Sobre o conceito de Contrato Administrativo, leciona Celso Antônio Bandeira de Mello:

 É um tipo de avença travada entre a Administração e terceiros na qual, por força de lei, de cláusulas pactuadas ou do tipo de objeto, a permanência do vínculo e as condições preestabelecidas assujeitam-se a cambiáveis imposições de interesse público, ressalvados os interesses patrimoniais do contratante privado.

(BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio - Curso de Direito Administrativo – 28ª edição – São Paulo: Malheiros, 2011, página 627).

 1.CLÁUSULAS EXORBITANTES

Os contratos da Administração Pública visam garantir a satisfação do interesse público. Por esta razão, são regidos por princípios típicos do Direito Administrativo, os quais, nos dizeres de Celso Antônio Bandeira de Mello:

Conferem à Administração prerrogativas de supremacia, enquanto instrumentais à realização da finalidade pública e na medida em que o sejam, do mesmo passo em que lhe irrogam sujeições típicas, umas e outras armadas ao propósito de acautelar o interesse público. (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio, obra citada, página 627).

Com efeito, pode-se dizer que as cláusulas exorbitantes representam prerrogativas da Administração, asseguradas pela Lei n° 8.666/93, lhe conferindo supremacia em relação ao contratado, tendo em vista a função administrativa de efetivação do interesse público. Nos dizeres de Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

“São cláusulas exorbitantes aquelas que não seriam comuns ou que seriam ilícitas em contrato celebrado entre particulares, por conferirem prerrogativas a uma das partes (a Administração) em relação à outra; elas colocam a Administração em posição de supremacia sobre o contratado.” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella – Direito Administrativo – 24ª edição – São Paulo: Atlas, 2011, página 271).

Neste exato sentido, se manifesta o Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. RESCISÃO. INDENIZAÇÃO.

1. Distinguem-se os contratos administrativos dos contratos de direito privado pela existência de cláusulas ditas exorbitantes, decorrentes da participação da administração na relação jurídica bilateral, que detém supremacia de poder para fixar as condições iniciais do ajuste, por meio de edital de licitação, utilizando normas de direito privado, no âmbito do direito público.

2. Os contratos administrativos regem-se não só pelas suas cláusulas, mas, também, pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes supletivamente as normas de direito privado.

3. A Administração Pública tem a possibilidade, por meio das cláusulas chamadas exorbitantes, que são impostas pelo Poder Público, de rescindir unilateralmente o contrato.

4. O Decreto-Lei nº 2.300/86 é expresso ao determinar que a Administração Pública, mesmo nos casos de rescisão do contrato por interesse do serviço público, deve ressarcir os prejuízos comprovados, sofridos pelo contratado.

5. Recurso especial provido em parte.

(REsp 737.741/RJ, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/10/2006, DJ 01/12/2006, p. 290)    

São exemplos de cláusulas exorbitantes previstas na Lei 8.666/93: a exigência de garantia (artigo 56, § 1º); a alteração unilateral (artigo 58, inciso I, combinado com o artigo 65); a rescisão unilateral (artigo 58, inciso II, combinado com os artigos 79, inciso I, e 78, incisos I a XII e XVII); a fiscalização (artigo 58, inciso III, combinado com o artigo 67); a aplicação de penalidades (artigo 58, inciso IV, combinado com o artigo 87); e a retomada do objeto (artigo 80). Além disso, prevê a Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal a possibilidade de anulação do contrato.

Contudo, em que pese a existência de tais prerrogativas ou cláusulas exorbitantes, estes contratos trazem lucros consideráveis ao particular contratante. Do contrário, não haveria quem contratasse com o Poder Público.     

 2. ESPÉCIES

Maria Sylvia Zanella afirma que “Dentre os contratos administrativos, sujeitos ao direito público, compreendem-se a concessão de serviço público, a de obra pública, a de uso de bem público, a concessão patrocinada, a concessão administrativa (as duas últimas como formas de parcerias público-privadas), o contrato de prestação ou locação de serviços, o de obra pública, o de fornecimento, o de empréstimo público, o de função pública”. (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, obra citada, página 290).

Já Hely Lopes Meirelles elege como os principais contratos administrativos: 1) contrato de obra pública; 2) contrato de serviço; 3) contrato de fornecimento; 4) contrato de concessão; 5) contrato de gerenciamento; 6) contrato de gestão; 7) contrato de programa e; 8) termo de parceria. (MEIRELLES, Hely Lopes – Direito Administrativo Brasileiro – 34ª edição – São Paulo: Malheiros, 2008, páginas 256 a 273)

 3. FATO DO PRÍNCIPE E FATO DA ADMINISTRAÇÃO

Hely Lopes Meirelles (MEIRELLES, Hely Lopes, obra citada, página 241 e 242) nos traz a diferenciação entre Fato do Príncipe e fato da Administração. Diz o autor que:

“Fato do príncipe é toda determinação estatal, positiva ou negativa, geral, imprevista e imprevisível, que onera substancialmente a execução do contrato administrativo. Essa oneração, constituindo uma álea administrativa extraordinária e extracontratual, desde que intolerável e impeditiva da execução do ajuste, obriga o Poder Público contratante a compensar integralmente os prejuízos suportados pela outra parte, a fim de possibilitar o prosseguimento da execução, e, se esta for impossível, rende ensejo à rescisão do contrato, com as indenizações cabíveis”.

Já o fato da Administração:

"Fato da administração é toda ação ou omissão do Poder Público que, incidindo direita e especificamente sobre o contrato, retarda ou impede sua execução. O fato da Administração equipara-se à força maior e produz os mesmos efeitos excludentes da responsabilidade do particular pela inexecução do ajuste.”

Para Celso Antônio Bandeira de Mello,  teoria do fato do príncipe ocorre “nos casos em que o Poder Público, no uso de prerrogativas alheiras à sua qualidade contratante, adota medidas que desbalanceiam o equilíbrio contratual originalmente estipulado” (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio, obra citada, página 646).

A teoria do fato do príncipe é acolhida pacificamente pelos Tribunais Superiores:

 CONTRATO ADMINISTRATIVO. EQUAÇÃO ECONÔMICO- FINANCEIRA DO VÍNCULO. DESVALORIZAÇÃO DO REAL. JANEIRO DE 1999. ALTERAÇÃO DE CLÁUSULA REFERENTE AO PREÇO. APLICAÇÃO DA TEORIA DA IMPREVISÃO E FATO DO PRÍNCIPE.

1. A novel cultura acerca do contrato administrativo encarta, como nuclear no regime do vínculo, a proteção do equilíbrio econômico-financeiro do negócio jurídico de direito público, assertiva que se infere do disposto na legislação infralegal específica (arts. 57, § 1º, 58, §§ 1º e 2º, 65, II, d, 88 § 5º e 6º, da Lei 8.666/93.

Deveras, a Constituição Federal ao insculpir os princípios intransponíveis do art. 37 que iluminam a atividade da administração à luz da cláusula mater da moralidade, torna clara a necessidade de manter-se esse equilíbrio, ao realçar as "condições efetivas da proposta".

2. O episódio ocorrido em janeiro de 1999, consubstanciado na súbita desvalorização da moeda nacional (real) frente ao dólar norte-americano, configurou causa excepcional de mutabilidade dos contratos administrativos, com vistas à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro das partes.

3. Rompimento abrupto da equação econômico-financeira do contrato.

Impossibilidade de início da execução com a prevenção de danos maiores. (ad impossiblia memo tenetur).

4. Prevendo a lei a possibilidade de suspensão do cumprimento do contrato pela verificação da exceptio non adimplet contractus imputável à administração, a fortiori, implica admitir sustar-se o "início da execução", quando desde logo verificável a incidência da "imprevisão" ocorrente no interregno em que a administração postergou os trabalhos. Sanção injustamente aplicável ao contratado, removida pelo provimento do recurso.

5. Recurso Ordinário provido.

(RMS 15.154/PE, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/11/2002, DJ 02/12/2002, p. 222)

Assim, o fato do príncipe pode ser caracterizado por um “ato geral” do Poder Público, incidindo indiretamente sobre o contrato administrativo. Por sua vez, o fato da Administração incide direta e especificamente sobre o contrato. Neste sentido é o entendimento de Maria Sylvia Zanella di Pietro:

"O fato da Administração distingue-se do fato do príncipe, pois, enquanto o primeiro se relaciona diretamente com o contrato, o segundo é praticado pela autoridade, não como “parte” no contrato, mas como autoridade pública que, como tal, acaba por praticar um ato que, reflexamente, repercute sobre o contrato.” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, obra citada, página 284).

Por fim, conclui Hely Lopes Meirelles que “a superveniência de qualquer desses fatos permitirá a rescisão do contrato, ou a sua revisão para a continuidade dos trabalhos ou, mesmo, a cobrança final da indenização devida pela eventual paralisação ou retardamento da obra ou do serviço, com desequilíbrio da equação econômico-financeira inicial, que obrigará a nova composição de preços, para compensar os prejuízos acarretados aos contratado, sem culpa de sua parte” (MEIRELLES, Hely Lopes, obra citada, página 242).

4. EXTINÇÃO

De acordo com Hely Lopes Meirelles:

 “Extinção do contrato é a cessação do vínculo obrigacional entre as partes pelo integral cumprimento de suas cláusulas ou pelo seu rompimento, através de rescisão ou da anulação”. (MEIRELLES, Hely Lopes, obra citada, página 235).

Diz ainda o autor, a extinção do contrato administrativo pode ocorrer pela conclusão do objeto, pelo término do prazo, pela rescisão (administrativa, judicial, amigável ou de pleno direito) e por sua anulação. Neste sentido, se manifesta Celso Antônio Bandeira de Mello:

 “A rescisão unilateral do contrato – pela Administração, como é evidente -, tal como a modificação unilateral, também só pode ocorrer nos casos previstos em lei (cf. art. 58, II, c/c arts. 78 e 79, I) e deverá ser motivada e precedida de ampla defesa (art. 78, parágrafo único).” (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio, obra citada, página 635).

Tal rescisão se dará, fundamentalmente, por razões de interesse público fundadas e justificadas ou por falta do contratado, sempre observados os princípios da legalidade, ampla defesa e devido processo legal.

Mais a frente, afirma Bandeira de Mello que um contrato administrativo pode ser extinto pela própria Administração, embora a lei não preveja, contudo:

“Neste caso, o princípio da legalidade imporá sua invalidação (anulação ou constituição de nulidade), se não couber convalidação – analogamente ao que ocorreria com os casos de convalidação de ato unilateral.” (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio, obra citada, páginas 635 e 636).

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Fonte doutrinária:

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio - Curso de Direito Administrativo – 28ª edição – São Paulo: Malheiros, 2011.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella – Direito Administrativo – 24ª edição – São Paulo: Atlas, 2011.

MEIRELLES, Hely Lopes – Direito Administrativo Brasileiro – 34ª edição – São Paulo: Malheiros, 2008.