O escritor e sociólogo Gilberto Freyre (1900-1987), deixou uma obra primorosa para os estudos do Brasil, levando-se em conta suas falhas, contradições e contribuições às Ciências Humanas em geral.

O livro intitulado Casa-grande & senzala (1933) completa 75 anos de existência. Foi traduzido em várias línguas, sendo tema de seminários, cursos e debates em todo o mundo. Mas para entendermos um pouco sobre este livro, é preciso falar um pouco sobre o pernambucano Freyre, filho de proprietário de terras nos arredores de Recife, tendo estudado nos EUA, onde bacharelou-se em Artes Liberais, pela Universidade de Baylor, no Texas. Com o trabalho Social Life in Brazil in the Middle of the 19ht Century, obteve o grau de mestre em Ciências Políticas e Sociais, abordando a temática da escravidão colonial e patriarcalismo.

Em universidades de todo o mundo, seu pensamento continua a servir de base nos estudos referentes à sociologia e história, com ênfase em estudos sobre nordeste e cotidiano. Como disse certa vez Darcy Ribeiro: "É o mais brasileiro dos ensaios que já escrevemos. Creio que poderíamos passar sem qualquer dos nossos ensaios e romances, mas não passaríamos sem este livro".

O marco histórico de uma produção sociológica brasileira surge numa época em que autores privilegiam a glorificação religiosa de personalidades para propagação de informações históricas acríticos.

Casa-grande contribuiu, paradoxalmente, para o "mito da democracia racial", tese bastante refutada atualmente pela produção científica, expõe a união das raças – em particular no nordeste – como uma relação pacífica do sistema colonial português, criticada duramente pela historiografia contemporânea. Este estudo revela uma defesa das tradições lusas advindas com a monocultura do açúcar no nordeste, exaltando a sexualidade do negro e indolência do indígena, somadas ao espírito "empreendedor" do colonizador, debate que já não apresenta sustentação teórica.

Antropólogos como Roberto da Matta, de certa maneira, representam reminiscências desse pensamento. A própria idéia "coisificante" dos sentidos, "predisposição sexual do brasileiro" também instiga uma revisão de tais discursos. Entretanto, a riqueza dos detalhes etnográficos surpreende os interessados nos estudos da cultura referente ao Brasil Colônia.

Escrito de maneira colonial, Casa-grande & senzala também se destacava por lidar com assuntos corriqueiros que não freqüentavam de maneira mais habitual as ciências sociais à época de sua publicação. Entre malefícios, benefícios, críticas, contribuições e interpretações variadas, vale a pena ler este interessante ensaio brasileiro.