Após estudo da obra "Igualdade e Liberdade" de Norberto Bobbio, buscou-se responder três questionamentos que durante sua leitura sucederam-se. O primeiro quanto aoreal objetivo da denominada "Igualdade de Oportunidades" que o autor destaca. Seguidamente, partindo-se da divisão "Liberdade Positiva versus Liberdade Negativa", segundo classificação do autor, que espécie de liberdade é aquela insculpida no art. 5º, II, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. E por fim, buscar o entendimento do autor do que vem a ser a "verdadeira liberdade".

Concernente ao propósito de Bobbio, a igualdade de oportunidades é a equivalência de condições entre os indivíduos que não se assemelham socialmente, pelo contexto em que se deu o ponto de partida de sua existência. Trata-se, em linhas rápidas e genéricas, de um princípio congênere ao da igualdade.

Bobbio destaca seu objetivo, no sentido de proporcionar a todos os partícipes da sociedade a possibilidade de emergir a partir de um ponto comum, retratado que, assim, a desigualdade – por maior descrença que possa sobrelevar – possa ser o instrumento mais apropriado na busca pela igualdade, considerando a forma desigual de tratamento aos desiguais, por óbvio, na medida de sua desigualdade material, intentando-se sua igualdade formal, ao menos.

É próxima, portanto – inclusive na organização capitular do próprio autor – à igualdade de fato, esta finalística enquanto a igualdade de oportunidades está ligada ao ponto de partida. Apresenta-se, também, se vale dizer,como algo relativamente próximo ao princípio democrático que tange modernamente pela idéia de que Aristóteles[1]tratou por "primeiro tipo de democracia", em que se tem por base a igualdade, em que esta vem significar que ricos e pobres possuem o mesmo direito político, a mesma legitimidade para exercer o poder democrático. Encerra este posicionamento argüindo que a democracia – em essência – é o resultado da associação da liberdade e da igualdade como princípios políticos. É o que o Filósofo tratava por pureza democrática, sinônimo de igualdade política. Cumpre ressaltar que se trata de uma igualdade formal.

Posteriormente tem-se a indagação acerca das liberdades positiva e negativa e qual delas coaduna-se com o inciso II do art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Como Bobbio destaca, a liberdade negativa é um ente de direito dual, ou seja, compreende duas emanações de legitimidade de exercício de direito. Primeiramente, a liberdade negativa compreende a "ausência de impedimento, ou seja, a possibilidade de fazer".[2] Assim o indivíduo não pode ser privado ou inibido de agir, se lei nenhuma consignar aquela conduta como proibida. Se não defesa a atividade, por conseguinte autorizada e, portanto, o indivíduo pode fazer tudo o que a lei não proibir.

De outra monta está – como parte integrante da liberdade negativa – a "ausência de constrangimento, ou seja, a possibilidade de não fazer".[3] Essa acepção institui, por sua vez, que ninguém é obrigado a agir, senão em virtude da Lei. A ausência da lei, neste caso, possui um viés permissivo omitivo, de maneira que a omissão da lei em obrigar o fazer, entende-se como a permissão do indivíduo de não-fazer.

Bobbio reúne os propósitos de Hobbes, Locke e Montesquieu para afirmar que a referida liberdade consiste em poder fazer tudo o que a lei permite – seja por expressão desta, ou por sua própria omissão.

Seguidamente Bobbio explora o tema liberdade positiva. A priori tida numa perspectiva política de que tal liberdade assemelha-se a uma autodeterminação ou autonomia da vontade do indivíduo de fazer. Enquanto a liberdade negativa trata de ausências dispositivas, a liberdade positiva trata da existência de um querer, do querer específico do indivíduo, o que significa a capacidade de se mover para uma finalidade sem com isso ser movido.

Bobbio se usa de Rousseau, Kant e Hegel para descrever a liberdade positiva como uma fonte de autonomia porém, autonomia esta que Hegel disse se tratar somente da do Estado, pois este a realizaria como vontade através das leis. Bobbio, por sua vez, chega tratar a liberdade positiva como contraditória, pois a liberdade em si mesma, é própria da falta de algo. Bobbio bem apresenta que a liberdade positiva desprende da ação a própria liberdade, levando-a próxima do atributo da vontade.

O art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 corresponde à parte do texto magno tratante dos direitos e garantias fundamentais, encontrando-se no Capítulo I deste Título, dos direitos e deveres individuais e coletivos. Disciplina em seu caput que "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes" e prossegue em seu segundo inciso que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".

Por certo, o referido dispositivo constitucional diz respeito à liberdade negativa, esta em suas duas acepções. No tocante ao primeiro período da oração "ninguém será obrigado a fazer" diz respeito à ausência de constrangimento, sendo, portanto, lícito não fazer. Quanto ao segundo período da oração "ou deixar de fazer", se enlaça com o propósito da ausência de impedimento, lícito, desta forma, fazer. O último período "alguma coisa senão em virtude de lei", auto-explicativo, denota que é a lei que garante a liberdade e seu limite dentro do ordenamento jurídico brasileiro.

A última análise do presente escrito, é tida na persecução do que o jusfilósofo Norberto Bobbio entende como sendo a verdadeira liberdade.

Depois de o autor discorrer sobre as liberdades positiva – consoante ao conceito político de externar o querer pessoal, liberdade, portanto, como autodeterminação de vontade, e não de ação – e negativa – de não ser coagido a fazer ou deixar de fazer nada senão em virtude da lei, condizente à ação em vista disso – Bobbio explana sobre uma certa "discussão vazia"em relação à qual delas poder-se-ia chamar de a verdadeira ou a boa liberdade.

Bobbio apresente a lição de Constant, para quem a verdadeira ou boa liberdade é tão somente aquela que diz respeito ao não constrangimento do indivíduo à ação, nada prestando a este entendimento aquele que trata da liberdade como autodeterminação da vontade, pois não haveria como se chamar de liberdade àquela que o constrangimento esteja somente na seara do eu mesmo. Bobbio explica que a objeção de Constant é compreensível, pois encara que a vontade, de per si não leva em conta o agir, e o não agir aparenta não expressar fato humano relevante.

Aparenta que Bobbio defenda a liberdade positiva como a boa liberdade, ao passo que tenta por diversas vias demonstrar que esta diz respeito à autodeterminação e, desta forma, não encontra limites ou balizas externas, sendo do âmago do ser. Por fim o autor discreteia sobre a dificuldade política, e não conceitual do trato desta objeção, em que se mesmo a liberdade positiva – como autodeterminação – é uma idéia-limite, não se pode excluir – por completo – de que seja um ideal reproposto, e mais, de que seja possível considerar a preponderância de um regime ou de outro, a se aproximar desse ideal.



[1] ARISTÓTELES. Política. Tradução de Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2002. Livro Sexto.

[2] BOBBIO, Norberto. Igualdade e Liberdade. 3. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1997. p. 49.

[3] BOBBIO, Norberto. Igualdade e Liberdade. p. 49.