Conselhos Gestores: Potencialidades para a efetivação do controle social nas políticas públicas.

 

Maria Edneide Lopes. 1

 

Resumo: O texto a seguir tem como propósito discutir e levantar questões de extrema relevância a despeito da institucionalização da democracia participativa no Brasil, através da análise da participação popular por meio dos conselhos gestores, uma vez que se faz necessário o conhecimento destes espaços, suas potencialidades e principalmente sua função, tendo em vista o papel dos conselhos gestores como instrumento de participação da sociedade na esfera pública.

 

Palavras-chave: Democracia participativa, participação popular, conselhos gestores, políticas públicas.

 

Abstract: The following text is to discuss and raise issues of extreme importance in spite of the institutionalization of participatory democracy in Brazil, through the analysis of popular participation through management councils, since it requires knowledge about these spaces, their potential and especially its role in view of the role of management councils as an instrument of social participation in public life.

Keywords: Participatory democracy, popular participation, management councils, public policies.

 

Introdução.

 

            A conjuntura Brasileira pós-constituição Federal de 1988, caracteriza-se pela abertura do novo viés democrático contemporâneo, no qual foi implantada a concepção universalista dos direitos sociais como dever do estado e consagrou a democracia participativa, com definição de mecanismos e instrumentos que permitem a participação popular, cada vez mais indispensável para o fortalecimento do processo de democracia participativa nos moldes constitucionais. As experiências de democracia participativas criadas a partir da Constituição inauguram novos mecanismos e relações de representação política, mesmo com todos os entraves presentes no modelo de democracia representativa vivenciado no Brasil, é importante ressaltar que ultimamente tem-se observado uma tentativa de subordinação entre a democracia representativa sobre a democracia participativa, a primeira tenta se sobrepor-se a segunda, porém “a relação entre as duas deve ser de tensionamento e complementaridade e não de subordinação de uma a outra” (PAZ, 2009, p. 25). Por essa razão é que se vê a necessidade do conhecimento e entendimento da dinâmica presente nestes novos espaços, que vem sendo implantados, em busca de resultados efetivos ao atendimento dos interesses da sociedade, cujo teor democrático impulsiona a abertura da relação entre os cidadãos e o Estado, proposta esta que se remete aos conselhos gestores com o intuito de alcançar o bem comum entre as partes.

            Analisar o papel que esses conselhos buscam assumir, nos remete primeiramente percebê-los como mecanismos de participação popular na esfera pública, uma vez que, o esforço para a construção destes conselhos está diretamente ligado ao processo de luta da classe trabalhadora pela democracia, tal fato tem resultado em uma nova visão de participação, na qual se tem percebido o envolvimento de diferentes atores sociais. Nesta perspectiva, o presente artigo busca analisar o papel dos conselhos gestores como potencialidades para a efetivação do controle social nas políticas publicas. Para isso se faz necessário perceber com qual intensidade tais conselhos funcionam como mecanismos de participação popular e em que sentido tem contribuído de fato, para a instauração da democracia participativa, levando em consideração sua natureza deliberativa e consultiva.

            Sendo assim, ao longo do texto farei uma abordagem acerca da tentativa de instauração da democracia participava no Brasil, levando em consideração todos os entraves surgidos no decorrer deste processo, sendo o principal deles a influência da política neoliberal, a qual ganha hegemonia na déc. de 90, dificultando ainda mais tal processo, também serão apresentados alguns elementos para o entendimento de como tem sido o protagonismo dos conselhos gestores, seus desafios e suas potencialidades, uma vez que, estes devem funcionar como canais democráticos de participação, tendo como finalidade a promoção do controle político e social nas políticas publicas.

             

 

 

 

  1. Democracia Participativa - Perspectiva para o protagonismo da sociedade civil nos espaços públicos.

 

A idéia de termos uma democracia participativa ocorre através da Constituição Cidadã de 1988, onde se tem a introdução de mecanismos que possibilitam a integração da população no processo de construção, fiscalização e avaliação das ações desenvolvidas pelo Estado Brasileiro. A passos lentos vem ocorrendo uma maior abrangência da participação dos cidadãos no discurso a respeito da gestão pública, porém, sabe-se que o processo de constituição da cidadania  no Brasil foi marcado pela restrição das liberdades civis, enquanto o executivo ficava com o papel de criar os direitos sociais, como um distribuidor, repressor e paternalista de empregos e favores. (PEREIRA, 2009, p.04), Não existia, portanto, nenhuma negociação entre governo e representações políticas, é claro que gradativamente a visão do Estado e suas relações com os indivíduos foram sendo modificada até que se chegasse a possibilidade de fortalecimento dos direitos e garantias individuais, culminando com a eclosão dos direitos sociais. A CF/88 em seu Art. 1º, parágrafo único especifica que “[...] todo poder  emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente...” (BRASIL, 1988), neste sentido, a concepção de ascensão do poder do povo, é característica de nossa recente democracia, que vem sendo expressada constitucionalmente por uma via dupla: o exercício decorrente da representação (democracia representativa) e aquela praticada de maneira direta pelo próprio povo (democracia participativa). De acordo com (CAMPOS, 2009, p.19) “A democracia participativa funda-se em critérios e valores ideo-políticos distintos da democracia representativa...”. Nesta, o cidadão é dotado de autoridade para realizar escolhas e eleger governantes, porém, neste processo percebe-se o afastamento do cidadão das arenas que tratam da gestão pública, diferentemente, a democracia participativa se apóia e se nutre nos atores coletivos, nos cidadãos organizados. No Brasil, o que notamos é a insistência de prevalência da democracia representativa, na qual o Estado abarca todo o poder decisório, afastando cada vez mais a sociedade dos espaços públicos, sendo esta uma estratégia da política neoliberal, a qual teve um avanço fenomenal apartir da década de 90, e realizou com seu programa de ajuste fiscal, um verdadeiro desajuste social, ou seja, todas as garantias e direitos conquistados pela classe trabalhadora, vêm sendo esfacelados com a predominância da política neoliberal.

 

 

No Brasil, o governo Collor (1990/1992) inaugurou a entrada do projeto neoliberal no País, com intensos processos de desregulamentação, abertura dos mercados, incentivos a reestruturação das empresas e a disseminação ideológica para toda a toda a sociedade brasileira de que a causa dos males sociais centrava-se no “gigantismo” do Estado e a solução seria reduzi-lo ao máximo... (PEREIRA, 2009, p.05)

 

 

De acordo com a autora, é apartir deste momento que o Estado começa a perder sua hegemonia para o capital, tornando-se mínimo para a sociedade e máximo para a política neoliberal. É importante esclarecer que, as alternativas de intervenção democrática no Estado, proposta pelos trabalhadores, organizações e movimentos populares, expressam a contra posição de projetos alternativos hegemônicos entre classes antagônicas ou se caracterizam como instrumentos reprodutores  de conciliação e consenso afirmadores da ordem social dominante, os quais se adequam, não desafiam à estratégia neoliberal de preservação da  reprodução expansiva do  capital.

Contudo, se em momentos históricos anteriores o Estado assumiu as responsabilidades de seus aliados sobre os interesses maiores, afirmando seu poder centralizador e autoritário, com a assunção da CF/88, este assume uma nova postura perante a população, onde se pode perceber uma co-responsabilidade necessária entre o Estado e os próprios cidadãos. Neste aspecto, ao passo que, a sociedade se torna co-responsável pelas ações do Estado, esta passa também a assumir gradativamente suas funções, desresponsabilizando, portanto, o Estado de seu dever. É possível então perceber que “as lutas pela democratização da sociedade brasileira, protagonizadas por amplos movimentos sociais, são expressões da tentativa de constituir esferas públicas, quando a luta pela conquista e pela extensão de direitos associou-se a construção democrática do Estado e da sociedade” (RAICHELES, 2008, p. 30), sendo assim, , deve permitir através de espaços de comunicação, que a participação popular seja manifestada diretamente sobre as decisões da gestão pública, “[...] estabeleceu mecanismos de participação no campo das políticas sociais, instituindo a criação de conselhos gestores, integrados por representantes dos diferentes segmentos da sociedade para colaborar na implementação e no controle de tais políticas.” (RAICHELES, 2008, p. 40). Nesse sentido, a democracia participativa, vem acontecendo no Brasil através dos conselhos, os quais vêm assumindo uma importante função, no sentido da construção da cidadania e da reivindicação dos padrões de convivência democrática. A seguir aprofundarei tais considerações sobre os conselhos gestores, as dificuldades e limites enfrentados por eles para o desempenho das atribuições que lhes são conferidas. 

  1. Conselhos gestores - Instâncias de controle democrático: Desafios, limites e possibilidades.

 

A concepção de participação, defendida apartir dos anos 80, é a de gestão nas políticas através do planejamento e fiscalização da sociedade civil em órgãos, agências ou serviços do Estado, sendo este responsável pela elaboração e gestão das políticas públicas na área social. A partir da CF/88 foram criados espaços institucionais de participação cidadã, os chamados conselhos gestores de políticas públicas vêm confirmar a ampliação dos sujeitos sociais na democratização do estado brasileiro, tendo no horizonte uma nova relação Estado-sociedade com a ampliação de canais de participação direta. O controle social, enquanto direito conquistado pela Constituição Federal de 1988, mais precisamente do seu principio de “participação popular” tendo como propósito a ampliação da democracia representativa para a democracia participativa.

De acordo com (BRAVO, 2009, p.396) “os mecanismos de controle democrático, entretanto, foram implementados [...] num cenário de regressão dos direitos sociais, de globalização e mundialização do capital, que tem na financeirização da economia um novo estágio de acumulação capitalista”, talvez tal fato, venha se caracterizar como o grande desafio a institucionalização de fato do controle social nas políticas públicas, outro grande desafio considerado por (CAMPOS, 2009, p.10) “foi o deslocamento de um modelo meritocrático particularista para um novo padrão de atenção”, o qual dá ênfase a participação e o controle da sociedade civil na esfera pública.

Neste sentido, percebe-se que os conselhos têm enfrentado diversas dificuldades para realizarem efetivamente o controle social, seja pela conjuntura adversa relacionada à política econômica, pelas duras resistências do aparato governamental e se instalar e obter o reconhecimento como espaço institucional e legitimo para o exercício do controle social, ou ainda pela grande rejeição do poder executivo em dividir o poder com a sociedade. Então conforme afirma (SOAREES e GONDIM 2002, p.80),

 

 

A presença, nas políticas públicas, desses novos agentes, que aos pouco, emergiram do seu “casulo” nos movimentos sociais, é uma marca da cena política brasileira contemporânea, constituindo-se num contraponto à retração do estado, motivada pela sua incapacidade fiscal de responder as demandas da população e a relativa incapacidade dos movimentos sociais de preencherem de forma sistemática, os espaços de participação criados pelo poder público.

            Os conselhos gestores, como proposta de materialização da democracia participativa, se despontam como instrumentos democráticos que viabiliza a comunicação entre o poder público e o poder popular. Sua composição paritária integrada por cidadãos da sociedade civil e representantes da esfera do poder governamental indica uma possibilidade de mudança. Porém, um dado que vem comprometendo e dificultando essa mudança, é o fato de os representantes da sociedade civil estarem sendo indicados pelo poder público, e não escolhidos por meio de eleições em fóruns e conferências, conforme estabelece a Lei.  “Uma outra questão extremamente relevante diz respeito à dificuldade de concluir a lógica dos interesses específicos ou localizados, que presside a escolha dos representantes dos conselhos e, em geral, norteie sua atuação, com a lógica dos interesses coletivos ou globais” (SOARES e GONDIM, 2002, P. 87).

            Sabemos que, os conselhos gestores, têm por finalidade o controle social da administração pública, constatando se as ações realizadas por esta, estão se pautando em bases legais e atendendo aos interesses coletivos, sobre este aspecto, os conselhos são vistos como potencialidades para a efetivação da democracia participativa, enquanto instâncias permanente, com prerrogativas para deliberar, normatizar e fiscalizar as políticas públicas. Observa-se, portanto, que do ponto de vista institucional, a participação da sociedade civil nas instâncias que elaboram e gerenciam as políticas públicas é uma condição necessária e fundamental. Porém o exercício do controle social, segundo (CAMPOS, 2009, p.22) “pressupõe de um lado, a existência de uma sociedade civil organizada, mobilizada, representativa e politicamente estimulada para a valorização do interesse público, e de outro, a existência de governantes democráticos que valorizem o dialogo com a sociedade civil e que revelem disposição para partilhar decisões com a sociedade”.  Sobre este aspecto, é importante alocarmos algumas reflexões acerca da representação e da representatividade. Na democracia participativa, a representação está combinada com a participação, pois os representantes são escolhidos ou eleitos em fóruns próprios para participar de espaços públicos e falar em nome de um grupo ou segmento (Paz, 2009, p.26), sendo assim,  representar significa assumir a responsabilidade de falar e responder em nome de outro ou de um grupo, agindo sempre com limites e princípios éticos e uma certa prática política.

 

 

 

 

 

 Considerações Finais.

 

            Reconhecendo a participação popular como um direito fundamental, é de suma importância que o controle social seja operacionalizado por instrumentos como os conselhos gestores, estes por sua vez, vêm sendo considerados como experiências inovadoras de gestão, uma vez que, vem possibilitar a participação de setores tradicionalmente marginalizados da cena publica e do envolvimento nos assuntos do governo, os quais são de interesse de toda sociedade, desse ponto de vista, o ideal que orienta os conselhos é de fato, a influencia que a sociedade civil pode exercer na cena política.

            Todavia, podemos perceber grandes dilemas enfrentados por este segmento, mediante a sua institucionalização, seja pela forte influencia da política neoliberal, seja pela desarticulação existente entre os conselhos e suas entidades representativas ou ainda pela falta de mobilização da categoria, dificultando ainda mai a atuação dos conselhos na esfera de mobilização e participação social. È importante então, percebermos as fragilidades e precariedades que os conselhos vivenciam na atualidade. Nesse sentido, é preciso fortalecer o controle social por meio da atuação dos conselhos, para o desenvolvimento de suas funções, pois, só assim estes poderão se tornar potencialidades para a concretização da cidadania participativa no Brasil.             

 

Referências Bibliográficas

 

BRASIL. Constituição Federal, de 05.10.88. Atualizada com as Emendas Constitucionais Promulgadas.

BRAVO, Maria Inês Souza. O trabalho do assistente social nas instancias públicas de controle democrático. In. Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. Brasília: CFESS/ABEPSS, 2009.

CAMPOS, Edval Bernadino. O protagonismo do usuário da Assistência Social na implementação e controle social do SUAS . In. Caderno de Textos: Subsídios para debates – Participação e controle social no SUAS. Brasília: Ministério do desenvolvimento social e combate a fome/ Conselho Nacional de Assistência Social, 2009. 
MARTINS, Valdete de Barros. Participação e controle social no SUAS: O que temos e o que queremos . In. Caderno de Textos: Subsídios para debates – Participação e controle social no SUAS. Brasília: Ministério do desenvolvimento social e combate a fome/ Conselho Nacional de Assistência Social, 2009. 
PAZ, Rosangela D. O. da. Representação e representatividade: Dilemas para os conselhos de Assistência Social. In. Caderno de Textos: Subsídios para debates – Participação e controle social no SUAS. Brasília: Ministério do desenvolvimento social e combate a fome/ Conselho Nacional de Assistência Social, 2009. 

RAICHELLE, Raquel. Esfera Publica e conselhos de Assistência Social: Caminhos da construção democrática. 5ª Ed. São Paulo: Cortez, 2008.

SOARES, José Arlindo; LINDA, Gondim. Os desafios da gestão municipal democrática. 2ª Ed. São Paulo: Cortez, 2002 


1 Maria Edneide Lopes – Acadêmica do Curso de Bachareladoem Serviço Social pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Cajazeiras - FAFIC. E-mail: [email protected]