CRÉDITOS DE PIS E COFINS NA AQUISIÇÃO DE BENS E SERVIÇOS

 

Felipe Augusto Marcos

Acadêmico da Universidade Presbiteriana Mackenzie

 

 

I – Considerações iniciais

O regime não cumulativo do PIS e da COFINS (instituído por meio da Lei n° 10.833 de 2003) sempre causou muitas controvérsias, principalmente no que se refere à tomada de créditos na aquisição de bens e serviços.

A falta de definição do conceito de insumo, aliada às divergências doutrinárias e jurisprudenciais vem sendo motivo de um cenário cada vez mais incerto e inseguro. Neste sentido, abordaremos o atual direcionamento dos principais tribunais no que se refere a alguns bens e serviços que ainda não possuem um entendimento claro:

ü  Serviços contratados de portaria e limpeza;

ü  Despesas com restaurante;

ü  Despesas com material de segurança, calçados, uniformes, luvas, óculos de proteção (pessoal da produção diretos e indiretos);

ü  Serviços contratados de remoção de lixo;

ü  Convênio médico e odontológico, exames anuais e de admissão, medicamentos;

ü  Serviços de manutenção do prédio e instalações em geral;

ü  Materiais de limpeza em geral;

ü  Gastos na produção não constante na estrutura do produto;

ü  Combustível com veículos;

ü  Despesas de leasing operacional.

É do que passamos a tratar.

II – Sistemática da apuração de créditos de PIS e COFINS

 

As Leis nº 10.637/02 e 10.833/03 introduziram a sistemática da não cumulatividade para o cálculo do PIS e da COFINS, respectivamente. Referida sistemática se baseia na possibilidade de apuração de créditos sobre os valores de insumos adquiridos pelas empresa, os quais devem ser descontados do montante de contribuição a pagar.

 

Para a análise da possibilidade de creditamento na apuração do PIS e da COFINS, é preciso observar que a Lei nº 10.833/03 determina, em seu artigo 3º, as hipóteses passíveis de creditamento[1]. In verbis:

“Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a: 

[…]

II - bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da Tipi;”

Cumpre notar que o legislador ordinário não definiu o conceito de insumos, fato que tem gerado grande divergência de entendimentos entre o Fisco e os contribuintes. A questão da abrangência desse conceito é fruto de diversas discussões doutrinárias e ainda carece de jurisprudência definitiva sobre o assunto[2].

As primeiras tentativas de se definir o conceito de insumo vieram com a edição das Instruções Normativas n.s. 247/02 (redação dada pela IN 358/03) e 404/04, pela Secretaria da Receita Federal[3]. Conforme tais instruções, os insumos são “a matéria-prima, o produto intermediário, o material de embalagem e quaisquer outros bens que sofram alterações, tais como o desgaste, o dano ou a perda de propriedades físicas ou químicas, em função da ação diretamente exercida sobre o produto em fabricação, desde que não estejam incluídas no ativo imobilizado” ou “os serviços prestados por pessoa jurídica domiciliada no País, aplicados ou consumidos na produção ou fabricação do produto”.

Vê-se, pois, que o Fisco adotou a definição de insumo na forma e termos da legislação do IPI, isto é, considerou como insumos os bens ou serviços que se agregam física e integralmente ao produto fabricado.

No entanto, tal entendimento tem sido objeto de recorrentes questionamentos, sob o argumento de que a definição proposta não corresponde ao sentido do termo empreendido pela Lei nº 10.833/03, uma vez que os métodos da não-cumulatividade aplicáveis ao IPI e ao PIS/COFINS são diferentes, o que impede de os critérios empregados para a apuração dos créditos sejam os mesmos.[4] Isso porque, ao contrário do que acontece com o IPI, que incide sobre produtos industrializados, onerando a atividade de industrialização, as contribuições ao PIS e à COFINS, incidem sobre receitas, onerando atividades as mais diversas, como a comercialização e a prestação de serviços.[5]

Na tentativa de suprir a ausência da definição do termo insumo para as contribuições em questão, alguns julgados apontaram para uma aproximação ao conceito de “despesas necessárias” utilizado na legislação do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica. Nesse sentido é o Acórdão proferido pela 3ª Câmara do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF, em 2008[6]:

“Da simples leitura das atividades da recorrente, extrai-se que a contratação de seguros está estrita e necessariamente vinculada às suas atividades fim; sendo que assim devem ser tidas como despesas operacionais, conforme, aliás, dispositivos contidos no RIR/00.”

Referido entendimento, apesar de ser observado em algumas decisões tanto de órgãos administrativos quanto judiciais, não é unanimidade entre os julgadores, causando muita controvérsia.

Mais recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, notadamente no voto do Ministro Campbell Marques[7], sinalizou a adoção de um novo critério para identificação dos insumos aptos a gerar créditos de PIS/CONFINS, qual seja, o critério da “essencialidade” das despesas. Vejamos um trecho do voto do Min. Campbell Marques:

“Tem-se, portanto, um conceito de insumos que se extrai da teleologia da própria norma para os casos ali não expressos. Insumos, para efeitos do art. 3º, II, da Lei n. 10.637/2002, e art. 3º, II, da Lei n. 10.833/2003 são todos aqueles bens e serviços pertinentes ao, ou que viabilizam o processo produtivo e a prestação de serviços, que neles possam ser direta ou indiretamente empregados e cuja subtração importa na impossibilidade mesma da prestação do serviço ou da produção, isto é, cuja subtração obsta a atividade da empresa, ou implica em substancial perda de qualidade do produto ou serviço daí resultantes.

Esse conceito não sofre da excessiva restrição imposta pelas Instruções Normativas SRF n. 247/2002 e 404/2004, que importaram indevidamente o conceito de “insumos” para efeito de creditamento de IPI, e não sofre da já demonstrada excessiva elasticidade proposta pelo uso inapropriado dos conceitos de “Custos e Despesas Operacionais”, próprios da lógica do Imposto de Renda.”

Ocorre que o tema ainda se mostra bastante controverso, mostrando divergências inclusive dentro da própria Corte Superior. Em outra decisão, a 1ª Turma do STJ convalidou as disposições das Instruções Normativas n° 247/02 e 404/04, em processo que se discutia a possibilidade de creditamento com relação a despesas referentes a comissões pagas pela representação comercial, as despesas de marketing, os serviços de consultoria prestados por pessoas jurídicas e outros, como limpeza e vigilância[8]:

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. CREDITAMENTO. LEIS Nº 10.637⁄2002 E 10.833⁄2003.  NÃO-CUMULATIVIDADE. ART. 195, § 12, DA CF. MATÉRIA EMINENTEMENTE CONSTITUCIONAL. INSTRUÇÕES NORMATIVAS SRF 247⁄02 e SRF 404⁄04. EXPLICITAÇÃO DO CONCEITO DE INSUMO. BENS E SERVIÇOS EMPREGADOS OU UTILIZADOS DIRETAMENTE NO PROCESSO PRODUTIVO. BENEFÍCIO FISCAL. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. IMPOSSIBILIDADE.  ART. 111 CTN.

1. A análise do alcance do conceito de não-cumulatividade, previsto no art. 195, § 12, da CF, é vedada neste Tribunal Superior, por se tratar de matéria eminentemente constitucional, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal.

2. As Instruções Normativas SRF 247⁄02 e SRF 404⁄04 não restringem, mas apenas explicitam o conceito de insumo previsto nas Leis 10.637⁄02 e 10.833⁄03.

3. Possibilidade de creditamento de PIS e COFINS apenas em relação aos bens e serviços empregados ou utilizados diretamente sobre o produto em fabricação.

4. Interpretação extensiva que não se admite nos casos de concessão de benefício fiscal (art. 111 do CTN).”

No âmbito administrativo a controvérsia também é verificada, causando ainda mais insegurança jurídica às empresas que possuem elevados gastos com despesas diversas no seu dia a dia. O CARF possui várias decisões sobre o tema, mas ainda não chegou à esperada uniformidade no entendimento.

Entretanto, recentemente o órgão adotou uma postura mais favorável ao pleito dos contribuintes. Neste sentido, tomou grande notoriedade a decisão da Câmara Superior prolatada em 2012, que adotou um entendimento mais abrangente se comparado a noção de insumos para fins de IPI (adotada pelas INs 202/02 e 404/04), porém mais restritivo quando comparado ao conceito de despesas necessárias para fins de IRPJ[9]:

“COFINS. INDUMENTÁRIA. INSUMOS. DIREITO DE CRÉDITO.ART. 3º LEI 10.833/03.

Os dispêndios, denominados insumos, dedutíveis da Cofins não cumulativa, são todos aqueles relacionados diretamente com a produção do contribuinte e que participem, afetem, o universo das receitas tributáveis pela referida contribuição social. A indumentária imposta pelo próprio Poder Público na indústria de processamento de alimentos exigência sanitária que deve ser obrigatoriamente cumprida é insumo inerente à produção da indústria avícola, e, portanto, pode ser abatida no cômputo de referido tributo.

[…]

  

E quais são esses dispêndios, denominados insumos, dedutíveis da COFINS não cumulativa? Entendo que sejam todos aqueles relacionados diretamente com a produção do contribuinte e que participem, afetem, o universo das receitas tributáveis pelas contribuições ao PIS e COFINS.

[…]

Em minha opinião, o texto do artigo 3º da Lei 10.637/2002, bem assim da Lei 10.833/2003, não poderia ser mais específico ao regrar os créditos suscetíveis de abatimento pelo contribuinte. É evidente que não se tem como enumerar todos os eventos capazes de gerar crédito, mas diante do que dispõe a lei para identificar se o dispêndio é suscetível de abatimento, se o mesmo se consubstancia em insumo, basta verificar se o mesmo corresponde a resposta afirmativa da seguinte indagação: o dispêndio é indispensável à produção de bens ou à prestação de serviços geradores de receitas tributáveis pelo PIS ou pela COFINS não cumulativos? Se sim, o direito de crédito do contribuinte, a meu ver, é inquestionável.

Nota-se, pelo teor da decisão, que o indispensável para determinação da possibilidade de creditamento do PIS e da COFINS é a essencialidade da despesa quando observada a produção do bem ou prestação do serviço.

Nestes termos, apesar de recente, constata-se haver uma nova tendência de caracterização do termo insumo considerando-se o grau de essencialidade e necessidade do produto ou serviço à atividade do contribuinte.

Cumpre ressaltar que, apesar de a decisão acima ter sido prolatada pelo órgão máximo do CARF, esta não possui poder vinculante, sendo aplicável tão somente às partes envolvidas no processo. Além disso, parece-nos que a tendência é de que a Corte continue adotando um posicionamento específico a cada caso levado a julgamento.

Por fim, não é demais reiterar que esse entendimento ainda não é aceito pela RFB, de modo que, se realizado o creditamento, este provavelmente estará sujeito à autuação fiscal, cujas chances de êxito em eventual defesa são classificadas como possíveis.

 

III – Decisões específicas ao caso concreto

Diante das inúmeras incertezas sobre o tema, faz-se necessária a análise específica de cada situação à luz da jurisprudência para se tentar chegar a uma definição quanto aos riscos na tomada de créditos de PIS e de COFINS.

Leasing operacional

Iniciamos a análise pelo último item, – despesas de leasing operacional - por estar expressamente previsto na legislação regente.

Conforme prevê o inciso V do mesmo art. 3º da Lei n° 10.833/03, é permitida a apropriação de créditos em decorrência da contraprestação de operação de arrendamento mercantil:

“Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a: 

[…]

V - valor das contraprestações de operações de arrendamento mercantil de pessoa jurídica, exceto de optante pelo Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte – SIMPLES.”

Vê-se, pois, que com base no dispositivo transcrito, o contribuinte poderá apropriar créditos de PIS e de COFINS com relação às contraprestações decorrente das operações de leasing realizadas para aquisição dos carros.

Para fins de creditamento, não faz diferença tratar-se de leasing operacional ou mercantil, já que a legislação não traz tal distinção. Também não existe aqui a exigência de que o bem objeto do arrendamento esteja essencialmente ligado ao processo produtivo, bastando tratar-se de verdadeira operação de arrendamento mercantil.

Combustível

Assim como no caso do leasing, as despesas com combustíveis também encontram-se expressamente previstas como passíveis de creditamento, nos termos do próprio inciso II do art. 3º já mencionado:

“Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a: 

[…]

II - bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da Tipi;”

Ocorre que a legislação apenas concede a possibilidade de creditamento aos casos em que os combustíveis sejam utilizados na forma de insumos para a produção dos bens ou prestação dos serviços.

O combustível utilizado em atividades que não se caracterizem como essenciais ao processo de produção ou prestação de serviços está fora do alcance da legislação. Neste sentido:

“NÃOCUMULATIVIDADE. CREDITO. OUTRAS DESPESAS.
Por falta de previsão legal, não geram direito ao crédito do PIS/Cofins as despesas realizadas ou incorridas que não se enquadrem no conceito de insumo, exceto as previstas na legislação. Também não geram direito a crédito as despesas que não forem comprovadas por meio de documentação hábil e idônea.
COMBUSTÍVEL E LUBRIFICANTES USADOS NA PRODUÇÃO.
DIREITO AO CRÉDITO.
As despesas com a aquisição de combustíveis, inclusive o GLP, e os lubrificantes usados no processo produtivo da adquirente dão direito ao crédito do PIS/Cofins não cumulativos.”

(CARF – Ac. n° 3801-00.482. 3ª Seção da 1ª Turma Especial. Rel. Cons. José Luiz Bordignon. DJ de 08/02/2011)

“CRÉDITOS DA NÃO-CUMULATIVIDADE, CONCEITO DE INSUMOS.
Não geram direito a créditos a serem descontados da Cofins os gastos de produção que não aplicados ou consumidos diretamente no processo fabril, vez que não se enquadram no conceito de insumos.
CRÉDITOS DA NÃO-CUMULATIVIDADE, COMBUSTÍVEIS.
Os combustíveis utilizados ou consumidos diretamente no processo fabril geram o direito de descontar créditos da Cofins apurada de forma não cumulativa
.”
(CARF – Ac. n° 3801-00.487. 3ª Seção da 1ª Turma Especial. Rel. Cons. Flávio de Castro Pontes. DJ de 05/01/2011)

Neste sentido, não vislumbramos a possibilidade de o contribuinte apropriar créditos de PIS e de COFINS com relação às despesas com combustíveis utilizados, por exemplo, nos veículos de seus empregados, por não estarem ligados ao processo de produção de suas mercadorias ou prestação de seus serviços[10].

Despesas com pessoal

Dos itens analisados, três referem-se a despesas diretas com empregados, estejam estes relacionados diretamente à produção ou não:

ü  Despesas com restaurante;

ü  Despesas com material de segurança, calçados, uniformes, luvas, óculos de proteção;

ü  Convênio médico e odontológico, exames anuais e de admissão, medicamentos.

Tais despesas, a despeito de se tratarem de encargos suportados pela empresa, sem os quais não conseguiria realizar com a mesma qualidade e eficiência suas atividades diárias, não ensejam direito a apropriação de créditos de PIS e de COFINS.

O primeiro motivo é a falta de previsão legal específica: Não há na legislação do PIS e da COFINS permissivo para a apropriação de créditos referentes a tais despesas. Também não há que se falar que caracterizam-se como insumos indispensáveis a produção dos bens ou prestação dos serviços.

Imagina-se um cenário onde a empresa negocie com seus empregados a extinção do fornecimento de alimentação, convênio médico, etc. Tal fato, por si só, não inviabilizaria sua produção fabril, o que impede a apropriação dos referidos créditos. Outro não é o entendimento dos tribunais[11]:

“COFINS NÃO-CUMULATIVA. DIREITO DE CRÉDITO. DEFINIÇÃO DE INSUMO.
As despesas com fornecimento de alimentação, transporte, assistência médica e odontológica, seguro de vida em grupo, treinamentos e reembolso de combustível, não se enquadram como bens ou serviços aplicados ou consumidos como insumos na prestação de serviços, sendo, portanto, vedado seu aproveitamento como crédito a descontar da Cofins não-cumulativa.”

(Solução de Consulta n° 158 de 19 de maio de 2009)

 “INCIDÊNCIA NÃO-CUMULATIVA - CRÉDITO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE MONTAGEM E MANUTENÇÃO. DESPESAS ADMINISTRATIVAS. DESPESAS MÉDICAS. ALIMENTAÇÃO. CESTA BÁSICA. ALUGUÉIS. MATERIAL DE USO E CONSUMO. MANUTENÇÃO DE MÁQUINA.

Para fins de apuração do crédito a ser descontado do valor da contribuição para o PIS não-cumulativo, os custos e despesas, inclusive aluguéis, dependem da vinculação com a atividade e desde que estejam explicitamente previstos na norma. Por conseqüência, as despesas administrativas, inclusive materiais de escritório e consumo, e os gastos com alimentação, cesta básica e assistência médica, mesmo as incorridas com pessoal da área de produção, não geram crédito. Considera-se insumo apenas os bens e serviços que forem aplicados ou consumidos diretamente na produção de serviços, e que guardem relação intrínseca com a quantidade produzida ou que altere ou modifique a qualidade do serviço para adequar ao contratado pelas partes. Estão alcançadas pelo conceito de insumo as despesas ou custos com bens de pequeno valor e os de manutenção de máquina, que vise recuperar o desgaste ou dano, decorrente do uso na produção. É do produtor do serviço o ônus da caracterização dos insumos, podendo ser-lhe exigida eventuais diferenças de créditos indevidamente descontados do PIS.”
(Processo de Consulta n° 67 de 01 de dezembro de 2004)

Aqui, vale uma ressalta com relação às despesas com indumentárias, que se mostra um tema abordado de maneira específica no CARF.

O órgão decidiu em alguns casos de maneira favorável a apropriação de crédito de PIS e COFINS referentes a despesas com vestimentas e outros materiais de segurança utilizados pela indústria alimentícia em sua cadeia produtiva.

O destaque para o fato de ser indústria alimentícia é necessário porque o argumento utilizado pelo CARF para possibilitar a apropriação dos créditos foi o de que, por expressa previsão legal, mostra-se obrigatória a utilização de determinada indumentária pelas pessoas que atuem diretamente na cadeia produtiva. Inclusive, referidos materiais são regulamentados pelos órgãos competentes, não ficando a livre liberalidade das empresas.

Isso tudo para justificar que a não utilização de referidos materiais acarretaria na paralisação da produção destas indústrias. Daí o argumento de que, por se tratarem de produtos que afetam diretamente a produção, deve ser possibilitada a tomada de créditos de PIS e de COFINS com relação a tais despesas:

“CRÉDITO INDUMENTÁRIA. INDÚSTRIA AVÍCOLA.
A indumentária de uso obrigatório na indústria de processamento de carnes é
insumo indispensável ao processo produtivo e, como tal, gera direito a crédito
do PIS/COFINS.

[…]

O caso em tela trata de gastos com indumentária, sem o qual não há como produzir carne de frango industrializada. Portanto, é a indumentária um insumo ou fator de produção usado na produção de carne de frango, independente dela se enquadrar ou não no conceito de "bens intermediários" existente na legislação do IP!. Os gastos com a sua aquisição são, evidentemente, custos para realizar a produção. E a legislação do PIS/Cofins fala em "insumo" e "custos" utilizado/incorrido na fabricação de bens (Lei n° 10.833/03, art. 3°, inciso II, e art. 6 0, § 3°) e não fala em "matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem" a que se refere a legislação do IPI (Lei n° 9.363/96, art. 1°). Aqui, aplica-se a legislação do PIS/Cofins e não a legislação que trata do ressarcimento do IPI.

[...]

Por último, a indumentária usada pelos operários na manipulação de carnes não se confunde com fardamento ou uniforme, que são de livre uso e escolha de modelo pela empresa e aquele é de uso obrigatório e deve seguir modelos e padrões estabelecidos pelo Poder Público. Fardamento/uniforme não é insumo, mesmo que utilizado por operários na linha de produção. Por evidente, alguns operários da recorrente, que não manipulam carne, podem usar fardamento ou uniforme e, neste caso, tais bens não se enquadram no conceito de insumo, não fazendo jus ao crédito do PIS e da Cofins não cumulativos os gastos com a sua aquisição.”

(CARF – Ac. 2102-00.107. 1ª Câmara da 2ª Turma Ordinária. Rel. Cons. Walber José da Silva. DJ de 08/05/2009)

Neste sentido, as despesas com material de segurança, calçados, uniformes, luvas e óculos de proteção não encontram amparo legal ou jurisprudencial para apropriação de créditos de PIS e COFINS, sendo remotas as chances de êxito em eventual discussão administrativa ou judicial.

Produtos e serviços não ligados à produção

Nesta categoria temos as despesas relacionadas a:

ü  Serviços contratados de portaria e limpeza;

ü  Serviços contratados de remoção de lixo;

ü  Materiais de limpeza em geral;

Caracterizam-se os itens acima como serviços e produtos que não mantêm correlação direta com a parte produtiva de mercadorias ou serviços.

Neste cenário, novamente, a indicação parece ser desfavorável à possibilidade de aproveitamento de créditos de PIS e COFINS. Novamente, tais itens não comportam amparo legal e não são considerados insumos pela jurisprudência atual:

“[...] COFINS NÃO CUMULATIVA. DESPESAS COM BENS E SERVIÇOS NÃO INCLUÍDOS NO CONCEITO DE INSUMOS DO ART. 3º DA LEI Nº 10.833/03. IMPOSSIBILIDADE DE CRÉDITO. As despesas com alimentação dos empregados, fornecimento de cesta básica, material de consumo, material de expediente, material de escritório, pessoal de serviço administrativo, serviço de segurança e vigilância, material de limpeza, manutenção de equipamentos de informática, serviços de consultoria, serviços de advocacia, vale transporte, serviços de transporte de funcionários, uniformes, material de segurança, planos de saúde e despesas de viagens a que se refere às glosas em discussão, correspondem a despesas de caráter geral voltadas para a administração da empresa e despesas referentes a benefícios aos empregados e não guardam relação direta com a prestação de serviço realizada. As despesas glosadas não tem nenhum efeito direto sobre a prestação de serviços de limpeza e conservação realizados pela Recorrente, visto tratarem-se atividades auxiliares ao funcionamento da empresa e portanto, não pode ser utilizado para gerar os créditos do PIS e da COFINS não cumulativos.”
(CARF – Ac. 3102-001.586. 3ª Seção da 1ª Câmara da 2ª Turma Ordinária. Rel. Cons. Winderley Morais Pereira. DJ de 28/11/2012)

“[...] CRÉDITOS. VESTUÁRIO, LAVANDERIA, REMOÇÃO E INCINERAÇÃO DE LIXO E SERVIÇOS DE CONSERVAÇÃO E LIMPEZA. Os gastos com vestuário, lavanderia, remoção e incineração de lixo e com serviços de conservação e limpeza não se enquadram como de insumos utilizados na produção de bens destinados a venda ou na prestação de serviços, não gerando direito a crédito da contribuição não-cumulativa.”

(CARF – Ac. 3302-002.064. 3ª Seção da 3ª Câmara  da 2ª Turma Ordinária. Rel. Cons. José Antonio Francisco. DJ de 15/05/2013)

BASE DE CÁLCULO. CRÉDITOS. INSUMOS.
O sujeito passivo poderá, no cálculo da Cofins, no regime nãocumulativo, descontar créditos calculados sobre valores correspondentes a insumos, assim entendidos os bens ou serviços aplicados ou consumidos diretamente na produção ou fabricação de bens e na prestação de serviços. A água somente será considerada como insumo quando for utilizada diretamente na fabricação ou produção de bens destinados à venda; Equipamentos de Proteção Industrial - EPI e fardamento; material de escritório e limpeza das obras, material de campanhas educacionais e materiais para utilização no ambulatório médico da obra não são considerados insumos, pois não atendem ao requisito de o desgaste ou dano ter ocorrido "em função da ação diretamente exercida sobre o produto em fabricação"; os serviços de vigilância, telefonia, passagens e hospedagens em hotéis, exames médico- admissional, cursos e treinamento, serviços de transportes, mesmo que referidos empregados estejam vinculados à obras, não geram direito a créditos a serem descontados do PIS/Pasep, por não se enquadrarem no conceito de insumos aplicados ou consumidos diretamente na produção ou fabricação de produtos; o aluguel de veículos não gera direito ao crédito por não se enquadrar no art. 3º, inciso IV da Lei 10.833, de 2003.


Assim, por serem consideradas despesas gerais com a administração da empresa e não relacionados especificamente com sua atividade produtiva, não geram direito a crédito as despesas com aquisição de materiais de limpeza e aquisição de serviços de remoção de lixo, portaria, limpeza, etc.

Materiais e serviços de manutenção de prédios, máquinas e instalações

Neste tópico, podemos considerar alguns materiais que são não dificilmente são utilizados pelas empresas na produção de seus produtos e/ ou serviços, mas atuam de forma indireta. Lixas, brocas, óleos lubrificantes, fitas, bisnagas, sacos plásticos, toalhas, etc., bem como serviços contratados para manutenção corriqueira das instalações.

Neste cenário, cumpre diferenciar os materiais e serviços que efetivamente atuam na cadeia produtiva dos que não o fazem. Brocas e óleos lubrificantes, por exemplo, servem para manter a qualidade e continuidade das máquinas e instalações que produzem os materiais. Atuam de maneira preventiva para que a cadeia de produção não seja interrompida. Sofrem, inclusive, desgaste ou perda por conta disso.

Este é um argumento válido na defesa de que, em decorrência destas características, devem sim ser considerados insumos, ensejando direito a crédito de PIS e COFINS. Os óleos e lubrificantes, que atuem diretamente na cadeia produtiva, também podem ser considerados como insumos. Neste sentido:

“CONTRIBUIÇÃO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL COFINS Período de apuração: 01/04/2004 a 30/06/2004 INCIDÊNCIA NÃO-CUMULATIVA. CRÉDITO. Do montante apurado para a contribuição, a pessoa jurídica pode descontar créditos sobre os valores das aquisições efetuadas no mês de bens e serviços, inclusive combustíveis e lubrificantes, utilizados como insumos na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda. COMBUSTÍVEIS E LUBRIFICANTES. Os combustíveis e lubrificantes, assim como a energia elétrica, quando participantes do processo industrial, caracterizam-se como insumos indiretos para os quais há determinação específica na legislação que permite o aproveitamento de créditos.”

(CARF – Ac. 3402-000.472. Terceira Seção de Julgamento. Rel. Cons. Gilson Macedo Rosenburg Filho – DJ de 23/12/2012)

“DISPOSITIVOS E MATERIAIS DE ABRASÃO UTILIZADOS NO PROCESSO PRODUTIVO. CARACTERIZAÇÃO COMO INSUMO. DIREITO A CRÉDITO. CRÉDITOS NÃO APROVEITADOS NOS ÚLTIMOS CINCO ANOS. DIREITO À COMPENSAÇÃO OU RESTITUIÇÃO.

No regime de apuração não cumulativa, podem ser descontados créditos, a título de insumos à fabricação, em relação a dispositivos e materiais de abrasão, tais como lixas, discos de corte e lixas de discos, utilizados no processo produtivo.

O crédito eventualmente não aproveitado no momento correto poderá sê-lo a posteriori, desde que seja refeito o cálculo das contribuições a pagar, com a retificação dos Dacon e DCTF referentes a cada um dos meses em que haja modificação na apuração da Contribuição para ao PIS/Pasep. O eventual saldo corresponderá a pagamento indevido e poderá ser compensado ou restituído no prazo de cinco anos contados do pagamento.”

(Solução de Consulta n° 13/2013. 9ª Região Fiscal)

“PEDIDO DE RESSARCIMENTO DE CRÉDITOS. REGIME DA NÃO CUMULATIVIDADE. INSUMOS. IDENTIFICAÇÃO COM O PROCESSO PRODUTIVO. Na legislação que trata do PIS/Pasep e da Cofins não cumulativos não existe um comando para que, para a identificação do que seja insumo capaz de gerar créditos, deva ser aplicada subsidiariamente a legislação do IPI, como se deu em relação ao crédito presumido estabelecido pela Lei nº 9.363, de 14 de dezembro de 1996. Desta forma, o conceito legal de insumos e que está contido no art. 3º, II, da Lei nº 10.637, de 30/12/2002, e no art. 3º, inciso II, da Lei nº 10.833, de 29/12/2003, não está restrito às matérias-primas, aos produtos intermediários e aos materiais de embalagem e outros bens que sofram alterações em função da ação diretamente exercida sobre o produto em fabricação, desde que não incluídos no ativo imobilizado, mas, sim, se estende, além desses, àqueles itens que são capazes de serem perfeitamente identificados com o processo produtivo da empresa.”

(CARF – Ac. 3401-001.713. 3ª Seção da 4ª Câmara da 1ª Turma Ordinária. Rel. Cons. Odassi Guerzoni Filho. DJ de 25/02/2013)

Já com relação aos materiais que não sejam utilizados no processo produtivo, bem como os serviços de manutenção das instalações prediais[12] não são considerados insumos, por não participarem de forma efetiva no processo produtivo.

“PIS/PASEP. BASE DE CALCULO DE CRÉDITOS. INCIDÊNCIA NÃO- CUMULATIVA. BENS E SERVIÇOS UTILIZADOS COMO INSUMOS. A condição imposta para o aproveitamento dos créditos de PIS/COFINS não- cumulativos, gerados pela aquisição de insumos com incidência da contribuição, é a efetiva utilização do insumo no processo produtivo, não podendo o termo "insumo" ser interpretado corno todo e qualquer bem ou serviço que gera despesa necessária para as atividades da empresa, mas, tão- somente, aqueles bens/serviços que, adquiridos de pessoa jurídica domiciliada no Pais, sejam efetivamente aplicados na produção ou fabricação do produto”

(CARF – Ac. 3301-001.769. 3ª Seção da 3ª Câmara da 1ª Turma Ordinária. Rel. Cons. Antonio Lisboa Cardoso. DJ de 18/06/2013)

IV - Conclusão

A definição do conceito e aplicabilidade da legislação em matéria de insumos que dão direito a apropriação de créditos de PIS e COFINS continua incerta e com inúmeras divergências.

Vem ganhando força nos tribunais uma corrente que considera como insumos ensejadores de créditos aqueles que se mostrem essenciais à produção do bem ou serviço, ou seja, sem os quais não haveria possibilidade de produção ou prestação.

A despeito deste entendimento, o caminho mais seguro hoje ainda é a tomada de créditos destas contribuições com relação a despesas com bens e serviços intrinsecamente ligados à produção, de preferência que se integram ao bem ou que sofram desgaste ou perda.

Independente deste cenário, mostra-se provável que a RFB continue autuando as empresas com relação a maioria das despesas consideradas como insumos creditáveis, não podendo este fator ser desconsiderado na análise.



[1] Ressalta-se que as mesmas disposições são aplicáveis ao PIS, contribuição regida pela Lei n° 10.637/2002.

[3] Art. 66, §5º, I, ‘a’ e ‘b’ e Art. 8º, §4º, I, ‘a’ e ‘b’, respectivamente.

[4] BERGAMINI, Adolpho; PEIXOTO, Marcelo Magalhães. PIS E COFINS na Teoria e na Prática. 2009. pg. 291.

[5] SCHOUERI, Luís Eduardo; VIANA, Matheus Cherulli Alcantra. O termo “insumos” na legislação das contribuições sociais ao PIS/PASEP  e à COFINS: a discussão e os novos contornos jurisprudenciais sobre o tema. In PIS e COFINS à luz da jurisprudência do CARF. 2011. pg. 419.

[6] Acórdao n. 201-13.045, de 02 de julho de 2008, Terceira Câmara do Segundo Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda (atual CARF). No mesmo sentido, Ac. 3202-00.226 de 17/01/2011.

[7] Recurso Especial nº 1246317. O julgamento do recurso especial encontra-se interrompido por conta do pedido de vista do Ministro Herman Benjamin.

[8] REsp 1020991. Rel. Min. Sergio Kukina. DJe de 14/05/2013.

[9] CARF - Ac. n° 9303-001.740 3ª Turma. Rel. Cons. Nanci Gama. Sessão de 09/11/2011.

[10] Neste caso, excetua-se as empresas as quais prestem serviços de transporte de mercadorias, ou as quais o serviço seja prestado através do veículo utilizado (ambulância, por exemplo).

[11] No mesmo sentido, Ac. 3102-001.585, citado mais adiante.

[12] Importante notar que aqui não estamos nos referindo a benfeitorias que, contabilizadas no ativo imobilizado, geram direito a credito de PIS e COFINS por conta do art. 3, VII da Lei n° 10.833/03. Tratamos aqui de meras reparações necessárias diariamente, como troca de lâmpadas, fios, etc.