Construindo propostas de didatização de gênero: desafios e possibilidades de Ana Maria de Mattos Guimarães
Publicado em 30 de maio de 2013 por Érika Ramos de Lima Aureliano
GUIMARÃES, Ana Maria de Mattos. Construindo propostas de didatização de gênero: desafios e possibilidades. Linguagem em (Dis)curso - LemD, Tubarão, v. 6, n. 3, p. 347-374, set./dez. 2006.
Ana Maria de Mattos trata a questão dos desafios que o professor encontra muitas vezes em trabalhar com gêneros dentro da sala de aula. Neste artigo ela propõe expor e analisar uma experiência didática a cerca do trabalho com gêneros textuais dentro das escolas, com especial atenção para a aplicação das seqüências didáticas propostas e análise dos resultados obtidos, procedimento por ela justificado pela importância de tais estudos e pela exigência por parte dos Parâmetros Curriculares Nacionais para que o trabalho com gêneros seja levado para dentro das salas de aula.
Segundo Guimarães, a experiência didática que serviu de base para o estudo e análise tinha como projeto norteador o processo de produção de textos narrativos e o papel da escola nesse processo, tendo em consideração a visão socio-interacionista de Bronckart, que vê a linguagem como prática e interação social, aliada a concepção de gênero textual de Bakhtin, que propõe a materialização da linguagem dentro de formas pré-determinadas de enunciados.
A partir dessas premissas teóricas básicas, Guimarães acrescenta que o projeto buscou trabalhar com a releitura feita por Bronckart, Schneuwly e Dolz a respeito do conceito de gênero textual visando às práticas escolares e definindo gênero como um modelo didático a ser estabelecido e trabalhado, cujo aprendizado depende de uma série de fatores como a decisão didática de se trabalhar efetivamente com gêneros textuais, os objetivos dessa aprendizagem, os conhecimentos já existentes a cerca dos gêneros a serem trabalhados, as capacidades dos alunos envolvidos e os objetivos do ensino.
A autora especifica que as atividades foram desenvolvidas a partir dos esquemas da narração de Adam (1985,1987) e de Labov (2001), com a sugestão de um tema genérico para que fosse possível fazer um diagnóstico com base nos textos iniciais produzidos pelos alunos, e detalha as três fases de desenvolvimento do projeto. Na primeira etapa, Guimarães afirma que foi escolhido o gênero conto de fadas (Schneuwly 2002, Canvat 2003, Jolles 1993), tendo como justificativa o conhecimento prévio e interesse dos alunos pelo gênero e também por atender aos propósitos didáticos do projeto, utilizando para isso os contos de fadas ditos “modernos”.
A autora relata que esta estapa foi dividida em sete oficinas que levaram os alunos a compreender os vários elementos constitutivos do gênero e a questão da releitura e da reescrita. Os resultados das redações produzidas ao final da etapa foram apresentados num quadro com percentuais de alunos tinham a compreensão dos elementos constitutivos e conseguiram utilizá-los na composição das redações. Ao analisar os resultados, a autora destacou que antes da seqüência didática ser aplicada os alunos não distinguiam nem os elementos de um texto narrativo e por isso muitos tiveram problemas ao não utilizá-los na produção inicial para o diagnóstico.
Na segunda etapa, Guimarães justificou a escolha do novo gênero, peça teatral (Belinky; Gouveia 1984), na intenção de trabalhar os sinais de pontuação ligados a elementos lingüísticos externos como entonação e leitura.
Nesta etapa foram desenvolvidas dez oficinas que estabeleceram os elementos constitutivos do gênero, as marcas do diálogo, a relação entre fala e pontuação e finalmente a elaboração e tramatização de uma peça de teatro pelos os alunos. Novamente um quadro com os percentuais comparando uma produção inicial e a produção final foi apresentado para ilustrar os resultados finais que mostraram que a maioria dos alunos compreendeu e adquiriu os diversos aspectos relacionados ao gênero trabalhado.
Para a terceira etapa, a autora relata que o projeto voltou aos esquemas narrativos trabalhados na primeira etapa, mas desta vez com o gênero história de detetive (Todorov 1970) que foi escolhido devido ao interesse dos alunos e desenvolvido em doze oficinas que incluiram leitura de textos do gênero, compreensão dos elementos constitutivos e a produção final. Com a apresentação do quadro de resultados finais, Guimarães mostrou que os alunos já tinham um bom domínio das seqüências narrativas na produção inicial e portanto foram aprimorados somente os elementos constitutivos do gênero, mas embora tenham ocorrido melhoras, nem todos os alunos compreenderam e utilizaram tais elementos por semrem mais complexos que os das etapas anteriores. Na conclusão de seu artigo, a autora reafirma uma citação de Schneuwly (2002) na qual a aprendizagem da escrita depende da apropriação dos utensílios da escrita e entre eles os elementos constituintes dos gêneros. Em sua análise, Guimarães considerou bastante produtiva a utilização das seqüências didáticas propostas, dado comprovado pelos resultados obtidos que mostraram tranformações importantes das capacidades de linguagem dos estudantes e por entrevistas feitas com os alunos envolvidos ao final do projeto que avaliaram positivamente a experiência. Guimarães finaliza com a ressalva de que embora tal procedimento seja produtivo, o grande problema na elaboração de seqüências didáticas para serem desenvolvidas em sala de aulas é que tais seqüências dependem fundamentalmente do professor que deve ser capacitado e estar respaldado nas firmes bases teóricas que o trabalho com gênero exige, o que nem sempre acontece.