Rosania Soares Carminati



RESUMO


O eixo reflexivo deste artigo é o Conselho de Classe enquanto espaço legitimador de discussão e avaliação do aproveitamento dos alunos e da turma como um todo. O Conselho Participativo estimula o diálogo, fortalece o senso crítico, pois ajuda os alunos e professores a verem a realidade na qual estão inseridos pela visão do outro e modificar o processo pedagógico. O objetivo principal do artigo bibliográfico aqui apresentado é repensar a estrutura do Conselho de Classe como espaço diagnóstico da prática educativa. O estudo foi realizado para dar mais sentido ao processo de avaliação que a escola desenvolve vendo o aluno como um todo, além das notas ou conceitos. Todo o estudo foi conduzido aprofundando e refletindo conceitos lidos sobre Conselho de Classe e observações feitas durante a realização dos Conselhos na escola na tentativa de ajudar a construir uma nova visão ao processo de avaliação da prática educativa.


Palavras-chave: Avaliação. Diálogo. Prática Educativa. Espaço Diagnóstico.


1 INTRODUÇÃO


Como se realiza o Conselho de Classe nas escolas sempre me chamou atenção e me provocou muitas reflexões. Pensar um Conselho de Classe como reflexão pedagógica em que professor e aluno se situem conscientemente no processo que juntos desenvolvem e não apenas como um espaço burocrático de entregar notas dos alunos à coordenação.
O Conselho verifica se os objetivos, processos, conteúdos e relações estão coerentes com o referencial de trabalho pedagógico da escola. Sob esse ponto de vista, ele é uma forma de avaliação, de controle da realização da proposta pedagógica. (PERRENOUD, 1998).
O conselho de Classe cumprirá sua função se realmente ajudar professores e alunos a reorientar sua ação pedagógica para a próxima etapa do trabalho na escola e não apenas para classificar os alunos.
O trabalho aqui apresentado buscará refletir sobre o Conselho de Classe como espaço de avaliação do trabalho individual e coletivo da equipe de professores e da coordenação pedagógica sobre seu próprio trabalho. Pensar também na participação do aluno representante durante a primeira etapa do Conselho de Classe como sujeito principal do processo educativo. A intenção é proporcionar um espaço de reflexão sobre o trabalho que está sendo realizado e possibilitar a tomada de decisão para um novo fazer pedagógico, favorecendo mudanças para estratégias mais adequadas à aprendizagem de cada turma ou aluno.
Na busca da solução de algumas observações feitas durante a participação dos Conselhos de Classe na escola aumentou o interesse pelo aprofundamento teórico sobre o tema citado acima para conhecer a origem do Conselho de Classe e entender o porquê de tanta resistência de alguns professores em querer o modelo de Conselho que aí está. A pesquisa feita esclareceu alguns pontos e fortaleceu outros, como a participação de alunos no pré-conselho e a maneira que se faz a avaliação sobre uma parte e não sobre todo o processo de ensino, pois nos Conselhos não se analisam as práticas dos professores, mas tão somente as do aluno.
Muito ainda precisa ser fundamentado e discutido para que o professor entenda que o conselho deve refletir a ação pedagógico-educativa e não apenas focar as notas, conceitos ou problemas de determinados alunos.


2 O QUE É CONSELHO DE CLASSE?


Embora o Conselho de Classe tenha surgido na França (ROCHA, 1984) e sua implantação no Brasil, inicialmente tenha sido voluntária e depois determinada por portarias e deliberações a fim de avaliar o resultado do aluno de forma coletiva, ainda hoje esse Conselho, embora teoricamente deva servir a este propósito, o que se observa é outra perspectiva.
Os Conselhos de Classe, em muitas escolas, tem-se constituído em espaço legitimador da exclusão dos alunos das classes populares da escola. Rocha (1984) conceitua o conselho de classe como uma reunião dos professores da turma com múltiplos objetivos, entre outros destacamos: avaliar o aproveitamento dos alunos e da turma como um todo; chegar a um conhecimento mais profundo do aluno e promover a integração dos professores e de outros elementos da equipe da escola.
Porém, as escolas reduziram o Conselho de Classe a uma reunião em que apresentam as notas/conceitos que os alunos obtiveram durante o período e se discutem as questões de disciplina das turmas. As reuniões do Conselho de Classe devem ser entendidas como fonte de informações, como acréscimo de conhecimentos que auxiliarão o educador na compreensão do processo de aprendizagem.
Cruz (1995) vai um pouco mais além. Aproxima o conceito de Conselho ao conceito de avaliação. Assim, o Conselho de Classe é o momento de uma avaliação diagnóstica da ação pedagógico-educativa feito pelos professores e alunos em momentos distintos, às vezes à luz do Marco Operativo da Escola. (CRUZ, 1995, p. 117).
O conceito apresentado por Cruz traduz dois momentos importantes. O primeiro é que o Conselho de Classe é um momento de avaliar diagnosticamente o trabalho coletivo a partir de um referencial e em determinado tempo. O segundo é que ele deve subsidiar as ações e o Projeto Político Pedagógico, onde no marco operativo estão descritos os objetivos que se pretende alcançar. Portanto, é uma reflexão conjunta da ação pedagógica na vida da escola.
Democraticamente orientado, o Conselho de Classe pode reforçar e valorizar as experiências praticadas pelos professores, incentivar a ousadia para mudar e ser instrumento de transformação da cultura escolar sobre avaliação. É o momento, o espaço de avaliação diagnóstica da ação educativa da escola, feita pelos professores e pelos alunos, à luz do Projeto Político Pedagógico.
Libâneo (2004, p.303) também define Conselho de Classe como um órgão colegiado composto pelos professores da classe, por representantes dos alunos e em alguns casos, dos pais. É a instância que permite acompanhamento dos alunos, visando a um conhecimento mais minucioso da turma e de cada um e análise do desempenho do professor com base nos resultados alcançados. Tem a responsabilidade de formular propostas referentes à ação educativa, facilitar e ampliar as relações mútuas entre os professores, pais e alunos, e incentivar projetos de investigação.
Libâneo (2004), como os demais autores aqui citados conceituam o Conselho atentando para a responsabilidade que este órgão colegiado tem de formular propostas com base educativa que garantam uma relação cordial entre professores, alunos e pais.
"À medida que se concebe a avaliação como um compromisso de futuro, o olhar para trás deixa de ser explicativo ou comprobatório e transforma-se em ponto de partida para a ação pedagógica." (HOFFMANN, 2002).
O Conselho de Classe é uma reunião avaliativa em que as pessoas envolvidas no processo ensino aprendizagem discutem acerca da aprendizagem dos alunos, o desempenho dos docentes, os resultados das estratégias de ensino empregadas, a adequação da organização curricular e outros aspectos referentes a esse processo, a fim de avaliá-lo coletivamente, mediante diversos pontos de vistas.
É uma oportunidade de reunir professores com o objetivo de refletir sobre a aprendizagem dos alunos e o processo de ensino.


3 QUE ESPAÇO É ESSE?


Os alunos são considerados como tendo alcançado êxito ou fracasso na escola porque são avaliados em função de exigências manifestadas pelos professores ou outros avaliadores, que seguem os programas e outras diretrizes determinadas pelo programa educativo. (PERRENOUD, 1999).
O espaço que deveria ser o mais rico de transformação da prática pedagógica e, talvez, dos mais mal aproveitados nas escolas é o conselho de classe. Transformando-se apenas em julgamento dos alunos, sem direito à defesa e em espaço de críticas improdutivas sobre a prática pedagógica. O conselho de classe deveria ser uma etapa do processo de avaliação, podemos dizer que o Conselho de Classe é a avaliação que a escola pratica no dia a dia. O Conselho de Classe tem obrigação de ver o aluno como um todo, muito além das notas/conceitos.
O diálogo deve ser entendido como algo que faz parte da própria natureza histórica dos seres humanos. É parte de nosso progresso histórico, do caminho para nos tornarmos humanos. O diálogo é o momento em que os humanos se encontram para refletir sobre sua realidade tal como fazem e refazem. (SHOR; FREIRE, 1986).
O que não se encontra na maioria dos Conselhos é o diálogo, falar sobre o aluno, as análises feitas são superficiais. Os professores têm centrado suas atenções quase que apenas na constatação dos problemas disciplinares. Ainda é pequena a discussão sobre por que os estudantes não aprendem, onde se situam as dificuldades, que causas individuais e/ ou coletivas provocam as dificuldades de aprendizagem. Raramente nos Conselhos de Classe se discutem situações em que as causas estão no tipo de conteúdo, na metodologia, nos processos de avaliação, nas relações entre professor-aluno.
Repensar o conselho de classe é dar sentido e coerência ao processo de avaliação que a escola desenvolve e ajudar a mudar-lhe a prática educativa. A maioria das escolas reduziu o conselho de classe a uma reunião em que se apresentam as notas ou conceitos que os alunos atingiram durante o período e também se discutem as questões de disciplina das turmas.
Há certas crenças e valores no cotidiano de nossas práticas de que não abrimos mão. Não as questionamos nem em reuniões pedagógicas, nem sequer em conselhos de escola. Lembro-me de uma dessas reuniões de conselho de escola, discutíamos se dois alunos, bons alunos, estudiosos, deveriam ser reprovados porque estavam fracos em uma matéria, mas muito bons no resto. Terminamos concordando, passariam. A reunião ia ser encerrada e me atrevi a perguntar, e os outros? Que repitam, foi a resposta unânime. Tentei defender que todos passassem, ponderei com teorias pedagógicas, psicológicas, humanitárias, apelando aos direitos da infância e da adolescência... (ARROYO, 2009).
É interessante observar como professores com uma visão mais ampla de avaliação começam a questionar, nos Conselhos, as práticas de avaliação da escola. Pedindo muitas vezes para deixar o conceito em aberto para que ele possa avaliar o aluno melhor no bimestre seguinte partindo do pressuposto de que o aluno não é um sujeito pronto, acabado e que se constrói a todo o momento e isso pode ser positivo, pois pode sinalizar que o professor está em processo de construção de um juízo e não quer se precipitar na avaliação.


4 O CONSELHO DE CLASSE COM A PARTICIPAÇÃO DOS ALUNOS


Para Sant?Ana (1995) o Conselho de Classe é a atividade que reúne um grupo de professores da mesma série, visando em conjunto chegar a um conhecimento mais sistemático da turma, bem como acompanhar e avaliar o aluno individualmente, através de reuniões periódicas.
A avaliação escolar e o Conselho de Classe são elementos para que ocorram mudanças na luta pela democratização do espaço escolar. A escola precisa estar comprometida com os reais interesses da população, ou seja, que promova seu reconhecimento, valorização e conhecimento mútuo, o compromisso com a aprendizagem, respeito as diferenças individuais.
Penin (1992) escreve que o Conselho Participativo é um momento de diálogo e avaliação de todos os atores responsáveis pela formação do aluno, logo a escola pode e deve mudar as formas e condições do serviço prestado, conforme as necessidades dos alunos.
A ideia do Conselho Participativo não tem aceitação pacífica por parte dos professores, porque de fato vai possibilitar aos alunos maior participação no processo pedagógico. O que, em outras palavras, partilha o poder de decisão que durante toda a história da educação tem sido fonte de poder dos professores.
A polarização e criativa entre dois sujeitos que promovem e se confrontam se constroem e se destroem, se atraem e se repelem, este é o espaço educativo, político no âmago. Por isso, educação autêntica só pode ser educação política. (DEMO, 1988).
Penso o Conselho Participativo como o espaço de liberdade, de debate, de diálogo construtivo. É uma prática em que os alunos têm vez e aos poucos se soltam, crescem em visão política das práticas da escola e em seus comentários sobre a atuação dos professores. Para se falar bem, é preciso falar. Assim também para se saber criticar de forma correta e adequada é preciso que se possa criticar. É esse o espaço do Conselho de Classe.
5 QUESTÕES PRÁTICAS QUE PODEM SER CONSIDERADAS NUM CONSELHO DE CLASSE


Na tentativa de construir uma nova proposta ao processo de avaliação da prática educativa que se desenvolve no Conselho de Classe, foram elaboradas algumas questões que podem ajudar os professores, coordenadores e direção da escola no processo de avaliação da escola como um todo:
1- Auto-avaliação dos profissionais da escola sobre seu trabalho pedagógico durante o bimestre ou trimestre;
2- Análise diagnóstica das turmas;
3- Proposta de ação individual e coletiva;
4- Análise dos casos relevantes;
5- Participação de um aluno escolhido pelo grupo no pré-conselho para debater os processos metodológicos, as relações entre alunos e professores. Sem a discussão de notas, conceitos, relatórios, mas o trabalho que se desenvolve em sala de aula.
As questões devem ser introduzidas na medida em que se vai tendo maior segurança e clareza. Ler atentamente a reação dos professores com cada etapa acima será de grande ajuda para a introdução de outras etapas. Cada questão deve ser bem observada e muita segurança para ser executada, só assim poderá avançar para outra questão e, sobretudo, firmeza na direção em que se processam as mudanças.
Cruz (2005, p. 19) escreve que quem espera ter clareza total e segurança máxima para mudar, não quer mudar. Em educação não há estrada asfaltada. O caminho se faz caminhando e quem vai à frente se arranha e se espeta. Ou, se preferir ir pela água, estará nadando contra a corrente...


6 CONSIDERAÇÕES FINAIS


Esta pesquisa surgiu de uma preocupação com o Conselho de Classe, da necessidade de pensar o Conselho como reflexão pedagógica e não apenas disciplinar. Através do aprofundamento teórico percebesse que o Conselho de Classe é um espaço de avaliação do trabalho individual e coletivo de todos que estão envolvidos no processo ensino aprendizagem.
Toda leitura feita foi de grande importância para aproximar a teoria da prática e melhor compreender a razão de ser do Conselho de Classe, dando a partir daí maior sentido e coerência ao processo de avaliação.
Para que comece a modificar a visão de Conselho de Classe praticado até os dias atuais é preciso dedicar-se e aprofundar algumas questões que ajudarão professor, coordenadores e direção da escola a promover ações concretas que possam interferir na prática educativa.
Toda pesquisa se voltou para o trabalho de entender o Conselho como uma etapa dinamizadora do processo educativo. Como nos diz Cruz (2005, p.15) em sua frase: "Avaliação realizada de forma participativa, como construção conjunta, cumpre a função de ajudar na formação da subjetividade e criticidade do professor e do aluno."


7 REFERÊNCIAS


ARROYO, MIGUEL. Ofício de Mestre: imagens e auto-imagens. Petrópolis: Vozes, 2000.

CRUZ, Carlos H. C. Conselho de Classe e Participação. Revista de Educação AEC. Brasília, D.F.: AEC do Brasil, nº. 94, jan./mar 1995, p. 117.

______. Conselho de Classe: Espaço de diagnóstico da prática educativa escolar. São Paulo, S.P.: Edições Loyola, 2005.

DEMO, Pedro. Avaliação Qualitativa. São Paulo: Cortez, 1988.

HOFFMANN, Jussara. Avaliar para promover: As setas do caminho. 4.ed. Porto Alegre: Mediação, 2002.

LIBÂNEO, José Carlos. Organização e gestão da escola: teoria e prática. José Carlos Libâneo. 5.ed. Revista ampliada. Goiânia: Alternativa, 2004.

PENIN, Sônia T. S. Educação Básica a Construção do Sucesso Escolar. Em Aberto, Brasília, nº. 53, 1992.

PERRENOUD, Philippe. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens ? entre duas lógicas. Trad. Patrícia Chittoni Ramos. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.

SANT?ANNA, Iiza Martins. Por que avaliar? : Como avaliar? : Critérios e instrumentos. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

SHOR, Ira; FREIRE, Paulo. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. 7 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986.