Conhecimento tradicional no manejo da pesca ao longo das gerações na comunidade de Porto Novo

 

 

         Saulo Ubiratan Pinheiro da Silva¹ – [email protected]

Sofia Dosares Batista da Silva² [email protected]

Talita Cunha de Faria³ – [email protected]

Tâmara Nascimento Campos4[email protected]

Thaís Vieira Silva5[email protected]

 

RESUMO

            O estudo examina o universo da pesca tradicional na região de Porto Novo, localidade pertencente ao município de Belterra, no Estado do Pará. Dados foram coletados através de observações e questionário previamente elaborados. Os dados serviram de embasamento para a avaliação da dinâmica cultural que envolve a atividade pesqueira naquele local. A finalidade desta pesquisa foi verificar as mudanças ocorridas no âmbito da pesca artesanal, mais precisamente no modo de pescar e nos artefatos utilizados pelos pescadores.  A presença de apetrechos como arco, flecha, arpão, tarrafa, malhadeira, anzol, etc., constituem um conjunto de elementos materiais ainda presentes na cultura pesqueira que tem como alicerce os costumes tradicionais na prática da pescaria, técnicas essas que foram repassadas ao longo das gerações, permitindo a manutenção da pesca artesanal na comunidade de Porto Novo.

Palavras-chave: Mudanças, costumes, dinâmica cultural, pesca, artefatos.

 

 

 

Introdução

            As comunidades amazônicas tradicionais fundamentam suas atividades num conhecimento relevante que são transmitidas oralmente através de várias gerações. Neste sentido, intuição e perceptividade representam a um “saber tradicional” que consolida a prática da pesca artesanal na localidade de Porto Novo. Entretanto, os saberes tradicionais não têm recebido o valor quem merecem, visto que a pesca artesanal se faz presente em quase todas as comunidades ribeirinhas. Nesta situação, a pesca na Amazônia envolve um conjunto de elementos culturais onde diversos sujeitos estão diretamente inseridos no universo da atividade pesqueira.

            Na Amazônia, a pesca é secular. Desde o período pré-colonial, os recursos pesqueiros assumiram um papel de suma importância por ser uma fonte primordial de alimento, principalmente para os índios que praticavam de forma rudimentar (arco e flecha), a pescaria de subsistência. (SANTOS; SANTOS, 2005).

Objetivos

GERAL

            Conhecer como funciona a atividade pesqueira em Porto Novo, bem como o conhecimento empírico dos pescadores locais  para, assim, analisar se houve ou não mudanças no  manejo da pesca ao longo da gerações.

 ESPECÍFICO

- Examinar a atividade de pesca artesanal desenvolvida pela comunidade de Porto Novo comparando os métodos de pesca utilizados na captura de peixes ao longo das gerações;

- Comparar as possíveis diferenças de instrumentos utilizados ao longo do tempo na atividade pesqueira;

- Analisar como as condições ambientais influenciam na captura dos peixes;

- Traçar o perfil dos pescadores da comunidade que trabalham nesse ramo;

- Conhecer a importância socioeconômica da pesca artesanal em Porto Novo.

 

 

Caracterização da área de estudo

            A área de estudo, Porto Novo), está localizada a 7 km de Belterra, e a 45 km de distância da cidade de Santarém, no Oeste do Estado do Pará. Apresenta uma vasta vegetação, clima quente e úmido, solo arenoso e está inserida na unidade de conservação (Flona Tapajós). É constituída por aproximadamente 52 (cinquenta e duas) famílias que residem na comunidade. 

Metodologia

            A metodologia utilizada foi uma pesquisa de campo, onde foi empregado um questionário com o método de estudo qualitativo/quantitativo baseado nas entrevistas que foram fornecidas por 11 (onze) habitantes da comunidade que praticam a pesca artesanal. Os pescadores responderam 4 (quatro) perguntas norteadoras. Os resultados dos questionamentos foram  colocados em formas de gráficos e tabelas para uma melhor ilustração.

 

Resultados e Discussões

            Constatou-se a presença de instrumentos como: malhadeira, tarrafa, espinhel, arpão, zagaia, caniço, currículo, entre outros. Na atividade pesqueira, foram observadas poucas mudanças na utilização dos instrumentos pesqueiros ao longo das gerações, desde os avôs até os netos, pois a atividade é desenvolvida utilizando-se métodos tradicionais e equipamentos rudimentares, de modo geral confeccionados pelos próprios pescadores.

            A atividade pesqueira para uma grande maioria dos entrevistados, 73% é tida como meio de sobrevivência. Essas pessoas vivem prioritariamente da pesca. Entretanto, os dados obtidos sobre a pesca possibilitaram verificar que a atividade também contribuí como fonte de renda. Por isso, a pesca representa uma atividade de suma importância para os pescadores de Porto Novo, visto que é fonte geradora de trabalho dos ribeirinhos moradores desta localidade em estudo. Assim sendo, jovens e adultos que participam de modo direto do manejo da pesca, dificilmente pensam em deixar a comunidade ou procurar outro tipo de atividade.  Somente 27% dos entrevistados utilizam a pesca como consumo ou lazer. Toda essa importância dada pela população local  pela pesca pode ser explicado mediante a grande abundância de peixes existentes na região Amazônica. De acordo com Silvano (2004, p.184), ”em comunidades ribeirinhas, a pesca artesanal, ainda é uma importante atividade fornecedora de renda e alimento”.

            A partir das entrevistas realizadas, pode-se perceber que os instrumentos dos pescadores da comunidade de Porto Novo são quase que na totalidade iguais. A malhadeira e a tarrafa estão entre os principais objetos utilizados na atividade da pesca e o espinhel sendo manuseado por poucas pessoas. A idade média dos pescadores entrevistados variou 9 a 63 anos, tanto do sexo feminino quanto do masculino.  41 % responderam que o instrumento mais utilizado na captura do peixe é a malhadeira e a tarrafa; 11 % utilizam o anzol( linha de pesca) como material principal; 26% o caniço; 15 % zagaia e arpão; 7 % currículo e espinhel.

            Portanto, apesar da diferença de idade entre os entrevistados, os instrumentos utilizados na pesca não varia de forma significativa, o que de certa forma leva a concluir que o costume de se empregar certos objetos na pescaria é transmitido ao longo das gerações, pois os materiais que eram, por exemplo, usados há 60 anos atrás continuam a ser manejados na comunidade. A exceção abrange o espinhel, que passou a ser pouco requisitado devido a sua periculosidade no ato de manusear.

            Para as pessoas da comunidade, a pesca é extremamente influenciada pela natureza. De acordo com eles, quando a lua em está em fase de nova, os peixes encontram-se muito no fundo do rio, devido à falta de luminosidade; na lua crescente o início de uma melhor luminosidade, os peixes começam a subir um pouco mais na superfície; na lua cheia acontece o ápice da pesca, pois a luminosidade é intensa e atrai os peixes; já na minguante os peixes começam a se direcionar para a parte mais funda.

            A partir do que já se conhece sobre saberes tradicionais, verifica-se a importância da transmissão ao longo das gerações. Todos os entrevistados disseram que aprenderam as técnicas da pesca através de familiares ou amigos e que, por isso, não houve nenhuma mudança significativa no manejo da pesca. Assim sendo, o aprendizado da pesca está diretamente relacionado à cultura, haja vista que o fato de aprender comporta relações e conhecimentos que são repassados conforme as práticas, os costumes, crença e valores de cada pescador. Neste sentido, o saber local, enquanto patrimônio de um de uma população inscreve-se como expressão simbólica e material de um determinado grupo social, a partir de seu modo de ser, e ver o mundo no qual estar inserido. Neste sentido, as práticas objetiva e subjetivas tecem e moldam modos de vida ao projetar formas sociais reveladoras de conhecimentos peculiares pertinentes a pesca artesanal.

Considerações Finais

            Constatou-se que a pesca na comunidade pesquisada caracteriza-se como um forte traço na cultura local, por ser atividade praticada essencialmente voltada para a cultura de subsistência. Portanto, espera-se que o reconhecimento do saber tradicional da cultura local, passe a ser considerado como uma contribuição no plano de manejo dos peixes. Também espera-se que esse conhecimento aponte caminhos para outros estudos que possam preservar a cultura pesqueira tradicional. A Constituição Federal, por exemplo, assegura através de seus artigos 215 e 216 que os conhecimentos tradicionais devem ser protegidos como patrimônio cultural brasileiro, garantindo a diversidade e a proteção dos bens e valores culturais.

 

 

Referências Bibliográficas

 

CASTRO, E.Território, biodiversidade e saberes de populações tradicionais. In: Diegues, A.C(org). Etnoconservação: novos rumos para a proteção tópicos. São Paulo: Annablume/NUPAUB/HUCITEC: 2000 p.165-182.

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DIEGUES, A.C; Arruda, R.S.U. Saberes tradicionais e Biodiversidade no Brasil. São Paulo, USP, (Biodiversidade, 4) 2001, p.176

GARCEZ, D.S. &SÁNCHES-BOTERO,J. I. Comunidades de Pescadores artesanais. Atlântica, Rio Grande, 27(1): 17-29, 2005.

MALDONADO, S. 1992. Em dois meios, em dois mundos: a experiência pesqueira marítima. Tese (Doutoramento), UNB.

RUDDLE, K.  2000. Systems of knowledge: dialogue, relationships and process. In Begossi, A. and Hens, L. Environment, development and sustainability. Kluwer Academic Publishers, v. l2, ns3-4.