O crescimento econômico de um país, o combate à pobreza, a eficiência dos meios produtivos e a livre concorrência são afetados pela corrução. A globalização dos mercados e os avanços nas áreas de transporte e telecomunicações, estreitou as relações entre os países e provocou um grande aumento no fluxo de negócios em todo o mundo. Este movimento trouxe para as empresas, especialmente aquelas que operam em mercados globais, a necessidade de produzir com mais eficiência e agilidade. Contudo, também criou ambiente mais favorável à corrupção. Governos e empresas se engajam no compromisso de tentar diminuí-la. Convenções internacionais promovem ações práticas para atingir este propósito. A Convenção da OCDE tem se monstrado a mais eficiente neste propósito. A criação e aplicação de leis anticorrupção e o fomento às práticas de Compliance tem sido uma alternativa viável, mas cheias de desafios. Este trabalho analisa a eficácia das leis anticorrupção em perspectiva comparada. As análises se concentraram no Foreign Corrupt Practice Act (EUA 1977), no UK Bribery Act (Reino Unido 2010) e na Lei brasileira anticorrupção (12.846/13).

INTRODUÇÃO
Corrupção não é necessariamente um tema recente na história dos empreendimentos públicos e privados, nas relações entre empresas e governos, nem mesmo nas relações de negócios interpessoais. O tema certamente possui uma infinidade de estudos tentando conceituar e entender suas razões e suas consequências1. Ao longo dos últimos vinte anos tem se percebido um forte incremento nas regras de controle institucional, de natureza interna e externa, de grandes empresas, especialmente aquelas que têm abrangência transnacional (SPAHN, 2012;), (DESTEFANO, 2014).
Mais recentemente, este movimento tem alcançado também o setor público e as pequenas e médias empresas (independentemente do alcance geográfico de seus negócios). Tal processo se dá muito em função da ocorrência de práticas de corrupção como elemento presente nas relações de negócio estabelecidas pelas empresas com governos e com o próprio setor privado. Estas práticas trazem prejuízo para o livre comercio e para o desempenho econômico e social dos países (ONU, 2001, p.101).
Seguindo a mudança de paradigma econômico, a percepção sobre o problema da corrupção e a necessidade de controlá-la ficaram mais evidentes, especialmente quanto a prática do suborno exercida por empresas frente aos agentes públicos. A competição a que se submetem as empresas privadas pelos mercados consumidores e a necessidade que os países têm da captação de investimentos para financiar seus projetos de desenvolvimento geram uma confluência de interesses. As práticas de suborno poderiam desequilibrar esta relação, favorecendo empresas e governos que ignorassem a boa-fé e a ética nos negócios.
Cuervo-Cazurra (2008) sugere, como uma alternativa a este problema, a internacionalização da introdução de leis contra o suborno. Para o autor, tais leis reduzem os incentivos à corrupção aumentando o custo e o risco incorridos pelas grandes empresas quando se detecta o pagamento de suborno a um funcionário do governo estrangeiro.
Atualmente há leis deste tipo em quase todos os países com relações comerciais internacionais. Os Estados Unidos foram os pioneiros com a promulgação do Foreign Corrupt Practice Act de 1977. Em 2010, o Reino Unido promulgou o seu UK Bribery Act; em 2013, o Brasil promulgou a sua lei especifica sobre o tema: a "lei anticorrupção" (Lei nº. 12.846/13).
Todas elas trazem consigo um arcabouço jurídico no combate à prática do suborno que é baseado em temas como a responsabilização objetiva da pessoa jurídica, responsabilização do agente infrator nas ações comissivas e omissiva e o incentivo à adoção de programas de Compliance pelas empresas. Tais programas são utilizados na iniciativa privada e no setor público como instrumentos mitigadores de condutas ilícitas no ambiente de negócios ou de relações institucionais.
Os programas de Compliance fazem parte de um projeto amplo de governança, e são caracterizados como instrumentos que viabilizam a participação mais democrática na tomada de decisões complexas no contexto regulatório contemporâneo. Para Breier e Carril (2013), as questões de governança e Compliance nas empresas e no setor público já estão inter-relacionadas com questões no âmbito penal, permitindo que empresas, sejam elas públicas ou privadas, possam ser responsabilizas por atos delituosos. Como exemplo, cita-se Espanha, Estados Unidos, Chile e Alemanha que já possuem em seu ordenamento o reconhecimento dos programas de integridade corporativa, de origem privada, para questões penais.
No Brasil, os programas de Compliance circundam programas de prevenção no âmbito administrativos. Tal cenário abre margem para discussões complexas e longas sobre qual caminho o ordenamento jurídico brasileiro tende a seguir.
Dentro da atual realidade político-econômica brasileira, este trabalho se apresenta relevante para expandir a compreensão da sociedade e da comunidade acadêmica ao abordar o significado jurídico e as respectivas consequências da aplicação dos programas de Compliance como instrumentos de combate à corrupção; a sua relevância para o setor privado e sua institucionalização no ordenamento jurídico brasileiro, alcançando as entidades da administração pública.
Este trabalho se propõe a analisar os aspectos dos programas de Compliance como ferramenta de mitigação às práticas de suborno do agente público. Para responder a este objetivo, a pesquisa se propôs a responder Em que medida a institucionalização dos programas de Compliance contribuem efetivamente para o combate à corrupção; como as organizações privadas respondem a esta tendência?; quais os principais mecanismos e instrumentos jurídicos fomentam a criação os programas de Compliance?; apresentar os aspectos positivos já alcançados no Brasil e quais os seus principais desafios à sua plena adoção por empresas privadas e pelo setor público; quais os desafios a serem transpostos e as tendências futuras da legislação anticorrupção no Brasil?
Para o desenvolvimento deste trabalho, adota-se o pressuposto que: os programas de Compliance já são previstos em algumas leis de combate a corrupção no Brasil; a incorporação destes institutos na Lei nº. 12.846/13 é, em tese, um avanço no combate à corrupção, mas ainda é cedo para correlacionar sua vigência com o efetivo filtro contra as condutas ilícitas; as empresas veem se estruturando organizacionalmente para este novo cenário. Todavia, este movimento ainda é percebido somente nas grandes corporações; que as principais motivações para a adoção de sistema de Compliance no setor privado são a manutenção ou a busca pela competitividade nos seus mercados de operações, bem como a adoção das novas regras de relacionamento com o setor público e a preocupação com os danos à reputação a empresa frente aos seus clientes e a possibilidade da responsabilização objetiva por atos e corrupção e seus diretores e demais empregados.
A temática será avaliada da seguinte forma. A segunda parte desenvolve uma abordagem histórica e conceitual sobre a prática do suborno frente aos agentes públicos. Na sequência, é apresentada uma breve revisão bibliográfica sobre os efeitos mais visíveis da corrupção sobre as sociedades em geral. Avalia-se os efeitos da corrupção no âmbito dos negócios privados e suas relações entre empresas e o setor público. Também se identifica os principais agentes de fomento contra as práticas de corrupção; quais mecanismos de ordem administrativa e jurídica são utilizados para o combate ostensivo à corrupção; qual o reflexo destes mecanismos na ordem jurídica e cada nação tomada como exemplo neste estudo.
Na segunda parte, a abordagem foca na conceituação dos programas de Compliance, os seus elementos motivadores e sua gênese, os seus modelos ou roteiros de implantação; se há diferentes modelos aplicáveis às relações jurídicas entre o setor público e o setor privado; quais os impactos esperados no setor público.
Por fim, a terceira parte, faz uma análise comparativa entre as legislações anti-suborno dos EUA, do Reino Unido e do Brasil. Primeiramente se apresenta as características conjunturais, jurídicas e processuais de cada legislação. Em seguida, é apresentada uma análise comparativa mostrando as convergência e divergências de cada legislação frente aos sistemas de Compliance aplicados no combate à corrupção de agentes públicos.