CONTOS DE FADAS: A IMPORTÂNCIA DA FANTASIA PARA FORMAÇÃO DE VALORES E DESENVOLVIMENTO PSÍQUICO INFANTIL.

                                                      Vilma Viana de Lima  

RESUMO: Este artigo tem como tema “A importância dos contos para a formação de valores e o desenvolvimento psíquico Infantil”, abordando, a relevância que a contação de história demonstra na dimensão lúdica nos aspectos que favorecem o desenvolvimento infantil. Apresenta uma abordagem teórica, que favorece a reflexão e análise do tema. O questionamento que motivou a escolha dessa temática foi: qual é a importância da fantasia no desenvolvimento infantil? A pesquisa bibliográfica fundamentou a elaboração desse trabalho, no qual foram utilizadas concepções de importantes autores tidos como referências teóricas em relação aos contos. A reflexão teórica revelou que embora a contação de história seja uma fonte enriquecedora para o desenvolvimento infantil, geralmente, os professores, não tem o conhecimento sobre a real importância dos contos para as crianças.

Palavras chave: contos de fadas, desenvolvimento psíquico, valores, Psicopedagogia e contação de história.

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo destacar a importância dos contos para a formação de valores e desenvolvimento psíquico das crianças. Mostrando a relevância de se trabalhar a contação de história no cotidiano escolar. Para tal utilizamos a Pesquisa Bibliográfica onde foram realizados fichamentos da bibliografia indicada. Abordaremos em nossa pesquisa Bruno Bettelheim, Glória Radino, Mário Corso e Diana Corso, que servirão de base para enriquecê-la, pelo estudo que propuseram sobre os contos de fadas e literatura infantil. Realizando uma interação desses pesquisadores com outros autores tidos como referências teóricas em relação à temática abordada.

1. CONTOS TRADICIONAIS: SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS.

No percurso, da história da humanidade, as atividades educacionais das crianças, com excesso das experiências que tinham dentro do lar, dependeu das histórias místicas e religiosas dos contos de fadas. Essa literatura tradicional alimentava a imaginação da criança e estimulava a fantasia. O enredo respondiam as questões mais importantes e eram mediadores de socialização.

Os mitos e as lendas religiosas estavam intimamente relacionados aos contos e trabalhavam os conceitos da origem da criança e do próprio mundo, também como os ideais sociais que lhes serviam de modelo.

Os conteúdos dos contos de fadas estão diretamente relacionados com os problemas e conflitos interiores. Não trata do mundo exterior, embora comece de forma realista, e trate de assuntos do nosso cotidiano.

Bettelheim (2012, p. 36 e 37) afirma que:

Algumas histórias folclóricas e de fadas se desenvolveram a partir dos mitos; outras foram a eles incorporados. Ambas as formas incorporaram a existência cumulativa de uma sociedade, diante da necessidade de transmitir a sabedoria dos antigos às gerações futuras. Esses contos fornecem percepções profundas que sustentam a humanidade nas longas vicissitudes de sua existência, uma herança que não é revelada às crianças sob nenhuma outra forma de modo tão simples, direto e acessível.

          Assim como o mito, o conto originou-se na memória coletiva pelo intermédio de um narrador anônimo e, como tal inscreveu-se numa tradição. Sendo por meio dessa trama que o narrador apropria-se da história dando-lhe sentido. Sendo difícil descrever uma diferença entre conto e mito, principalmente, o momento em que o mito foi incorporado aos contos de fadas. É fato que existem semelhanças entre as duas narrativas, mas há diferenças fundamentais.

          Um mito, tal qual uma história de fadas, pode abordar um conflito interno de forma simbólica e sugerir possibilidades de como resolvê-lo, todavia essa não é sua preocupação central.  Apresenta seu tema de forma majestosa; transmitindo uma força espiritual, onde o divino é presente e vivenciado na forma de heróis imortais, deuses que fazem solicitações constantes aos simples mortais. Por mais que queiramos ser como esses heróis, seremos sempre inferiores a eles.

          Nos contos as personagens e situações narradas também personificam e ilustram conflitos íntimos, mas sugerem como esses conflitos podem ser solucionados e quais os passos a serem dados rumo à humanidade elevada. Tratam de heróis comuns, parecidos com qualquer um de nós ou qualquer criança. Seus protagonistas não possuem um nome particular, que aponte o personagem como um sujeito real. Essa temática torna, mas fácil uma identificação com esses personagens, que vivem situações cotidianas e que têm uma família comum, e não sobre-humana ou sobrenatural.··.

          Radino (2003) resalta que uma diferença fundamental entre conto de fadas e mito é o final. Nos mitos, é quase sempre trágico, enquanto nos contos de fadas existe a realização do herói em um final feliz.

Essas diferenças revelam que é mais fácil para uma criança se identificar com os contos de fadas ao invés dos mitos. Nos contos, a imaginação infantil é regada e assegurada por um final feliz. Mesmo encontrando obstáculos, a criança poderá superá-los e amadurecer. Divergente dos mitos que não dão soluções favoráveis, que a criança precisa e espera ouvir e com seus acontecimentos grandiosos que só distanciam da realidade infantil. (Radino, 2003, p. 61)

          Partindo dessa reflexão, podemos perceber porque os contos são um tipo de literatura que contribuem de maneira incomensurável para o desenvolvimento infantil no que se refere aos aspectos, cognitivo, psíquico, motor e consequentemente na formação de valores. Como uma obra de arte é passível de inúmeras interpretações, que despertam a fantasia que é o motor propulsor do desenvolvimento infantil.

2. CONTOS DE FADAS: FANTASIA E MAGIA QUE ENCANTAM E FAZEM A DIFERENÇA.

 

Os contos de fadas exercem uma influência benéfica na formação da personalidade e ao mesmo tempo formam seres mais humanizados com bons valores. Descobrindo o verdadeiro sabor de ser criança e um futuro adulto seguro de suas opiniões, decisões e atitudes.

          Para Bettelheim (2012) é característico de o conto colocar um dilema existencial de maneira breve e incisiva, permitindo a criança apreender o problema em sua forma mais essencial, enquanto que uma forma mais complexa confundiria as coisas para ela. O conto de fadas simplifica todas as situações. Suas personagens são esboçadas claramente; e detalhes, exceto quando muito importantes são eliminados. Todas as personagens são típicas em lugar de únicas.

          O autor relata que ao contrário de muitas histórias infantis modernas, nesta literatura o mal é tão onipresente quanto à virtude. Em praticamente todo conto, o mal e o bem são corporificados sob a forma de alguns personagens e de suas ações, uma vez que o bem e o mal são onipresentes na vida e as propensões para ambos estão presentes em todo homem. È essa dualidade que coloca o problema moral e requer uma luta para resolvê-lo. Assim como na vida, a punição ou o medo dela é apenas um fator limitado de inibição do crime. A convicção de que o crime não compensa é um meio de inibição muito mais efetivo, e essa é a razão pelo qual, nas histórias, a pessoa má sempre perde.

          Não é o fato de a virtude vencer no final que promove a moralidade, mas sim o fato de o herói ser extremamente atraente para o ouvinte que se identifica com ele em todas as lutas. Devido a essa identificação, imagina que sofre com o herói suas provas e tribulações, e triunfa com ele quando a virtude sai vitoriosa. A criança faz essas identificações inteiramente por conta própria, e as lutas interiores e exteriores do herói lhe imprimem moralidade. Dessa forma a criança vai formando seus valores.

          Essas narrativas consideram as angústias e dilemas existenciais e se dirige diretamente a

eles: a vontade de ser amado e o medo de ser considerado sem valor; o amor pela vida e o medo da morte. Pelo intermédio da fantasia as crianças vão trabalhar certos conflitos, buscar soluções e procurar respostas para aquilo que não esta bem. Oferecendo soluções de modos tais que sejam passíveis de apreensão pela criança no seu nível de compreensão.

          Esses contos têm grande significado psicológico para crianças de todas as idades, tanto meninas quanto meninos, independentes da idade e sexo do herói da história. Obtém-se um significado pessoal rico das histórias de fadas porque elas facilitam mudanças na identificação, já que elas lidam com diferentes problemas, um de cada vez.

          Bethelheim (2012) discorre que como não podemos saber em que idade um conto específico será mais importante para um acriança específica, não podemos decidir qual dos vários contos lhe deveria ser contado num determinado momento ou por quê. Só a criança pode determinar e revelar pela força com que reage emocionalmente àquilo que o conto evoca na sua mente consciente e inconsciente. A criança indicará que certa história se tornou importante para si, seja respondendo-lhe de imediato, seja pedindo para que seja contada repetida vezes. Se tudo ocorrer bem, o entusiasmo pela história será contagioso. Finalmente, chegará o momento em que terá obtido todos os significados da história preferida, referentes aos problemas que faziam com que respondesse a ela e serão substituídos por outros que encontram melhor expressão em outro conto.

          Segundo o teórico não podemos explicar para uma criança por que um conto de fadas é tão cativante para ela porque destrói, além de tudo, o encantamento da história, que depende em grau considerável, de a criança não saber absolutamente porque está maravilhada. Havendo também um perda do potencial que tem a história para ajudar a criança a lutar por conta própria e a dominar por si só o problema que em princípio tornou a história significativa para ela.

Os contos de fadas, diferentemente de qualquer outra forma de literatura, direcionam a criança para a descoberta de sua identidade e vocação, e também sugerem as experiências que são necessárias para desenvolver ainda mais o seu caráter. Ratificando o que foi relatado no capítulo anterior, às personagens e situações da narrativa personificam e ilustram conflitos íntimos, propondo engenhosamente como esses conflitos podem ser solucionados e quais os próximos passos a serem dados para alcançar a humanidade elevada. O enredo é apresentado de um modo simples; nenhuma solicitação é feita ao ouvinte. Isso impede que até a menor das crianças se sinta compelida a agir de maneiras específicas, e ela nunca é levada a se sentir inferior. Reassegurando, dando esperança para o futuro e oferecendo a promessa de um final feliz.

          Corso e Corso (2006) relatam que Bettelheim demonstra um enfoque que poderíamos chamar de darwiniano dessa relação bem sucedida, acreditando que as tramas que sobreviveram ao longo dos tempos foram aquelas que ofereciam oportunidades para representar conteúdos do inconsciente infantil, ou seja, as que foram capazes de se adaptar às necessidades atuais. Para ele, há uma seleção ativa por parte das crianças e sua famílias, no sentido de escolher e usar certas histórias como se fossem um esquema no qual se apoiar para suas elaborações. Cada história tem em si uma mensagem, um desafio e um desfecho que para cada criança interessa ouvir em determinado momento de sua vida. Nesta perspectiva eles concordam com o autor.

       Neste contexto os contos são histórias que nos tocam profundamente e nos conquistam. Essa conquista é coletiva e ocorre na mais tenra idade, quando ainda vivemos no período mais frutífero e repleto de significados: a infância. É nele que vivenciamos as experiências, as fantasias, os jogos, as alegrias e dramas que vão moldar nossa personalidade, nosso caráter, nosso jeito de ver, interagir e de viver o mundo. Histórias como Cinderela, Chapeuzinho Vermelho, A Bela Adormecida, Branca de Neve dentre tantas são parte desse processo de desenvolvimento, de aprendizagem, dessa aventura infantil que nos conduz ao crescimento e ao amadurecimento.

          Para uma melhor compreensão de tudo que foi relatado sobre a importância desses contos para o desenvolvimento psíquico e formação de valores de crianças, será relatada uma análise do conto Cinderela realizada por Chalita (2005).

          Chalita (2005) discorre que Cinderela é uma dessas lembranças indeléveis, eternizadas por uma misteriosa junção de fatores. Dentre eles, a capacidade de dar aos seres humanos os recursos para poder sonhar. Nele vivenciamos sensações e sentimentos diametralmente opostos que nos habilitam, por meio da reflexão proveniente da ficção, à ampliação de nossos horizontes.

          O autor discursa que essa literatura nos permite realizar uma catarse, palavra grega que significa purificação e limpeza. Fazendo com que extravasemos nossas emoções mais reprimidas, colaborando para que nos livremos de maus sentimentos e dos traumas mais variados. Pelas mãos de cinderela, somos convidados e conduzidos a um baile especial. Um espetáculo em que ela prossegue como estrela principal, executando números tão complexos quanto belos. A exibição de Cinderela nos guia às emoções mais diversas e nos faz questionar e refletir sobre a música e a dança de nossa própria vida.

          Uma vez conhecida à narrativa, uma vez seduzidos pelo encanto de suas personagens, somos automaticamente, e para sempre, influenciados. Atraídos pelos seus desígnios, pelos seus modos, pelos seus dons, pelos seus valores, pelas suas ações, pelos seus temperamentos, pela sua coragem, pela sua verdade mais profunda. Não é por outro motivo que a trajetória da jovem humilhada pela madrasta e pelas suas filhas vem comovendo gerações há séculos, tornando-se uma narrativa referencial em diversos países.

          Mesmo em meio a um turbilhão de provações, Cinderela permanece pura de coração. Nada parece abalar suas virtudes, suas qualidades, sua doçura, sua humildade exemplar, que serve de escudo para que ela possa suportar as numerosas tentativas maléficas da madrasta e suas invejosas filhas. É a humildade que a faz resistir a todas às etapas dolorosas, mas fundamentais ao crescimento interior e a descoberta das próprias potencialidades que a conduz a conquistar, no final, a recompensa eterna em forma de felicidade.

          No momento crucial, surge o ser onírico encarregado de providenciar a volta por cima, uma espécie de renascimento espiritual da heroína. Cinderela recebe auxílio por meio da intervenção oportuna de um ser iluminado enviado para defendê-la e lhe conceber os instrumentos necessários a sua transformação, sua fada madrinha, que na noite do baile, vem em seu socorro tirando-a das cinzas e munindo-a dos apetrechos necessários a transformação e a caracterização como a mais bela das princesas. Uma princesa capaz de conquistar o amor redentor que acarretará em suas opositoras sensações de rejeição, de frustração e de desprezo, armas equivocadamente utilizadas para maltratar a heroína ao longo da história.

          O enredo é eficaz porque transmite à criança a certeza de que o bem sempre vence o mal independentemente dos poderes, das artimanhas e dos artifícios utilizados pelos vilões que protagonizam essa conhecida e temida batalha universal. Por meio da jornada de Cinderela, que, em nenhum momento, se desviou do caminho do bem, compreendemos que a humildade, a bondade, a simplicidade e a singeleza são reconhecidas e recompensadas no final da trajetória dos heróis e, por extensão, de todas as pessoas.

          Nesta concepção, vemos a relevância de fazer desse texto um modelo para criança e jovens que, hoje, precisam reforçar valores e conceitos essenciais à boa convivência familiar e social. Cinderela aponta os caminhos mais difíceis, porém mais importantes, para que às crianças possam construir uma existência voltada á ética e ao bem coletivo. Valores e ações que contribuirão para a paz e para união entre nossos irmãos mais próximos e também entre os povos de todas as nações.

          Mesmo aparentemente frágil e indefesa, Cinderela, traz em si a fortaleza que caracteriza as pessoas que têm em seus sonhos um porto seguro onde encontrará tranquilidade ao fim de violentas e perigosas aventuras. O final da história revela que o importante é preservar a bondade, a pureza e a humildade, valores renovadores que nos dão coragem para continuar a lutar e ensinam a dançar, com potência e graça, a valsa de nossa história.

          Nesta perspectiva os contos passam ensinamentos de extrema importância para as crianças mostrando conflitos ocultos e também problemas relacionados aos pais. Todavia, dá para notar a importância desses para a demonstração dos sentimentos infantis para encontrarem e formarem suas identidades no percurso de seu desenvolvimento ao que se referem à maturidade, suas preocupações internas, enfim, sua percepção do mundo e o crescimento de sua personalidade.

          O interessante é que a criança pode se identificar com o personagem, transferi todos os seus conflitos para aqueles vividos na história, e por esse motivo pede para repeti-la. Quando o problema estiver resolvido, ela simplesmente não pedirá mais esse conto. E nós, psicopedagogos e educadores, possuímos a difícil tarefa de ajudá-las a encontrar significativos na vida. Os assuntos tratados nos contos são reais, tais como os medos que enfrenta: medo do escuro, do cachorro, da mãe deixá-la na escola e não buscá-la mais, etc. medos que fazem parte da nossa vida e, de uma maneira ou de outra, aprendemos a enfrentá-los.

3. A CONTAÇÃO DE HISTÓRIA NO CONTEXTO PSICOPEDAGÓGICO.

 

          A Psicopedagogia segundo Neves apud Alves (2013) estuda o ato de aprender e ensinar, levando sempre em conta as realidades interna e externa da aprendizagem, tomadas em conjunto, E, mais, procurando estudar a construção do conhecimento em toda a sua complexidade, procurando colocar em pé de igualdade os aspectos cognitivos, afetivos e sociais que lhe estão implícitos.

          Seguindo esta linha de raciocínio a aprendizagem está vinculada com o meio social do educando nas relações que estabelece com seus familiares e os outros. Sendo um processo ativo permeado pela afetividade. Contudo, o processo de aprendizagem ocorre pelo intermédio da transmissão de conhecimento, onde deve existir o interesse e motivação do educando para apreender os conteúdos de forma efetiva. Sendo necessário à utilização de metodologias e recursos que oportunizem ao aluno relacionar os conceitos que aprende na escola com seus conhecimentos prévios que estão impregnados de afetividade.

          Portanto, a contação de história é um recurso psicopedagógico para estimular, promover e potencializar o desenvolvimento infantil em seus aspectos: cognitivo, afetivo, psíquico, motor e simultaneamente na formação de valores. Onde o trabalho psicopedagógico deve estabelecer um vínculo entre o conhecimento e a criança em seu processo de aprendizagem, buscando atrair e despertar o desejo de aprender.

          Para Alves (2013) nessa nova perspectiva pedagógica professores e alunos interagem usando a empatia, a confiança, o diálogo, o aprender a aprender. Isso é fundamental, pois nesse encontro professor e aluno, vão sendo constituídos métodos de se praticar a educação. E nesse processo o papel do psicopedagogo é mediar essa relação, trabalhando em parceria com o professor, auxiliando e propondo métodos que favoreçam a superação das dificuldades dos educandos.

          Nesta cadeia de relações a contação de história como recurso psicopedagógico, utilizada de forma lúdica, transforma o ambiente escolar em um espaço de alegria, imaginação e fantasia, despertando o prazer por ouvir histórias, onde o educando através dos conceitos trabalhados nos contos podem compreender e interpretar a si próprio e a realidade.

          A contação por ser uma atividade lúdica desperta o interesse das crianças, elas ficam concentradas, atentas e se envolvem com o enredo da história. Essa atividade conduz as crianças a fazerem descobertas, estimulando a fantasia e a imaginação das mesmas, proporcionando o jogo simbólico, onde aprendem ao brincar de faz de conta e por consequência vivenciam e tornam significante a sua realidade, construindo assim, conceitos sobre o mundo que as cercam.

          Nesta concepção o papel do psicopedagogo é mostrar aos gestores, funcionários, pais e principalmente o professor a importância da contação de história como recurso lúdico. Sendo preciso que exista um novo olhar sobre o lúdico, pois o aluno ao brincar de faz de conta, fantasia e compreende a si própria e a sociedade. Seguindo esses princípios a contação auxilia a criança na resolução de problemas internos, na estruturação da personalidade e na formação de valores.

4. EDUCAÇÃO: HÁ LUGAR PARA FANTASIA NO CONTEXTO ESCOLAR?

 

A Psicologia tem mostrado que as crianças necessitam de atividades mais expressivas para o seu desenvolvimento sadio. Essas podem ser realizadas por meio do brinquedo, dos contos de fadas, da música, das artes plásticas, da expressão corporal, entre outras. Não basta a escola possuir essas atividades em seu currículo, mas sim examinar como elas vêm sendo executadas e com que finalidade. Para isso é necessário rever a concepção de infância que permeia esse discurso pedagógico. Mais do que preencher a criança com tarefas, responsabilidades e compromissos, é preciso assegurar seu direito maior, de ser simplesmente criança. Esse direito pode ser conquistado na família, na escola e na comunidade, em uma ação conjunta e integrada. (RADINO, 2003, pág. 161)

Seguindo esta concepção se a educação é um processo social e de desenvolvimento integral da personalidade, a brincadeira da criança tem uma função educativa. Com o brinquedo as crianças aprendem, de forma autônoma, a elaborar regras e a conviverem comunidade. Essa interação com os objetos, as pessoas, os animais e os fatos, por intermédio do brinquedo, conduz a criança a ir se adaptando a realidade à sua compreensão e construindo seu conhecimento.

Contudo, a necessidade fundamental de a criança conhecer o mundo por meio do brin- quedo e da fantasia acaba sendo colocada racionalmente dentro da escola. O brincar é priorizado, mas dentro de uma diretriz pedagógica baseada em conhecimentos científicos, pautados principalmente na psicologia cognitiva. Tanto o brincar como o ouvir histórias tornaram-se tarefas quando objetivam a realização de atividades pedagógicas. O brincar espontâneo fica restrito ao recreio, ao parque, que aparece, muitas vezes, como um prêmio por bom comportamento.

Winnicott apud Radino (2003, p. 163) descreve que o mais importante na brincadeira da criança é o estado de alheamento, em que não são admitidas intrusões de adultos. O que menos importa é o conteúdo e o tipo de brinquedo. Para criança, qualquer objeto pode servir como instrumento para brincar, seja uma pedra, um pedaço de pau ou uma caixa de fósforos. A brincadeira perde suas características essenciais e sua função educativa quando as regras e leis são impostas pelos adultos.

          Radino (2003) aborda que é percebível nas escolas, uma preocupação em incentivar a leitura junto ás crianças. Sendo unânime a ideia de que um ambiente familiar que valoriza a escrita, facilita o interesse da criança pela leitura. Como o próprio Referencial Curricular Nacional (1998) aponta, deve-se criar um ambiente alfabetizador desde a educação infantil. Dessa forma, a linguagem escrita é valorizada em detrimento da linguagem oral.

          Seguindo essa concepção os professores temendo um fracasso posterior e acreditando que as crianças provêm de um ambiente familiar desfavorável, procuram valorizar os textos escritos e acabam desprezando a linguagem e narração oral da história. Apesar de o conceito de alfabetização ser considerado atualmente como um processo cultural e social, em que participam todos os códigos de linguagem, prioriza-se a escrita. Neste sentido o ato de contar histórias é valorizado, mas diretamente vinculado à leitura do livro. A linguagem oral é trabalhada em situações cotidianas, de forma a estimular o aluno a relatar uma situação vivida ou resolver um problema em conjunto com os colegas.

          Atualmente em muitas escolas o processo de alfabetização ainda é feito de forma mecânica e estática. Dessa forma, o estudante afasta-se dos livros, seja por ter sido alfabetizado de maneira inadequada ou por desejar esquecer experiências didáticas desprazerosas. Contrariando essa lógica mecânica, o ato de ouvir histórias o auxilia no processo de alfabetização. Quanto mais histórias ouvir, aguçará sua imaginação e desenvolverá seu mundo simbólico.

          Na educação infantil, mesmo tendo passado por diversas transformações, percebesse na prática que sua função ainda está vinculada a preparação para o ensino fundamental. São valorizadas atividades que desenvolvam aptidões como a coordenação motora, a percepção, a discriminação visual e auditiva, a orientação espacial e temporal, dentre outras. As histórias são inseridas no planejamento do professor em função da atividade que ela pode desencadear. Segundo Bettelheim (2012) utilizar o conto de fadas com uma finalidade pedagógica é transformá-lo em um conto admonitório, numa fábula, que atingirá a mente consciente da criança quando o seu objetivo maior é atingir o inconsciente.

          Em sua pesquisa Radino (2003) constatou que nenhuma professora mostra algum conhecimento específico referente aos contos de fadas, seja em seu processo formal ou em seus aspectos psicológicos. As professoras relataram que durante sua formação nunca tiveram nenhum curso que tratasse do uso de contos de fadas na educação infantil ou de sua importância no desenvolvimento infantil. A Pesquisadora percebeu nas entrevistas que uma das dificuldades no trabalho com contação encontrava-se em sua narração. As educadoras falaram da necessidade de utilizar muitos recursos para prender a atenção de seus alunos. Relataram que dessa forma a transmissão de contos torna-se cansativa e requer recursos materiais e pessoais exagerados.

          As docentes procuram recursos materiais e externos por não terem confiança na sua capacidade interna, como profissionais. O que lhes faltavam eram recursos internos para lidar com a emoção e seus alunos. Segundo Radino (2003) se o ato de contar histórias ficar restrito a um contato mais íntimo entre professor e aluno, as emoções de cada um poderão manifestar-se. Neste sentido as professoras percebem-se empobrecidas de recursos internos. Ao retirar-se o material de apoio, sentem que lhes restam poucas possibilidades para realizarem seu trabalho. Todavia, ao retirar a técnica e os recursos visuais auxiliares, resta a pessoa do professor. E este só terá condições de ser professor se trabalhar isso internamente.

          Radino (2003) discorre que para Held o impacto que os contos de fada podem provocar na criança é mais intenso e durável se sua apresentação for realizada em um clima livre. Como uma obra de arte, sua compreensão é emocional, ajudando a criança e entender-se por si própria. Dessa forma, o conto de fadas é por si mesmo pedagógico, na medida em que responde às principais questões da criança: vida, morte, sexualidade, medo, etc. A ênfase da escola está na atividade que o conto pode proporcionar.

          Sendo importante que o pequeno ouvinte sinta-se acolhido para ouvir um conto. Para ela, acolher a criança não diz respeito só ao espaço fictício criado, mas uma intimidade entre narrador e as crianças. O narrador pode procurar conhecer o momento emocional que as crianças estão vivendo para saber os referenciais que necessitam. Assim, um ambiente acolhedor faz-se necessário também na forma de narrar à história, criando um clima de envolvimento, encanto, respeitando o tempo para o imaginário de cada sujeito.

          As salas de educação infantil são dispostas de tal maneira que possibilita que se faça uma roda e que possam se sentar no chão, em volta da professora. Proporcionando um ambiente acolhedor, que facilita a criação de um ambiente lúdico e propício à criação de fantasias. Esse é o momento de contar por prazer e despertar o desejo e prazer de ouvir. Através da contação de história a fantasia tem um lugar na escola.

5. CONSIDERAÇÕES.

          Os contos de fadas envolvem as crianças porque neles podem transferir seus sentimentos de: perda, abandono, medo, baixa autoestima para os personagens e podem dessa forma resolver seus problemas afetivos, contribuindo assim para o desenvolvimento da personalidade. A relevância dos contos de fadas para o desenvolvimento psíquico está no fato em que esses ao transportarem mensagens fundamentais estimulam as crianças no seu processo de aculturação, estruturação da personalidade, formação de valores e melhor adaptação à realidade que as rodeia. Embora nossa sociedade seja diferente daquela que marcou a época em que foram criados, a mensagem que os contos encenam é intemporal.

Como ressalta Bettelheim (2012) o conto de fada é sugestivo suas mensagens podem trazer implícitas soluções, mas ele nunca soletra, deixando para a própria fantasia da criança a decisão de se como aplicar a si própria àquilo que a história revela sobre a vida e a natureza humana. Uma criança confia no que o conto diz por que a visão do mundo aí apresentada está de acordo com a sua. Diante do exposto é compreensível designar o imaginário infantil como o lugar dos contos , onde as fantasias afloram , crescem e nutrem as crianças de esperança para superar as dificuldades, ajudando-as no seu desenvolvimento psíquico e formação de valores, consolidando sua personalidade e humanidade.

              Neste contexto na instituição escolar, gestores, pais, funcionários e principalmente os educadores devem conhecer o verdadeiro caráter pedagógico da contação de história que é o lúdico, a fantasia, a imaginação, que propulsionam o interesse e a curiosidade pelo autoconhecimento e conhecimento do mundo. E o profissional habilitado a mostrar a relevância da contação como recurso essencial para o desenvolvimento infantil é o psicopedagogo, que vive em busca de novos conhecimentos e metodologias que auxiliam na superação das dificuldades de aprendizagem.

              A contação de história deve ser realizada para despertar o desejo e prazer de ouvir o conto e não como meio para realizar atividades didáticas. A fantasia tem que ser priorizada na escola e para ser efetivada deve se dá atenção a formação dos professores. O professor só poderá compreender a importância da fantasia para a criança e dos contos de fadas, se ele tiver a oportunidades de vivê-la. A escuta ou leitura de um conto de fadas proporciona prazer e desperta emoções, criando um momento em que parte da infância perdida é resgatada. Se realmente queremos que nossas crianças sejam acolhidas em sua totalidade, como ressalta Radino (2003) precisamos também acolher as emoções dos professores em um ambiente seguro em que possam colocar-se como seres humanos.

REFERÊNCIAS

 

ALVES, Catarina. Introdução à Psicopedagogia. Valinhos, p. 1- 55, 2013. Disponível em: < http://anhanguera.com>. Acesso em 1 de fev. 2013.

AMARO, TEIXEIRA E VIANA. O conto de fadas e o mito: mediando valores e constituindo a personalidade. Disponível em:< http://www.artigonal.com> Acesso em: 6 de junho de 2013.

BETTELHEIM, Bruno. A Psicanálise dos Contos de Fadas. São Paulo: Paz e Terra, 2012.

CHALITA, Gabriel. Pedagogia do Amor. 11 ª Ed. São Paulo: Editora Gente, 2005.

CORSO, Denise Lichtenstein; CORSO, Mário. Fadas no divã: psicanálise nas histórias infantis. Porto Alegre: Artmed, 2006.

RADINO, Gloria. Contos de Fadas e Realidade Psíquica: A importância da Fantasia no Desenvolvimento Infantil. 1 ª Ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.