Acordei bem cedo...pequei minha calopsita na gaiola, que estava lá se matando de resmungar, para amolecer o coração de uma boa alma que lhe desse atenção...voltei a me deitar, com ela em cima de meu braço...a princípio, ficou meio ressabiada com o escuro, mas depois se acalmou e ficou lá, próxima ao meu rosto, e em silêncio...ambas cochilando...e mais uma vez, o silêncio...observando aquele instante, fiquei idealizando o quanto seria agradável se as relações humanas fossem assim...se cada ser tivesse uma individualidade que tornasse tão impossível qualquer diálogo, ao ponto de ninguém tentar se comunicar...pois, oq me incomoda hj não é a comunicação, mas sempre suas tentativas mal sucedidas...cada vez menos, me faço entender com minhas palavras diante das pessoas...e quando poupo a mim e aos demais estando em silêncio, enxergam meu silêncio como a comunicação de coisas que nunca quis dizer...especulam...menos a Poli, minha calopsita..ela não parece especular..as vezes, me bica quando lhe convém, as vezes passa levemente seu bico sobre meu rosto, ou abaixa a cabecinha para que eu acaricie suas penas..como se não houvesse memória, ou continuidade, ou comunicação que possa ser incompleta, já que são apenas instantes completos em si, e nada mais...

Agora, sobre a coletividade...sim sim...percebo que é impossível estar em grupo, e não esperar nada dos outros, e vice-versa...as expectativas que imperam nesses envolvimentos grupais, são sempre sufocantes demais pra mim...então, talvez eu deva me mudar para um viveiro de calopsitas, onde ninguém vai se incomodar com meu silêncio, e se eu falar demais, tbm será só mais um som desconhecido entre os assobios e canções desses pássaros...e nada representará nada, as palavras não teriam peso algum...não consigo assistir "o náufrago", sem morrer de inveja do maldito tom hanks, ali sozinho naquela ilha....podendo gritar qualquer coisa, ser qualquer coisa que puder ser...se eu não posso ser tudo oq possa ser, tem algo de errado....ou não? Isso é tão indiferente, que chegam a ser patéticas minhas "reinvindicações"...

Só sei que, cada vez mais sinto prazer em me calar...a menos que queira atingir fatalmente alguns, com as grosserias que potencialmente posso dizer quando quero ferir, e me satisfaz tanto em meu orgulho de mulher verbalmente super-defensiva e idiota....

Hoje eu me permito o silêncio, só o silêncio...e que se foda...