Sumário: 1. Formas de inconstitucionalidade 2. Momentos de controle 3. Controle difuso (origem marshalliana) 4. Controle concentrado (origem kelseniana) REFERÊNCIAS
Através de uma forma sintetizada, este artigo demonstrará as questões principais deste vasto assunto que é o controle de constitucionalidade.
Primeiramente, para o controle dos atos normativos, houve a necessidade da criação de mecanismos que agissem com esse intuito. É o mecanismo de defesa; de fiscalização da Constituição.
Um dos requisitos basilares para esse controle, seria a Constituição rígida[1] que possuímos (art.60, CF/88) e um órgão que possui a competência de resolver o problema de Constitucionalidade, podendo este órgão variar de acordo com o sistema de controle perfilhado.
1. Formas de inconstitucionalidade
Pode advir que, em certas ocasiões, normas infraconstitucionais tolerem vícios inconstitucionais em sua concepção, o que afrontará desta maneira a Constituição. Essa afronta pode ocorrer de duas formas. Através de um:
a) Vício formal: quando há inconstitucionalidade na forma de alguma lei ou ato normativo infraconstitucional, ou seja, no processo legislativo da elaboração. Como preleciona Pedro Lenza (2003, p.80): "A inconstitucionalidade formal é também conhecida também como nomodinâmica e pode aparecer em dois momentos do processo legislativo: iniciativa e nas fases posteriores"
Na fase de iniciativa, pode ser verificado o vício formal subjetivo. Por exemplo, existem leis de competência exclusiva do Presidente da República (art.61, § 1º, I, II, a, b, c, d, e, f, CF/88), ou seja, somente ele pode deflagrar; iniciar o processo legislativo da mesma. Se isso ocorrer, por exemplo, por um deputado federal, isso consistirá em inconstitucionalidade.
Nas fases posteriores, pode ser verificado o vício formal objetivo. Por exemplo, uma lei complementar ser votada com quorum de maioria relativa, sendo que deveria ser através de maioria absoluta (art.69, CF/88).
b) Vício material: quando há inconstitucionalidade na matéria, ou seja, no conteúdo da lei infraconstitucional que afronta a Lei Maior. Por exemplo, lei discriminatória que fere o princípio da Isonomia. Nas lições de Lenza (2003, p.81): "A inconstitucionalidade material é também conhecida como nomoestática".
Uma lei pode possuir ou somente vício formal, ou vício material ou possuir os dois simultaneamente.
2. Momentos de controle
O controle de constitucionalidade pode ocorrer antes (controle prévio ou preventivo) ou depois (controle posterior ou repressivo) de virar lei. Antes, quando é somente um projeto de lei ou depois, quando já é uma lei.
a) Controle prévio ou preventivo: é o controle realizado durante o processo legislativo da elaboração do ato normativo, através do qual o iniciador verifica "[...] a regularidade material do aludido projeto de lei" (LENZA, 2003, p.82).
Pode ser realizado pelo Legislativo, Executivo ou Judiciário.
No primeiro, através do Senado Federal (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) e da Câmara dos Deputados (Comissão de Constituição e Justiça e de Redação)[2].
Michel Temer[3] enfatiza que esse controle não ocorre sobre medidas provisórias, resoluções dos Tribunais e decretos.
De acordo com o Regimento Interno do Senado, em caso de inconstitucionalidade parcial, pode ocorrer emenda no projeto, mas a regra é que seja rejeitada e arquivada em definitivo, "[...] por despacho do Presidente do Senado, salvo, desde que não seja unânime o parecer, [...] interposto por no mínimo 1/10 dos membros do Senado, manifestando opinião favorável ao seu processamento" (LENZA, 2003, p.82).
No segundo, pode o Chefe do mesmo sancionar ou vetar o projeto de lei. Ele pode considerar inconstitucional (veto jurídico) ou contrário ao interesse público (veto político).
Sobre o último, veja o que Pedro Lenza (2003, p.84) diz: "Explicando, a única hipótese de controle preventivo a ser realizado pelo Judiciário sobre projeto de lei em trâmite de Casa Legislativa é para garantir ao parlamentar o devido processo legislativo, vedando a sua participação em procedimento desconforme com as regras da Constituição. Trata-se, como visto, de controle exercido, no caso concreto, pelos parlamentares, pela via de exceção ou defesa, ou seja, controle difuso de constitucionalidade". (vide art.60, § 4º, CF/88)
b) Controle posterior ou repressivo: é controle realizado sobre a lei já formada. Esse controle pode ser político, jurisdicional ou misto (político + jurisdicional).
O controle político ocorre em Estados em que o controle é exercido por órgão distinto dos três poderes. Esse controle geralmente ocorre em países europeus como Portugal e Espanha, através das Cortes ou Tribunais Constitucionais.
No controle jurisdicional, o controle é realizado através pelo Poder Judiciário, podendo ser por um único órgão (controle concentrado) ou por qualquer Tribunal ou juiz (controle difuso). Eles agem como guardiões da Constituição.
No Brasil, adota-se o controle jurisdicional misto, por ser realizado pelo Poder Judiciário tanto de forma concentrada como difusa e por misturar as duas formas. De acordo com as lições de Pinto Ferreira[4] (1990, p.260): "Ele reflete o sistema difuso tradicionalmente adotado nos EUA, que é o controle in concreto de normas e atos jurídicos, ao lado do sistema concentrado de controle da constitucionalidade inaugurado pela Constituição da Áustria de 1920".
No controle misto, onde há uma mescla do político com o jurisdicional, há vezes em que o controle dos normas é realizado por órgão distinto dos três poderes (político) ou através do Poder judiciário (jurisdicional).
Existem exceções quanto ao controle jurisdicional. Nestes casos, o controle é exercido pelo Poder Legislativo. As exceções se encontram no art.49, V da CF/88. "[...] Mencionado controle será realizado através de decreto legislativo a ser expedido pelo Congresso Nacional [...]" (LENZA, 2003, p.87) e art.62, CF/88, através de medidas provisórias, controladas pelo Congresso Nacional.
3. Controle difuso (origem marshalliana)
Controle difuso (repressivo ou posterior), também chamado de controle pela via de exceção ou defesa ou controle aberto, é realizado por qualquer juiz ou tribunal do Judiciário[5].
Apesar de ser utilizada a expressão "por via de exceção" ao controle difuso, a mesma é, de acordo com Ada Pellegrini Grivover, equivocada. Segundo a autora[6] (1984, p.154): "Quando se fala em exceção, o que se indica é a defesa oposta pelo réu. Essa nomenclatura, no entanto, não é adequada ao controle da constitucionalidade pelo sistema difuso, por via da denominada exceção, porque nem sempre será o réu que levantará a questão da inconstitucionalidade"
Este controle é verificado no caso concreto e a inconstitucionalidade "[...] dá-se de forma incidental [...], prejudicialmente[7] ao exame do mérito [...]" (LENZA, 2003, p.89), "[...] por ser ele relevante e necessário para se saber se a lei vai ser aplicada, ou não, ao caso concreto" (VELOSO, 2003, p.41)
Leciona Pedro Lenza (2003, p.89) que: "Pede-se algo ao juízo, fundamentando-se na inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, ou seja, a alegação de inconstitucionalidade será a causa de pedir processual"
O controle difuso pode ocorrer nos tribunais da seguinte maneira segundo Lenza (2005, p.104): "Observadas as regras do processo civil, a parte sucumbente poderá devolver a análise da matéria ao tribunal ad quem [...]
No tribunal competente, distribuído o processo para uma câmara, turma ou seção [...], verificando-se que existe questionamento incidental sobre a Constitucionalidade de lei ou ato normativo, suscita-se uma questão de ordem e a análise da Constitucionalidade da lei é remetida ao pleno ou órgão especial do tribunal, para resolver aquela questão suscitada [...]". Vide art.97 ? cláusula de reserva de plenário ? e art.93, XI da CF/88)
Se a norma for declarada inconstitucional, a conseqüência é a sua não-aplicação, ou seja, a mesma é atingida desde a sua edição (ex tunc), tornando-se então nula.
Os efeitos para as partes no controle difuso são: a) inter partes e b) ex tunc.
Mas essa invalidação não é para todos, ou seja, não é geral (erga omnes). Segundo as lições de Zeno Veloso[8] (2003, p.41): "A decisão afasta apenas, a sua incidência no caso, para o caso e entre as partes". Para outros casos, a lei continua tendo validade.
Entretanto, se esta matéria chegar ao STF, através de recurso extraordinário (art.102, III, a, b, c, CF/88) e for considerada a lei inconstitucional, por sentença definitiva, fica resolvida a situação, mas ainda dizendo respeito a somente as partes (inter partes).
Mas o que está em questão agora é se deve ou não ser necessária sempre "[...] a apreciação pelo órgão especial ou plena da questão prejudicial, qual seja, a realização do controle incidenter tantum de constitucionalidade da lei ou ato normativo pelos aludidos órgãos" (LENZA, 2003, p.90).
Sobre o art.97 da Constituição Federal, ressalta Lúcio Bittencourt[9] (1949, p. 43-6): "A regra do art.97 destaca-se como verdadeira condição de eficácia jurídica da própria declaração de inconstitucionalidade dos atos do poder público".
Entretanto, já pensam em uma forma de dispensar o art.97, "[...] toda vez que já haja decisão do órgão especial ou pleno do Tribunal, ou do STF, o guardião da Constituição sobre a matéria" (LENZA, 2003, p.91).
O efeito da decisão valem somente para as partes, como via de regra, não extrapolando, é claro, os limites da lide estabelecidos. Isto seria controle difuso de espécies normativas que se confrontam com a Constituição Federal.
No caso de Constituição Estadual, Pedro Lenza (2003, p.93), citando Michel Temer, diz: "Em se tratando de lei municipal ou lei estadual confrontadas perante a Constituição Estadual, Michel Temer entende que, em face do princípio federativo, ?pode e deve o Tribunal de Justiça ou Tribunal de Alçada, após declarar a inconstitucionalidade, remeter essa declaração à Assembléia Legislativa para que esta suspenda a execução da lei (evidentemente, nos Estados em que as Constituições confiram essa competência à Assembléia?"
Cabe agora ao Senado Federal, através de resolução, suspender a execução da lei (art.52, X, da CF/88). Ocorrendo isso, aí sim a decisão passa a ser geral (erga omnes). Os efeitos da lei serão suspensos, mas não retroativos (ex nunc) a efeitos passados. Quem quiser reaver algo que ocorreu antes da Resolução do Senado, deverá mover uma ação individual.
Uma observação importante é que pode ou não o Senado suspender a execução de lei que for considerada inconstitucional, por possuir discricionariedade política, ou seja, ele não é obrigado a suspender a execução, respeitado-se assim o princípio da separação de poderes.
Controle difuso em sede de ação civil pública, só será cabível "[...] como instrumento idôneo de fiscalização incidental de Constitucionalidade, pela via difusa, de quaisquer leis ou atos do Poder Público, mesmo quando contestados em face da Constituição da República, desde que, nesse processo coletivo, a controvérsia constitucional, longe de identificar-se como objeto único de demanda, qualifique-se como simples questão prejudicial, indispensável a resolução do litígio principal" (Min. Celso de Mello, RCL. 1.733-SP, DJ 1.112.00 ? Informativo 212/STF).
No entanto, de acordo com a jurisprudência do STF, o mesmo: "exclui a possibilidade do exercício da ação civil pública, quando, nela, o autor deduzir pretensão efetivamente destinada a viabilizar o controle abstrato de constitucionalidade de determinada lei ou ato normativo" (RDA 206/267, Rel. Min. Carlos Velloso ? Ag. 189.601 ? GO (AgRg); Rel. Min. Moreira Alves)
Sobre esse assunto, Lenza (2003, p.95) acrescenta: "Se, contudo, o ajuizamento da ação civil pública visar, não à apreciação da validade constitucional de lei em tese, mas objetivar o julgamento de uma específica e concreta relação jurídica, aí, então, tornar-se-á lícito promover, incidenter tantum, o controle difuso de Constitucionalidade de qualquer ato emanado do Poder Público"
4. Controle concentrado (origem kelseniana)
O controle concentrado, por via de ação direta de inconstitucionalidade (ADIn ou ADI), é exclusivamente de competência do STF, que decidirá em primeira e última instância e tem por objetivo "[...] alcançar a declaração de inconstitucionalidade, em tese, de lei ou ato normativo federal ou estadual (CF, art.102, I, a)" (VELOSO, 2003, p.61).
Na ADI, não se julgará uma relação jurídica em particular, mas uma situação in abstrato, através de um processo objetivo, "[...] específico e principal, de competência privativa de um órgão colegiado (Tribunal ou Corte Constitucional) [...]" (VELOSO, 2003, p.62). "[...] Portanto, tem por objeto a regra jurídica, em si mesma, sem considerar sua aplicação a um caso concreto" (VELOSO, 2003, p.61).
Nas lições de Zeno Veloso (2003, p.61): "O controle de constitucionalidade, em tese, é da competência privativa do órgão de cúpula do Poder Judiciário, do guardião-mor da Carta Magna"
REFERÊNCIAS
BITTENCOURT, Lúcio. O controle jurisdicional da Constitucionalidade das leis. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1949
FERREIRA, Luis Pinto. Comentários à Constituição brasileira. São Paulo: Saraiva, 1990
GRINOVER, Ada Pellegrini. O processo em sua unidade ? II. Rio de Janeiro: Forense, 1984
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 6.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Método, 2003
___________. Direito constitucional esquematizado. 9.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Método, 2005
VELOSO, Zeno. Controle jurisdicional de constitucionalidade. 3.ed., 2ª tiragem rev.,atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2003
TEMER, Michel. Elementos de direito constitucional. 14.ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 1998

NOTAS:

[1] Aquela que possui um grau de dificuldade maior para a ocorrência de alterações em comparação ao processo legislativo das normas não-constitucionais
[2] [...] O plenário das referidas Casas também poderá verificar a inconstitucionalidade do projeto de lei, o mesmo podendo ser feito durante as votações (LENZA, 2003, p.82)
[3] Michel Temer, Elementos de direito constitucional, 14.ed. rev. e ampl., São Paulo, Malheiros, 1998, p.43
[4] Luis Pinto Ferreira, Comentários à Constituição brasileira, São Paulo, Saraiva, 1990, p.260
[5] Quando dizemos qualquer juízo ou tribunal, devem ser observadas, é claro, as regras de competência processual, a serem estudadas no processo civil (LENZA, 2003, p.89)
[6] Ada Pellegrini Grinover, O processo em sua unidade ? II, Rio de Janeiro, Forense, 1984, p.154
[7] Questão prévia que o juiz deverá apreciar antes da questão principal, exatamente para verificar se a alegada inconstitucionalidade existe, ou não (GRINOVER, 1984, p.154)
[8] Zeno Veloso, Controle jurisdicional de constitucionalidade, 3.ed., 2ª tiragem rev.,atual. e ampl., Belo Horizonte, Del Rey, 2003, p. 41
[9] Lúcio Bittencourt, O controle jurisdicional da Constitucionalidade das leis, 2.ed., Rio de Janeiro, Forense, 1949, p.43-46