Elidiane Melo

O Curso Introdutório da Abordagem Centrada na Pessoa foi de grande valia para o meu crescimento pessoal, como também, profissional. As discussões feitas sobre o início desse pensamento de Rogers sobre o cuidar numa terapia contribuíram para uma reflexão das experiências que vim tendo durante toda a minha vida acadêmica e posso até dizer que em outras áreas também.

A prática psicoterapêutica, com a nova linha de pensamento de Rogers, passa por uma revolução que surgiu da insatisfação com relação aos modelos de terapia, antes estabelecidos, em que o sujeito era visto como apenas paciente e não como uma pessoa ativa no processo terapêutico.

Rogers acredita no ser humano como um ser em desenvolvimento, mutável, capaz de resignificar suas potencialidades a ponto de transcendê-las e caminhar para uma autoconstrução de um ser que não está complemente acabado. A abordagem centrada na pessoa está mais interessada pela maneira como a mudança da personalidade ocorre do que pelas causas e estrutura desta.

O homem é percebido como um ser de possibilidades de existência e não como uma essência perfeita corrompida pela sociedade, mas sim, como um ser de valor natural positivo e que possui características próprias a serem elaboradas a cada experiência.

O livro, Conversa sobre Terapia, possui uma estrutura de conversa contínua, mostrando dessa forma, um maior contato com o leitor e o colocando nas situações apresentadas nos dois casos que acabam por suas histórias estarem relacionadas.

São dois casos discutidos, em que dois terapeutas conversam sobre seus clientes e sentimentos que eram despertados devido às histórias.  No livro, um dos terapeutas atende um cliente que não tinha valores e princípios prezados pela sociedade e pelo próprio terapeuta, despertando um sentimento de repulsa enorme sobre ele e que por chegar a se perceber dessa forma, decide não dar continuidade na relação terapêutica e o encaminha para outro profissional.

Essa situação é muito real na atuação clínica. É necessário que o terapeuta não se submeta, mas sim, se comprometa com um trabalho pessoal, visando elaborar questões próprias, ainda mal resolvidas. É interessante que se tenha um supervisor que irá colaborar com discussões sobre determinados casos que a problemática venha sendo constante e de difícil mudança.

Na iniciativa do terapeuta do texto em levar o caso para ser discutido em supervisão, pode-se observar questões éticas, em que, o terapeuta se percebe limitado em seus sentimentos e indagações sobre a relação. Ele reinicia, então, seu processo terapêutico com o intuito de elaborar questões que estavam impedindo a evolução da terapia.

Ao mesmo tempo o livro traz a tona, a evolução do tratamento psicológico em outro caso. A cliente acolhida pela terapeuta não estava trazendo verdades de seus sentimentos para a terapia, ela não estava congruente consigo mesma e por isso, autêntica na relação, porém, ela não se percebia dessa forma, ainda não era o momento.

No entanto a intervenção da terapeuta não foi de invasão do conteúdo ainda não desvelado pela cliente, mas sim, de espera. Numa relação terapêutica, é preciso que o terapeuta se permita esperar que o cliente traga suas questões mais profundas do que forçar, de repente, uma sentimento que não é real, fazendo com que o rumo da terapia se distancie cada vez mais do foco de mudança.

Quando a cliente se desvela na relação, o processo começa a tomar um rumo de evolução, até que a própria cliente se perceba mais autêntica em sua relação com o mundo e com ela mesma.

Observando todas essas questões na teoria de Rogers, percebe-se que ele se baseia na congruência natural e espontânea da criança, em que o desenvolvimento para a maturidade humana é um processo mais complexo, porém, rico. Primeiramente o homem, nesse processo, se encontra numa organização de sua personalidade, em que a experiência é percebida como uma realidade pessoal, e a interação com essa realidade acontece por uma tendência atualizante, no qual as experiências são percebidas num complexo sistema, cujas potencialidades do sujeito caminham para um desenvolvimento a favorecer sua conservação e enriquecimento.

A desorganização da personalidade se explica como um estado de vulnerabilidade, como se ocorresse uma desintegração da personalidade, antes “perfeita”, pois o indivíduo está sujeito a um desequilíbrio interior.

O processo de reorganização da personalidade afirma a importância do papel do terapeuta na relação, exigindo uma reflexão sobre a consideração positiva incondicional desse sujeito. O indivíduo precisa se reconhecer em desajustamento para que o processo de reorganização aconteça, como também, perceber-se aceito e respeitado, cuja suas potencialidades são notadas e creditadas.

Nos dois casos apresentados no livro, todos esses conceitos da teoria de Rogers puderam ser notados. No primeiro, o sujeito não se percebia em desajustamento, para ele tudo estava caminhando muito bem, e ao longo do processo, ele não se permitiu ou a relação não favoreceu um resultado satisfatório.

No segundo, a cliente chegou, também, como se tudo estivesse certo em sua vida e na verdade estava, certo demais, no sentido de estar bem firmado, incoerentemente firmado e por isso difícil à mudança. No entanto, o ser humano é capaz de se auto-direção, no sentido de fazer suas próprias escolhas, se responsabilizando por elas e de se auto-desenvolver, a partir do momento em que percebe suas relações com o mundo e consigo mesmo atribuindo significados.

O homem é um ser de possibilidades, tornando a vida como um processo ativo numa construção de um vir-a-ser. Essa tendência de auto-desenvolvimento de crescimento remete a noção de Rogers com relação a natureza humana com valor positivo e que tais capacidades inatas precisariam passar por um processo de liberação.

Observando essas questões, a psicoterapia é entendida, então, como um encontro existencial, interpessoal, em que o momento é marcado por uma experienciação. O processo acontece por uma vivência integrada que não há impasses e é experienciada na sua totalidade, seguindo para uma aceitação interna pessoal. O indivíduo passa, nesse sentido, por uma vivência de auto-aceitação e de integração.

Para que esse processo ocorra, o terapeuta deve se encontrar num estado de acordo interno, ou seja, de congruência, não se escondendo por trás de uma condição de sábio ou potente para guiar à problemática e dessa forma, o cliente passa a, então, experimentar um sentimento de segurança que possibilitará um crescimento positivo.

O terapeuta deve aceitar o cliente de modo positivo e incondicional e para que isso ocorra é preciso acreditar no ser humano e suas potencialidades. Não há julgamento moral ou ético e desrespeito pelo “cliente”.

O terapeuta não aprova ou desaprova atitudes da pessoa, aceita-a incondicionalmente, porém ele não se perde em seus valores e crenças e o cliente passa a perceber essas experienciações vivenciadas pelo terapeuta, contribuindo, assim, para o crescimento positivo na relação terapêutica e na sua totalidade das experiências.

O que se nota em Conversa sobre Terapia é um conhecimento rico das possibilidades de intervenções nos diversos casos que venham surgir em nossa atuação profissional e as posturas mais adequadas a serem tomadas no exercício clínico e antes de tudo como pessoa.

REFERÊNCIAS  

POMPÉIA, João Augusto e SAPIENZA, Bilê Tatit. Na presença do Sentido: Uma aproximação fenomenológica a questões existenciais básicas." São Paulo: EDUC/Paulus, 2004.

ROGERS, C. R. Tornar-se Pessoa. São Paulo: Martins Fontes, 1987.

Fonseca, Afonso H Lisboa da. Trabalhando o Legado de Rogers: Sobre os Fundamentos Fenomenológicos Existenciais. Maceió,1998.  Disponível em: <http://www.rogeriana.com/fonseca/legado/legado.htm>. Acesso em 08 de nov, 2009.