São seis horas da manhã e é preciso levantar, preparar-se para o novo dia. O sol já banhou as vidraças, lambeu as paredes, iluminou a copa das árvores.

            Vou saindo, devagarinho, enchendo os olhos de puro embevecimento. Olho o lilás do “véu de viúva, as flores da quaresma, o rosa das três marias... Um beija-flor vem afagar as estrelizas. Um pardal atrevido voa rasante sobre a água da piscina, bebericando.

            Paro diante do portão e vou apertando sem vontade o controle remoto. Um perfume se espraia pelo ar e fica maior a vontade de quedar-me diante dos meus tesouros. Meu jardim é meu reino e guardo ali minhas riquezas. Alongo o olhar preguiçoso e me deslumbro diante das orquídeas que se abriram com o orvalho da noite. Lindas!

            Ao passar pelo pessegueiro copado, vejo um fruto exibindo-se ao sol. É o primeiro. Enterneço-me diante dele. É um bebê se desenvolvendo, é a vida retomando seu curso.

            Incrível o que faz a chegada da estação das flores. Tudo fica mais bonito, há cores e odores, o céu é mais azul, a vida tem mais atrativos. É uma época em que ocorre o florescimento de várias espécies de plantas. É o período em que a natureza fica ainda mais bela, presenteando o ser humano com flores coloridas e perfumadas. A função deste florescimento é o início da época de reprodução de muitas espécies de árvores e plantas.

            Tudo parece renascer, árvores, plantas, flores e também as pessoas. Depois de muitas chuvas, frios por volta dos três ou quatro graus, a temperatura amena faz com que se guarde os agasalhos pesados e escuros, em tons terrosos, e se mostrem roupas mais leves, coloridos, estampas, lenços, echarpes esvoaçantes. Somos borboletas saindo do casulo.

            Assim na vida. Depois de passarmos por períodos em que parece que não conseguiremos carregar a carga pesada demais, entramos em um outro em que tudo fica diferente, para melhor. Aí percebemos a mão DELE. Deus não nos põe à prova se não pudermos suportar. Como diz o dito popular: Deus dá o frio conforme a coberta.

            É bem verdade que não podemos por toda a responsabilidade NELE. Muitas e muitas vezes, pagamos o preço por escolhas mal feitas, opções erradas, decisões nada sábias. Isso se chama livre arbítrio. Nós temos esse direito, o de enveredar por caminhos resultantes das nossas próprias atitudes.

            Também temos o direito de retornar, de começar de novo, de renascer. Somos frutos de estações, não climáticas, mas espirituais, da alma. E, devemos, sabiamente, fazer dos erros lições para o futuro. Aí, plagiamos o poeta: “Tudo vale a pena se a alma não é pequena.” (Fernando Pessoa).