Como os Direitos se tornaram Humanos?
Antes do século 20, o que hoje se entende por direitos humanos era, em geral, chamado de direitos naturais. Como bem afirma o professor universitário Renato Janini Ribeiro; "O inglês nascido livre ou livre por nascença" (Freeborn englishman). Haveria uma série de direitos que o inglês teria só por nascer. É o que explica o termo "Diretos Naturais". Natural é que se tem por nascença. Direitos Naturais são os que tem antes de qualquer decisão governamental ou política, sem que haja necessidade da autorização do Estado ou de quem quer que seja."
Em 1689 sua primeira formulação constitucional está na declaração de direitos ingleses, a Bill of Rights (declaração dos direitos ? Bill em inglês é mais ou menos o que chamamos de projeto de Lei, antes de ser sancionado pelo Executivo), proclamada em 1689. Entre seus avanços está a extinção do "direito divino dos reis" e a limitação dos direitos do trono: ??É ilegal o poder de suspender as leis, pela autoridade real, sem a autorização do Parlamento".
Isso quer dizer que os direitos existem e vigoram, não porque um rei ? ou mesmo Assembléia ? quis, mas porque naturalmente todos os humanos têm tais direitos.
Apesar dos avanços, o texto proclama "os antigos e indubitáveis direitos e liberdade do povo deste reino", isto é, universaliza os direitos naturais apenas aos cidadãos ingleses.
Em 1789 a universalização dos direitos acontece durante a Revolução Francesa quando a Assembléia Nacional francesa declara os direitos do Homem e do Cidadão, válida para todos os indivíduos. "Tendo em vista que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos governos, (os representantes do povo francês) resolveram declarar solenemente os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem". Os diretos agora são da humanidade inteira, não só um único povo, como era visto na Inglaterra.
Em 1791 o passo seguinte encontra-se na primeira emenda à Constituição americana, ratificada em 1791, que determina com clareza os limites do Estado e define os campos aos quais deve se estender a liberdade de todos os cidadãos: "O Congresso não legislará no sentido de estabelecer uma religião, ou proibindo o livre exercício dos cultos; ou cerceando a liberdade de palavra, ou de imprensa, ou o direito do povo de se reunir pacificamente, e de dirigir ao governo petições para a reparação de seus agravos".
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, elaborada durante dois anos, foi pontuada por desacordos entre países comunistas e capitalistas até ser aprovada, em 10 de dezembro de 1948, em Paris. A aprovação aconteceu na 3ª Sessão da Assembléia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), Presidida por Herbert Evah. Na época, o organismo reunia 58 países. Hoje conta com 192 Estados-Membros o que nos reflete uma consciência maior em relação ao assunto no mundo.
Segundo texto da Folha de São Paulo, edição de 3 de dezembro de 1998, até o último dia a Declaração foi objeto de batalhas. Os soviéticos (extinção da União Soviética em 1991) classificavam a Declaração insatisfatória e incentivavam outros países a fazerem o mesmo.
O levante só não foi adiante devido à ação da presidente da Comissão de Direitos Humanos, Anna Eleonor Rosevelt (1884-1962). Ex-primeira-dama dos Estados Unidos, ela foi indicada representante norte-americana na ONU em 1945 e atingiu o cargo de coordenadora da Declaração em 1946.
Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo estava dividido em dois blocos: de um lado, capitalistas, de outro, comunistas. Em 1946, quando a ONU começou-se a formar a Comissão dos Direitos Humanos, foi decidido que teria 18 membros, isso em 1947.
Haviam grupos, subdivididos em três partes, um subgrupo para criação do texto, um para métodos de implantação e outro para dados de apoio.
Pronto e estudado o texto, foram realizadas cópias e enviadas para sugestões de alteração.
Algumas partes foram reescritas até a aprovação final. Houve polêmicas. O primeiro artigo diz que "todos os seres humanos nascem livres e em igualdade de direitos". Originalmente a palavra utilizada era "men" ? homem em inglês, mas os EUA eram contra. Queriam trocar por "human being" ? ser humano. Conseguiram. E, ao meu ver, termo melhor empregado.
A China implicou com o texto original do artigo 2 ? "Todo homem tem capacidade para gozar as liberdades (...) sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua (...) ? porque colocava a palavra "cor" antes da palavra "raça" . os chineses entendiam que o parágrafo listava uma ordem decrescente de importância. Para eles a ordem certa era "raça" e depois "cor", como acabou ficando.
A antiga URSS queria incluir a palavra propriedade na lista, mas se contentou com a palavra riqueza.
O Reino Unido apresentou veto as mulheres terem direito à salários iguais aos do homem, alegando que os homens deveriam ganhar mais para poderem sustentar suas mulheres donas de casa. Reflexo da discriminação e atitude machista da época. Ainda existe diferenças entre homens e mulheres em alguns países, portanto, ainda há trabalhos pela igualdade.
Até a igreja Católica pressionou a ONU, pedindo para incluir Deus na Declaração.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos nasceu como uma resposta de profundo conteúdo humanista às atrocidades inéditas cometidas durante a Segunda Grande Guerra Mundial (1939-1945). Na essência, é um hino à vida, à liberdade e a padrões consagrados de justiça, exatamente os itens que mais foram violados durante a guerra. Ou, posto de outra forma, são os direitos humanos fundamentais, aos quais foram se somando, nessas décadas, uma série de outros ? sociais, de defesa de minorias, ambientais e assim por diante.
Os Direitos Humanos estão acima de qualquer poder do Estado. Por isso, é um idéia antipositivista. O positivismo jurídico é aquele, do qual dispõe a tese de que uma lei vale porque foi decretada, imposta ou afirmada pela autoridade legítima. Então, com isso, só haveria direitos ou obrigações com base em poder. Mas a tese dos Direitos Humanos supõe, juntamente, que acima de qualquer Poder existente já vigem direitos inegáveis e irredutíveis.
Toma-se, portanto, uma conclusão lógica: os governos não podem violar tais direitos impunemente, e, caso o venha fazer, devem pagar por isso. Necessário assim de uma jurisdição supranacional que julgue e puna os criminosos.
Mas o importante não são as limitações dessas declarações, e sim, suas potencialidades. Nos últimos três séculos, uma consciência de direitos aumentou, limitando o poder. Os direitos se ampliam, incluindo os direitos sociais, que se distinguem da "primeira geração" de direitos por beneficiarem grupos e não indivíduos, trabalhadores e não proprietários.
E recentemente surgiram os direitos difusos, dos quais são os relativos ao meio ambiente. Podendo até ser irônico, porque o direito ao ar puro protege até aos poluidores, pois precisam para viver, da mesma atmosfera que estão degradando.
Quando defendendo uma espécie em extinção, o fundamento aceito por diversos juristas é de que, pode ser o arremate dos direitos humanos seja, além do homem, uma declaração de direitos dos animais e até da natureza. E atinge o homem diretamente, pois é de interesse do próprio homem manter um ambiente equilibrado e biodiversificado.
Acredito que estamos caminhando para à promoção da igualdade da pessoa humana. Se todos fossem integramente respeitados, seria algo como o paraíso na Terra.