SINOPSE DE CASE:

COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS[1]

 

 

 

 

Ícaro Carvalho Gonçalves[2]

Antônio de Moraes Rego[3]

 

SINOPSE DO CASO

 

  1. Descrição do Caso

No dia 20/10/2011, a sociedade limitada ALFA RENT LTDA, sediada na capital do Maranhão, São Luis, formalizou, perante a Secretaria da Receita Federal (SRF), um pedido administrativo de restituição de R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais), ainda pendente em análise. No ano seguinte, em 15/02/2012, a empresa deixou de recolher à mesma secretaria um débito de R$ 250.00,00 (duzentos e cinquenta mil reais), que foi então inscrito em dívida ativa somente em 17/04/2013.

A ALFA RENT LTDA então, se posiciona objetivando promover a compensação do débito com seu crédito ainda pendente de devolução.

 

    1. Descrição dos Personagens Relevantes

  • ALFA RENT LTDA: Sociedade limitada que objetiva alcançar o instituo da compensação tributária

  • SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL: Órgão responsável pela inscrição da dívida ativa no prazo correto.

     

     

    1. Identificação do problema principal

      1.  Nos termos do art. 74 da lei 9.430/06, a compensação, neste caso, seria possível?

    2. Identificação dos problemas secundários

      1. Há direito adquirido á compensação ou aplica-se, na hipótese, o inciso III, do parágrafo 3º do art. 74 da Lei 9430/96?

      2. A restrição trazida pelo art. 17, da Lei nº 10.833/2003, que inseriu o mencionado inciso III, do § 3º do art. 74 da Lei 9430/96, tolhe apenas o direito do contribuinte efetuar a compensação ou também impede que o Fisco, após julgar procedente o pedido de restituição, proceda à compensação de ofício do débito inscrito em dívida ativa, conforme previsto pelo art. 34, da Instrução Normativa nº 600/05?

 

  1. IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

Inicialmente, deve-se discorrer sobre o que se trata a extinção de créditos tributários. A obrigação tributária é formada por três principais elementos: sujeito ativo, sujeito passivo e crédito tributário. Via de regra, a extinção incide sobre a obrigação tributária, e não somente sobre o crédito tributário, que é elemento desta primeira.

As causas extintivas liberam o contribuinte da posição de sujeito passivo em uma relação de sujeição para com a Fazenda Pública. As principais causas de extinção de crédito tributário encontram-se previstas no CTN, no artigo 150. É um rol exemplificativo, sendo que existe construção doutrinária de causas extintivas de crédito tributário.

As causas de extinção previstas no CTN são: pagamento; compensação; transação; remissão; prescrição; decadência; conversão de depósito em renda; pagamento antecipado e homologação do lançamento, nos termos do disposto no art. 150; consignação em pagamento, nos termos do art. 164; decisão administrativa irreformável, que não mais possa ser objeto de ação anulatória; decisão judicial transitada em julgado; dação em pagamento de bens imóveis, na forma e condições estabelecidas na lei.

As causas de extinção construídas pela doutrina são: desaparecimento, sem sucessor, do sujeito passivo do tributo; desaparecimento, sem sucessor, do sujeito ativo do tributo; e, por fim, confusão.

A compensação, objeto principal do tema tratado pelo caso, ocorre quando o fisco e o contribuinte encontrarem-se ambos nas posições de credor e devedor. Ou seja, há embate de contas do contribuinte e do fisco. O contribuinte é ao mesmo tempo credor e devedor do fisco. No âmbito do direito civil, é possível se falar em compensação legal e consensual, que depende da vontade e anuência das partes.

No entanto, no âmbito do direito tributário, apenas é possível a compensação prevista em lei, dependendo de três requisitos para a sua existência:

  • As partes devem ser idênticas. O contribuinte só poderá pedir compensação de crédito federal contra outro crédito do âmbito federal;

  • As quantias dos créditos devem ser líquidas, estar liquidadas no momento do pedido da compensação;

  • É necessária a previsão legal autorizadora da compensação. A doutrina entende que tributos de espécies diferentes podem se compensar, contanto que sejam tributos, enquanto a Lei previa que apenas tributos da mesma espécie possuem essa capacidade. No entanto, desde a alteração do artigo 74 da Lei 9.430/96, pela Lei 10.637/2002, é possível a compensação de tributos de espécies distintas, desde que fossem administrados pela Secretaria da Receita Federal por requerimento do contribuinte :

    O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão.

    § 1o A compensação de que trata o caput será efetuada mediante a entrega,

    pelo sujeito passivo, de declaração na qual constarão informações relativas aos créditos utilizados e aos respectivos débitos compensados

De acordo com o artigo 170 do CTN: 

A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários líquidos e certos, vencidos e vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública

 

  1. DECISÕES POSSÍVEIS

    1. Considerar como não possível a compensação

    2. Considerar como possível a compensação

 

  1. ARGUMENTOS PARA FUNDAMENTAR CADA DECISÃO

    1. Considerando possível a compensação

O art. 74 da lei 9.430/96 veda a utilização de débito já inscrito em dívida ativa como objeto de compensação. No entanto, observa-se que, no caso concreto, a empresa ALFA RENT LTDA formalizou o requerimento, solicitando a restituição, no dia 20/10/2011. A inscrição do débito na dívida ativa apenas ocorreu em 17/04/2013.

Na data da inscrição na dívida ativa, o direito à compensação já havia sido adquirido pela empresa, pois esta já havia formulado pedido de restituição quase dois anos antes. O direito à compensação surge da identificação do indébito tributário, que ocorreu com o requerimento da restituição.

A instrução normativa SRF 600/05, revogada pela IN RFB 900/08, que fora também revogada, pela IN 1300/12, tratava da possibilidade de compensação convertida de pedido de restituição. Na IN 1300/12, vigente na época do surgimento da dívida, pode-se observar em seu artigo 61:

Art. 61. A restituição e o ressarcimento de tributos administrados pela RFB ou a restituição de pagamentos efetuados mediante DARF e GPS cuja receita não seja administrada pela RFB será efetuada depois de verificada a ausência de débitos em nome do sujeito passivo credor perante a Fazenda Nacional.

§ 1º Existindo débito, ainda que consolidado em qualquer modalidade de parcelamento, inclusive de débito já encaminhado para inscrição em Dívida Ativa da União, de natureza tributária ou não, o valor da restituição ou do ressarcimento deverá ser utilizado para quitá-lo, mediante compensação em procedimento de ofício.

§ 1º-A A compensação de ofício de débito parcelado restringe-se aos parcelamentos não garantidos.

§ 2º Previamente à compensação de ofício, deverá ser solicitado ao sujeito passivo que se manifeste quanto ao procedimento no prazo de 15 (quinze) dias, contados do recebimento de comunicação formal enviada pela RFB, sendo o seu silêncio considerado como aquiescência.

§ 3º Na hipótese de o sujeito passivo discordar da compensação de ofício, a autoridade da RFB competente para efetuar a compensação reterá o valor da restituição ou do ressarcimento até que o débito seja liquidado.

§ 4º Havendo concordância do sujeito passivo, expressa ou tácita, quanto à compensação, esta será efetuada.

§ 5º O crédito em favor do sujeito passivo que remanescer do procedimento de ofício de que trata o § 4º ser-lhe-á restituído ou ressarcido.

 

Ou seja, como o pedido de restituição já havia sido formalizado no momento da inscrição do débito na dívida ativa, a restrição trazida pelo artigo 17, da lei nº10.833/03, que alterou o parágrafo 3º do art. 74 da Lei 9.430/96, apenas impede que o contribuinte efetue a compensação com débitos já inscritos na dívida ativa. Porém, o fisco, depois que considerar procedente o requerimento da restituição, poderá, de ofício, realizar a compensação mesmo de crédito que estiver já inscrito na dívida ativa.

 

    1. Considerando como não possível a compensação

Atendo-se ao artigo 74 da Lei 9.430/96:

Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão.(Redação dada pela Lei nº 10.637, de 2002)

[...]

§ 3º Além das hipóteses previstas nas leis específicas de cada tributo ou contribuição, não poderão ser objeto de compensação mediante entrega, pelo sujeito passivo, da declaração referida no § 1º: (Redação dada pela Lei nº 10.833, de 2003)

I - o saldo a restituir apurado na Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda da Pessoa Física;(Incluído pela Lei nº 10.637, de 2002)

II - os débitos relativos a tributos e contribuições devidos no registro da Declaração de Importação. (Incluído pela Lei nº 10.637, de 2002)

III - os débitos relativos a tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal que já tenham sido encaminhados à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional para inscrição em Dívida Ativa da União; (Incluído pela Lei nº 10.833, de 2003)

 

No caso em questão, o crédito que o sujeito passivo pretende utilizar para a compensação de débitos é um crédito passível de restituição, conforme se observa no pedido administrativo de restituição do valor de R$ 400.000,00. Observa-se que créditos passíveis de restituição podem ser utilizados, de fato, como compensação.

No entanto, conforme o inciso III do artigo terceiro, incluído pela Lei nº 10.833/2003, débitos que já foram encaminhados pela Secretaria da Receita Federal para sua inscrição na dívida ativa não podem ser objetos do requerimento de compensação.

No caso em questão, o débito, além de ter sido encaminhado, fora efetivamente inscrito em dívida ativa no dia 17/04/2013, sendo que o pedido de compensação não fora, até esta data, formulado. A partir do momento em que o débito está inscrito em dívida ativa, não se pode mais compensá-lo nem por crédito passível de restituição.

De mesmo modo que o artigo 73 da Lei 9.430/96 formaliza a limitação à compensação, a Instrução Normativa RFB 1300/2012, vigente na época em que a empresa deixou de recolher o débito, em seu artigo 41, expressa:

§ 3º  Não poderão ser objeto de compensação mediante entrega, pelo sujeito passivo, da declaração referida no § 1º:

[...]

III - o débito que já tenha sido encaminhado à PGFN para inscrição em Dívida Ativa da União;

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

 

BRASIL. Instrução Normativa RFB, nº 1300 de 20 de Novembro de 2012. Disponível em <http:// http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/ins/2012/in13002012.htm>. Acesso em 24/09/2014

 

BRASIL. Lei 5.172, 25 out. 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, 27 out. 1966. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.htm>. Acesso em: 24/09/2014

 

BRASIL. Lei de Ajuste Tributário, nº 9.430 de 27 de Dezembro de 1966. Dispõe sobre a legislação tributária federal, as contribuições para a seguridade social, o processo administrativo de consulta e dá outras providências. Disponível em <http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/leis/Ant2001/lei943096.htm>. Acesso em 24/09/2014

 



[1] Tema do Case

[2] Aluno do Oitavo período Vespertino do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB

[3] Prof. Me. Responsável por ministrar a disciplina de Direito Tributário II na UNDB