CONSENSO NO TEMPO-EVOLUÇÃO (parte 2) 

Destarte, para não ficar truncado e dar continuidade lógica a esta parte segunda (2) de tais escritos, encerrei, em um dos parágrafos de sua parte primeira (1), com dizeres algo parecidos com o que agora transcrevo: 

“Detendo-se à letra e não ao essencial, alega alguns polemistas que a principal obra de Ubaldi – “A Grande Síntese” – não é tão confiável por conta de algumas expressões menos exatas (raríssimas, por sinal), o que desautorizaria o autor levantando dúvidas sobre a autenticidade dos novos princípios que ela entesoura. Todavia, se conhecessem melhor a Doutrina do Espiritismo que professam; e se conhecessem melhor a Doutrina contida na obra Monista ubaldiana e as condições em que a mesma fora elaborada, e não pronunciariam tamanha insensatez”. 

Ora, sabemos bem que desde a publicação de “O Livro dos Médiuns” obra de Espiritismo Experimental - (Allan Kardec 1861), que uma mensagem ditada por um Espírito comunicante poderá ser mais ou menos afetada pela aparelhagem mediúnica durante o processo em que a mesma é transmitida, quer o médium seja intuitivo, semi-mecânico ou inteiramente mecânico, pois que tal fenômeno de transmissão guarda estrita relação com as capacidades do médium, seus conhecimentos atuais e os arquivados em seu perispírito. Com efeito, verifica-se que, por uma espécie de fusão fluídica entre seus corpos etéreos (perispiríticos) é que se inicia o intercâmbio entre o Espírito livre (emissor) e o médium encarnado (receptor) no mundo. 

Havendo a concordância do médium a tal comando espiritual, verifica-se o circuito mediúnico por onde vai percorrer-se a corrente mental, isto é, o pensamento que se queira transmitir, sendo que a vestidura do mesmo pela palavra vem a seguir, quando então, o primeiro retira do cérebro do segundo os componentes que possam dar forma ao que queira transmitir. 

Existem, porém, algumas dificuldades a se transpor desde o início do intercâmbio. Primeiro: terá de se fazer uma espécie de associação entre duas mentes que, por mais se afinem, intelectualmente e moralmente, são diferentes entre si; Segundo: havendo a associação mental e a permissão do médium para tal expediente, este deverá, conquanto o domínio e o comando mental do comunicante, assimilar e compreender o seu pensamento, pois que, embora parcialmente fundidos um no outro, são seres de identidades próprias e distintas; Terceiro: o médium deverá exprimir o pensamento estranho o mais exato possível, pois existem conceitos que estão muito acima do seu entendimento, inexistindo, pois, palavras e códigos gramaticais que se possa torná-los inteligíveis ao nosso entendimento. 

Isto quer dizer que os ditados que o médium obtém, estão a reproduzir, quando à forma e ao colorido, o cunho mesmo de sua personalidade, do que lhe é estritamente pessoal, levando-nos a concluir que se ao Espírito pertencem a informação e o conceito, ao médium pertencem a interpretação e a forma que, certamente, estarão sendo e estão influenciadas pelas qualidades inerentes à sua personalidade, seu particular e exclusivo campo psíquico-emocional. 

Com efeito, se o pensamento do Espírito comunicante pode ser, de alguma maneira, influenciado pela instrumentação mediúnica, pode ele, então, ressentir-se da imperfeição dos meios à sua disposição e não reproduzir exatamente aquilo que se cogitava e gostaria de transmitir. Mais ainda: por qualquer desarranjo psíquico ou emocional do médium poderá ocorrer que a mensagem recebida não seja o mais fiel retrato do pensamento comunicante, sendo tal irregularidade possível de suceder mesmo com os melhores, mais perfeitos e moralizados médiuns existentes. 

Recordemos, para tanto, a Nota da Editora constante no livro de psicografia de Chico Xavier “O Consolador” (Emmanuel – 1940 – Feb), em que dito autor espiritual corrigiu o texto da questão 378 do referido livro, devido, segundo ele, a perturbações no processo de filtragem mediúnica, onde o seu pensamento fora prejudicado.

Obviamente que com médiuns de tamanha envergadura (Chico e Ubaldi), tais ocorrências constituem raríssimas exceções face aos refinamentos de sua avançada instrumentação mediúnica e inegável condicionamento ético e disciplinar. Mas serviram para mostrar que também eles estiveram sujeitos a tais contingências e isto em razão de uma existência também repleta de dores, de árduas provações, cercada de rotinas comuns, de estafantes trabalhos profissionais e demais preocupações inerentes a todo e qualquer ser humano, e que, mesmo com a mais rigorosa disciplina a que se possa manter, pode afetar a recepção metafísica. 

E mais: em estando eles, dotados de uma sofisticada aparelhagem receptora, aparelhagem que, por sua estrutura maleável, é suscetível das mais diversas interferências e oscilações, óbvio se demande tempo para que o conjunto todo se harmonize por completo. Mas há, ainda aí, outro problema, pois o campo em que labora o Espírito é inteiramente diverso do nosso. Considerando-se situações antípodas, de nós homens e de um ente espiritual muitíssimo elevado, diríamos que: estamos no finito relativo de nossas grosseiras concepções, e ele, situa-se no infinito de sutilezas cósmicas inconcebíveis; estamos na matéria, repletos de instintos vis, e ele, na Espiritualidade mais alta de ofuscante luz. E, por isto, “Sua Voz” adverte no Capítulo 06 de “A Grande Síntese” acerca do problema de transformar-se a força do pensamento cósmico em elementos da nossa cotidiana compreensão, com os dizeres: 

“Atentai mais aos conceitos do que às palavras”. (Opus Cit.). 

Lembrando, pois, que o “transformar-se a força do pensamento cósmico em elementos da nossa cotidiana compreensão” pode acarretar em distorções do seu pensamento, prejudicando e alterando sua essência primordial. É o que veremos em seu segmento final.

 (final da parte 2) 

Articulista: Fernando Rosemberg Patrocínio

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