CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR COMO CAUSAS EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE POR FATO DO PRODUTO E DO SERVIÇO: o âmbito de incidência do caso fortuito e força maior no direito do consumidor

 

Yure Rezek

Julio Ferreira[1]

Roberto Almeida²

RESUMO

Há algum tempo que vivemos em uma sociedade de consumo, contempla-se a ideia que nas relações cotidianas, vez que o homem contrata a todo o momento, existe a necessidade de tutelar o consumidor fazendo-se respeitar a sua dignidade, segurança e saúde. No entanto, nem todas às vezes a responsabilidade cairá sobre o fornecedor, parte mais forte da relação consumerista, pois existem as hipóteses de exclusão de responsabilidade. O paper trabalhado visa explorar os institutos do CDC que implicam na responsabilização civil, prima-se por explorar a responsabilização do fato do produto e do serviço, bem como os casos que excluem essa responsabilidade, além de questionar se existe aplicabilidade do caso fortuito e força maior como excludente de responsabilidade no Código de Defesa do Consumidor.

Palavras-chave: responsabilidade do fato do produto e do serviço; excludente de responsabilidade; caso fortuito e força maior.

INTRODUÇÃO

Diante das inúmeras transformações nas relações de consumo ao longo do tempo, principalmente devido à produção em massa fruto da revolução industrial, houve a necessidade de criar um Código de Defesa do Consumidor que abrangesse de forma satisfatória todas as relações entre consumidor e fornecedor. O fornecedor, agora visto como pólo mais forte e capacitado, tem o dever de zelar em prol do consumidor. A segurança, a saúde, a dignidade do consumidor, antes não contempladas nas relações de consumo, transformaram-se em direitos assegurados pela própria Constituição Federal. Contudo, assim como existem hipóteses de responsabilização do fornecedor por infringir tais direitos, também existem hipóteses que excluem a responsabilidade deste. Neste sentido, o presente trabalho tem por objeto o estudo da aplicabilidade do caso fortuito e força maior como umas das causas excludentes de responsabilidade civil decorrente de fato do produto e do serviço. Aqui, busca-se demonstrar a importância desses institutos criados pelo Código de Defesa do Consumidor, abordando seus conceitos e suas peculiaridades com fim de aumentar a gama de conhecimento e contribuir de forma eficaz para um maior entendimento sobre o assunto.

 

  1. RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO E DO SERVIÇO

Antes de tudo é necessário analisarmos quais são os tipos de responsabilidade adotados pelo CDC (Código de Defesa do Consumidor). O CDC traz a responsabilidade pelo fato do produto e serviço e a responsabilidade pelo vício do produto e serviço. A responsabilidade do fato é disciplinada nos artigos 12 a 17, e a responsabilidade do vício esta contida nos artigos 18 a 25.

A responsabilidade do fato do produto e serviço corresponde aos riscos que o produto e serviço podem trazer à segurança do consumidor, podendo causar um evento danoso, intitulado “acidente de consumo”. Já a responsabilidade pelo vício do produto e serviço diz respeito aos vícios de adequação, ou seja, o vício é identificado quando da utilização ou fruição do produto ou serviço. (GARCIA, 2012, p. 135)

Para exemplificar Leonardo Medeiros cita a compra de um aparelho de som que não funciona, tendo, portanto, um vício de adequação. Veja que nesse caso o prejuízo é intrínseco. Mas se o aparelho de som, devido a um curto circuito, pega fogo e causa danos às pessoas, tem-se acidente de consumo, gerando responsabilidade do fato, pois o prejuízo, neste caso, é extrínseco ao produto.

É importante citar a diferença trazida pela doutrina a respeito do vício e o defeito. O vício torna inadequado o uso do produto ou serviço, sendo algo intrínseco e não atingindo o consumidor, diferente do que ocorre com o defeito. Há vício sem defeito, mas não há defeito sem vício. O defeito gera um dano ao consumidor ou a outras pessoas. (NUNES, 2005, p. 167)

A responsabilidade pelo fato do produto determina que o responsável pelo defeito do produto ou serviço é o fornecedor, independente de culpa, existindo assim a responsabilidade objetiva do fornecedor, exceção feita à responsabilidade pelo fato do serviço do profissional liberal (art. 14, parágrafo 4 do CDC). E ainda, para configurar a responsabilidade pelo fato do produto e do serviço necessita-se de alguns pressupostos como: conduta-ato, defeito, resultado danoso e nexo causal.

Para Leonardo Medeiros Garcia (2012, p. 141);

A responsabilidade, portanto, do fabricante, produtor, construtor e do importador ocorrerá independentemente da investigação de culpa (responsabilidade objetiva), ou seja, será desnecessária a averiguação de negligência, imperícia ou imprudência, sendo suficiente que o consumidor demonstre o dano ocorrido (acidente de consumo) e a relação de causalidade entre o dano e o produto adquirido (nexo causal).

A responsabilidade objetiva esta no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil que diz que haverá obrigação de reparar o dano independente de culpa, nos casos especificados em lei. Há também responsabilidade objetiva quando a natureza da atividade do fornecedor implicar risco para os direitos das pessoas. O CDC adotou a teoria da atividade em relação à responsabilidade objetiva, visto que existem exceções a cerca da responsabilidade do fornecedor (art. 12, parágrafo 3). A outra teoria é a do risco integral, onde não é levado em consideração o nexo causal. O dever de indenizar é identificado apenas com o dano mesmo com culpa exclusiva do consumidor, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior. (VENOSA, 2007, p. 15)

Ainda tratando da responsabilidade objetiva, não importa, para o CDC, a divisão civil entre responsabilidade contratual e extracontratual, importando apenas a existência de relação jurídica de consumo a ser pautada por vícios de qualidade-segurança e qualidade-adequação. Há a chamada teoria unitária da responsabilidade civil, personificada na teoria da qualidade, onde o fornecedor tem o dever de ter qualidade na sua atividade, baseando-se no princípio da proteção à confiança. (GARCIA, 2012, p. 138)

Portanto fica claro que a responsabilidade seguida pelo CDC foi a do risco da atividade, no qual o nexo de causalidade é importantíssimo na averiguação da responsabilidade do fornecedor. Analisando o parágrafo 3, artigo 12 do CDC, vemos que o fornecedor pode argumentar, para livrar-se da responsabilidade, que não colocou o produto no mercado. O fornecedor pode alegar também que o dano foi causado por culpa exclusiva do consumidor ou que o dano não existe.

Veja que nos casos supracitados não há nexo de causalidade entre a conduta do fornecedor e o dano causado pelo produto ou serviço, provando a não adoção do risco integral. Sem o nexo de causalidade entre a conduta do fornecedor e o dano causado ao consumidor não há como responsabilizar objetivamente o fornecedor. Importante citar que o ônus de provar que o produto não tem defeito, ou que o produto não foi posto em circulação, é do fornecedor conforme o artigo 6 do CDC.

O CDC não traz como excludente de responsabilidade pelo fato do produto ou serviço o caso fortuito e a força maior, causando grande discussão na doutrina consumerista a respeito destes institutos. Alguns doutrinadores não admitem a força maior e o caso fortuito como excludentes de responsabilidade civil, pois a dicção do dispositivo legal diz que “só não será responsabilizado”, considerando, portanto, como um rol taxativo. Outros doutrinadores admitem a força maior e o caso fortuito, pois com esses institutos há uma quebra do nexo de causalidade. Tal celeuma será analisada com mais vagar em capítulo especial.

 

  1. CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR

O caso fortuito e a força maior estão disciplinados no artigo 393 do Código Civil, verificando-se ambos quando os efeitos de um fato necessário não puderem ser evitados ou impedidos. Para Silvio Rodrigues (2007, p. 174.) “é, em rigor, o ato alheio à vontade das partes contratantes ou do agente causador do dano e que tampouco derivou da negligência, imprudência ou imperícia daquelas ou deste”. Veja que o caso fortuito e a força maior são, portanto, excludente de responsabilidade civil, pois põe fim a relação de causalidade entre a conduta do fornecedor e o dano sofrido pelo consumidor.

A doutrina não é pacífica na definição de caso fortuito e força maior. Para alguns doutrinadores a distinção entre os dois institutos é inútil no campo prático. Contudo nós iremos diferenciar os dois institutos para melhor compreendermos. O caso fortuito decorreria das forças da natureza, enquanto a força maior viria de atos humanos como guerras. De todo modo a força maior e o caso fortuito devem ser estranhos a vontade das partes, inexistindo culpa, pondo fim, portanto, ao nexo causal. (VENOSA, 2007, p. 48-49)

O conceito dos dois institutos sempre gira em torno da imprevisibilidade e inevitabilidade, juntamente com a falta de culpa. Importante analisarmos as teorias a respeito do caso fortuito. Existem duas teorias. A primeira teoria é o fortuito interno, sendo fato imprevisível e inevitável, que tem relação com a organização da empresa. Cavalieri Filho cita exemplos de fortuito interno como o estouro do pneu de um ônibus, o incêndio do veículo etc., pois são ligados a organização da empresa. Por isso o fortuito interno não configuraria excludente de responsabilidade. Há um nexo de causalidade entre o fato fortuito, a empresa e o dano causado ao consumidor. (CAVALIERI FILHO, 2005, p. 322)

A outra teoria é do fortuito externo onde o fato imprevisível e inevitável é estranho à organização da empresa, não tendo nenhuma ligação com a atividade do fornecedor, isto é, o fortuito externo rompe com o nexo de causalidade entre a conduta do fornecedor, o fato e o dano causado ao consumidor. Veja que aqui o fato fortuito é completamente desconexo com a atividade do fornecedor. Tal entendimento se mostra contrário ao CC, pois, como já visto, em seu artigo 393, o caso fortuito é excludente de responsabilidade, inexistindo tal diferenciação para a aferição de responsabilidade. (GARCIA, 2012, p. 146-147)

 

  1. 3.      INCIDÊNCIA DO CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR NO CDC COMO EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE POR FATO DO PRODUTO E DO SERVIÇO;

Antes do surgimento do Código de Defesa do Consumidor não havia legislação eficiente para proteger os consumidores contra os riscos do consumo. Estes riscos corriam por conta do consumidor, porquanto o fornecedor só respondia no caso de dolo ou culpa, cuja prova era praticamente impossível. Era uma verdadeira aventura do consumo, pois o consumidor ao adquirir determinado produto tinha que assumir os riscos deste. Com o advento do Código de Defesa do Consumidor, ocorreu a transferência dos riscos do consumo do consumidor para o fornecedor. O Código estabeleceu a responsabilidade objetiva para os casos de acidente de consumo, quer decorrentes do fato do produto, quer decorrentes do fato do serviço. (CAVALIERI FILHO, 2008, p. 475)

Deste modo, com a produção e o consumo em massa houve a necessidade de responsabilizar aqueles que descumpriam as normas protetivas dos consumidores, criando as seguintes sanções: a) civil, envolvendo a responsabilidade dos fornecedores perante os consumidores por danos decorrentes da nocividade ou periculosidade dos produtos ou serviços; b) administrativa, envolvendo a responsabilidade perante a administração federal, estadual ou municipal, pelo descumprimento de deveres previstos em normas legais ou regulamentares; e c) penal, envolvendo a responsabilidade dos fornecedores perante a justiça pública, pela prática de ilícitos penais. (DENARI, 2007, p. 171)

A sanção civil, a que nos interessa neste caso, refere-se à chamada responsabilização civil presente no direito do consumidor, esta foi criada no intuito de dar uma maior proteção ao consumidor, pois o fornecedor deve se responsabilizar pelo produto ou serviço que coloca no mercado. Para Zelmo Denari (2007, p. 182) “a colocação de bens ou serviços no mercado de consumo a cargo dos fornecedores suscita a relação de responsabilidade”. Portanto, como exposto anteriormente, os fornecedores respondem pela reparação dos danos causados aos consumidores, independente da existência de culpa, ou seja, acolheu-se a responsabilidade objetiva para o instituto da responsabilidade por fato do produto ou do serviço.

Neste contexto, segunda a doutrina de Sergio Cavalieri Filho, foi adotada a teoria do risco da atividade;

Todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder por eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços. O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos. (CAVALIERI FILHO, 2008, p. 275-276)

Ocorre que, mesmo na responsabilidade objetiva, prevista na responsabilidade do fato do produto e do serviço, é indispensável o nexo de causalidade para que ocorra a sanção ao fornecedor, pois inexistindo relação causa e efeito acontecerá à exoneração dessa responsabilidade.

O próprio Código de Defesa do Consumidor estabeleceu hipóteses que mitigam a responsabilidade por fato do produto e do serviço, cujo fundamento, na maior parte delas, é a inexistência do nexo causal, são as denominadas “causas excludentes de responsabilidade”.

As causas excludentes de responsabilidade estão previstas no artigo 12, parágrafo 3°, in verbis:

Art. 12, §3° - O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

I- que não colocou o produto no mercado;

II- que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste; e

III- a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Ao analisar este artigo percebe-se que em regra, são situações que afastam o nexo de causalidade, mas podendo também ser reconhecida por meio do afastamento de outros elementos de configuração da responsabilidade civil, razão pela qual se inadmite a responsabilidade do fornecedor. A existência do defeito, ou seja, o dano no consumidor, por si só, não caracteriza a responsabilidade do fornecedor, haja vista que se precisa de todos os pressupostos da responsabilidade por fato do produto ou do serviço: conduta-ato, dano, defeito, nexo causal, etc.

Outro fato notável e de enorme relevância é que o legislador não dispõe sobre o caso fortuito ou força maior entre as causas excludentes da responsabilidade pelo fato do produto e do serviço. O caso fortuito e a força maior estão previstas no Código Civil como eximentes da responsabilidade, no entanto não está expressamente prevista no CDC. Os conceitos de caso fortuito e força maior tem assentada aplicação tanto no Direito Civil quanto no Direito Penal como causas excludentes de responsabilidade. Entretanto, o legislador pátrio, ao tratar da responsabilização por fato do produto e do serviço, não incluiu tais institutos no Código de Defesa do Consumidor.

Daí decorre a afirmativa de alguns doutrinadores de que o Código do Consumidor adota a responsabilidade objetiva nos moldes da teoria do risco integral, isto é, segundo o conceito de Rui Stocco (2007, p. 160) é uma teoria pela qual qualquer fato culposo ou não culposo impõe ao agente o dever de reparar, desde que identificado um dano efetivo, ainda que inexistente o nexo causal, ficando afastada a ideia de culpa, mostrando-se desimportantes as circunstancias em que o dano se verificou.

Por ter adotado esta linha, segundo alguns autores, não se admitiria quaisquer causas excludentes de responsabilidade, senão as expressamente elencadas no próprio código. Neste raciocínio, alguns chegam a negar a ocorrência de caso fortuito e força maior nas relações consumeristas. Luis Antônio Rizzatto Nunes (2008, p. 284-285), por exemplo, afirma que a responsabilidade prevista no CDC, não só é puramente baseada no risco integral, como também não admite causas excludentes de responsabilidade. Segundo o autor, o CDC admite apenas as causas excludentes de nexo causal prevista na própria lei. Ele chama a atenção para o fato de o legislador ter utilizado o advérbio “só” ao citar as causas excludentes de responsabilidade (§3º do artigo 12). Assim, por óbvio, defende que o legislador não recepcionou o caso fortuito e força maior no CDC.

Por outro lado, Otávio Braz Ribeiro Junior (2012, p. 2), entende que as opiniões desses autores de não admitir o caso fortuito nas relações consumeristas decorre, dentre outras justificativas, de uma interpretação fundamentalmente gramatical da legislação. Contudo, tal entendimento, na prática, poderia levar à imputação de responsabilidade àquele que não tem sua atividade ligada ao resultado danoso. Sendo assim, poder-se-ia tornar prescindível um dos elementos mais importantes da responsabilidade civil que é o nexo causal. Com isso, existem outros doutrinadores que defendem a tese de admitir outras causas excludentes de responsabilidade como o caso fortuito e a força maior, pois analisando o nexo causal poderemos auferir se corresponde a um caso de excludente de responsabilidade ou não, além de que esta corresponde à teoria da atividade no qual fundamenta o CDC, sendo imprescindível a presença do requisito de nexo de causalidade.

Assim, a doutrina criou no sentido de dar solução ao problema, os conceitos de caso fortuito externo e interno. A doutrina se ateu apenas ao caso fortuito não mencionando a força maior, pois grande parte dos autores entende que existem muitas semelhanças entre estes institutos.

Estes conceitos já exposto no capítulo anterior são imprescindíveis para a inclusão do caso fortuito e força maior no CDC, no entanto, vale relembrá-los. Para Sergio Cavalieri Filho (2008, p. 490) fortuito interno seria entendido como o fato imprevisível e, por isso, inevitável ocorrido no momento da fabricação do produto ou da realização do serviço, não excluindo a responsabilidade do fornecedor porque faz parte da sua atividade, liga-se aos riscos do empreendimento, submetendo-se à noção geral de defeito de concepção do produto ou de formulação do serviço. Se o defeito ocorreu antes da introdução do produto no mercado de consumo ou durante a prestação de serviço, não importa saber o motivo que determinou o defeito, o fornecedor seria sempre responsável. No que diz respeito ao fortuito externo, seria aquele fato que não guarda nenhuma relação com a atividade do fornecedor, absolutamente estranho ao produto ou serviço, via de regra ocorrido em momento posterior ao da sua fabricação ou formulação. Aqui, não se vislumbra o nexo de causalidade, excluindo-se, portanto, a responsabilidade do fornecedor.

 Partindo do conceito de caso fortuito apresentado, a questão se torna simples, pois se comprovar a incidência do caso fortuito ou força maior no momento da fabricação ou no momento anterior, a responsabilidade, sem dúvida alguma, se causar algum dano ao consumidor, será do fornecedor, ou seja, estará presente o nexo causal de colocar o produto no mercado de consumo causando o dano ao consumidor. Só não ocorrerá esta hipótese se a situação narrada incidir em alguma outra excludente de responsabilidade prevista no CDC. Por outro lado, se o fornecedor colocar o produto no mercado de consumo e, posteriormente, ocorrer uma situação de caso fortuito ou força maior causando dano ao consumidor, ele não será responsabilizado pelo falta de nexo causal entre a fabricação e o dano.

Desse modo, é impossível negar a incidência do caso fortuito e força maior como causas excludentes de responsabilidade, assim se posiciona a doutrina dominante e a jurisprudência do STJ, reconhecendo a aplicação do caso fortuito e força maior no CDC neste sentido.

  1. 4.      COMO O FORNECEDOR E O CONSUMIDOR DEVEM PROCEDER NO CASO DE INCIDÊNCIA DO CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR NO QUE DIZ RESPEITO À RESPONSABILIDADE POR FATO DO PRODUTO E DO SERVIÇO

Zelmo Denari (2007, p. 199) diz que a doutrina mais atualizada já advertiu que esses acontecimentos, ditados por forças físicas da natureza, ou que, de qualquer forma, escapam ao controle do homem, tanto podem ocorrer antes como depois da introdução do produto no mercado de consumo, incidindo ou não a responsabilidade do fornecedor no que diz respeito ao fato do produto ou do serviço. A razão é bastante simples, pois até o momento em que o produto ingressa formalmente no mercado de consumo tem o fornecedor o dever de garantir que os produtos não sofra qualquer tipo de alteração que possa torná-lo defeituoso, oferecendo riscos à saúde e segurança do consumidor. Por outro lado, quando o caso fortuito e a força maior se manifesta após a introdução do produto no mercado de consumo, ocorre uma ruptura do nexo de causalidade que liga o defeito ao evento danoso. Não tem cabimento qualquer alusão ao defeito do produto, uma vez que aqueles acontecimentos, na maior parte das vezes são imprevisíveis, criam obstáculos de tal monta que a boa vontade do fornecedor não pode suprir. Na verdade, diante do impacto do acontecimento, a vítima, ora consumidora, sequer pode alegar que o produto se ressentia de defeito, vale dizer, fica afastada a responsabilidade do fornecedor pela inocorrência dos respectivos pressupostos já abordados.

João Batista de Almeida (2008 p. 94) acrescenta que não teria sentido algum, por exemplo, responsabilizar o fornecedor de um eletrodoméstico se um raio faz explodir o aparelho, e, em consequência, causa incêndio e danos aos moradores. Inexistia nexo de causalidade a ligar eventual defeito do aparelho ao evento danoso.

A dificuldade seria deduzir o momento em que o produto entra no mercado de consumo, pois este seria o momento fundamental para que o consumidor possa tomar alguma providencia.

Segundo Sergio Cavaliere Filho (2008, p. 486), como o código não tem nenhuma regra estabelecendo o momento a partir do quase se considera o produto introduzido no mercado, caberá essa tarefa a jurisprudência, em face dos casos concretos, com os subsídios colhidos na doutrina nacional e estrangeira. Para ele, será a partir do momento em que o produto é remetido ao distribuidor, ainda que a título experimental, de propaganda ou de teste.

Portanto, o consumidor deve se atentar para o momento em que o produto é colocado no mercado para buscar seus direitos, mas sempre lembrando que é parte vulnerável da relação e o ônus da prova é do fornecedor, devendo este provar que não teve nenhuma relação com dano causado ao consumidor para se eximir da responsabilidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente paper mostrou a responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor, abordando o tema da responsabilidade civil pelo fato do produto e do serviço, também conhecida como acidente de consumo. Foi observado que tal responsabilidade adota a teoria objetiva da responsabilidade civil, ou seja, ao se falar em relação de consumo foge-se à regra do Código Civil que exige o elemento culpa para que haja a reparação do dano causado, por isso, deve-se entender que uma obrigação ao nascer de uma relação de consumo, é aplicado o Código de Defesa do Consumidor, independente de haver celebração contratual ou não. Observou-se que sempre quando o produto contiver defeito e causar dano ao consumidor ocorrerá um acidente de consumo, devendo haver um nexo de causalidade entre o defeito e o dano, sendo que tal defeito está violando o dever de segurança colocando o consumidor em risco, podendo até mesmo causar dano à sua integridade física ou moral e à sua saúde. Neste sentido, aplicaram-se os conceitos de caso fortuito e força maior no CDC, precisamente, como uma causa excludente de responsabilidade do fato do produto e do serviço, pois na ocorrência deste, se houver nexo de causalidade da conduta do fornecedor com o dano causado ao consumidor, poderá ocorrer à responsabilização civil.

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIA

 

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 8 ed. São Paulo:

Atlas, 2008.

DENARI, Zelmo; GRINOVER, Ada Pellegrini; [...]. Defesa do Consumidor: comentados pelos autores do anteprojeto. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.

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JUNIOR RIBEIRO, Otávio Braz. Aplicabilidade do caso fortuito e força maior como causas excludentes de responsabilidade civil decorrente de fato do produto. Goiania, 2012. Disponível em: <http://www.cpgls.ucg.br/7mostra/Artigos/SOCIAIS%20APLICADAS/APLICABILIDADE%20DO%20CASO%20FORTUITO%20E%20FOR%C3%87A%20MAIOR%20COMO%20CAUSAS%20EXCLUDENTES.pdf>. Acesso em: 17 de maio de 2013.

NUNES, Luís Antônio Rizzato. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2005

NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de direito do consumidor: com exercícios. 3. ed.

rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2003.

STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. 7 ed. São Paulo: Atlas, 2007



[1] Alunos do 6º período do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB.

² Professor orientador da disciplina de Direito do Consumidor