BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE OS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA 

RESUMO: O presente artigo tem por objetivo fazer uma breve análise acerca dos atos de improbidade administrativa, sua base legal, modalidades e as penas aplicáveis. 

PALAVRAS-CHAVE: improbidade administrativa – atos de improbidade – enriquecimento ilícito – dano ao erário – violação de princípios. 

INTRODUÇÃO

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) estatui os princípios básicos da Administração Pública em seu art. 37, determinando, no parágrafo 4º, a imposição de sanções para os atos de improbidade administrativa. Da violação do princípio da moralidade administrativa decorre a prática de ato de improbidade administrativa (ROSA: 2010, p. 210).

Segundo ROSA:

“Por improbidade administrativa entende-se o ato que afronta os princípios norteadores da atuação administrativa; é designativo da chamada corrupção administrativa ou, tecnicamente, fato jurídico decorrente de conduta humana, positiva ou negativa, de efeitos jurídicos involuntários. É ilícito político-administrativo, que induz à aplicação de sanções de natureza extrapenal em processo judicial.”

Nesse contexto, conclui-se que improbidade é sinônimo de desonestidade ou má-fé, consubstanciando a improbidade administrativa na violação do dever imposto a todo agente público de atuar com probidade.

Na lição de ALEXANDRINO e PAULO (2010, p. 311):

“O § 4º do art. 37 do Texto Magno é uma norma constitucional de eficácia limitada. Em 1992 ocorreu sua necessária regulamentação, operada pela Lei 8.429/1992, diploma de caráter nacional, isto é, de observância obrigatória para a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios.”

Ainda segundo ALEXANDRINO e PAULO (2010, p. 310), “a norma alcança a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes, em todos os entes da Federação, não só pela amplitude de sua redação, mas, também, pelo fato de estar situada no art. 37 da Constituição Federal”.

A improbidade administrativa é um assunto que está em voga nos dias atuais, diante da proliferação da corrupção em todos os escalões do governo.

O presente trabalho abordará os atos de improbidade administrativa, dando especial enfoque às três modalidades previstas na Lei nº 8.429/92, e às sanções aplicáveis. 

1. ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Os atos de improbidade administrativa estão previstos na Lei nº 8.429/92, denominada Lei de Improbidade Administrativa (LIA), que os divide em três categorias, em seus artigos 9º, 10 e 11.

O artigo 9º trata da improbidade administrativa que gera enriquecimento ilícito e o artigo 10 aborda a modalidade que causa dano ao erário, por ação ou omissão, dolosa ou culposa. Por fim, o artigo 11 traz os atos que violam os princípios da administração pública, como legalidade, moralidade e imparcialidade.

Passa-se agora à análise de cada uma das modalidades de atos de improbidade administrativa.

1.1 Atos que importam enriquecimento ilícito

Prescreve o art. 9º da Lei de Improbidade Administrativa (LIA) que constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º.

Para configuração do enriquecimento ilícito é necessário: ação ou omissão dolosa do agente; vantagem patrimonial ilícita, isto é, qualquer vantagem que não corresponda à remuneração legal do agente e; nexo causal entre o enriquecimento e o exercício funcional.

O art. 9º traz, em seus incisos, rol meramente exemplificativo dos atos de improbidade que causam enriquecimento ilícito. São eles:

“I – receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto,

que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público;

II – perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação de serviços pelas entidades referidas no artigo 1o por preço superior ao valor de mercado;

III – perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a alienação, permuta ou locação de bem público ou o fornecimento de serviço por ente estatal por preço inferior ao valor de mercado;

IV – utilizar, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades mencionadas no artigo 1o desta Lei, bem como o trabalho de servidores públicos, empregados ou terceiros contratados por essas entidades;

V – receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para tolerar a exploração ou a prática de jogos de azar, de lenocínio, de narcotráfico, de contrabando, de usura ou de qualquer outra atividade ilícita, ou aceitar promessa de tal vantagem;

VI – receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer declaração falsa sobre medição ou avaliação em obras públicas ou qualquer outro serviço, ou sobre quantidade, peso, medida, qualidade ou característica de mercadorias ou bens fornecidos a qualquer das entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei;

VII – adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público;

VIII – aceitar emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou assessoramento para pessoa física ou jurídica que tenha interesse suscetível de ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público, durante a atividade;

IX – perceber vantagem econômica para intermediar a liberação ou aplicação de verba pública de qualquer natureza;

X – receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indiretamente, para omitir ato de ofício, providência ou declaração a que esteja obrigado;

XI – incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei;

XII – usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei.”

           

A prática de atos dessa natureza sujeita o responsável às seguintes cominações (art. 12, I): (a) perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao seu patrimônio; (b) obrigação de ressarcimento do dano, quando houver; (c) perda da função pública; (d) suspensão dos direitos políticos; (e) pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial; e (f) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de dez anos.

1.2 Atos que importam dano ao erário

Considera-se ato de improbidade que causa prejuízo ao erário qualquer ação ou omissão dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades previstas no art. 1º (art. 10).

Para configuração dessa modalidade de ato é necessário a concorrência dos seguintes requisitos: ação ou omissão do agente; dolo ou culpa; lesão efetiva ao erário, pois se a lesão não for real, haverá violação do art. 11 e não do art. 10; e nexo causal entre o prejuízo e a conduta do agente.

O art. 10 prevê, de forma exemplificativa, os seguintes atos que causam lesão ao erário:

“I – facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei;

II – permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;

III – doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou assistenciais, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei, sem observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie;

IV – permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrante do patrimônio de qualquer das entidades referidas no artigo 1º desta Lei, ou ainda a prestação de serviço por parte delas, por preço inferior ao de mercado;

V – permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado;

VI – realizar operação financeira sem observância das normas legais e regulamentares ou aceitar garantia insuficiente ou inidônea;

VII – conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;

VIII – frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá‑lo indevidamente;

IX – ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;

X – agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público;

XI – liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;

XII – permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;

XIII – permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei, bem como o trabalho de servidor público, empregados ou terceiros contratados por essas entidades;

XIV – celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestação de serviços públicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades previstas na lei;

XV – celebrar contrato de rateio de consórcio público sem suficiente e prévia dotação orçamentária, ou sem observar as formalidades previstas na lei.”

Quem incorrer nessa modalidade de ato de improbidade estará sujeito às seguintes sanções (art. 12, inc. II): (a) obrigação de ressarcimento integral do dano; (b) perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio; (c) perda da função pública; (d) suspensão dos direitos políticos; (e) pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano; e (f) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de cinco anos.

1.3 Atos que importam violação de princípios

Por fim, prevê o art. 11 da LIA, que constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da Administração Pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições.

Para a configuração desse tipo de ato, devem estar presentes os seguintes requisitos: ação ou omissão do agente; violação de qualquer princípio constitucional relativo à Administração Pública; dolo do agente; e nexo causal entre a violação e a função pública.

O referido artigo arrola os seguintes atos como atentatórios aos princípios da Administração Pública:

“I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto na regra de competência;

II – retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;

III – revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo;

IV – negar publicidade aos atos oficiais;

V – frustrar a licitude de concurso público;

VI – deixar de prestar contas quando esteja obrigado a faze‑lo;

VII – revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço.”

       Quem incorrer nesse tipo de ato estará sujeito às seguintes cominações (art. 12, inc. III): (a) obrigação de ressarcimento integral do dano, se houver; (b) perda da função pública; (c) suspensão dos direitos políticos; (d) pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente; e (e) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de três anos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se do exposto que nosso ordenamento jurídico condena os atos de improbidade administrativa, impondo responsabilização aos agentes que incorram em sua prática.

Constitui a Lei nº 8.429/92 importante instrumento de combate à corrupção no setor público que, a despeito de contar com duas décadas de vigência, ainda gera muitas discussões entre os aplicadores do direito.

As sanções cominadas pela LIA aos atos de improbidade administrativa aplicam-se independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica.

Demais disso, as penas previstas para cada categoria de ato de improbidade podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do ato (art. 12, caput).

A jurisprudência do STJ é no sentido de que as penas previstas no art. 12 da LIA não devem ser necessariamente aplicadas de forma cumulativa. Cabe ao magistrado dosar as sanções de acordo com a natureza, gravidade e consequências do ato ímprobo. É indispensável, sob pena de nulidade, a indicação das razões para a aplicação de cada uma delas, levando em consideração os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (REsp 658.389).

De qualquer forma, não poderá o juiz, na fixação das penas, perder de vista a extensão do dano causado, bem como o proveito patrimonial obtido pelo agente.           

REFERÊNCIAS:

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Resumo de direito administrativo descomplicado. 3. ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2010. 

BRASIL. Lei n. 8.429, de 02 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8429.htm>. Acesso: 11 dez. 2012. 

______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 11 dez. 2012. 

ROSA, Márcio Antônio Fernando Elias. Direito administrativo parte II – col. sinopses jurídicas – São Paulo: Saraiva, 2010. 

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Improbidade administrativa: desonestidade na gestão dos recursos públicos. Disponível em: < http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=103422>. Acesso em: 11 dez. 2012.