INSTITUTO LUTERANO DE ENSINO SUPERIOR DE ITUMBIARA

CURSO DE DIREITO

IVAN LUÍS MOTTES

COOPERATIVAS DE TRABALHO: A LUTA CONTRA OS EFEITOS INDIRETOS DO CAPITALISMO.

Setembro/2009

RESUMO 

O presente artigo pretende abordar situações fáticas de cunho histórico, mas que, porém repercutem cotidianamente no sistema jurídico brasileiro, envolvendo matérias sobre terceirização de mão-de-obra e cooperativas de trabalho, temas estes amparados pelo direito do trabalho, mas que ainda não detém a devida regulamentação legislativa necessária para alcançar a plena eficácia, evitando assim, interpretações divergentes entre os tribunais. Este trabalho enfatiza a ideia de promover a substituição da relação trilateral ocasionada pela terceirização, excluindo o intermediador da prestação de serviços, pelas cooperativas de trabalho onde estas farão o papel de assumir os riscos do contrato privilegiando, dentre outros princípios, a gestão democrática, o apoio mútuo entre os associados e a valorização do trabalhador enquanto cerne principal desta sociedade. Outros pontos relevantes também a serem abordados serão a exposição da importância do movimento sindical no Brasil, sua evolução e a posição dos sindicatos perante as problemáticas advindas da globalização, mostrando as dificuldades que essas associações enfrentam devido o processo de terceirização de mão-de-obra, a definição das cooperativas de mão-de-obra como uma solução aos efeitos indiretos do capitalismo, além indicar as diferenças entre as sociedades cooperativas e as sociedades mercantis. Nessa pesquisa, a metodologia relaciona-se ao método dedutivo dentro de uma abordagem qualitativa, por corresponder aos pressupostos do referencial teórico eleito para a pesquisa, da professora Leda Maria Messias da Silva e do professor Ricardo Luiz Coltro Antunes. Nesse sentido foram utilizadas fontes bibliográficas, visto que o tema demanda uma leva muito grande de conhecimentos históricos e foi necessário buscar uma base sólida para construção de uma teoria que fosse compatível com o problema proposto. O estudo foi realizado não só sob um enfoque interdisciplinar, abrangendo diversos ramos do direito como o direito civil, comercial e principalmente o do trabalho, mas também, transdisciplinar por envolver outras ciências dentre elas a sociologia e a história. 

Palavras chave: Terceirização, movimento sindical e cooperativas de trabalho 

 

 

 

 

 

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

A partir da década de 1930 teve início o período de industrialização no Brasil, “inaugurando-se a intervenção estatal do tipo desenvolvimentista, em que se engajou diretamente no processo de modernização econômica[1].” Este período ficou conhecido como o início da Era Vargas e a da implantação da política econômica intervencionista, e teve como finalidade, “evitar repetir as desastrosas medidas de política econômica que culminaram na grande depressão dos anos 30”[2], ocasionado pelo liberalismo econômico até então vigente. Foi marcado também pela efetiva regulamentação do trabalho e do mercado de trabalho no Brasil, sendo criados órgãos de implementação às políticas públicas de emprego, como é o caso do Ministério do Trabalho Indústria e Comércio hoje MTE, “além da organização dos sindicatos que foi estimulada pela legislação varguista e a criação de tribunais específicos para questões trabalhistas”.[3]

Nessa época houve uma expansão do modelo fordista de produção, no qual priorizava-se a produção em massa dos bens de consumo e não as exigências do destinatário final: o consumidor. Como exemplo disso era a fabricação de automóveis que mantinha como base a tintura preta, pois secava mais rápido e permitia certa aceleração da produção.

Contudo a partir da década de 80, o surgimento da globalização e do Estado neoliberal passou-se a preconizar

a reforma do Estado, desestatização da economia, privatização de empresas produtivas e lucrativas governamentais, abertura de mercados, redução de encargos sociais relativos aos assalariados por parte do poder público e das empresas e corporações privadas, informatização de processos decisórios, de comercialização e outros, busca da qualidade total, intensificação da produtividade e da lucratividade da empresa ou a corporação nacional e transnacional.[4]

Nesse sentido o modelo de produção fordista foi substituído pelo toyotista que privilegiava “a produção adaptada à demanda do mercado” e “a flexibilização da produção, pela ‘especialização flexível’, por novos padrões de busca produtividade, por novas formas de adequação da produção à lógica do mercado” [5]. Com isso surge o instituto da terceirização, que se traduz, na “extinção de um determinado setor ou setores de uma empresa, no fito de buscar a redução de custos. Portanto, para se terceirizar determinada atividade, evidente que se desativa parte dessa mesma empresa.”[6] Normalmente, para a concentração de bens e serviços, a empresa contrata os denominados terceirizados com os quais, geralmente, celebra contratos bilaterais, regidos pela legislação civil e comercial, ou seja, “a empresa organizada conforme o modelo ‘Toyota’, recorre as relações triangulares de trabalho nas quais aparece apenas como cliente de mão-de-obra fornecida por empresas terceiras”.[7]

Como se pode observar, o sistema toyotista para privilegiar o consumidor acaba ferindo indiretamente os direitos do empregado, visto que este não mantém vínculo algum com a empresa tomadora de serviços e os direitos trabalhistas estão sendo camuflados dentro de um contrato de locação de serviços estipulado pela empresa prestadora com a tomadora, sem a participação do empregado.

A queda do Estado intervencionista e a sua transição para um Estado incentivador da iniciativa privada propiciou uma brecha para que as relações de trabalho fossem mais flexíveis, podendo ser suprimidas pelos acordos e convenções coletivas, amparadas até constitucionalmente segundo a Constituição Federal de 1988. Contudo é inegável que esta flexibilização teve seu lado positivo sendo fruto de um processo histórico assim como a terceirização também o é.

Cabe ressaltar que legislador constituinte ao editar as normas envolvendo direitos trabalhistas, não optou por um direito engessado e preso a vontade exclusivamente estatal, mas possibilitou maior negociação entre as partes para disporem sobre o contrato de trabalho tornando-o assim flexível.

Com a crise mundial estabelecida no começo deste ano, e que manteve reflexos em vários países e inclusive no Brasil, pôde-se notar o quanto a flexibilização de direitos foi eficaz para proteger a continuidade da relação empregatícia, em um momento de conjuntura econômica pela qual diversas empresas presenciaram foi necessário adotar medidas como os acordos e convenções coletivas para redução de salários e flexibilização de jornadas para evitar tragédias maiores, como por exemplo, o desemprego. Percebe-se que se ainda tivéssemos um direito engessado, com certeza os resultados poderiam ser bem piores, já que o Estado como o tutor das normas jurídicas não iria permitir que as mesmas fossem violadas.

Outro ponto relevante e que precisa ser mencionado é a questão dos sindicados. De acordo com Carlos Alberto Bosco citando Jorge Mattoso

“nota-se que, no modelo fordista de produção, a classe patronal ficava na defensiva, em razão da postura forte do sindicato. Ao contrário nos dias atuais, é o empregador que apresenta sua pauta de reivindicações porque essa desestruturação no mundo do trabalho, caracterizado por essa insegurança do trabalho em vários níveis, tende a colocar os sindicatos na defensiva, enfraquecendo suas praticas reivindicativas de conflito e negociação e, na grande maioria dos casos, reduzindo os níveis de sindicalização.” [8]

Não é fácil a tarefa do sindicato no dever de representar uma classe de trabalhadores que está sob a dependência de empresas prestadoras de serviço, visto que eles não laboram para estas e sim para as empresas tomadoras com as quais não mantém vínculo algum da relação empregatícia.

Na verdade, “quando se está realmente diante de um contrato de prestação de serviços, o que interessa ao tomador é pura e simplesmente o resultado do trabalho, e não com quem, como e quando o executa”.[9] Outra dificuldade é a de se manter uma base de trabalhadores sólida contribuindo para manutenção do sindicato e que também deve ser repensada, pois com a flexibilização do trabalho, a própria ideologia intervencionista do sindicato sustentado por leis rígidas caiu por terra, assim como o modelo fordista de produção.

A legislação trabalhista brasileira ainda não possui uma lei específica que trata da terceirização como atividade-meio, sinal que a legislação obreira vigente ainda está apegada a situações fáticas de quando entrou em vigor, não se adaptando a realidade atual, tendo apenas a súmula 331 do TST regulamentando a matéria. De regra, a terceirização deve ser regida por atividade-meio, mas existem situações em que se acolhe a terceirização para atividade-fim, como são os casos do trabalho temporário e da terceirização dos serviços de telecomunicações, ambas reguladas por leis próprias.

O presente trabalho pretende mostrar um breve histórico da luta sindical no Brasil e expor as deficiências do sistema sindical que se mostra inerte perante o processo de descentralização produtiva, além de propor soluções para a adaptação da classe trabalhadora às problemáticas advindas da globalização, como a formação de cooperativas de trabalho.

  1. 1.      Breve analise histórica do processo de desenvolvimento sindical no Brasil e a sua posição perante o processo de descentralização produtiva

Segundo Ricardo Antunes,

“os sindicatos são associações criadas pelos operários para sua própria segurança, para a defesa contra a usurpação capitalista, para a obtenção de um salário digno e de uma jornada de trabalho menos extenuante, uma vez que o lucro capitalista aumenta não só em função da baixa de salários e da introdução das máquinas, mas também em função do tempo excessivo de trabalho que o capitalista obriga o operário a exercer.” [10]

Ricardo Antunes salienta também que a finalidade da representação sindical se dá, para “evitar que o operário continue sua luta isolada e individualmente frente ao capitalista.” [11]

O processo de formação dos sindicatos no Brasil se deu a partir do final do século XIX, e os primeiros núcleos operários se instalaram na região de São Paulo e Rio de Janeiro. “Suas primeiras formas de organização foram as Sociedades de Socorro e Auxílio mútuo, que visava auxiliar materialmente os operários nos momentos difíceis, como nas greves e dificuldades econômicas.”[12] Entretanto mais tarde “estas associações mutualistas sucederam as Uniões Operárias, que por sua vez, com o advento da indústria, passaram a se organizar por ramos de atividades, dando origem aos sindicatos.”[13]

Mais adiante entre os anos de 1918 a 1920, marcou-se um período em que os sindicatos impulsionados pela ideologia anarquista lideravam movimentos grevistas em vários pólos do país, movimentos estes que passaram a ser violentamente combatidos.

Antunes expõe que “não há dúvidas que muitas reivindicações pelas quais lutavam as massas trabalhadoras foram alcançadas total ou parcialmente, mas as vitórias alcançadas não estavam em proporção com o vulto e a extensão do movimento geral.” [14] Contudo, os anarquistas não prosperaram por muito tempo dado que o

 “movimento anarco-sindicalista limitou-se as reivindicações econômicas, negando a luta política e sequer exigindo do Estado uma legislação trabalhista, dado que os anarquistas eram contrários às leis do Estado. Também não admitiam a existência de um partido político da classe operária, assim como não aceitavam a política de aliança de classes com os demais setores subalternos da sociedade, o que acarretou o isolamento da luta operária, tornando-se presa fácil do Estado de sua força policial repressiva.” [15]

Já com a Era Vargas o sindicalismo brasileiro apresentou uma nova face, o “Estado varguista procurou, numa primeira fase, controlar o movimento operário e sindical trazendo-o para dentro do aparelho do Estado.” [16]

Criou-se o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e estabeleceu regras estipulando os limites dos sindicatos, tais como,

“controle financeiro pelo respectivo ministério dispondo sobre os recursos dessas associações, proibindo a sua utilização pelos operários durante as greves; permitia aos delegados do Ministério do Trabalho o direito de participar das assembleias operárias; proibia o desenvolvimento de atividades políticas e ideológicas dentro dos sindicatos; vetava sua filiação a organizações sindicais internacionais; negava o direito de sindicalização aos funcionários públicos; limitava a participação de operários estrangeiros nos sindicatos e assegurava a unicidade sindical.” [17]

No entanto houve certa rejeição a estas exigências e o movimento grevista ainda era intenso nesse período, tendo logrado êxito em suas reivindicações, mas o governo prevendo um avanço popular iniciou uma ação repressiva. Lembrando que nessa época a ideologia nazi-fascista foi incorporada ao governo brasileiro, gerando bastante violência no combate as manifestações.

Antunes ressalta que a partir da década de 1940 o Estado Novo já mostrava seus sinais de debilidade e no mesmo ano em que Vargas foi deposto em 1945, foram

“eliminados não só os dispositivos legais que obrigavam a presença de representantes do Ministério do trabalho nas assembleias, sindicais, como também aqueles que exigiam a aprovação prévia do ministério para a realização de eleições e posse das direções sindicais eleitas.” [18]

Com isso o movimento operário ganhou mais força perdurando de 1945 até 1964, tendo como aliados membros do Partido Comunista Brasileiro.

Com o golpe militar, iniciou-se uma fase obscura para o sindicalismo brasileiro, “proibiu-se o direito de greve e a fixação de índices salariais passou a ser tarefa do Estado deixando de ser feita através de negociação entre operários e patrões.” [19]Esse arrocho salarial, como era considerado, gerou descontentamentos por parte dos empregados, que como eram impedidos de entrar em greve e violentamente reprimidos se a fizessem, começaram a ‘amarrar a produção’ como uma forma de auto-defesa. Lembrando que durante a ditadura militar os direitos sindicais não eram o único anseio da sociedade, como também o re-estabelecimento do governo democrático, que veio depois de muitos anos de ditadura.

Diante de todos esses fatos históricos, pelos quais o movimento sindicalista brasileiro presenciou, pôde-se perceber que “a luta sindical é uma luta contra os efeitos do capitalismo e não contra as suas causas.” [20]

Partindo-se dessa afirmação feita por Antunes, podemos constatar que o processo de terceirização foi uma causa capitalista advinda de outro processo que é o de multinacionalização, tendo um enfoque muito mais econômico do que propriamente de restrição de direitos que é um efeito do capitalismo. Mas, porém a terceirização tem efeitos causados indiretamente, sendo quase imperceptíveis para quem está inserido no contexto social em que ela se encontra.

A luta sindical brasileira foi marcada por insatisfações ocasionadas justamente porque o ponto principal de sustento do trabalhador – o seu salário e direitos – estavam sendo solapados pelo capital. E toda essa inquietude fez com que proletariado fosse as ruas reivindicar o que é seu, fez surgirem greves e outras manifestações, e mesmo com um governo opressor como o foi na época da ditadura militar, ainda assim, não foi o bastante para manter o trabalhador calado.

A discussão alcança maior interesse quando fala-se das cooperativas de trabalho, que ganharam espaço dentro do cenário brasileiro de trabalho, uma vez que torna-se um instrumento de combate aos efeitos indiretos da terceirização. Para Leda Maria, quando

 “os trabalhadores são donos do próprio empreendimento, em gestão democrática, organizados, atuam como um “sindicato-cooperativa”, eliminando a figura do patrão como intermediário, e negociando diretamente com o tomador de seus serviços, de igual para igual, pois a inferioridade própria do empregado, em face de sua hipossuficiência, seria compensada pela força conjunta da atuação de um grupo de homens e mulheres cooperados, solidariamente ajudando uns aos outros.”[21]

  1. 2.      Das cooperativas de trabalho enquanto fomentadoras de direitos sociais e forma de substituição à Terceirização

Segundo Leda Maria Messias da Silva,

“cooperativa é uma sociedade de pessoas, de natureza civil e com características próprias, que se unem solidária e voluntariamente, com a finalidade de atender suas necessidades econômicas, sociais, educativas e culturais, por meio do empreendimento de propriedade comum e gestão democrática.” [22]

Ao se falar em cooperativas de trabalho vale ressaltar que o presente artigo faz menção as cooperativas de mão-de-obra que é espécie do gênero cooperativa, visto que existem outras espécies de sociedades cooperativas. Outro ponto que deve ser frisado é que

 “tais cooperativas são perfeitamente viáveis e devem ser consideradas legais, desde que constituídas não como meras locadoras de mão-de-obra, mas, sim, com o fito de eliminar a figura do intermediário – no, caso a empresa prestadora –, e desde que não haja subordinação do cooperado e pessoalidade na prestação dos serviços, em relação ao tomador, e, ainda, desde que esses serviços não sejam realizados nas atividades fim das empresas, e que se trate de serviços especializados.” [23]

Vale dizer que o entendimento exposto pela autora condiz com o que preceitua a súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, quando faz referência a proibição prestação de serviços de atividade-fim as tomadoras, mostrando-se compatível com a modalidade de cooperativa de mão-de-obra, pois

“a mão-de-obra se prestaria a criar apenas uma empresa fictícia – a própria tomadora de serviços –, que não teria nenhuma função social nessa relação, a não ser a de encarecer a mão-de-obra, pois seria uma estrutura ‘morta’, onde tudo estaria terceirizado, desde a atividade-meio até a atividade-fim, e provavelmente seria ela que abarcaria os lucros da operação, sem que produzisse qualquer utilidade.” [24]

Vantuil Abdala “adverti que, em situações dúbias, a circunstância de a tomadora ter empregados permanentes exercendo as mesmas funções que os terceirizados é forte elemento de convicção para o juiz não admitir como legítima a subcontratação.”[25]Sendo assim o mesmo vale para os cooperados que prestam serviços para tomadores de serviço.

Várias são as vantagens auferidas pelas cooperativas quando cumprem a sua verdadeira função social que é agir em prol de seus associados. A primeira será a facilidade de manutenção da cooperativa, já que como todos os sócios são solidariamente responsáveis por essa sociedade, mais fácil será a possibilidade de obter crédito para gerir os negócios, visto que será uma maior confiança e garantia para os credores transacionarem com seus clientes, além de serem conferidas vantagens no tocante ao apoio e estímulo estatal garantidos constitucionalmente. Os contratos de prestação de serviço serão firmados de igual para igual, com as exigências de ambas as partes, sem que nenhum dos associados seja prejudicado.

Outro ponto relevante é que cooperado não é empregado, não possui vínculo empregatício nem com a cooperativa, tampouco com o tomador de serviços. O cooperado é “um autônomo, e como tal não é subordinado a ninguém: trabalha com total autonomia e assume os riscos de seu trabalho.” [26] Sendo assim não é onerado por empregador, já que o “pagamento é feito pela cooperativa em forma de rateio, dependendo do volume de suas operações, após computadas receitas e despesas.” [27]Não existe a figura da pessoalidade para o cooperado, como nos contratos de emprego que são intuito personae, pois o contrato de prestação de serviço é firmado entre a cooperativa que é uma pessoa jurídica e o tomador, podendo o cooperado ser substituído por qualquer outro cooperado.”[28]Com base nessas explanações tem-se a decisão transcrita abaixo, demonstrando uma tentativa fraudulenta de se pleitear a relação empregatícia, quando na verdade esta não existia:

“Relação de emprego. Não configuração. Cooperativa de trabalho. Comprovada a ilicitude da cooperativa constituída, à qual se filiou espontaneamente o trabalhador para prestar serviços na condição de empregado autônomo, inexistindo provas em sentido contrário, não pode ser reconhecida a relação de emprego, pois ausentes os elementos fático-jurídicos exigidos para sua configuração. Processo 00459 2002 109 03 00 3 RO, publicado em 04.09.2003, Sexta Turma do TRT de MG, Relator Juiz Ricardo Antonio Mohallem.”

2.1 Peculiaridades das cooperativas de trabalho em relação às empresas capitalistas

O tópico anterior fez menção à forma de recebimento das verbas devidas aos cooperados na qual é feita na forma de retirada, contudo faz-se necessário fazer algumas ressalvas a esta questão, pois “há empresas em que a maioria opta pela igualdade das retiradas por uma questão de princípio ou então porque os trabalhos que executam são idênticos, ou quase.” [29] Mas Singer salienta que “a maioria das empresas solidárias adota certa desigualdade das retiradas, que acompanha o escalonamento vigente nas empresas capitalistas, mas com diferenças muito menores, particularmente entre o trabalho mental e manual.” [30]

Para o autor as razões que

“levam a maioria dos cooperadores a aceitar certa desigualdade de retiradas variam de empresa para empresa. Em algumas delas a maioria acha natural que certos trabalhos valham mais do que outros, pois os trabalhadores aceitam e defendem a hierarquia profissional a que foram acostumados. Em outras, a maioria opta, pela desigualdade de retiradas para não perder a colaboração de cooperadores mais qualificados, que poderiam obter melhor remuneração em empresas capitalistas.” [31]

 Singer questiona que a impressão de não fazer muita diferença em trabalhar numa empresa capitalista ou numa solidária e não se exalta ao dizer que essa impressão é falsa, porque na

“empresa capitalista, os salários são escalonados tendo em vista maximizar o lucro, pois as decisões são tomadas por dirigentes que participam nos lucros e cuja posição estará ameaçada se a empresa que dirigem obtiver taxa de lucro menor que a média das empresas capitalistas. Já na empresa solidária, o escalonamento é decidido pelos sócios, que têm por objetivo assegurar boas retiradas para todos principalmente para a maioria que recebe as menores retiradas.” [32]

Várias são as distinções entre as cooperativas de trabalho (empresa solidária) e as sociedades mercantis (empresa capitalista), contudo o presente trabalho não busca adentrar a fundo nessa comparação, mas alguns breves pontos específicos serão enfatizados, tomando, por exemplo, uma definição acolhida por Leda Maria, em que

“enquanto na sociedade mercantil o principal é o capital, na sociedade cooperativa, o principal é o homem; os sócios vendem seus produtos e serviços a uma massa de consumidores, enquanto na cooperativa o cooperado é sempre o dono e usuário da sociedade; cada ação ou quota conta como um voto na assembleia, na sociedade comercial, na sociedade cooperativa cada pessoa conta como um voto na assembleia; o controle é financeiro na primeira, já na segunda o controle é democrático; é uma sociedade de capital que funciona hierarquicamente, a mercantil, a cooperativa é uma sociedade que funciona democraticamente; as quotas podem ser transferidas a terceiros (mercantil), as quotas não podem ser transferidas a terceiros (cooperativa); são, muitas vezes, os próprios intermediários (mercantil), e a cooperativa afasta o intermediário; dividendos retornam aos sócios proporcionalmente ao número de ações (mercantil), e os resultados retornam aos sócios de forma proporcional às operações (cooperativa); limita, por vezes, a quantidade de acionistas (mercantil), aberta à participação de novos cooperantes; contrata o trabalhador como força de trabalho (mercantil), valoriza o trabalhador e suas condições de trabalho e vida (cooperativa); defende o maior preço possível (mercantil), defende preços justos (cooperativa); promove a concorrência entre as sociedades (mercantil), promove a integração entre as cooperativas (cooperativa); o compromisso é econômico (mercantil), o compromisso é educativo, social e econômico (cooperativas).” [33]

A partir de todas essas comparações realizadas, não resta dúvida quanto o conceito, a natureza e a finalidade da cooperativa de trabalho, que possui suas características próprias e bem modeladas, com as quais guarda ínfimos traços com as sociedades mercantis, pois apesar da cooperativa ser um instrumento a favor dos trabalhadores, não desvincula-se do sistema capitalista por inteiro e fora deste não consegue sobreviver.

  1. 3.      Considerações finais.

O cooperativismo busca alcançar não só a satisfação de seus associados proporcionando melhores condições de vida, mas cumprir um objetivo fundamental almejado pela Constituição Federal brasileira que é o de construir uma sociedade livre, justa e principalmente solidária. Buscando incentivar a libertação da classe trabalhadora, da famigerada posição inferior da relação contratual e eliminar possíveis fraudes provocadas pela intermediação de mão-de-obra.

Contudo é difícil a tarefa de difundir essa ideia entre os trabalhadores, principalmente os liberais, pois estes em sua maioria atuam de forma isolada, às vezes, às margens da informalidade e sem contribuir para a previdência social. Embora as atividades cooperativas sejam aceitas desde a década de 70 no Brasil, a sua prática tem-se restringido ao setor agrícola onde possui o maior número de adeptos, formando cooperativas de consumo e produção.

            Tramita o projeto de lei de n° 68/2001 no Congresso Nacional de iniciativa do Senador Jonas Pinheiro e que estabelece disposições gerais sobre as cooperativas de trabalho, seus associados e no tocante a sua representação e coordenação, a fim de especificá-la e diferenciá-la das outras, mas que ainda espera por aprovação. Outro empecilho desfavorável é que no Brasil a constituição de cooperativas ainda é muito pequena, visto é a dificuldade por parte do brasileiro em confiar no próximo e demonstrar um apoio mútuo, além da falta de conhecimento técnico suficiente para manutenção desse tipo de instituição, principalmente em questões administrativas. Mas apesar dos entraves citados, não restam dúvidas de que as Cooperativas de trabalho são um meio eficaz de extinguir a prestação de serviços por intermediação.

 

 

 

 

 

 

 

 

Bibliografia

 

ABDALA, Vantuil. Terceirização: Normatização – Questionamentos. Rev. TST, Brasília, vol. 74, nº 4, out/dez 2008

Acórdão proferido pela Sexta Turma do TRT 3ª Região, Processo 00459 2002 109 03 00 3 RO, publicado em 04.09.2003, Relator Juiz Ricardo Antonio Mohallem

ANTUNES, Ricardo Luiz Coltro. O que é sindicalismo. São Paulo. Ed. Brasiliense S.A. 1980

BOSCO, Carlos Alberto. Trabalho Informal: Realidade ou relação de emprego fraudulenta? . Curitiba. Ed Juruá. 2006

SILVA, Leda Maria Messias da. Cooperativas de trabalho: terceirização sem intermediação. São Paulo. Ed. LTr. 2005

SINGER, Paul. Introdução à Economia Solidária. São Paulo. Ed. Fundação Perseu Abramo. 2008

THEODORO, Mario. Desenvolvimento, subsistência e trabalho informal no Brasil. São Paulo. Ed Cortez. 2004



[1]           THEODORO, Mario. Desenvolvimento, subsistência e trabalho informal no Brasil. São Paulo. Ed Cortez. 2004, p.99.

[2]           BOSCO, Carlos Alberto. Trabalho Informal: Realidade ou relação de emprego fraudulenta? . Curitiba. Ed Jurua. 2006, p.22

[3]           THEODORO, Mario. Desenvolvimento, subsistência e trabalho informal no Brasil. São Paulo. Ed Cortez. 2004, p.100.

[4]           BOSCO, Carlos Alberto. Trabalho Informal: Realidade ou relação de emprego fraudulenta? . Curitiba. Ed Juruá. 2006, p.33

[5]           Ibid., p.36

[6]           Ibid., p.52

[7]           Ibid., p.44

[8]           Ibid., p.37

[9]           ABDALA, Vantuil. Terceirização: Normatização – Questionamentos. Rev. TST, Brasília, vol. 74, nº 4, out/dez 2008

[10]          ANTUNES, Ricardo Luiz Coltro. O que é sindicalismo. São Paulo. Ed. Brasiliense S.A. 1980. p. 13

[11]          Ibid., p. 13

[12]          Ibid., p. 48

[13]          Ibid., p.48

[14]          Ibid., p. 53

[15]          Ibid., p. 54

[16]          Ibid., p.58

[17]          Ibid., p.59

[18]          Ibid., p.65

[19]          ANTUNES, Ricardo Luiz Coltro. O que é sindicalismo. São Paulo. Ed. Brasiliense S.A. 1980. p.76

[20]          Ibid., p.41

[21]          SILVA, Leda Maria Messias Da. Cooperativas de trabalho: terceirização sem intermediação. São Paulo. Ed. LTr. 2005, p. 89

[22]          Ibid., p.58

[23]          Ibid., p.88

[24]          Ibid., p.88

[25]          ABDALA, Vantuil. Terceirização: Normatização – Questionamentos. Rev. TST, Brasília, vol. 74, nº 4, out/dez 2008

[26]          SILVA, Leda Maria Messias Da. Cooperativas de trabalho: terceirização sem intermediação. São Paulo. Ed. LTr. 2005, p.85

[27]          Ibid., p.85

[28]          Ibid., p.85

[29]          SINGER, Paul. Introdução à Economia Solidária. São Paulo. Ed. Fundação Perseu Abramo. 2008, p.12

[30]          Ibid., p.12

[31]          Ibid., p.12

[32]          Ibid., p.14

[33]          SILVA, Leda Maria Messias Da. Cooperativas de trabalho: terceirização sem intermediação. São Paulo. Ed. LTr. 2005, p.57