BRUNO RICARDO COGAN

Doutorando e Mestre em Processo Penal pela PUC/SP

Delegado de Polícia da Polícia Civil de São Paulo

 

Prevê o artigo 1º, da Lei 13.010, de 26 de junho de 2014, que acresce o artigo 18 - A, ao Estatuto da Criança e do Adolescente -Lei 8.069, de 13 de junho de 1990:

Art. 18-A. A criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los.

Parágrafo único. Para os fins desta Lei, considera-se:

I - castigo físico: ação de natureza disciplinar ou punitiva aplicada com o uso da força física sobre a criança ou o adolescente que resulte em:

a) sofrimento físico; ou

b) lesão;

II - tratamento cruel ou degradante: conduta ou forma cruel de tratamento em relação à criança ou ao adolescente que:

a) humilhe; ou

b) ameace gravemente; ou

c) ridicularize.

Antes de tudo, deve-se perceber que o reductio ad absurdum mostra a impossibilidade de se aceitar a letra seca da lei. Por exemplo, o nascimento mesmo da criança, que consiste na mudança do meio útero para o meio externo, é por si um trauma gravíssimo.

Ainda no furor da socialização da criança, a necessária limitação do dos impulsos, em afronta ao sentimento oceânico, natural, o que gera forte sofrimento psicológico, próprio da adaptação ao meio. Nem por isso é ilegítimo.[1]

Entre outros tantos exemplos, que figuram como meios imperiosos a preparar a criança e o adolescente para a vida adulta, em especial para sobreviver aos traumas e revezes do dia a dia, o dissabor, o querer frustrado, a necessidade de conformação, nota-se que está o preparo para a vida. E isso compete principalmente à família.

Quer a Lei proibir qualquer sofrimento, físico ou mental. O primeiro pela proibição de lesionar ou provocar sofrimento físico. O segundo pela vedação de humilhar, ameaçar gravemente ou ridicularizar.

É notória a falta de fluência linguística, e a verdadeira falha científica na definição dos termos.

Ao tratar da violência física, emprega os termos ‘lesão’ e ‘sofrimento físico’. Lesão parece remeter ao artigo 129, do Código Penal, que, sob a rubrica ‘lesão corporal’ tipifica a conduta de ‘ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem’. Usa a Lei 13.010, de 26 de junho de 2014, pois, no Direito, termos estranhos à ciência jurídica -talvez a revelar a fonte idealizadora.

Quanto à violência psicológica, repise, é mencionado que qualquer ‘tratamento cruel ou degradante’ seria proibido. Mas sua definição seria, ex vi legis, de ‘conduta ou forma cruel de tratamento’, que humilhe, ameace gravemente ou ridicularize.

Patente o reclamo: fica estabelecido que tratamento cruel ou degradante é o agir cruel (SIC), que provoque determinadas consequências (‘cruel’ no caso de grave ameaça e ‘degradante’ no caso de humilhar ou ridicularizar).

Além de repetir o termo definido no campo da definição (‘cruel’), trata como sinônimos ‘cruel’ e ‘degradante’ no antecedente da proposição, os quais, do ponto de vista vernacular, não o são[2].

É certo que ridicularizar ou humilhar nunca foi aceito como forma de punição dos filhos[3], ainda que -como qualquer outro desvio- ocorresse por vezes. Por um motivo: o vínculo que une os membros da família -amor[4], instituto de sobrevivência, socialidade- é contrário ao animus injuriandi.

Por outro lado, a ‘ameaça’ e o contato físico (palmada, tapa, beliscão e outros) fazem parte da cultura brasileira, tão influenciada pela cultura indígena, latina e africana.

Assim, apenas casos animalescos, isto é, que refogem ao sentimento coletivo de justiça e atentam claramente contra o cerne da personalidade humana (afronta à dignidade) são vedados culturalmente. E não pode a Lei -democrática- querer mudar este sentimento.

Lembre-se a advertência de Augusto Comte:

Só o público deve indicar o objetivo a ser alcançado, porque, se nem sempre ele sabe o que lhe é necessário, sabe perfeitamente o que quer, e ninguém deve pensar em querer por ele.

Dos meios para atingir esse objetivo, ocupar-se-ão, entretanto, exclusivamente os especialistas em política, desde que tal objetivo seja claramente indicado pela opinião pública. Seria absurdo que a massa pretendesse discorrer a esse respeito. A opinião deve querer, os publicistas propor os meios de execução, e os governantes executar. Enquanto estas três funções não forem distintas, haverá confusão e arbítrio em maior ou menor grau.[5]

Daí, a tradição brasileira que se quer revogar por lei.

Como é cediço, o Código Civil de 1916, Lei 3.071, de 1º de janeiro de 1916, reservava ao pai o pátrio poder. O pai era o chefe da família e a ele cabia o poder sobre toda a família e patrimônio. Na sua falta ou impedimento, a mulher passava a exercê-lo; era, portanto, sucessivo.

Código Civil de 1916. Art. 233. O marido é o chefe da sociedade conjugal.

Compete-lhe:

I. A representação legal da família.

II. A administração dos bens comuns e dos particulares da mulher, que ao marido competir administrar em virtude do regime matrimonial adaptado, ou do pacto antenupcial (arts. 178, § 9º, nº I, c, 274, 289, nº I, e 311).

III. direito de fixar e mudar o domicílio da família (arts. 46 e 233, nº IV). (Vide Decreto do Poder Legislativo nº 3.725, de 1919).

IV. O direito de autorizar a profissão da mulher e a sua residência fora do tecto conjugal (arts. 231, nº II, 242, nº VII, 243 a 245, nº II, e 247, nº III).

V. Prover à manutenção da família, guardada a disposição do art. 277.

Art. 379. Os filhos legítimos, os legitimados, os legalmente reconhecidos e os adotivos estão sujeitos ao pátrio poder, enquanto menores.

Art. 380. Durante o casamento, exerce o pátrio poder o marido, como chefe da família (art. 233), e, na falta ou impedimento seu, a mulher.

Com a Lei 4.121, de 27 de agosto de 1962, que dispunha sobre a situação jurídica da mulher casada, procedeu-se a mudanças na Lei Civil, que .deram papel auxiliar à mulher -muito longe da isonomia trazida pela Carta de 1988.

Art. 233. O marido é o chefe da sociedade conjugal, função que exerce com a colaboração da mulher, no interêsse comum do casal e dos filhos (arts. 240, 247 e 251).

Compete-lhe:

I - A representação legal da família;

II - a administração dos bens comuns e dos particulares da mulher que ao marido incumbir administrar, em virtude do regime matrimonial adotado, ou de pacto, antenupcial (arts. 178, § 9º, nº I, c, 274, 289, nº I e 311); (Redação dada pela Lei nº 4.121, de 1962).

III - o direito de fixar o domicílio da família ressalvada a possibilidade de recorrer a mulher ao Juiz, no caso de deliberação que a prejudique;

IV - prover a manutenção da família, guardadas as disposições dos arts. 275 e 277.

Art. 380. Durante o casamento compete o pátrio poder aos pais, exercendo-o o marido com a colaboração da mulher. Na falta ou impedimento de um dos progenitores, passará o outro a exercê-lo com exclusividade. .

Mesma linha de evolução, de desconcentração do poder, percebeu-se na situação jurídica da prole.

Iniciou, juridicamente, como objeto de direito, conforme se vê no Código Civil de 1916, Lei 3.071, de 1º de janeiro de 1916[6], na Consolidação das Leis de Assistência e Proteção a Menores, Decreto 17.943A, de 12 de outubro de 1927,[7] e o Código de Menores, 6.697, de 10 de outubro de 1969[8].

Até mesmo o Código Civil vigente, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002, na redação original do artigo 1.634, praticamente repete o contido no código anterior. Mas imbuído do espírito liberal da Constituição de 1988, já não previa pátrio poder, senão poder familiar.

Desta forma, efetivamente, no mundo jurídico foi o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069, de 13 de julho de 1990[9], e a Constituição Federal de 1988[10], que trouxeram rol de direitos e garantias para as crianças e adolescentes, colocando-os em posições jurídicas ativas (explícitas).

Essa é a tônica adotada pelo Código Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002, com a redação dada pela Lei 13.058, de 22 de dezembro de 2014:

Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:

I - dirigir-lhes a criação e a educação;  (...)

IX - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. (g.n.)

Portanto, historicamente, é reconhecida a legitimidade de castigos físicos, ressalvados abusos.

Assim também se manifestou a doutrina:

Incumbe aos pais velar não só pelo sustento dos filhos, como pela sua formação, a fim de torná-los úteis a si, à família e à sociedade. O encargo envolve, pois, além do zelo material, para que o filho fisicamente sobreviva, também o moral, para que, por meio da educação, forme seu espírito e seu caráter.[11]

Em referência ao inciso VII, renumerado para IX Lei 13.058, de 22 de dezembro de 2014, Carlos Roberto Gonçalves afirma que os pais podem até castigar os filhos fisicamente, “desde que o façam moderadamente. A aplicação de castigos imoderados caracteriza o crime de maus-tratos, causa de perda do poder familiar (art.1.638, I)”[12].

Maria Helena Diniz, por sua vez, aponta que compete aos pais promover meios materiais para subsistência e instrução dos filhos, de acordo com suas possibilidades financeiras e posição social,

“preparando-os para a vida, tornando-os úteis à sociedade, assegurando-lhes todos os direitos fundamentais inerentes a pessoa humana. Cabe-lhes ainda dirigir espiritual e moralmente os filhos, formando seu espírito e caráter, aconselhando-os herdando-lhes uma formação religiosa”[13].

Continuando, preleciona que os pais

“podem, ainda, usar, moderadamente, seu direito de correção, como sanção do dever educacional, pois o poder familiar não poderia ser exercido, efetivamente, se os pais não pudessem castigar seus filhos para corrigi-los. Todavia, é preciso esclarecer, que embora os pais estejam legitimados a castiga-los, no exercício de seu poder disciplinar não estão autorizados os castigos imoderados; assim, os genitores que abusarem dos meios corretivos poderão ser destituídos do poder familiar, além de incorrerem em responsabilidade criminal” (CP, art.136)[14].

Sucintamente, confirmam-no Roberto Senise Lisboa[15], Regina Beatriz Tavares da Silva[16].

Portanto, a Lei 13.010, de 26 de junho de 2014, analisada cum grano salis, nada acrescentou[17]. Se interpretada literalmente[18], criar-se-ia subversão da condição social -migração da qualidade de filho à de senhor- e, juridicamente, incidiria em insanável inconstitucionalidade.

Outra questão a ser levantada está no âmbito das consequências: a quem interesse enfraquecer a família, o poder familiar.

Sabe-se que a pobreza nada diz sobre o caráter de um ser humano por si só. Porém, é sempre elemento que favorece a instigação do crime, a vontade de mudar de meio por qualquer caminho, a busca por bens materiais e poder -tudo o que não possui; o vício que não se consegue tratar; o alimento, a cultura que lhe são inacessíveis. Faz comum a necessidade de a mãe trabalhadeira, na costumeira família monoparental dos rincões, deixar seus filhos com pessoas não capacitadas, habilitadas, vocacionadas. Entre tantos outros fatores que periclitam uma personalidade em desenvolvimento, e a deixam exposta, cedo demais, ao crime, às drogas, à vulgaridade[19].

É nesse afã, de famílias lutando para se sustentar, para proteger seus membros mais fracos[20], que se busca proibir um mecanismo usado milenarmente. Extirpa-se, assim, uma ferramenta necessária para educação, disciplina e imposição do poder familiar.

Outro argumento contrário à literal interpretação da Lei 13.010, de 26 de junho de 2014, é utilitarista[21]: não será de auxílio às famílias a atingir justiça social e o bem estar. Muito pelo contrário, tolherá os genitores e facilitará o desrespeito à autoridade parental (que agiria no melhor interesse da criança e do adolescente).

Numa leitura fria, olvidando o caráter tridimensional do Direito[22], entende-se que a volunta legislatoris seria proscrever toda dor provocada contra o corpo de criança e adolescente, deixe ou não marcas[23].

Lembra-se que, desde o século XIX, a doutrina da interpretação da norma jurídica cindiu-se na investigação da vontade do legislador, com caráter subjetivista, de um lado, e na investigação dos aspectos imanentes e objetivistas, do outro. Essa separação continua até os dias presentes e é representada na vida jurídica dos povos, pois cada qual tem seu fundo de verdade, porém igualmente sua parcialidade.[24]

A verdade da teoria subjetivista é que a lei jurídica, ao invés da lei natural, é feita por homens e para homens, é expressão de uma vontade dirigida à criação de uma ordem tanto quanto possível justa e adequada às necessidades da sociedade. Por trás da lei há uma intenção reguladora, estão valorações, aspirações e reflexões substantivas, que nela acharam expressão mais ou menos clara. (...) A verdade da teoria objetivista é que a lei, logo que seja aplicada, irradia uma acção que lhe é peculiar, que transcende aquilo que o legislador tinha intentado. A lei intervém em relações da vida diversas e em mutação, cujo conjunto o legislador não podia ter abrangido e dá resposta a questões que o legislador ainda não tinha colocado a si próprio. Adquire, com o decurso do tempo, cada vez mais como que vida própria e afasta-se desse modo das ideias dos seus autores.[25]

Ainda que assim o seja, a vontade do legislador (como quer que se tenha tramitado nas Casas Legislativas) conflita com a realidade social que a lei se insere e produz. Por este motivo, temos que a men legis há de prevalecer, e assim o conteúdo restrito do dispositivo, porque é resultado necessário do enfrentamento das causas (socialidade da conduta que se quer proibir) e consequências (teratologia de proibir qualquer punição a pessoas em desenvolvimento que precisam ser educadas para integrar o meio social).

Nem precisa se afirmar que a tipicidade dos crimes previstos no artigo 129, 132, 135 e 136, do Código Penal, serão alteradas pela Lei 13.010, de 26 de junho de 2014, uma vez que, por expressa previsão legal, não tencionou criar tipo penal; pelo contrário, previu em seu artigo 1º (que criou o artigo 13 B, do Estatuto da Criança e do Adolescente), sanções próprias.

Verdadeiramente, essa é a única interpretação possível em face de um ato normativo evidentemente antissocial, e culturalmente dissociada da comunidade na qual que tenta influir.

 

Referências

 

BENTHAM, Jeremy. Uma Introdução aos Princípios da Moral e da Legislação, tradução de Luiz João de Baraúna, in Os Pensadores, v. XXXIV, Jeremy Bentham e Jonh Stuart Mill, 1ª edição, São Paulo: Abril Cultural, 1974.

COMTE, Augusto. Opúsculos de Filosofia Social, tradução de Ivan Lins e João Francisco de Souza, Porto Alegre: Globo; São Paulo: Ed da universidade de São Paulo, 1972.

DINIZ, Maria Helena. Direitos de Família, 5° volume: direito de família / Maria Helena Diniz, 21ª ed. rev. e atual. de acordo com o novo Código Civil (Lei n.10.406 de 10-01-2002) e o Projeto de Lei n.6.960/2002. – São Paulo: Saraiva, 2006.

DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado . 10. ed. ver. e atual. de acordo com o novo Código Civil (Lei n.10.406, de 10-1-2002). São Paulo: Saraiva, 2004.

FIUZA, Ricardo (coord). Novo Código Civil comentado, 3ª ed. atualizada, São Paulo: Saraiva, 2004.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Volume VI: Direito de Família – 4ª Ed, São Paulo: Saraiva, 2007.

ISHIDA. Válter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescente: doutrina e jurisprudência, 16ª edição, São Paulo: Atlas, 2015.

LARENZ. Karl. Metodologia da Ciência do Direito, 2ª edição, tradução de José Lamego e revisão de Ana de Freitas, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1983, p. 380-381.

LEPARGNEUR, Hubert. Antropologia do Sofrimento, Aparecida, SP: Editora Santuário, 1985.

MATURANA, Humberto. Emoções e Linguagem na Educação e na Política. Tradução de José Fernando Campos Fortes, 1ª edição atualizada, Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009.

NUCCI, Guilherme de Souza. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: Em busca da Constituição Federal das Crianças e dos Adolescentes, Rio de Janeiro: Forense, 2014.

REALE, Miguel. Filosofia do Direito, v. 2, 7ª edição, revista, São Paulo: Saraiva, 1975.

 

[1] Sobre o histórico do sofrimento, vide LEPARGNEUR, Hubert. Antropologia do Sofrimento, Aparecida, SP: Editora Santuário, 1985.

[2] Igualmente, NUCCI, Guilherme de Souza. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: Em busca da Constituição Federal das Crianças e dos Adolescentes, Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 53-54.

[3] Veja-se o A Consolidação das Leis de Assistência e Proteção a Menores, Decreto 17.943A, de 12 de outubro de 1927: “Art. 31. Nos casos em que a provada negligencia, a incapacidade, o abuso de poder, os máos exemplos, a crueldade, a exploração, á perversidade, ou o crime do pae, mãe ou tutor podem comprometer a saude, segurança ou moralidade do filho ou pupillo, a autoridade competente decretará a suspensão ou a perda do patrio poder ou a destituição da tutela, como no caso couber.”

Também o Código de Menores, Art. 2º Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor: II - vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável; V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária;”

Da mesma forma o Código Civil de 1916: “Art. 395. Perderá por ato judicial o pátrio poder o pai, ou mãe: I. Que castigar imoderadamente o filho. II. Que o deixar em abandono. III. Que praticar atos contrários à moral e aos bons costumes.”

[4] Veja-se MATURANA, Humberto. Emoções e Linguagem na Educação e na Política. Tradução de José Fernando Campos Fortes, 1ª edição atualizada, Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009, p. 24, grifos no original: “Em outras palavras, digo que só são sociais as relações que se fundam na aceitação do outro como legítimo outro na convivência, e que tal aceitação é o que constitui uma conduta de respeito. Sem uma história de interações suficientemente recorrentes, envolventes e amplas, em que haja aceitação mútua num espaço aberto às coordenações de ações, não podemos esperar que surja a linguagem. Se não há interações na aceitação mútua, produz-se a separação ou destruição. Em outras palavras, se há na história dos seres vivos algo que não pode surgir na competição, isso é a linguagem.”

[5] COMTE, Augusto. Opúsculos de Filosofia Social, tradução de Ivan Lins e João Francisco de Souza, Porto Alegre: Globo; São Paulo: Ed da universidade de São Paulo, 1972, p. 10-11.

[6] Vide artigo 384 a 395, do Código Civil de 1916.

[7] “Art. 1º O menor, de um ou outro sexo, abandonado ou delinquente, que tiver menos de 18 annos de idade, será submettido pela autoridade competente ás medidas de assistencia e protecção contidas neste Codigo.”

[8] “Art. 1º Este Código dispõe sobre assistência, proteção e vigilância a menores: I - até dezoito anos de idade, que se encontrem em situação irregular; II - entre dezoito e vinte e um anos, nos casos expressos em lei. Parágrafo único - As medidas de caráter preventivo aplicam-se a todo menor de dezoito anos, independentemente de sua situação.

Art. 2º Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor: I - privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de: a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável; b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las; II - vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável; III - em perigo moral, devido a: a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons costumes; b) exploração em atividade contrária aos bons costumes; IV - privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos pais ou responsável; V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária; VI - autor de infração penal. Parágrafo único. Entende-se por responsável aquele que, não sendo pai ou mãe, exerce, a qualquer título, vigilância, direção ou educação de menor, ou voluntariamente o traz em seu poder ou companhia, independentemente de ato judicial.”

[9] Vide, entre outros, Título II - Dos Direitos Fundamentais, artigo 7º a 69.

[10] Vide Título VIII - Da Ordem Social, Capítulo VII  Da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso.

[11] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Volume VI: Direito de Família – 4ª Ed, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 373.

[12] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Volume VI: Direito de Família – 4ª Ed, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 373.

[13] DINIZ, Maria Helena. Direitos de Família, 5° volume: direito de família / Maria Helena Diniz, 21ª ed. rev. e atual. de acordo com o novo Código Civil (Lei n.10.406 de 10-01-2002) e o Projeto de Lei n.6.960/2002. – São Paulo: Saraiva, 2006, p. 533.

[14] DINIZ, Maria Helena. Direitos de Família, 5° volume: direito de família / Maria Helena Diniz, 21ª ed. rev. e atual. de acordo com o novo Código Civil (Lei n.10.406 de 10-01-2002) e o Projeto de Lei n.6.960/2002. – São Paulo: Saraiva, 2006, p. 533.

Veja-se, DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado . 10. ed. ver. e atual. de acordo com o novo Código Civil (Lei n.10.406, de 10-1-2002). São Paulo: Saraiva, 2004. p. 1124: “a) castigar imoderadamente o filho menor, tornando-o vitima de maus-tratos (Lei n.8.069/90, arts.13, 87, III, e 130; CP, art.136; AASP, 1.957:51)”.

[15] LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil volume 5 : direito de família e das sucessões, 3ª ed. ver., atual. e ampl. da 2ª edição do livro Manual elementar de direito civil, Volume 5 – Direito de família e das sucessões – São Paulo ; Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 377.

[16] In FIUZA, Ricardo (coord). Novo Código Civil comentado, 3ª ed. atualizada, São Paulo: Saraiva, 2004, p.1.446.

[17] “a nomenclatura utilizada na Lei 13.010/2014, que alterou este Estatuto, foi inadequada e abusiva. Esse é o ponto fulcral da questão. Afinal, em sã consciência, quem poderia dizer que uma criança merece ser degradada e tratada cruelmente? São atos típicos de um dos piores crimes contra a humanidade: a tortura. Mas não é isso que se pretende atingir, pois a tortura, por si mesma, é crime equiparado a hediondo. Quer-se impor às famílias uma educação sem palmada, beliscão, tapa, puxão de cabelo etc. Qualquer conduta mais agressiva que isso já é crime e não precisaria da denominada Lei da Palmada para regular o óbvio. Embora, no Brasil, o legislador insista em editar leis a respeito de coisas evidentes.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: Em busca da Constituição Federal das Crianças e dos Adolescentes, Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 53)

[18] Favorável à interpretação literal da lei  está ISHIDA. Válter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescente: doutrina e jurisprudência, 16ª edição, São Paulo: Atlas, 2015, p. 43: “Veda a violência física ainda que moderada mesmo que fundamentada no argumento pedagógico. Trata-se de inclinação da moderna teoria educacional, que privilegia o diálogo e a orientação, elidindo o castigo físico.”

[19] Guilherme de Souza Nucci (Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: Em busca da Constituição Federal das Crianças e dos Adolescentes, Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 240), lembra do seguinte caso: “Exemplo concreto, encontrado em Curitiba, no Estado do Paraná: ‘Doa-se uma criança com apenas dois anos de idade. Come pouco, é obediente, sem gastos. Falar com xxxxxxx ou yyyyyyyy no telefone 00000000, pela manhã. Urgente! A criança está passando fome!’ Isso ilustra o abismo entre o que o Estado prega nas leis de proteção à criança ou adolescente e a triste realidade.”

[20] São conhecidos os casos de mães que amarraram filhos viciados em drogas às camas; ou que os trancafiam para evitar que saiam e roubem com amigos de comunidades.

[21] “A esta expressão [princípio da utilidade] acrescentei ultimamente -substituindo até a primeira- esta outra: a maior felicidade, ou o princípio da maior felicidade; isto por amor da brevidade, ao invés de expressar-me assim longamente: “o princípio que estabelece a maior felicidade de todos aqueles cujo interesse está em jogo, como sendo a justa e adequada finalidade da ação humana, e até a única finalidade justa, adequada e universalmente desejável; da ação humana, digo, em qualquer situação ou estado de vida, sobretudo na condição de um funcionário ou grupo de funcionários que exercm os poderes de governo”. A palavra “utilidade” não ressalta as ideias de prazer e dor com tanta clareza como o termo “felicidade” (hapiness, felicity); tampouco o termo nos leva a considerar o número de interessado; número este que constitui a circunstância que contribui na maior proporção para formar a norma em questão - a norma do reto e do errado, a única que pode capacitar-nos a julgar a retidão da conduta humana, em qualquer situação que seja. Esta falta de uma conexão suficientemente clara entre as ideias de felicidade e prazer, por uma parte, e a ideia de utilidade, por outra, tem constituído mais uma vez, para certas pessoas -conforme pude constatar-, um obstáculo para a aceitação do princípio acima, aceitação que, de outra forma, possivelmente não teria encontrado resistência. (nota do autor em julho de 1822)” (BENTHAM, Jeremy. Uma Introdução aos Princípios da Moral e da Legislação, tradução de Luiz João de Baraúna, in Os Pensadores, v. XXXIV, Jeremy Bentham e Jonh Stuart Mill, 1ª edição, São Paulo: Abril Cultural, 1974, p. 9).

[22] REALE, Miguel. Filosofia do Direito, v. 2, 7ª edição, revista, São Paulo: Saraiva, 1975, p. 476-482.

Dentro dessa teoria, essa passagem parece demonstrar o equívoco de qualquer interpretação literal da Lei 13.010, de 26 de junho de 2014: “A nosso ver, duas são as condições primordiais para que a correlação entre fato, valor e norma se opere de maneira unitária e concreta: uma se refere ao conceito de valor, reconhecendo-se que ele desempenha o tríplice papel de lemento constitutivo, gnoseológico e deontológico da experiência ética; a outra é relativa à implicação que existe entre o valor e a história, isto é, entre as exigências ideias e a sua projeção na circunstancialidade histórico-social como valor, dever ser e fim. Do exame dessas duas condições é que resulta a natureza dialética da unidade do Direito, como passamos a expor.” (op. cit., p. 476)

[23] Sobre a limitação conceitual de cada termo, vide NUCCI, Guilherme de Souza. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: Em busca da Constituição Federal das Crianças e dos Adolescentes, Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 53-56.

[24] LARENZ. Karl. Metodologia da Ciência do Direito, 2ª edição, tradução de José Lamego e revisão de Ana de Freitas, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1983, p. 380-381.

[25] LARENZ. Karl. Metodologia da Ciência do Direito, 2ª edição, tradução de José Lamego e revisão de Ana de Freitas, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1983, p. 381.