho a derivação antes mencionada, e o seu sentido, quando desvendado e assumido em práxis de vida, viola os protocolos da existência humana. Porém, esse mesmo termo nos dias atuais foi desenhado numa aparência de passas e uvas, pois, sendo a mesma coisa antes e agora, a nuances, precisou sofrer mudanças, para atender o gosto da "fiel" freguesia a essência do Evangelho, é ocultada.

Não estou ficando esclerosado em proferir tal afirmação, apenas irado, más não quero pecar. Por isso saio do arraial (deste) antes que "alguém" ou "algo" venha a oferecer-me um prato de lentilhas (a sedução do mundo) em troca do presente que me foi dado. A GRAÇA.

Entendamos: no mundo, isto é, no enredo da historia dos povos, encontramos aquilo que é do mundo, a saber, o conjunto de lógicas contraditórias, pois suscitadas são endereçadas para bases de formações sociais que se processam em posições divergentes. E, tais lógicas que atacam a diversidade de pensamentos para prevalecerem castram e/ou desqualificam os que de se divergem. É, então, em ultima instância, um conjunto de lógicas perversas. Um axioma.

Na Igreja, sendo esta, "manifestante das intenções de Deus", repousa sobre ela o dever ininterrupto de manifestar o que é de Deus para o mundo, ou seja, A GRAÇA, que na óptica do agraciador acompanha o amo e a caridade, a fraternidade, a justiça, o r etc.. O que se processa então, quando esse dever de proclamar o evangelho da Graça de Deus sem a consecução de proventos, é substituído pela ambição de acumular segundo as vias propostas pelo sistema capitalista (seja qual for sua fase)? A ideia original que orienta os paços da ekklesia se torna plástica, meramente uma intenção escondida, porque indesejada.

Onde estaria então o instrumento catalisador capaz de impulsionar, inquietar e motivar os cristãos? O que seria este instrumento? A resposta para essa indagação é mais que simples, é reducionista. Para os chamados evangélicos, só um retorno ao princípio de convivência demonstrado na vida do Cristo, revelado nas escrituras, e, infelizmente, quase que soterrado nos capítulos recentes da história, poderá restabelecer-lhe o exercício peculiar outrora abandonado.

Eleger prioridades deixadas para traz (a comunhão dos crentes com eles mesmos e a firme intenção de paz com todos os homes) reunir consciências diversas com concepções distintas do mundo e do papel de cada individuo, neste mundo, com o desafio de querer transformá-lo, e, fazendo com que possa surgir a tolerância e a diplomacia que suscita o erigir da paz que lembra o operar do Parakletos de Deus.

Faltou mencionar a Fé? Não. Ela está acesa uma vez que a condição precedente a todas essas coisas é "que Cristo habite pela fé nos vossos corações, a fim de que, estando arraigados e fundados em amor"***. Ora habitaria Cristo em meio à falta de solidariedade? Onde não haja amor (não se confunda amor com apreço)? O amor não se negocia assim como não se negocia a fé. Antes, com ele se dá prova de desinteresse e satisfação em simplesmente poder acolher por que se ama. O cristo fez isso e pediu para que o feito dele se reproduzisse, portanto, foi algo ensinado aos primeiros (ver Atos) possível de se realizar enquanto práxis histórica mesmo se indesejado pelos povos.

É sabido que espelhando na conduta de Cristo nitidamente renasce uma certeza, se permanecermos na "condição de evangélicos" segundo os contornos da estrutura que está posta não poderemos mais dizer uns para os outros Shalon. A paz é fruto do Espírito. Então, não se manifesta onde o Espírito não habita nem tampouco se compraz.

Se numa tomada de posição caprichosa tornar-se veraz aos cristãos a possibilidade de conviver sem o consumo supérfluo, continuariam os evangélicos brasileiros alcançando tamanho crescimento? Indaga-se ainda, esse crescimento não é fruto do uso de textos bíblicos (sobretudo do Antigo Testamento) enquanto mercadorias trocadas por medidas de falsa fé? Para se alcançar uma resposta, é preciso compreender qual a real motivação do grosso crescimento dos chamados evangélicos brasileiros. Fato este, constatado, sobretudo, a partir dos anos de 1990.

Não temos condições de esclarecer qual é a verdadeira motivação de cada individuo da/na igreja evangélica brasileira, portanto, resta-nos doravante atuar com dignidade humana, guardando com ousadia o que nos foi dada - a GRAÇA incorruptível - e, mesmo que pareça os dias mais e mais cansativos, permanecer entoando gritos de liberdade sustentando na Fé em Cristo.

Dessarte, o adjetivo de evangélico passa a condizer com a práxis dos que o conduz, então, isso instigaria os evangélicos na póstera de seus feitos, entoar encómio ao Cristo, procurando ainda, seguir a laboriosa caminhada autonomamente engajados na história hasteando a bandeira da justiça, suspirando por ela e incessantemente portar-se como requerentes ativos na defesa da vida.


Notas
* Herculano Candido de Sousa Neto é Professor licenciado em Geografia pela Universidade Estadual da Paraíba. Atua na associação dos geógrafos brasileiros seção Campina Grande - PB desde 2006 e, atualmente exerce o cargo de Presidente da mesma (gestão 2010 -2012).

**Especial atenção ao livro de Atos dos apóstolos que revela o proceder de uma Igreja empenhada em agir de acordo com o modelo de vida que lhes foi apresentado pelo Cristo. (João Ferreira de Almeida, R C).

***Conforme a carta do apóstolo Paulo aos efésios cap. 3, V 17. (João Ferreira de Almeida, R C).